{"id":1404,"date":"2012-08-20T09:20:45","date_gmt":"2012-08-20T12:20:45","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=1404"},"modified":"2012-08-20T09:20:45","modified_gmt":"2012-08-20T12:20:45","slug":"produtividade-para-todos","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=1404","title":{"rendered":"Produtividade para todos"},"content":{"rendered":"

O Governo Federal tem buscado proteger a ind\u00fastria nacional. S\u00e3o isen\u00e7\u00f5es tribut\u00e1rias seletivas, barreiras \u00e0 concorr\u00eancia de importados, permiss\u00e3o legal para se pagar mais por produtos nacionais em licita\u00e7\u00f5es p\u00fablicas, exig\u00eancias de alto coeficiente de insumos nacionais em grandes empreendimentos, como o pr\u00e9-sal e \u00a0a telefonia m\u00f3vel 4G, al\u00e9m de cr\u00e9dito subsidiado do BNDES.<\/p>\n

Ao adotar essas pol\u00edticas o Governo est\u00e1 dizendo que vale a pena pagar mais caro por produtos nacionais de pior qualidade para preservar a ind\u00fastria nacional. Os maiores benefici\u00e1rios dessa pol\u00edtica s\u00e3o parcelas espec\u00edficas da popula\u00e7\u00e3o: empregados, propriet\u00e1rios e acionistas das empresas protegidas, sob a forma de sal\u00e1rios e lucros mais altos. Temos, assim, claramente, benef\u00edcios privados e custos socializados.<\/p>\n

Quando analisamos a pol\u00edtica do Governo Federal em rela\u00e7\u00e3o \u00e0s concess\u00f5es de infraestrutura o discurso governamental muda completamente. O argumento passa a ser o de que \u00e9 preciso oferecer estradas, portos, aeroportos e ferrovias ao menor custo poss\u00edvel para toda a popula\u00e7\u00e3o. Nesses casos, n\u00e3o se est\u00e1 disposto a aceitar que a sociedade \u201cpague mais caro\u201d, para ter expans\u00e3o r\u00e1pida e de qualidade na infraestrutura.<\/p>\n

Vimos isso no caso das concess\u00f5es rodovi\u00e1rias de 2007, em que as regras de leil\u00e3o geraram ped\u00e1gios barat\u00edssimos. O fen\u00f4meno se repetiu no leil\u00e3o dos aeroportos ao final de 2011 quando, em nome de estimular o m\u00e1ximo poss\u00edvel de concorr\u00eancia, o Governo fixou normas muito brandas de qualifica\u00e7\u00e3o t\u00e9cnica, o que resultou em forte concorr\u00eancia e altos \u00e1gios pagos pelos vencedores.<\/p>\n

A princ\u00edpio, esses seriam resultados fant\u00e1sticos. Os usu\u00e1rios seriam contemplados com ped\u00e1gios rodovi\u00e1rios baratos e com maiores investimentos do governo nos aeroportos que continuam sob controle estatal, cujo financiamento se daria com o dinheiro dos \u00e1gios dos leil\u00f5es dos aeroportos mais rent\u00e1veis.<\/p>\n

Na pr\u00e1tica, contudo, nas estradas de ped\u00e1gio barato os investimentos realizados, ap\u00f3s cinco anos de concess\u00e3o, est\u00e3o muito aqu\u00e9m do que fora inicialmente previsto, resultando em estradas ruins e acidentes em alta. As tarifas, que deveriam subir de acordo com a varia\u00e7\u00e3o do IPCA, sofreram reajustes bem acima da infla\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

Nos leil\u00f5es de aeroportos, os vencedores foram operadores aeroportu\u00e1rios sem experi\u00eancia na gest\u00e3o de grandes aeroportos e empresas com hist\u00f3rico n\u00e3o muito recomend\u00e1vel em outras concess\u00f5es similares. Isso permite antever problemas futuros.<\/p>\n

O que teria dado errado?<\/strong><\/p>\n

A quest\u00e3o \u00e9 que a regula\u00e7\u00e3o de servi\u00e7os p\u00fablicos concedidos enfrenta um conhecido dilema entre: 1) estimular o empenho do concession\u00e1rio, permitindo-lhe internalizar parte dos ganhos decorrentes de seus esfor\u00e7os, ou 2) oferecer servi\u00e7os a baixos custos aos usu\u00e1rios finais, por meio de tarifas baratas ou extra\u00e7\u00e3o de renda dos concession\u00e1rios via \u00e1gio.<\/p>\n

