{"id":368,"date":"2011-03-16T01:09:10","date_gmt":"2011-03-16T04:09:10","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=368"},"modified":"2011-04-27T10:18:48","modified_gmt":"2011-04-27T13:18:48","slug":"como-os-impostos-afetam-o-crescimento-economico","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=368","title":{"rendered":"Como os impostos afetam o crescimento econ\u00f4mico?"},"content":{"rendered":"

\u201cSomente a morte e os impostos s\u00e3o inevit\u00e1veis<\/em>\u201d (Benjamin Franklin)<\/p>\n

I. Introdu\u00e7\u00e3o<\/strong><\/p>\n

Os impostos cumprem uma importante fun\u00e7\u00e3o na sociedade moderna. Com os recursos arrecadados via tributa\u00e7\u00e3o, o Estado consegue financiar-se e prover bens p\u00fablicos \u00e0 popula\u00e7\u00e3o. Educa\u00e7\u00e3o, sa\u00fade e seguran\u00e7a p\u00fablica s\u00e3o alguns exemplos de bens que o governo fornece gratuitamente \u00e0 sociedade em troca do recebimento de impostos.<\/p>\n

Quanto maior \u00e9 o Estado, maior \u00e9 a necessidade de se arrecadar recursos junto \u00e0 sociedade. Quanto mais ineficiente for o setor p\u00fablico, tanto mais custoso ser\u00e1 ao trabalhador manter a estrutura estatal. Dessa maneira, um Estado pequeno e extremamente eficiente \u00e9 algo desej\u00e1vel aos trabalhadores. Afinal, em tal arcabou\u00e7o o Estado se limitaria a um conjunto espec\u00edfico de fun\u00e7\u00f5es e as exerceria com maestria, provendo \u00e0 popula\u00e7\u00e3o um bem p\u00fablico de qualidade, e a um custo acess\u00edvel.<\/p>\n

Do ponto de vista econ\u00f4mico o crescimento do Estado gera a necessidade do aumento da carga tribut\u00e1ria (total de contribui\u00e7\u00f5es obrigat\u00f3rias e impostos arrecadados dividido pelo PIB). Contudo, o aumento da carga tribut\u00e1ria torna o recebimento dos bens p\u00fablicos mais onerosos para os trabalhadores. Isto \u00e9, s\u00e3o obrigados a trabalharem mais horas para pagarem seus impostos. De maneira semelhante, o crescimento desordenado do Estado tamb\u00e9m onera os empres\u00e1rios, fazendo com que estes invistam menos. Sendo assim, um aumento da carga tribut\u00e1ria acima de determinado patamar afeta negativamente o padr\u00e3o de vida de longo prazo de uma sociedade.<\/p>\n

O objetivo desse artigo \u00e9 analisar os efeitos de curto e de longo prazo da carga tribut\u00e1ria brasileira sobre o crescimento econ\u00f4mico. Para tanto utilizamos dados trimestrais, referentes ao PIB e a carga tribut\u00e1ria, do per\u00edodo 1995 a 2009. De maneira geral, os resultados mostram um efeito negativo do aumento da carga tribut\u00e1ria sobre o crescimento econ\u00f4mico. A implica\u00e7\u00e3o de pol\u00edtica econ\u00f4mica desse fato \u00e9 \u00f3bvia: a carga tribut\u00e1ria brasileira est\u00e1 por demais elevada, e uma redu\u00e7\u00e3o da mesma levaria a uma dinamiza\u00e7\u00e3o do crescimento de longo prazo da economia brasileira.<\/p>\n

Al\u00e9m dessa introdu\u00e7\u00e3o, este artigo apresenta na se\u00e7\u00e3o 2 uma explica\u00e7\u00e3o mais detalhada do efeito da carga tribut\u00e1ria sobre o crescimento econ\u00f4mico. A se\u00e7\u00e3o 3 detalha a base de dados utilizada nesse estudo. A se\u00e7\u00e3o 4 reporta os resultados estat\u00edsticos. Por fim, a se\u00e7\u00e3o 5 disserta sobre as conclus\u00f5es e implica\u00e7\u00f5es de pol\u00edtica econ\u00f4mica advindas desse texto.<\/p>\n

