nov
28
2011

Flexibilizar o horário do programa “A voz do Brasil” proporciona bem-estar social?

Há proposições no Congresso Nacional que buscam flexibilizar o horário de veiculação do programa de rádio A Voz do Brasil. Pelas regras atuais, A Voz do Brasil é apresentada obrigatoriamente todos os dias úteis da semana no horário de 19 às 20 hs. Uma das alternativas propostas é permitir o horário de apresentação do programa entre o intervalo das 19 às 22 hs. Dessa forma, as rádios poderiam escolher, dentro da melhor conveniência, a retransmissão do programa.

Os debates no parlamento, sobre o tema, originaram três correntes de pensamento em torno do programa. A primeira posiciona-se pela extinção da obrigatoriedade da transmissão; a segunda corrente defende a continuação da obrigatoriedade com horário único e fixo para veiculação e, finalmente, há a que advoga pela manutenção da obrigatoriedade, porém, com a livre escolha do horário da transmissão.

A ABERT (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão) tem pressionado os deputados e senadores pela aprovação da flexibilização. O argumento é que esse horário é considerado nobre, com potencial econômico grande para as rádios e, ainda, a mudança poderia colaborar na prestação de serviços. Dessa forma, poderia ser mais explorado comercialmente.

Outra corrente de atores políticos, que também são favoráveis à flexibilização, acreditam que a população teria ganhos com o fim da rigidez do horário. O argumento utilizado diz respeito ao horário do programa hoje em vigor, que é justamente o período onde ocorre o maior fluxo de trânsito nas grandes metrópoles brasileiras. Assim, os envolvidos, e muitas vezes presos literalmente no trânsito, deveriam poder escolher de forma a maximizar sua utilidade, fato que hoje não ocorre devido à obrigação de transmissão do programa.

Os atores políticos contrários à proposta partem do princípio de que as regiões do Brasil, menos favorecidas economicamente, saem perdendo com a flexibilização, visto que o acesso a jornais e televisão é mais restrito. Outro argumento questiona: quem vai fiscalizar se as emissoras de rádio estarão de fato transmitindo em horários diferenciados? Entretanto, quanto à punição, está estipulada na proposição a suspensão por um dia das atividades das emissoras de rádio que descumprissem as normas de retransmissão. Isso mostra que a punição está de acordo, já que o prejuízo da emissora é grande se ela contrariar a lei. Resta saber se a punição seria efetiva.

Não flexibilizar fere a liberdade de escolha do cidadão, uma vez que ter um horário obrigatório em rede nacional torna-se uma imposição que só encontra situações semelhantes em países com regimes políticos fechados e ditatoriais. Além do mais, flexibilizar corrigiria uma falha de mercado (concorrência desleal entre as TVs e as rádios, pois os primeiros não têm a obrigação de ceder espaço em horário determinado pelo governo). Entretanto, temos que considerar o ponto de vista do Estado, que deverá criar uma estratégia de informação que lhe sirva para defender os seus próprios interesses dentro das regras do jogo. Ou seja, adaptar os pontos de vista globais a um modelo que favoreça um determinado conjunto de interesses nacionais e sociais, sem que, com isso, comprometa a eficácia do poder.

A dificuldade para alteração das atuais regras se dá pelo jogo de interesses entre o governo, políticos sem concessão de rádio, ABERT e os políticos com concessão de rádio. A ferramenta utilizada para manusear esse jogo é o lobby. O interesse comercial da Associação, somado a políticos (com concessão), que estão trabalhando em causa própria, pode proporcionar externalidades negativas para a sociedade, uma vez que esses atores defendem suas próprias motivações.

Assim, cabe ao Estado regular a atividade para proteger o interesse público, porém, tomando os devidos cuidados contra possíveis falhas de governo. Uma delas é o privilégio do governo de dispor de um horário exclusivo para expor seus projetos e ideias, o que caracteriza um monopólio estatal, visto que a oposição não tem a mesma regalia.  Com isso, perde a sociedade, pois é necessária uma pluralidade de informações, uma vez que os meios de comunicação, em uma democracia, deveriam levantar um debate de ideias para que os indivíduos possam formular suas próprias opiniões.

