31
2020
O que são as taxas de juros reais negativas?


Antes de discutir juros reais negativos, cabe esclarecer o que são juros reais. Os economistas distinguem a taxa de juros nominal da taxa de juro real. A primeira é a taxa, por período de tempo, negociada em transações como empréstimos e investimentos financeiros. Por exemplo, a poupança rende 70% da taxa Selic, a taxa básica de juros fixada pelo governo, em termos nominais, mais a chamada Taxa Referencial (TR), que se encontra zerada há tempos. A Selic está em 2,25% ao ano e 70% disso equivalem a 1,575% ao ano, ou 0,13% ao mês. Para chegar à taxa real, por exemplo, compara-se esta taxa com a da inflação mensal, usualmente a medida pelo IPCA, do IBGE. Ela foi de 0,26% em junho. Ou seja, se comparada com a inflação deste último mês, a poupança teve taxa de juros real negativa.
Mas vale lembrar que em abril e maio as taxas do IPCA foram negativas, -0,38% e -0,31%, respectivamente, e o ganho da poupança foi claramente positivo nesses dois meses. Ademais, a previsão do IPCA para agosto é de 0,10%, segundo o Relatório Focus, do Banco Central, de 24/7/20, que coleta semanalmente as previsões do mercado, o que daria outro ganho real para a poupança se a Selic permanecer como está e essa previsão de inflação se verificar.
Como ficamos? É interessante comparar taxas mensais, mas como a inflação oscila de um mês para o outro, cabe uma perspectiva de maior prazo, como a do rendimento nominal e na inflação acumulada em 12 meses. Olhando à frente, o mesmo Boletim Focus previa uma Selic de 2% ao ano, no final deste ano, e 70% disso seriam 1,4%. Também previa uma inflação anual de 1,67% até o final do ano. Ou seja, isso acontecendo, supondo um período de 12 meses em que a Selic e a inflação permanecessem nesses valores, a inflação ficaria acima do ganho da poupança, ou seja, levando a juros reais negativos.
Agora farei uma comparação da poupança com fundos de investimento de renda fixa de longo prazo que rendam 100% da Selic, ou do chamado CDI, que é bem perto da Selic. Aí entram duas complicações nos fundos: a taxa de administração e o imposto de renda. Fazendo cálculos com a Selic atual, de 2,25%, uma taxa de administração de 1% ao ano sobre o saldo da aplicação e um IR de 15% (para quem manteve a aplicação por mais de 2 anos), a remuneração líquida do fundo seria de 1,063% ao ano, ou seja, bem pior do que a da poupança, que seria de 1,575% ao ano.
O que fazer? É preciso manter algum dinheiro em renda fixa, para atender a necessidades imprevistas. Para não perder muito nesses fundos de investimento, seria preciso encontrar uma taxa de administração de 0,5%. Se não, é melhor ficar na poupança, sem a taxa de administração e IR, para pessoas físicas. E há aplicações que não têm taxas de administração, a exemplo dos CDBs (Certificados de Depósitos Bancários), nos quais os bancos, principalmente os pequenos, costumam oferecer taxas maiores do que a do CDI ou da Selic. Mas veja sempre se há a cobertura do Fundo Garantidor de Crédito, que garante investimentos até R$ 250 mil. Como todas essas questões envolvem muitos cálculos, sugiro usar a do Calculadora do Cidadão, disponível no site do Banco Central (www.bcb.gov.br), em particular a opção valor futuro de um capital, que permite passar de taxas anuais para mensais.
Roberto Macedo é Economista pela FEA-USP, doutor pela Harvard University e membro do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial.
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