dez
21
2021

Avanços recentes na Governança da Infraestrutura Brasileira

Avanços recentes na Governança da Infraestrutura Brasileira

Por Gabriel Fiuza de Bragança[1], Rodolfo Gomes Benevenuto[2], Diego Camargo Botassio[3], Fabiano Mezadre Pompermayer[4] e Rafael Ribeiro Silveira[5]

Investimentos em infraestrutura são essenciais para o desenvolvimento socioeconômico de um país. Entende-se por infraestrutura, estruturas e ações que servem de sustentação para o desempenho de diversas atividades econômicas, conferindo efeito multiplicador por toda a cadeia produtiva do país.

É importante frisar que as políticas de investimento em infraestrutura são estratégicas e, constantemente, os recursos para sua execução são escassos. Os desafios fiscais e a busca pela maior efetividade nas ações de interesse público exigem uma priorização daqueles empreendimentos que maximizem os retornos econômicos e sociais para cada real investido. Para isso, é necessário um processo de governança bem definido, envolvendo a estruturação, avaliação e monitoramento de projetos de investimento em infraestrutura. Todo esse conjunto traz transparência, racionalidade e eficiência para os investimentos de interesse público.

Diversas iniciativas têm sido desenvolvidas para propor modelos de governança nesse contexto. Destaca-se, para infraestrutura, o Grupo de Trabalho de Investimentos em Infraestrutura, instituído no âmbito do Comitê Interministerial de Governança (CIG) pela Resolução CIG nº 01/2019, que contou com a participação, enquanto convidados, de representantes dos ministérios setoriais de infraestrutura. Este grupo de trabalho propôs um Modelo de Governança dos Investimentos Públicos, baseado em avaliação sistemática dos projetos de investimento público, portões de aprovações por meio de comitês interministeriais, conforme o nível de maturidade dos projetos, e uma entidade independente para emitir pareceres sobre os projetos propostos (https://www.gov.br/casacivil/pt-br/assuntos/governanca/comite-interministerial-de-governanca/arquivos/relatorio_final.pdf).

Passos importantes para a implementação de boas propostas de governança também foram dados com a criação do Comitê Interministerial de Planejamento da Infraestrutura (CIP-Infra) e o Plano Integrado de Longo Prazo da Infraestrutura (Pilpi), ambos instituídos pelo Decreto 10.526/2020. Nesse plano, os novos projetos de infraestrutura já devem ter sua viabilidade socioeconômica estimada.

Nessa direção, considerando a ausência de metodologias padronizadas para estruturação, avaliação e monitoramento dos resultados alcançados para projetos de infraestrutura que estabeleça uma boa governança dos recursos, a Secretaria de Desenvolvimento da Infraestrutura (SDI), da Secretaria Especial de Produtividade e Competitividade (SEPEC) do Ministério da Economia (ME), tem desenvolvido, desde 2019, uma série de iniciativas com o objetivo de  sistematizar e disseminar as melhores práticas nacionais, internacionais e acadêmicas para estruturação, avaliação e monitoramento de projetos de infraestrutura.

Uma dessas iniciativas foi a publicação do Guia Geral de Análise Socioeconômica de Custo-Benefício de Projetos de Investimento em Infraestrutura (Guia ACB) publicado em 2021. A metodologia abordada no Guia ACB consiste em avaliar, de uma perspectiva ex ante, o valor socioeconômico dos projetos de infraestrutura para a sociedade. Para isso, o método se baseia na projeção dos efeitos comparativos (incrementais) do projeto ao longo do seu ciclo de vida (custos e benefícios) em relação a um cenário sem o projeto.

Para efeito de comparação, o processo é convertido em indicadores que possibilitam avaliar a viabilidade socioeconômica do projeto. Essa prática também é adotada em diversos países referência no gerenciamento de investimentos públicos, como o Chile (Chile, 2013), Reino Unido (H.M. Treasury, 2018), Austrália (Australia, 2018) e Coreia do Sul, e está em linha com recomendações de organismos multilaterais (Banco Mundial, 2017; FMI, 2018).

