{"id":45,"date":"2011-02-19T21:48:26","date_gmt":"2011-02-20T00:48:26","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=45"},"modified":"2011-02-25T03:48:44","modified_gmt":"2011-02-25T06:48:44","slug":"o-tcu-atrapalha-o-bom-desenvolvimento-das-obras-de-infraestrutura-do-governo-federal","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=45","title":{"rendered":"O TCU atrapalha o bom desenvolvimento das obras de infraestrutura do Governo Federal?"},"content":{"rendered":"

S\u00e3o comuns cr\u00edticas de autoridades do Poder Executivo acerca da atividade de fiscaliza\u00e7\u00e3o do Tribunal de Contas da Uni\u00e3o (TCU). A alega\u00e7\u00e3o central dessas cr\u00edticas seria o suposto fato de que \u201cburocratas\u201d do TCU, preocupados em seguir requisitos formais e de menor import\u00e2ncia, estariam determinando a paralisa\u00e7\u00e3o de uma grande quantidade de obras do Governo Federal, com elevado preju\u00edzo para o Pa\u00eds, devido ao atraso na conclus\u00e3o de infraestrutura vital para acelerar o crescimento da economia.<\/p>\n

Em setembro de 2009, por exemplo, a Folha On Line <\/em>publicou a seguinte declara\u00e7\u00e3o do Ministro do Planejamento:<\/p>\n

O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, criticou hoje (…)a atua\u00e7\u00e3o do TCU (Tribunal de Contas da Uni\u00e3o). <\/em><\/p>\n

Disse que o \u00f3rg\u00e3o assume as fun\u00e7\u00f5es de poder Judici\u00e1rio, Legislativo e Executivo, em vez de se concentrar em seu papel de corte de fiscaliza\u00e7\u00e3o ligada ao Congresso. <\/em><\/p>\n

Paulo Bernardo afirmou, em tom brincalh\u00e3o, que se o tribunal continuar nesse passo, o Brasil n\u00e3o conseguir\u00e1 realizar a Copa do Mundo em 2014, s\u00f3 em 2020. <\/em><\/p>\n

<\/em><\/p>\n

\u00c9 natural que altas autoridades empenhadas em acelerar o ritmo de investimentos sintam-se incomodadas com procedimentos que frustram a conclus\u00e3o de obras. Mas ser\u00e1 que, de fato, o TCU atrapalha?<\/p>\n

1. N\u00e3o \u00e9 o TCU quem paralisa as obras. <\/strong>O TCU realiza auditorias. Quando encontra ind\u00edcios de irregularidades, recomenda (n\u00e3o determina) ao Congresso Nacional que n\u00e3o aloque verbas no or\u00e7amento federal para aquela obra. Quem toma a decis\u00e3o final \u00e9 o Congresso Nacional, no \u00e2mbito da Comiss\u00e3o Mista de Or\u00e7amento.<\/p>\n

A cria\u00e7\u00e3o desse mecanismo ocorreu em 1994 quando do esc\u00e2ndalo de corrup\u00e7\u00e3o na obra da sede do Tribunal Regional do Trabalho de S\u00e3o Paulo. Embora estivesse evidente que havia desvio de dinheiro naquela obra, n\u00e3o existiam mecanismos institucionais capazes de barrar a destina\u00e7\u00e3o e o desembolso de verbas or\u00e7ament\u00e1rias. Por isso, o Congresso passou a incluir nas Leis de Diretrizes Or\u00e7ament\u00e1rias (LDO) um dispositivo prevendo que o TCU deveria recomendar a n\u00e3o aloca\u00e7\u00e3o de verbas para obras com ind\u00edcios de irregularidades, e que o Congresso deveria bloquear no or\u00e7amento a sua execu\u00e7\u00e3o f\u00edsica e financeira, at\u00e9 a corre\u00e7\u00e3o das irregularidades.<\/p>\n

