{"id":3377,"date":"2020-12-15T10:05:17","date_gmt":"2020-12-15T13:05:17","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=3377"},"modified":"2020-12-15T10:06:04","modified_gmt":"2020-12-15T13:06:04","slug":"revolucionando-a-cabotagem-no-brasil-com-a-competicao","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=3377","title":{"rendered":"Revolucionando a Cabotagem no Brasil com a Competi\u00e7\u00e3o"},"content":{"rendered":"
Por C\u00e9sar Mattos e Sandro Gon\u00e7alves<\/em><\/p>\n Na \u00faltima ter\u00e7a, dia 8 de dezembro, a C\u00e2mara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei (PL) n\u00ba 4.199\/2020, conhecido como \u201cBR do Mar\u201d, que altera a regula\u00e7\u00e3o do servi\u00e7o de navega\u00e7\u00e3o de cabotagem no Brasil. A vers\u00e3o aprovada ap\u00f3s intensa discuss\u00e3o no Plen\u00e1rio da C\u00e2mara manteve a linha mestra do texto original do Poder Executivo: ampliar a concorr\u00eancia no setor.<\/p>\n Diferentemente da avia\u00e7\u00e3o civil, atividade na qual apenas recentemente (Lei n\u00ba 13.842\/2019) a entrada de empresas com 100% de capital estrangeiro foi autorizada, a navega\u00e7\u00e3o de cabotagem nunca teve tal tipo de restri\u00e7\u00e3o. As duas maiores empresas de cabotagem no Brasil (com exce\u00e7\u00e3o da Transpetro, que atua com petr\u00f3leo) s\u00e3o de propriedade de grupos estrangeiros: a Alian\u00e7a, do grupo dinamarqu\u00eas Maersk, e a Mercosul Line Navega\u00e7\u00e3o e Log\u00edstica Ltda., do grupo franc\u00eas CMA-CGM. A origem do capital, portanto, nunca foi problema. A origem da embarca\u00e7\u00e3o, sim.<\/p>\n A principal quest\u00e3o concorrencial, aqui, diz respeito \u00e0 possibilidade de afretamento (aluguel) de embarca\u00e7\u00f5es estrangeiras. A lei atual imp\u00f5e severas restri\u00e7\u00f5es a esse tipo de opera\u00e7\u00e3o, obrigando, como esp\u00e9cie de condi\u00e7\u00e3o \u00e0 realiza\u00e7\u00e3o dela, que empresas desejosas de atuar na cabotagem ou de ampliar sua participa\u00e7\u00e3o nesse mercado contratem a constru\u00e7\u00e3o de navios no Brasil. Isso aumenta substancialmente o CAPEX requerido para entrar e, depois, crescer na atividade.<\/p>\n Por tr\u00e1s da regra que permite o afretamento de embarca\u00e7\u00e3o estrangeira na cabotagem e no transporte fluvial apenas no caso de a empresa de navega\u00e7\u00e3o possuir lastro em frota pr\u00f3pria, constru\u00edda ou em constru\u00e7\u00e3o no Pa\u00eds, est\u00e1 a ideia de vincular a pol\u00edtica de transporte aquavi\u00e1rio \u00e0 pol\u00edtica de constru\u00e7\u00e3o naval, h\u00e1 muito tempo materializada na legisla\u00e7\u00e3o brasileira.<\/p>\n N\u00e3o por acaso, enquanto na avia\u00e7\u00e3o comercial o aluguel de aeronaves \u00e9 a regra, na cabotagem o afretamento de navio estrangeiro ainda \u00e9 a exce\u00e7\u00e3o. Diante disso, o que pretende o legislador? A principal mudan\u00e7a da BR do Mar \u00e9 relaxar as restri\u00e7\u00f5es atuais das duas modalidades principais de afretamento: por tempo<\/u>, quando se aluga uma embarca\u00e7\u00e3o armada que traz tamb\u00e9m pelo menos parte da tripula\u00e7\u00e3o; e a casco nu<\/u>, quando se aluga apenas a embarca\u00e7\u00e3o, desarmada e sem tripula\u00e7\u00e3o.<\/p>\n Inicialmente, no quadro abaixo, comparamos as condi\u00e7\u00f5es existentes no regime atual de \u201cafretamento por tempo\u201d, conforme a Lei n\u00ba 9.432\/97, que continuar\u00e1 valendo para as empresas que N\u00c3O aderirem ao programa \u201cBR do Mar\u201d, com as condi\u00e7\u00f5es previstas no \u201cBR do Mar\u201d.<\/p>\n Quadro I – O Novo Afretamento a Tempo da BR do Mar<\/strong><\/p>\n II) houver interesse p\u00fablico;<\/p>\n III) substituir embarca\u00e7\u00f5es em constru\u00e7\u00e3o no Pa\u00eds, em estaleiro brasileiro, com contrato em efic\u00e1cia, enquanto durar a constru\u00e7\u00e3o, por at\u00e9 36 meses, at\u00e9 o limite:<\/p>\n a)da tonelagem de porte bruto contratada, para embarca\u00e7\u00f5es de carga;<\/p>\n b)da arquea\u00e7\u00e3o bruta contratada, para embarca\u00e7\u00f5es destinadas ao apoio.