<\/strong><\/p>\n

<\/strong><\/p>\n

II. A perda de efici\u00eancia econ\u00f4mica associada a uma alta carga tribut\u00e1ria<\/strong><\/p>\n

Existe uma ampla literatura especializada que estuda os impactos dos impostos sobre o n\u00edvel de bem estar de uma sociedade. Dentro dessa literatura existem fatos estabelecidos e quest\u00f5es em aberto. Por exemplo, os modelos te\u00f3ricos s\u00e3o claros ao afirmar que impostos que incidem sobre a movimenta\u00e7\u00e3o financeira (similares a antiga CPMF) s\u00e3o p\u00e9ssimos do ponto de vista econ\u00f4mico. Impostos sobre a movimenta\u00e7\u00e3o financeira causam muitas distor\u00e7\u00f5es na economia, afetando negativamente a efici\u00eancia econ\u00f4mica de uma sociedade. Essa perda de efici\u00eancia se traduz em queda de produtividade, que em \u00faltima inst\u00e2ncia reduz o crescimento econ\u00f4mico[1]<\/a>.<\/p>\n

Do ponto de vista emp\u00edrico, existe ampla evid\u00eancia de que impostos sobre bens suntuosos (de alt\u00edssimo luxo) s\u00e3o ruins para o trabalhador. Ao contr\u00e1rio do que a maioria acredita, quando o governo taxa produtos de alt\u00edssimo luxo quem paga a conta n\u00e3o \u00e9 o rico, mas sim o trabalhador que \u00e9 empregado nesse ramo de com\u00e9rcio. De maneira semelhante, os estudos t\u00eam demonstrado que impostos sobre o trabalho (por mais paradoxal que pare\u00e7a) s\u00e3o mais eficientes para promover o crescimento econ\u00f4mico de longo prazo do que impostos sobre o capital[2]<\/a>.<\/p>\n

Existem ainda muitas outras evid\u00eancias emp\u00edricas e te\u00f3ricas sobre qual a melhor maneira de se promover a arrecada\u00e7\u00e3o tribut\u00e1ria. Mas o resultado mais forte dessa literatura \u00e9: n\u00e3o use a carga tribut\u00e1ria para promover distribui\u00e7\u00e3o de renda. Distribui\u00e7\u00e3o de renda deve ser feita via gastos p\u00fablicos, e n\u00e3o via tributa\u00e7\u00e3o. Existem tamb\u00e9m assuntos onde os estudos n\u00e3o t\u00eam uma resposta definitiva. Por exemplo, ainda \u00e9 uma quest\u00e3o em aberto se impostos sobre o consumo s\u00e3o mais eficientes que impostos sobre a renda[3]<\/a>.<\/p>\n

De maneira geral, os impactos negativos dos impostos sobre o crescimento econ\u00f4mico v\u00eam de algo que os economistas chamam de \u201cpeso morto dos impostos\u201d. O \u201cpeso morto\u201d \u00e9 a perda de efici\u00eancia associada a um imposto espec\u00edfico. Toda vez que o governo aumenta ou cria impostos, uma quantidade de trocas que antes era realizada na economia deixa de ser realizada. Essa redu\u00e7\u00e3o nas trocas econ\u00f4micas \u00e9 justamente o peso morto do imposto. Por exemplo, suponha que voc\u00ea aceite pagar 10 reais para que lavem seu carro. Suponha tamb\u00e9m que exista algu\u00e9m disposto a lavar seu carro por 7 reais. Sendo assim, voc\u00ea ter\u00e1 seu carro lavado por um pre\u00e7o entre 7 e 10 reais. No caso do pre\u00e7o acordado ser de 8 reais, voc\u00ea teve um acr\u00e9scimo de 2 reais em seu bem-estar (toparia pagar 10 reais e pagou apenas 8 reais). E o lavador de carro teria um acr\u00e9scimo de 1 real em seu bem estar (toparia lavar o carro por 7 reais e recebeu 8 reais). Isto \u00e9, o bem estar da sociedade aumentou em 3 reais. Suponha agora que o governo crie um imposto de 4 reais sobre cada carro lavado. Neste caso, a troca anterior passa a ser imposs\u00edvel. Conseq\u00fcentemente, o bem estar da sociedade \u00e9 reduzido em 3 reais. Esta redu\u00e7\u00e3o no bem estar da sociedade decorrente do imposto \u00e9 o que chamamos de peso morto dos impostos.<\/p>\n