Trata-se, portanto, de um mecanismo preventivo, de \u201cestancar a sangria\u201d no momento em que ela \u00e9 detectada. Procedimento muito mais eficaz do que nada fazer e aguardar que auditorias feitas posteriormente constatem formalmente as irregularidades e os preju\u00edzos, abrindo-se um lento, custoso e quase sempre infrut\u00edfero processo de responsabiliza\u00e7\u00e3o criminal e de tentativa de recupera\u00e7\u00e3o do dinheiro perdido.<\/p>\n

O mecanismo mostrou-se bastante eficaz em epis\u00f3dios marcantes como o da chamada \u201cOpera\u00e7\u00e3o Navalha\u201d da Pol\u00edcia Federal que, em 2007, detectou um esquema de corrup\u00e7\u00e3o em obras p\u00fablicas centralizado na construtora Gautama. Antes mesmo da deflagra\u00e7\u00e3o da opera\u00e7\u00e3o policial, o TCU j\u00e1 havia apontado irregularidades graves nas obras e o Congresso j\u00e1 havia suspendido a aloca\u00e7\u00e3o de recursos or\u00e7ament\u00e1rios.<\/p>\n

2.Os par\u00e2metros de pre\u00e7os s\u00e3o adequados. <\/strong>Uma cr\u00edtica comum \u00e9 a de que o TCU usaria pre\u00e7os de refer\u00eancia nacionais, sem levar em conta diferen\u00e7as regionais e custos de frete. A afirma\u00e7\u00e3o n\u00e3o \u00e9 correta. O TCU utiliza dois sistemas de pre\u00e7os:\u00a0 o SICRO (elaborado pelo DNIT, existente h\u00e1 quase quarenta anos e submetido a permanente aperfei\u00e7oamento) e o SINAPI (sistema de pre\u00e7os da constru\u00e7\u00e3o civil elaborado em conjunto pela Caixa Econ\u00f4mica Federal e o IBGE). Ambos os sistemas apuram os custos por regi\u00e3o,<\/strong> em bases mensais e s\u00e3o fontes de refer\u00eancia consistentes.<\/p>\n

Ademais, a legisla\u00e7\u00e3o permite que o TCU aceite valores superiores aos de refer\u00eancia, desde que haja justificativa t\u00e9cnica. Al\u00e9m disso, o grau de detalhamento desses sistemas \u00e9 suficientemente amplo para que se possa compor custos a partir da quantidade de cada material individual utilizado, de modo que se pode diferenciar, por exemplo, o custo de pavimenta\u00e7\u00e3o de uma rodovia de alto tr\u00e1fego (que exige piso mais resistente) de uma estrada vicinal de baixo tr\u00e1fego.<\/p>\n

3.As apura\u00e7\u00f5es s\u00e3o detalhadas a ponto de detectar manipula\u00e7\u00f5es de planilhas. <\/strong>Uma reclama\u00e7\u00e3o comum \u00e9 de que o TCU aponta irregularidades em obras devido a pre\u00e7os elevados em alguns itens da obra, mesmo quando o custo total est\u00e1 abaixo daquele indicado pelos par\u00e2metros t\u00e9cnicos. Esse procedimento do TCU \u00e9 correto, pois a apresenta\u00e7\u00e3o, em licita\u00e7\u00e3o, de propostas que cont\u00eam itens muito caros e outros muito baratos constitui um artif\u00edcio conhecido como \u201cjogo de planilhas\u201d.<\/p>\n

Com o objetivo de ganhar a licita\u00e7\u00e3o, h\u00e1 empreiteiros que calculam um custo total competitivo, subfaturando alguns itens e superfaturando outros. No momento de execu\u00e7\u00e3o da obra, ele executa apenas as partes nas quais os itens est\u00e3o superfaturados. Quando chega o momento de fornecer os itens subfaturados, ele tem v\u00e1rias op\u00e7\u00f5es. A mais simples \u00e9 abandonar a obra (depois de ter recebido pela parcela superfaturada). Mas ele tamb\u00e9m pode pressionar por um aditamento de contrato ou, simplesmente, usar uma quantidade menor dos itens subfaturados do que aquela prevista na licita\u00e7\u00e3o. Em todos os casos a obra acaba saindo mais cara para o contribuinte.<\/p>\n