Além disso, vale ressaltar o papel fundamental do Guia ACB na implementação das estimativas de viabilidade socioeconômica previstas no Pilpi 2021-2050, publicado em dezembro de 2021. De igual maneira, ressalta-se o Decreto nº 10.411, de 30 de junho de 2020, que regulamentou a Análise de Impacto Regulatório (AIR), que estabeleceu a ACB como uma das metodologias recomendadas, no âmbito da AIR, para aferição do impacto econômico. Ainda, o documento “Diretrizes Gerais e Guia Orientativo para Elaboração de Análise de Impacto Regulatório – AIR” da Casa Civil da Presidência da República, publicado em junho de 2018, ressaltou que “segundo as práticas dos países mais avançados no uso da AIR, a análise que oferece mais informações e dados para a tomada de decisão é a análise de custo-benefício. Isso mostra o alinhamento das ações governamentais a caminho da adoção sistemática de análise socioeconômica como critério de decisão.

Tão importante quanto padronizar as metodologias de avaliação é disseminá-las. Por isso, junto à padronização das metodologias, foi criado em parceria com a Escola Nacional de Administração Pública (Enap) em programas de capacitação para servidores públicos. Essa ação endereça uma das principais barreiras para a consolidação de um modelo mais robusto e efetivo de planejamento da infraestrutura.

Até o momento, 300 pessoas já foram capacitadas nas metodologias do Guia Geral de Análise de Custo-Benefício (ACB) e M5D em turmas-piloto organizadas pela SDI com apoio da Enap e do governo britânico. Essas turmas incluem servidores da Casa Civil da Presidência da República; dos Ministérios Setoriais (MDR, MINFRA, MME, MCOM, MCTI), empresas de planejamento (EPE, EPL), bancos de desenvolvimento (BNDES, Caixa, BDMG), instituições de desenvolvimento (ABDI, SUDENE), órgãos de controle (CGU, TCU), instituições setoriais (Dnit, Codevasf, Dnocs); além de integrantes dos governos dos estados do Ceará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Bahia, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Pará e Santa Catarina.

As capacitações já estruturadas têm sido realizadas de maneira remota possibilitando ganho de escala e maior participação dos servidores das esferas estadual e municipal. A articulação e disseminação das entregas produzidas por essa política já foram reconhecidas por outros órgãos do governo. São exemplos: relatório anual sobre as fiscalizações de obras públicas (Fiscobras) do TCU, o Guia de Planejamento Setorial do Ministério da Infraestrutura, relatórios do Comitê Interministerial de Planejamento da Infraestrutura (CIP-Infra) e etc.

No relatório Fiscobras 2021, é relatado que um dos problemas chaves para alavancar a infraestrutura nacional é a estruturação, priorização e seleção de projetos, tanto para ações de desestatizações quanto para a execução de ações com recursos públicos. Conforme mostra o parágrafo 32: 

“32. A partir dos principais diagnósticos sobre os problemas-chave para alavancar a infraestrutura nacional, realizados pelo Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional, OCDE, Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República e pelo Instituto de Pesquisas Aplicadas, pode-se concluir por problemas estruturais e crônicos em dois segmentos principais: 32.1. Planejamento de longo prazo, avaliação, estruturação e priorização de projetos, tanto para ações de desestatizações quanto para execução de ações com recursos públicos; e 32.2. Governança do processo de planejamento orçamentário, especialmente da alocação de recursos por meio de emendas orçamentárias, nesse último caso específico para obras públicas.”

E no parágrafo 74, o guia ACB é mencionado explicitamente:

“74. É digno de nota que, nessa linha, o Ministério da Economia lançou em 2021 o guia de Avaliação Custo-Benefício (ACB) de projetos de investimentos. Tal guia é um importante referencial para se examinar o grau de maturidade dos projetos utilizando-se do método dos cinco casos (5 case model), utilizado pelo Tesouro Britânico no exame da maturidade de projetos no Reino Unido.”

Em resumo, essa iniciativa é mais um avanço no aprimoramento do planejamento da infraestrutura nacional, em conformidade com as melhores práticas internacionais utilizadas há décadas em países como Reino Unido, União Europeia, Austrália, Estados Unidos, Canadá, Coreia do Sul e Chile. A experiência bem-sucedida nesses países assola a importância da seleção robusta e sistemática de projetos de infraestrutura para garantir uma economia produtiva, competitiva, sustentável e socialmente mais justa a longo prazo.

Retroalimentando a avaliação dos projetos de infraestrutura, a SDI também está comprometida em disseminar métodos de avaliação de resultados da implantação de investimentos em infraestruturas. Os estudos que avaliam os impactos causados por esses investimentos são essenciais para que sejam avaliadas as lições aprendidas, e assim sejam aplicadas em novos investimentos.