Outra situação de ineficiência é vista quando o mercado ou o Estado produziriam menos riqueza e bem-estar do que seria desejável e possível. Isso é decorrente de um problema na alocação eficiente dos recursos. Uma delas é o monopólio, onde o monopolista tem incentivos para aumentar seus preços e extrair parcela do bem-estar do consumidor. Para a presente discussão, torna-se especialmente interessante a análise do monopólio estatal, que coloca a imprensa oficial em cômoda situação na qual até mesmo a ineficiência e a má qualidade são premiadas pela fidelidade compulsória dos consumidores.

O Poder Judiciário, ao analisar a questão, utiliza a ótica estritamente legal, argumentando que a radiofrequência é uma concessão da União e, portanto, não cabe às rádios argumentarem que a obrigatoriedade da Voz do Brasil seja uma violação à liberdade de expressão. Isto é, não houve uma correta avaliação da eficiência ou do bem estar social, que estão inseridos no entendimento da análise econômica do direito.

O fato de o Estado deter o monopólio sobre o horário de transmissão do programa pode acarretar ineficiências, pois não há motivação para inovações. O Estado não tem incentivos para investir em melhorias e mudanças no programa, já que não conta com concorrência pela audiência. Isso fica mais evidente ao observar o formato padronizado e muito constante ao longo dos anos de transmissão. A consequência imediata é que, apesar da exclusividade do horário, não se está utilizando a melhor maneira de transmitir a informação.

Como o programa é uma das poucas maneiras pela qual a sociedade tem de receber notícias dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, seria prejudicial simplesmente extingui-lo. Assim, por meio dos seus representantes no Congresso Nacional ou por outros canais de comunicação, é importante que a população sinalize sua preferência pela manutenção ou flexibilização do horário. Dessa forma, diminuiria a assimetria informacional no processo decisório, fazendo com que, mesmo influenciados pelo lobby, os representantes atentem para o bem-estar social.

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Bibliografia utilizada

ARAGÃO, Alexandre dos Santos, inAgência Reguladoras” – Editora Forense – 2006 – p. 37.

Análise Econômica do Direito [Internet]. Fernando Meneguin. 2011. Disponível em: <http://aulasaed.wordpress.com/>.

CAMPOS, H. Alves de. Falhas de Mercado e Falhas de Governo: uma revisão da literatura sobre regulação econômica. Prismas: Direito, Políticas Públicas e Mundialização (Brasília. Impresso), v. 5, n.2, p. 281-303, 2008.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.  Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. 8. ed. rev. e amp. São Paulo: Atlas, 2011, p. 204-205.

GARRIDO, L. P.; De Lima Dantas, George Felipe. Mal-estar da segurança Pública. Revista Jurídica Netlegis, 16 dez. 2010.

RUA, Maria das Graças. Análise de Políticas Públicas: Conceitos Básicos. Washington, Indes/BID, 1997, mimeo.

Sobre o Autor:

Emerson B., Geraldo M., Rafael P. e Vanderlei V.

Alunos de graduação do curso de Gestão Pública da Universidade Federal de Minas Gerais.

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9 Comentários Comentar

  • Tem que sair de cima do muro.
    Não há qualquer interesse “nacional” ou “social” na hora do Brasil.
    É um mero interesse governamental.

  • Parabéns Galera!… Show de Bola… O Artigo ficou excelente. Que futuramente vocês possam ser agraciados com mais publicações. Sucesso!…

  • A meu ver, o horário não deve ser flexibilizado de maneira alguma. Por que sempre a mídia privada deve ter preferência sobre a mídia pública?