A op\u00e7\u00e3o pela primeira hip\u00f3tese \u00e9 f\u00e1cil de justificar. Se os potenciais concession\u00e1rios se deparam com regras que remuneram adequadamente tanto a qualidade do servi\u00e7o prestado, como a amplia\u00e7\u00e3o da infraestrutura e os esfor\u00e7os de redu\u00e7\u00e3o de custos, eles ter\u00e3o incentivos para serem mais produtivos e cumprirem as metas de investimento e qualidade. Se as regras da concess\u00e3o n\u00e3o premiarem o esfor\u00e7o, o Governo, que n\u00e3o tem como medir o grau de empenho empreendido pelos concession\u00e1rios, pouco pode fazer, e os concession\u00e1rios tendem a se tornar mais relaxados.<\/p>\n

Ao optar por ped\u00e1gios baratos (nas rodovias) e por altos \u00e1gios (nos aeroportos), o governo sinalizou que n\u00e3o estava disposto a remunerar adequadamente os investimentos na amplia\u00e7\u00e3o dos servi\u00e7os, ou a busca de qualidade e produtividade pelo concession\u00e1rio.<\/p>\n

Esse tipo de sinaliza\u00e7\u00e3o costuma atrair cons\u00f3rcios que j\u00e1 entram no leil\u00e3o pensando em renegociar os termos do contrato ap\u00f3s venc\u00ea-lo. Oferecem lances muito competitivos, ganham o certame e, depois, come\u00e7am a atrasar os investimentos programados, a reduzir a qualidade do servi\u00e7o e a pedir reajustes tarif\u00e1rios acima da infla\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

O Governo pode, a princ\u00edpio, simplesmente cancelar o contrato e fazer outra licita\u00e7\u00e3o, buscando um melhor concession\u00e1rio. Mas isso tem alto custo. H\u00e1 um longo processo de prepara\u00e7\u00e3o da nova licita\u00e7\u00e3o, demandas judiciais da empresa destitu\u00edda por repara\u00e7\u00e3o de custos, e preju\u00edzo eleitoral para o governante pela descontinuidade ou m\u00e1 qualidade do servi\u00e7o prestado. Acaba sendo melhor para o governante – e n\u00e3o necessariamente para a popula\u00e7\u00e3o – renegociar os contratos e ceder \u00e0s vantagens solicitadas pelo concession\u00e1rio. O ped\u00e1gio barato ou o \u00e1gio elevado acabam virando servi\u00e7os de m\u00e1 qualidade, pre\u00e7os crescentes e insuficiente amplia\u00e7\u00e3o dos servi\u00e7os.<\/p>\n

Nossa infraestrutura \u00e9 prec\u00e1ria. Necessitamos urgentemente de gerar ganhos de produtividade, para acelerar o crescimento da economia, e o setor de infraestrutura \u00e9 vital nesse esfor\u00e7o. Nossas ag\u00eancias reguladoras n\u00e3o s\u00e3o suficientemente independentes para impor a ferro e fogo o cumprimento dos contratos. Nosso judici\u00e1rio n\u00e3o tem tradi\u00e7\u00e3o de zelar pelo cumprimento de contratos.<\/p>\n

Por isso, torna-se inevit\u00e1vel aceitar que os concession\u00e1rios tenham uma margem de lucro maior. For\u00e7ar a m\u00e3o em favor de tarifas mais baixas ou da gera\u00e7\u00e3o de \u00e1gios para financiar outros investimentos p\u00fablicos tende a afastar os concorrentes que se recusam a trabalhar com a hip\u00f3tese de colocar a \u201cfaca no pesco\u00e7o\u201d do Governo ap\u00f3s o leil\u00e3o, exigindo renegocia\u00e7\u00f5es. Aqueles que aparentemente aceitam as regras do jogo o fazem por acreditar que ter\u00e3o cacife pol\u00edtico para renegociar o contrato a posteriori<\/em> e mudar as regras a seu favor.<\/p>\n

Ao contr\u00e1rio da pol\u00edtica de prote\u00e7\u00e3o da ind\u00fastria nacional, em que os custos s\u00e3o socializados e os benef\u00edcios apropriados por poucos, no caso da concess\u00e3o de infraestrutura vale a pena pagar mais caro. Ou melhor: \u00e9 imperioso pagar mais caro, \u00a0porque uma boa infraestrutura beneficiar\u00e1 a todos, mediante fortes externalidades, que aumentar\u00e3o a produtividade de toda a economia, expandindo a renda e o crescimento. Entre os benefici\u00e1rios da boa infraestrutura se inclui a pr\u00f3pria ind\u00fastria nacional, que ganhar\u00e1 competitividade de forma sustent\u00e1vel e n\u00e3o apenas artificial.<\/p>\n

Texto publicado originalmente no jornal Valor Econ\u00f4mico em 21 de maio de 2012.<\/em><\/p>\n

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