{"id":3379,"date":"2020-12-18T09:30:10","date_gmt":"2020-12-18T12:30:10","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=3379"},"modified":"2020-12-18T08:50:59","modified_gmt":"2020-12-18T11:50:59","slug":"retomada-atual-em-v-nao-resolve-fraqueza-do-pib","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=3379","title":{"rendered":"Retomada atual em V n\u00e3o resolve fraqueza do PIB"},"content":{"rendered":"

Por Roberto Macedo<\/em><\/p>\n

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O relat\u00f3rio do IBGE sobre as Contas Nacionais Trimestrais relativas ao terceiro trimestre de 2020, divulgado no \u00faltimo dia 3, chegou com destaque \u00e0s manchetes por sua melhor not\u00edcia, a de que o produto interno bruto (PIB) cresceu 7,7% sobre o trimestre imediatamente anterior. Mas cabe colocar essa taxa num contexto mais amplo. Para tanto vale lembrar que o PIB teve taxas negativas no primeiro e no segundo trimestres de 2020, -1,5% e -9,6% (!) respectivamente, ligadas ao impacto da covid-19. Olhando essas tr\u00eas taxas, percebe-se que aquela positiva de 7,7% foi insuficiente para tirar a economia do novo buraco em que se meteu com as outras duas, que totalizaram queda de 11%.<\/p>\n

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Buraco novo porque aconteceu em outro muito mais duradouro no qual o PIB ainda se encontra. \u00c9 mostrado pelo relat\u00f3rio, embora seu texto n\u00e3o analise essa quest\u00e3o. Um dos seus gr\u00e1ficos apresenta um \u00edndice do PIB trimestral entre o primeiro trimestre de 1996 e o terceiro de 2020, e percebe-se que o valor mais alto foi l\u00e1 atr\u00e1s, no primeiro trimestre de 2014! A\u00ed come\u00e7a um movimento lembrando um U bem rebaixado e estendido, mas cuja haste direita n\u00e3o retornou ao mesmo n\u00edvel marcado pela esquerda em sua ponta. Isso define uma depress\u00e3o, mais longa e forte do que as duas recess\u00f5es ocorridas durante o mesmo movimento, a de 2015-2016 e a da covid-19. Venho insistindo em apontar essa depress\u00e3o ainda em curso, mas o notici\u00e1rio, a classe pol\u00edtica e mesmo v\u00e1rios economistas parecem ignor\u00e1-la, ou negligenciar a busca do seu enfrentamento.<\/p>\n

Sintoma disso \u00e9 que no momento se fala muito e com entusiasmo de uma retomada em V, mas \u00e9 um V incompleto, pois sua haste direita ainda n\u00e3o voltou \u00e0 altura da haste esquerda. E mesmo se voltasse, o problema maior, o dessa depress\u00e3o, continuaria a existir. Supondo que o PIB caia 4,4% neste ano \u2013 a previs\u00e3o do \u00faltimo boletim semanal\u00a0Focus<\/em>, do Banco Central \u2013, estimei que ele precisaria crescer perto de 7,2% a partir de 2021 para voltar ao seu valor de 2014, o que tomaria cerca de tr\u00eas anos crescendo perto de 2,5% ao ano, e com muitas incertezas pelo caminho. Assim, para ao final voltar ao PIB de 2014, tomaria nove anos!<\/p>\n

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Passo a uma vis\u00e3o setorial dessa depress\u00e3o, abrangendo tr\u00eas setores, com sua participa\u00e7\u00e3o no PIB, no primeiro trimestre de 2018, entre par\u00eanteses: servi\u00e7os privados, sem com\u00e9rcio (36,5%), ind\u00fastria (17%) e com\u00e9rcio (10,6%). No seu \u00faltimo relat\u00f3rio sobre esse setor de servi\u00e7os, relativo a outubro de 2020, o IBGE publicou gr\u00e1fico, que come\u00e7a em janeiro de 2011, onde mostra que o mesmo setor teve seu \u00faltimo pico em novembro de 2014, e no m\u00eas do relat\u00f3rio estava 16,6% (!) abaixo desse pico. J\u00e1 o setor industrial teve seu pico em maio de 2011 e no m\u00eas do relat\u00f3rio estava 14,9% (!) abaixo desse seu maior valor na s\u00e9rie. E o com\u00e9rcio teve o seu pico em outubro de 2020, o que mostra o \u00edmpeto desse setor na retomada, \u00e9 o menor dos tr\u00eas citados. Proporcionalmente ele adiciona menor valor ao que recebe de seus fornecedores do que os outros dois.<\/p>\n