    O mundo hoje gira em torno de geração de riqueza, e esquecem da geração de cultura, de notícias bem estruturadas e fundamentadas. A flexibilização seria possível se a mídia, essa mesma mídia que enriquece com a flexibilização do horário da Voz do Brasil, não adaptasse informações ao seu interesse, não criasse falácias sobre o que está sendo feito pelo governo. É necessário que o poder público tenha um programa em horário que a população escuta, senão, qual o sentido?

    • noticias bem estruturadas e fundamentadas, na voz do Brasil? kkkkkkkk

      que cinismo… so pode ser um funcionario da EBC

    • Acho que não se trata de favorecer o privado , pois no horário da 19 todo mundo esta no transito , no carro , ou no ônibus ouvindo rádio, isso quer dizer LIBERDADE!!! oUTRA COISA , QUERENDO OU NÃO OS números mostram como TODOS desligam as rádio nesse horário. Trata-se do fomento e melhor exposição dos anunciantes afim da manutenção de empregos na área, o que ja é raro , e empregos das famílias dos anunciantes. Democracia de fez com alternância de poder e de ideias. tem uma petição rolando vou fechar e publicar

  • Penso que não deva haver flexibilização, afinal é dos poucos canais que os poderes tem de expressar suas opiniões de forma não mediada pelos grandes meios. O espectro eletromagnético é bem público e difuso que é quase 100% utilizado e explorado por grupos privados. Não temos pluralidade de grandes meios de comunicação. Enquanto não se regulamentar os artigos 220 a 223 da CF e se implementar várias da resoluções da CONFECOM não que se falar de democracia em comunicações no Brasil.

  • Caros Parlamentares,

    Minha opinião é que o nosso tradicional programa A VOZ DO BRASIL continue sendo exibido todos os dias às 19 horas.
    Nossa rede de comunicação (TV e Rádio) não oferece informações suficientes para que a população tenha um conhecimento adequado das iniciativas do poder público.
    Gostaria até que no mesmo horário tivessemos o mesmo programa em todos os canais de televisão, inclusive na TV paga.

    José Antonio Moreira
    São Bernardo do Campo – SP
    Economista e contador

  • Dever ser flexibilizado sim. Quem realmente se interessa em ouvir o programa não encontrará problemas em sintonizá-los em outros horários. Sem falar que se essa história de que “A Voz do Brasil existe para se fazer cumprir a determinação de que rádios tenham 5% de conteúdo jornalístico em sua programação” funcionasse ao pé da letra, emissoras como Bandnews FM e CBN podem passar longe dessa aberração radiofônica.

  • No dia de hoje foi confirmado pelo STF a continuação da obrigatoriedade dessa ABERRAÇÃO intitulada A Voz do Brasil.

    Lamentável e retrógrada, como tantas outras obrigatoriedades, muito mais em uma cidade como São Paulo que tem no horário das 19 horas o pico do trânsito, quando as rádios prestam um serviço fundamental e de enorme utilidade pública, auxiliando os milhões de motoristas a retornarem mais rapidamente e em paz às suas casas. Para quem não mora em São Paulo ter uma idéia, é comum ouvirmos nos horários de maior movimento os ouvintes que ligam para as rádios para denunciarem os bandos de abutres, chamados de “trombadinhas” (na verdade assassinos bárbaros) que atacam os motoristas para assaltá-los, uma vez que isso é mais eficiente do que ligar para a Policia. E o STF nos tirou definitivamente a possibilidade de ter algum serviço que nos auxilie nessa hora de nervosismo e muitas vezes de desespero.

    Em resumo : o STF quer o programa, mas o povo brasileiro não quer !!!! Qual será o interesse de um órgão que deveria zelar pela modernização das leis brasileiras em manter esse absurdo ?

    PELA FLEXIBILIZAÇÃO DO HORARIO DO PROGRAMA A VOZ DO BRASIL !!!!!!!!

    Não sei como fazer isso, mas será que ninguém pode organizar um abaixo-assinado que mostre claramente a esse colégio de retrógrados a vontade do povo ? Se eu puder colaborar de alguma forma, contem comigo !

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