4.N\u00e3o \u00e9 qualquer pequena irregularidade que leva o TCU a recomendar a n\u00e3o aloca\u00e7\u00e3o de recursos para uma obra. <\/strong>Somente obras com ind\u00edcios de irregularidades graves recebem a recomenda\u00e7\u00e3o de suspens\u00e3o de recursos or\u00e7ament\u00e1rios. Faz-se uma avalia\u00e7\u00e3o dos benef\u00edcios (estancar procedimentos nocivos ao er\u00e1rio) e custos (perdas decorrentes da obra paralisada) antes de se recomendar a paralisa\u00e7\u00e3o. As Leis de Diretrizes Or\u00e7ament\u00e1rias (LDO) estabelecem claramente que as irregularidades devem alcan\u00e7ar valores relevantes em rela\u00e7\u00e3o ao custo total da obra. A t\u00e9cnica de auditoria utilizada \u00e9 de examinar a planilha de custos das obras, analisando os itens em ordem decrescente de valor e de impacto no custo total.<\/p>\n

N\u00e3o se trata, portanto, de recomendar a paralisa\u00e7\u00e3o da constru\u00e7\u00e3o de uma hidrel\u00e9trica \u201cporque as vassouras compradas pelo departamento de limpeza estavam superfaturadas\u201d. Os crit\u00e9rios para recomenda\u00e7\u00e3o de paralisa\u00e7\u00e3o s\u00e3o objetivos, e incluem principalmente :\u00a0 superfaturamento, projeto b\u00e1sico deficiente ou desatualizado, edital (ou contrato ou aditivo contratual) incompleto ou inadequado e restri\u00e7\u00e3o \u00e0 competi\u00e7\u00e3o no processo licitat\u00f3rio.<\/p>\n

Cabe chamar aten\u00e7\u00e3o para outra medida muito utilizada como alternativa \u00e0 paralisa\u00e7\u00e3o: a reten\u00e7\u00e3o parcial de valores. Nela opta-se pela anu\u00eancia \u00e0 continuidade da obra – mesmo com ind\u00edcios de irregularidades – sempre que fique comprovado na fiscaliza\u00e7\u00e3o que o eventual preju\u00edzo seja de natureza exclusivamente financeira e seja assegurado pelo gestor, sob diversas formas poss\u00edveis, um provisionamento de garantias suficientes \u00e0 cobertura do risco envolvido[1]. Este procedimento permitiu que 20% das obras suscet\u00edveis de paralisa\u00e7\u00e3o em 2009 e 34,92 % em 2010 n\u00e3o fossem objeto de bloqueio da respectiva execu\u00e7\u00e3o, sem risco de preju\u00edzo aos cofres p\u00fablicos.<\/p>\n

5. O Congresso Nacional \u00e9 quem tem a palavra final<\/strong>. O Gr\u00e1fico abaixo mostra que o n\u00famero de recomenda\u00e7\u00f5es de bloqueio feitas pelo TCU difere bastante do n\u00famero de obras efetivamente bloqueadas pelo Congresso. Em alguns anos o Congresso bloqueia mais obras que o recomendado pelo TCU e, em outros anos, bloqueia menos obras.<\/p>\n

Gr\u00e1fico 1 \u2013 Bloqueio de obras: n\u00famero de obras apontadas pelo TCU e n\u00famero de obras efetivamente bloqueadas pelo Congresso Nacional<\/strong><\/p>\n

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Fonte: Elabora\u00e7\u00e3o pr\u00f3pria a partir dos dados do TCU e do Congresso Nacional 2<\/p><\/div>\n