E para isso, a literatura em avaliação ex post apresenta metodologias para relações causais sobre impactos decorrentes do projeto. Nesse caminho, a SDI, no âmbito da cooperação internacional do governo brasileiro com o Programa das Nações para o Desenvolvimento (PNUD), contratou a consultoria Pezco Economics para o desenvolvimento de sete estudos de caso paradigmáticos visando a disseminação de melhores práticas de avaliações ex post nos setores de: logística, energia, segurança hídrica, mobilidade urbana, telecomunicações, saneamento básico e habitação social. Mais do que avaliar os projetos em si, tal iniciativa irá consolidar e disseminar metodologias que facilitem avaliações ex post de projetos de infraestrutura em todos os níveis de governo no país.

 

 

Referências

Transport and Infrastructure Council. Transport Assessments and Planning Guidelines (ATAP) – T2 Cost Benefit Analysis.

Banco Mundial [Martin Raiser, Roland N. Clarke, Paul Procee, Cecilia M. Briceño-Garmendia, Edith Kikoni, Joseph E. Kizito e Lorena Viñuela]. 2017. Back to planning: how to close Brazil’s infrastructure gap in times of austerity. Washington, D.C: World Bank Group.

Banco Mundial [Jay-Hyung dim, Jonas Arp Fallov e Simon Groom]. 2020a. Public Investment Management Reference Guide. International Development in Practice. Washington, D.C: World Bank. Disponível em https://openknowledge.worldbank.org/handle/10986/33368.

Banco Mundial. 2020b. Infratech Value Drivers. World Bank, Washington, DC. Disponível em https://openknowledge.worldbank.org/handle/10986/34320.

Banco Mundial. 2020c. Infratech Policy Toolkit. World Bank, Washington, DC. Disponível em https://openknowledge.worldbank.org/handle/10986/34326.

Banco Mundial [Stephane Hallegatte. Rubaina Anjum, Paolo Avner, Ammara Shariq, Michelle Winglee, Camilla Knudsen]. 2021. Integrating Climate Change and Natural Disasters in the Economic Analysis of Projects: A Disaster and Climate Risk Stress Test Methodology. Washington, D.C.: World Bank. Disponível em https://openknowledge.worldbank.org/handle/10986/35751.

Chile, Gobierno del. 2013. Ministério de Desarollo Social. Metodología General de Preparación y Evaluación Social de Proyectos. División de Evaluación Socialde Inversiones. Santiago.

  1. M. Treasury. 2018. Green book: appraisal and evaluation in central government. London. Disponível em https://www.pempal.org/sites/pempal/files/attachments/uk-green-book_eng.pdf.

[1] Gabriel Fiuza de Bragança é secretário adjunto de Desenvolvimento da Infraestrutura do Ministério da Economia.

[2] Rodolfo Gomes Benevenuto é subsecretário de Inteligência Econômica e Monitoramento de Resultados da Secretaria do Desenvolvimento da Infraestrutura do Ministério da Economia.

[3] Diego Camargo Botassio é coordenador-geral de Inteligência Econômica da Secretaria do Desenvolvimento da Infraestrutura do Ministério da Economia.

[4] Fabiano Mezadre Pompermayer é subsecretário de Planejamento Nacional da Secretaria do Desenvolvimento da Infraestrutura do Ministério da Economia.

5] Rafael Ribeiro Silveira é coordenador de Monitoramento e Resultados da Secretaria do Desenvolvimento da Infraestrutura do Ministério da Economia.

 

 

Sobre o Autor:

Gabriel Fiuza de Bragança

1 Comentário Comentar

  • Talvez vocês tenham considerado, porém no texto acima não foi mencionada a relevância dos fatores ambientais. O ESG vem sendo rapidamente adotado pelas empresas e fundos de investimentos, e considerando que a Infraestrutura necessitará de investimentos, sugerimos incluir na orientação os indicadores ambientais.

    No projeto Brasil 5.0 desenvolvemos um framework harmonizando a 3a hélice com o ESG que resultou no framework da 6a hélice, e a partir de janeiro de 2022 iniciaremos a jornada de evolução para o Brasil 6.0, ampliando o propósito: Brasil 6.0 – Protagonista na Inovação e Transformação Digital Global com Sustentabilidade: Econômica, Social e Ambiental.

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