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Como se percebe, o quadro setorial mostra, nos dois setores mais importantes, que somam 53,5% do PIB conforme as porcentagens acima, um quadro que reflete a depress\u00e3o j\u00e1 descrita acima.<\/p>\n

Voltando ao relat\u00f3rio do PIB trimestral, outro gr\u00e1fico mostra as taxas trimestrais de investimento e de poupan\u00e7a no per\u00edodo entre o terceiro trimestre de 2000 e o terceiro deste ano, ambas como propor\u00e7\u00e3o do PIB. A taxa de investimento esteve um pouco acima de 20% entre o terceiro trimestre de 2009 e o de 2013, mas depois caiu e nos \u00faltimos tr\u00eas anos, sempre no terceiro trimestre, esteve perto de 16% ao ano, claramente insuficiente para uma taxa satisfat\u00f3ria de crescimento do PIB, pois o ideal seria que fosse mais pr\u00f3xima de 25%. Os investimentos em forma\u00e7\u00e3o bruta de capital fixo \u2013 como em f\u00e1bricas, fazendas, hospitais, escolas e outras atividades \u2013 s\u00e3o o motor da economia ao gerarem emprego e renda, mas no horizonte que vejo \u00e0 frente n\u00e3o enxergo uma expans\u00e3o mais forte desses investimentos.<\/p>\n

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A taxa de poupan\u00e7a, que por quatro anos ficou perto de 14% do PIB, saltou para 17% do PIB no terceiro trimestre de 2020, por causa da poupan\u00e7a gerada pelo benef\u00edcio assistencial e, nas fam\u00edlias de maior poder aquisitivo, em raz\u00e3o da conten\u00e7\u00e3o do consumo, motivada pelo isolamento em suas resid\u00eancias diante da pandemia. Um fato pouco sabido \u00e9 que a poupan\u00e7a de empresas e fam\u00edlias alcan\u00e7a cerca de 20% do PIB, mas parte dessa poupan\u00e7a financia o governo, que deixa de investi-la, praticando, assim, uma \u201cdespoupan\u00e7a\u201d.<\/p>\n

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Enfim, este \u00e9 um quadro tr\u00e1gico do mau estado da economia brasileira. Quanto a pol\u00edticas p\u00fablicas em sentido contr\u00e1rio, no meu \u00faltimo artigo aqui preguei o fim do recesso parlamentar que come\u00e7a na pr\u00f3xima semana, e que o Congresso se reunisse em sess\u00e3o permanente at\u00e9 que produzisse medidas que estimulassem os investimentos. Nada disso se concretizou e, assim, o navio da economia segue desgovernado no meio de forte tempestade.<\/p>\n

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Roberto Macedo<\/strong> \u00e9 economista (UFMG, USP e Harvard), professor s\u00eanior da USP e membro do Instituto Fernand Braudel<\/p>\n

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Artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo, em 17 de dezembro de 2020<\/em><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Navio da economia segue desgovernado numa tempestade duradoura.<\/p>\n","protected":false},"author":125,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"_monsterinsights_skip_tracking":false,"_monsterinsights_sitenote_active":false,"_monsterinsights_sitenote_note":"","_monsterinsights_sitenote_category":0,"footnotes":""},"categories":[8,776],"tags":[],"class_list":["post-3379","post","type-post","status-publish","format-standard","hentry","category-crescimento-e-eficiencia-da-economia","category-reproducoes"],"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/posts\/3379","targetHints":{"allow":["GET"]}}],"collection":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/users\/125"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Fcomments&post=3379"}],"version-history":[{"count":0,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/posts\/3379\/revisions"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Fmedia&parent=3379"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Fcategories&post=3379"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Ftags&post=3379"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}