Quanto maior o peso morto de um imposto, maior ser\u00e1 o n\u00famero de trocas que deixar\u00e3o de ser realizadas na economia, e maior ser\u00e1 o impacto negativo desse imposto sobre o crescimento econ\u00f4mico de longo prazo. Alguns especialistas dizem, erradamente, que a CPMF era um bom imposto. Afirmam isso dizendo que a CPMF arrecadava muito e tinha um custo de arrecada\u00e7\u00e3o baixo. Do ponto de vista econ\u00f4mico, a qualidade de um imposto \u00e9 medida por tr\u00eas fatores: a) facilidade e custo da arrecada\u00e7\u00e3o; b) montante arrecadado; e c) peso morto associado ao imposto. A CPMF tinha bom desempenho nos itens \u201ca\u201d e \u201cb\u201d, mas \u00e9 um desastre no item mais importante, o item \u201cc\u201d. A CPMF distorce demais as transa\u00e7\u00f5es financeiras, com impactos diretos sobre a taxa de juros da economia. Dessa maneira, antes de qualificarmos um imposto como sendo \u201cbom\u201d \u00e9 fundamental que chequemos as distor\u00e7\u00f5es que o mesmo gera na economia.<\/p>\n

Quanto mais distor\u00e7\u00f5es um imposto gera, maior \u00e9 o n\u00famero de trocas que deixa de ser realizada, reduzindo assim a efici\u00eancia e a produtividade da economia, e maior ser\u00e1 o impacto negativo desse imposto para o crescimento econ\u00f4mico de longo prazo.<\/p>\n

III. Base de Dados<\/strong><\/p>\n

Este estudo fez uso de dados trimestrais para o per\u00edodo 1995:01 a 2009:04. A carga tribut\u00e1ria bruta trimestral total foi obtida junto ao IPEA. O PIB real foi obtido junto ao IBGE. Abaixo inclu\u00edmos os gr\u00e1ficos referentes ao PIB trimestral e a carga tribut\u00e1ria trimestral.<\/p>\n

Como pode ser visto na figura abaixo, a carga tribut\u00e1ria apresentou forte evolu\u00e7\u00e3o no per\u00edodo. Em 1995 a carga tribut\u00e1ria bruta se situava ao redor de 27,4% do PIB, mas terminou o ano de 2009 atingindo aproximadamente 34,4% do PIB. Isto \u00e9, um aumento de 7 pontos percentuais do PIB num per\u00edodo de 15 anos. A rigor, em 2008 a carga tribut\u00e1ria foi ainda mais alta atingindo 34,9% do PIB. As isen\u00e7\u00f5es tribut\u00e1rias adotadas pelo governo para combater a crise reduziram levemente a carga tribut\u00e1ria de 2009.<\/p>\n

\"\"<\/a><\/p>\n

A pr\u00f3xima figura mostra o desempenho do PIB nos \u00faltimos 15 anos. Sinalizando para um crescimento m\u00e9dio aproximado do PIB de 2,8% ao ano. Se descontarmos do crescimento do PIB a taxa de crescimento populacional, teremos que o PIB per capita brasileiro cresceu, em m\u00e9dia, aproximadamente 1% ao ano nos \u00faltimos 15 anos. Isto \u00e9, desempenho semelhante ao da d\u00e9cada de 1980, conhecida por d\u00e9cada perdida.<\/p>\n

\"\"<\/a><\/p>\n

A figura abaixo mostra a taxa de crescimento do PIB e da carga tribut\u00e1ria bruta nos \u00faltimos 15 anos. Como podemos observar, existe uma forte correla\u00e7\u00e3o negativa entre essas duas s\u00e9ries. Isto \u00e9, quando a carga tribut\u00e1ria sobe o PIB cai, e vice-versa. A correla\u00e7\u00e3o entre essas taxas de crescimento \u00e9 de -0,78[4]<\/a>.<\/p>\n

\"\"<\/a><\/p>\n

IV. Resultados Estat\u00edsticos <\/strong><\/p>\n

A correla\u00e7\u00e3o mostrada na figura acima \u00e9 apenas um ind\u00edcio inicial de que a carga tribut\u00e1ria pode afetar o crescimento do PIB ou de que a varia\u00e7\u00e3o do PIB pode afetar a carga tribut\u00e1ria. \u00a0Vamos fazer um exerc\u00edcio estat\u00edstico supondo que a rela\u00e7\u00e3o de causalidade parte da carga tribut\u00e1ria para o PIB: ou seja, um aumento da carga tribut\u00e1ria pelo governo teria impacto sobre o PIB.<\/p>\n