6.O n\u00famero e o porte das obras bloqueadas s\u00e3o \u00ednfimos em rela\u00e7\u00e3o ao total dos investimentos p\u00fablicos. <\/strong>Em 2010 os bloqueios atingiram apenas 0,43% das obras inclu\u00eddas na Lei Or\u00e7ament\u00e1ria Anual. Desde 2004 o maior percentual de obras atingidas por bloqueios foi de 1%, em 2005 . As obras bloqueadas em 2010 somavam R$ 5,45 bilh\u00f5es, o que representa menos de 5% do investimento total de R$ 128 bilh\u00f5es autorizado pelo or\u00e7amento[3].<\/p>\n

7.Grande parte das obras representa problemas cr\u00f4nicos. <\/strong>O Gr\u00e1fico 2 indica o percentual de obras com recomenda\u00e7\u00e3o de paralisa\u00e7\u00e3o em cada ano que j\u00e1 estavam na lista h\u00e1 mais de tr\u00eas anos. Fica evidente que, a cada ano que passa, \u00e9 maior a concentra\u00e7\u00e3o da recomenda\u00e7\u00e3o de paralisa\u00e7\u00e3o em obras com problemas cr\u00f4nicos. Em 2010 nada menos que 80% das recomenda\u00e7\u00f5es encaixavam-se nessa categoria, o que leva a crer que as fiscaliza\u00e7\u00f5es do TCU est\u00e3o induzindo uma melhoria na gest\u00e3o de novas obras, que agora est\u00e3o sendo aprovadas na malha fina das auditorias: um inequ\u00edvoco benef\u00edcio para o pa\u00eds.<\/p>\n

Gr\u00e1fico 2 \u2013 Percentual de obras que acumulam recomenda\u00e7\u00e3o de paralisa\u00e7\u00e3o\u00a0 h\u00e1 mais de tr\u00eas anos seguidos <\/strong><\/p>\n

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Fonte: Elabora\u00e7\u00e3o pr\u00f3pria a partir dos dados do TCU e do Congresso Nacional.<\/p><\/div>\n

Assim, os dados demonstram que a atua\u00e7\u00e3o dos \u00f3rg\u00e3os de controle externo \u2013 embora sujeita a eventuais erros e imprecis\u00f5es como qualquer outra atividade governamental \u2013 n\u00e3o representa em si um obst\u00e1culo ao investimento p\u00fablico, nem a sua supress\u00e3o implicaria em ganhos para o desenvolvimento.<\/p>\n

Em vez de um problema em si mesmo, a detec\u00e7\u00e3o de irregularidades tem sido um term\u00f4metro que indica a exist\u00eancia de problemas de gest\u00e3o mais s\u00e9rios, e os bloqueios preventivos t\u00eam servido como forma de minimizar preju\u00edzos ao Er\u00e1rio, induzindo uma gest\u00e3o mais eficiente e reduzindo desperd\u00edcios e fraudes.<\/p>\n

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[1] Para uma descri\u00e7\u00e3o detalhada desse mecanismo, veja Nota T\u00e9cnica Conjunta 09\/2009 das Consultorias de Or\u00e7amento do Congresso Nacional (
Saiba mais<\/a>).<\/p>\n

[2]\u00a0\u201cTCU\u201d corresponde ao total de subt\u00edtulos para os quais o Tribunal recomendou o bloqueio da execu\u00e7\u00e3o, e \u201cCongresso\u201d ao total de subt\u00edtulos constantes do Anexo espec\u00edfico de bloqueio de obras da mesma Lei.<\/p>\n

[3]\u00a0Fonte: sistema SIGA Brasil e leis or\u00e7ament\u00e1rias de cada exerc\u00edcio, com os respectivos relat\u00f3rios. Dados de execu\u00e7\u00e3o at\u00e9 maio\/2010.<\/p>\n

Downloads:<\/em><\/strong><\/p>\n