{"id":3497,"date":"2021-09-14T18:28:42","date_gmt":"2021-09-14T21:28:42","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=3497"},"modified":"2021-09-14T18:28:42","modified_gmt":"2021-09-14T21:28:42","slug":"o-v-o-k-e-o-x","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=3497","title":{"rendered":"O ‘V’, o ‘K’ e o ‘X’"},"content":{"rendered":"

O \u2018V\u2019, o \u2018K\u2019 e o \u2018X\u2019<\/strong><\/h1>\n

\u00a0<\/strong>Paulo Guedes encharca-se com ideias equivocadas, enquanto a sociedade fica mais injusta e desigual<\/strong><\/span><\/h3>\n

\u00a0<\/em>Por Lu\u00eds Eduardo Assis*<\/em><\/p>\n

A divulga\u00e7\u00e3o do PIB do segundo trimestre gerou confus\u00e3o. Como sempre, o IBGE deu destaque para os n\u00fameros dessazonalizados. Retirar dos indicadores a influ\u00eancia de fatores sazonais requer modelos econom\u00e9tricos que n\u00e3o t\u00eam a pretens\u00e3o de oferecer mais do que aproxima\u00e7\u00f5es. Conforme os par\u00e2metros escolhidos os resultados podem variar bastante, sem falar que a pandemia deve ter alterado os padr\u00f5es sazonais. Olhando os dados brutos, sem adivinhar os fatores sazonais, o que se sabe \u00e9 que o PIB entre abril e junho subiu (sim, subiu) 1,2% em rela\u00e7\u00e3o ao primeiro trimestre e foi 12,4% maior que no mesmo per\u00edodo do ano passado.<\/p>\n

Esse desempenho, de todo modo p\u00edfio, animou o ministro da Economia a jactar-se da recupera\u00e7\u00e3o \u201cem V\u201d do n\u00edvel de atividade. Aqui Paulo Guedes ataca espantalhos. Nunca se disse que, passado o isolamento social, a economia iria manter o n\u00edvel de atividade de antes. Se houve interrup\u00e7\u00e3o moment\u00e2nea das atividades, o retorno \u00e0 rotina anterior s\u00f3 poderia aparecer nos gr\u00e1ficos com a forma de um V. N\u00e3o h\u00e1 nada de surpreendente. O que assusta \u00e9 que, na falta de um projeto de crescimento, essa recupera\u00e7\u00e3o nem sequer nos coloca na posi\u00e7\u00e3o med\u00edocre em que est\u00e1vamos antes. Comparado com o segundo trimestre de 2019, estamos hoje com um PIB apenas 0,2% maior. Em rela\u00e7\u00e3o ao segundo trimestre de 2013, o PIB do segundo trimestre de 2021 ficou ainda 2,5% menor. Nesses oito anos, a popula\u00e7\u00e3o cresceu 6,1%.<\/p>\n

Al\u00e9m de irris\u00f3ria, a recupera\u00e7\u00e3o da economia vem agravar nossas iniquidades, j\u00e1 que a retomada foi ainda mais fr\u00e1gil no mercado de trabalho. A Pnad mostra que entre dezembro de 2019 e agosto de 2020 a pandemia reduziu em 12,9 milh\u00f5es, ou quase 14%, o n\u00famero de pessoas ocupadas. Desde ent\u00e3o, a recupera\u00e7\u00e3o econ\u00f4mica reincorporou apenas 6,1 milh\u00f5es de pessoas. Para os trabalhadores, n\u00e3o houve V. A infla\u00e7\u00e3o tamb\u00e9m acirrou a desigualdade. Nos 12 meses terminados em julho, a infla\u00e7\u00e3o das pessoas com renda inferior a R$ 1.810,13 foi de mais de 10%, ante 7,1% da infla\u00e7\u00e3o dos felizardos que t\u00eam renda mensal maior que R$ 18.106,00. O item \u201cAlimenta\u00e7\u00e3o no Domic\u00edlio\u201d, que atinge em cheio as pessoas mais pobres, aumentou 21,8%, ante 6,7% para a alimenta\u00e7\u00e3o fora do domic\u00edlio. O desemprego comprime a renda dos trabalhadores menos qualificados. O custo dos servi\u00e7os de manicure compilados no IPCA subiu menos de 5% nos \u00faltimos 12 meses. Para \u201cCabeleireiros e Barbeiros\u201d, o aumento foi ainda menor, 1,6%, o que n\u00e3o \u00e9 t\u00e3o ruim quanto o caso das costureiras, cujo servi\u00e7o ficou 0,4% mais barato nesse per\u00edodo.<\/p>\n

Enquanto isso, o g\u00e1s de cozinha aumentou 32,8% e o cox\u00e3o duro ficou 37,6% mais caro. Na outra ponta do Brasil, o mercado de bens de luxo vai de vento em popa. Os endinheirados que t\u00eam aplica\u00e7\u00f5es no exterior se regozijam com o d\u00f3lar mais caro e, na falta das viagens internacionais, se deleitam comprando aqui mesmo. Qual a forma de combater a infla\u00e7\u00e3o? Juros mais altos \u00e9 o que temos para o momento, o que premia os rentistas, deteriora as finan\u00e7as p\u00fablicas e agu\u00e7a a concentra\u00e7\u00e3o de renda. Ou seja, a recupera\u00e7\u00e3o tem mais a forma de um K. A popula\u00e7\u00e3o mais pobre v\u00ea sua condi\u00e7\u00e3o se deteriorar, enquanto os mais ricos t\u00eam dificuldade em escolher no que gastar. Como lembra J. Stiglitz em\u00a0The Price of Inequality<\/em>, a desigualdade custa muito caro: instabilidade econ\u00f4mica, menor crescimento e riscos \u00e0 democracia. O ministro da Economia perde-se em especula\u00e7\u00f5es nefelibatas, encharca-se com ideias equivocadas, contenta-se com o V min\u00fasculo e ignora que o X da quest\u00e3o \u00e9 o fato de que estamos criando uma sociedade ainda mais injusta e desigual. Ter\u00e1 muito o que explicar no futuro. Paulo Guedes tem um passado pela frente.<\/p>\n

* Lu\u00eds Eduardo Assis<\/strong> \u00e9 economista, foi diretor de Pol\u00edtica Monet\u00e1ria do Banco Central e \u00e9 membro do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial.\u00a0e-mail : luiseduardoassis@gmail.com<\/p>\n

Artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo<\/em> em 13 de setembro de 2021.<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

O autor critica a atua\u00e7\u00e3o do ministro da Economia e analisa o baixo crescimento e a alta desigualdade da economia brasileira.<\/p>\n","protected":false},"author":120,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"_monsterinsights_skip_tracking":false,"_monsterinsights_sitenote_active":false,"_monsterinsights_sitenote_note":"","_monsterinsights_sitenote_category":0,"footnotes":""},"categories":[8,776],"tags":[66,222,865,117],"class_list":["post-3497","post","type-post","status-publish","format-standard","hentry","category-crescimento-e-eficiencia-da-economia","category-reproducoes","tag-crescimento-economico","tag-desigualdade","tag-economia-brasileira","tag-inflacao"],"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/posts\/3497","targetHints":{"allow":["GET"]}}],"collection":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/users\/120"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Fcomments&post=3497"}],"version-history":[{"count":0,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/posts\/3497\/revisions"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Fmedia&parent=3497"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Fcategories&post=3497"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Ftags&post=3497"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}