A partir da\u00ed lan\u00e7amos m\u00e3o de procedimentos estat\u00edsticos padronizados, em uma \u201can\u00e1lise de regress\u00e3o\u201d[5]<\/a><\/p>\n

Na regress\u00e3o que procura estimar a rela\u00e7\u00e3o de longo prazo entre carga tribut\u00e1ria e PIB encontramos que um aumento de 1% da carga tribut\u00e1ria bruta geraria uma redu\u00e7\u00e3o de 3,86% do PIB no longo prazo. Esse \u00e9 um efeito extremamente negativo do crescimento da carga tribut\u00e1ria sobre o desempenho econ\u00f4mico de longo prazo.<\/p>\n

Na regress\u00e3o de curto prazo, encontramos que um aumento de 1% na taxa de crescimento da carga tribut\u00e1ria reduziria a taxa de crescimento do PIB em 0,42%. Os resultados indicam uma velocidade de ajustamento aproximada de 4,68% por trimestre.<\/p>\n

Claro que os resultados desse texto devem ser observados com cuidado. Este trabalho \u00e9 apenas um primeiro passo, e certamente ainda h\u00e1 muito que fazer. Tamb\u00e9m devemos ressaltar que uma s\u00e9rie grande de vari\u00e1veis que afetam o PIB n\u00e3o foram inclu\u00eddas nas regress\u00f5es[6]<\/a>. Por fim, \u00e9 importante lembrar que uma desagrega\u00e7\u00e3o da carga tribut\u00e1ria em diferentes tipos de impostos e contribui\u00e7\u00f5es tamb\u00e9m poderia fornecer resultados interessantes.<\/p>\n

Em vista de ser esta uma explora\u00e7\u00e3o preliminar dos dados, devemos ver os resultados contidos nesse estudo apenas como uma aproxima\u00e7\u00e3o, como uma linha de observa\u00e7\u00e3o. Mais importante do que a magnitude dos efeitos estimados, \u00e9 o fato de termos obtido ind\u00edcios dos impactos delet\u00e9rios da atual carga tribut\u00e1ria brasileira sobre o crescimento econ\u00f4mico de longo prazo de nosso pa\u00eds.<\/p>\n

V. Conclus\u00f5es e Sugest\u00f5es de Pol\u00edtica Econ\u00f4mica<\/strong><\/p>\n

Este artigo aponta ind\u00edcios de que o aumento da carga tribut\u00e1ria, nos \u00faltimos 15 anos, teve impacto sobre o baixo desempenho econ\u00f4mico da economia brasileira. Os resultados encontrados sugerem uma alta sensibilidade do PIB \u00e0 carga tribut\u00e1ria. Isso quer dizer que, no longo prazo, o aumento da carga tribut\u00e1ria tem impactos negativos, e de magnitude expressiva, sobre o crescimento econ\u00f4mico. Nossos resultados preliminares sugerem que, tomado isoladamente, o aumento de 1% da carga tribut\u00e1ria reduza o PIB no longo prazo em at\u00e9 3,8%. Como mencionado anteriormente, mais importante do que a magnitude da redu\u00e7\u00e3o do PIB (que devido aos problemas estat\u00edsticos anteriormente mencionados deve ser vista como um limite superior), \u00e9 o ind\u00edcio de que a carga tribut\u00e1ria brasileira est\u00e1 se colocando como um obst\u00e1culo ao crescimento de longo prazo da economia brasileira.<\/p>\n

Em rela\u00e7\u00e3o ao curto prazo, encontramos que um aumento de 1% na taxa de crescimento da carga tribut\u00e1ria gera uma redu\u00e7\u00e3o de 0,42% na taxa de crescimento do PIB. Ou seja, mesmo no curto prazo, o desempenho do PIB seria severamente prejudicado por aumentos na carga tribut\u00e1ria.<\/p>\n

A conclus\u00e3o de pol\u00edtica econ\u00f4mica desse artigo \u00e9 \u00f3bvia: possivelmente a redu\u00e7\u00e3o da carga tribut\u00e1ria brasileira atual teria potencial para dinamizar o crescimento econ\u00f4mico de curto, e sobretudo, de longo prazo da economia brasileira.<\/p>\n

Downloads:<\/em><\/strong><\/p>\n