<\/td>\n ii) substituir embarca\u00e7\u00e3o de tipo semelhante em constru\u00e7\u00e3o no Pa\u00eds<\/u>, na propor\u00e7\u00e3o de at\u00e9 200%<\/u> da tonelagem de porte bruto da embarca\u00e7\u00e3o em constru\u00e7\u00e3o, por at\u00e9 36 meses;<\/p>\n III) substituir embarca\u00e7\u00e3o de tipo semelhante em constru\u00e7\u00e3o no exterior<\/u>, na propor\u00e7\u00e3o de at\u00e9 100% da tonelagem de porte bruto da embarca\u00e7\u00e3o em constru\u00e7\u00e3o, at\u00e9 36 meses;<\/p>\n IV atender exclusivamente contratos de transporte de longo prazo;<\/p>\n V prestar opera\u00e7\u00f5es especiais de cabotagem (transporte de cargas em tipo, rota ou mercado ainda n\u00e3o existente ou consolidado) at\u00e9 48 meses.<\/td>\n<\/tr>\n<\/tbody>\n<\/table>\n A BR do Mar amplia bastante o escopo dos afretamentos a tempo, diminuindo custos de transa\u00e7\u00e3o na economia, em especial, ao permiti-los (i) para opera\u00e7\u00f5es que envolvam contratos de longo prazo, os quais requerem maior seguran\u00e7a de atendimento; e (ii) para opera\u00e7\u00f5es especiais de cabotagem, barateando a abertura do servi\u00e7o em novas cargas, rotas ou mercados. Sem as novas hip\u00f3teses de afretamento, quase nada disso seria vi\u00e1vel.<\/p>\n Mas \u00e9 no \u201cafretamento a casco nu\u201d que se introduz uma flexibiliza\u00e7\u00e3o mais profunda na cabotagem: para realiz\u00e1-lo, libera-se gradativamente a empresa brasileira de navega\u00e7\u00e3o da contrapartida de possuir embarca\u00e7\u00f5es pr\u00f3prias ou de contratar a constru\u00e7\u00e3o de navios em estaleiros nacionais. O quadro abaixo faz para a mudan\u00e7a do regime no afretamento a casco nu a mesma compara\u00e7\u00e3o que realizamos para o afretamento a tempo.<\/p>\n \u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0 Quadro II – O Novo Afretamento a Casco Nu da BR do Mar<\/strong><\/p>\n Este limite de afretamento ser\u00e1 ampliado:<\/p>\n I – ap\u00f3s 1 ano para 2 embarca\u00e7\u00f5es;<\/p>\n II – ap\u00f3s 2 anos para 3 embarca\u00e7\u00f5es;<\/p>\n III – ap\u00f3s 3 anos para 4 embarca\u00e7\u00f5es.<\/p>\n IV- ap\u00f3s 4 anos LIVRE <\/u><\/strong><\/td>\n<\/tr>\n<\/tbody>\n<\/table>\n A reda\u00e7\u00e3o atual da Lei n\u00ba 9.432\/97 deixa claro a depend\u00eancia do afretamento a casco nu tanto do fluxo de encomendas aos estaleiros nacionais quanto do estoque de embarca\u00e7\u00f5es pr\u00f3prias, no arcabou\u00e7o regulat\u00f3rio atual da cabotagem. Esse regime implica que quanto menor (maior) uma empresa de cabotagem for, maiores (menores) as restri\u00e7\u00f5es para ela crescer pela via do afretamento a casco nu, gerando uma tend\u00eancia natural a uma concentra\u00e7\u00e3o no mercado.<\/p>\n Tornar o afretamento independente do fluxo de encomendas (o contrato em efic\u00e1cia) e do estoque de embarca\u00e7\u00f5es pr\u00f3prias permite quebrar essa tend\u00eancia concentradora atual do setor de cabotagem, gerando um grande potencial de concorr\u00eancia.<\/p>\n Em particular, o afretamento permite aos entrantes ou empresas menores \u201ctestar\u201d o mercado antes de investir em uma frota pr\u00f3pria. Mais do que isso, favorece a multimodalidade. Empresas de transporte terrestre, por exemplo, passam a poder se verticalizar mais facilmente, seja com a propriedade de EBNs pr\u00f3prias, seja contratualmente com empresas menores, que passar\u00e3o a ter mais oportunidades para afretar navio estrangeiro. Isso significa que, com as regras do BR do Mar, o transporte rodovi\u00e1rio e o de cabotagem tendem a ser mais complementares do que substitutos.<\/p>\n Note-se que navios n\u00e3o s\u00e3o ativos que se caracterizam integralmente como \u201ccustos afundados\u201d, pois o propriet\u00e1rio pode reutiliz\u00e1-los para outras cargas e rotas assim que um determinado uso original se mostre n\u00e3o rent\u00e1vel. No entanto, h\u00e1 algum grau de \u201ccustos afundados\u201d, pois navios para cargas como de gran\u00e9is l\u00edquidos, por exemplo, n\u00e3o s\u00e3o revers\u00edveis para carregar gran\u00e9is s\u00f3lidos. Ademais, se a empresa internaliza um navio, h\u00e1 custos para reutiliz\u00e1-lo em outro pa\u00eds. Essa rigidez, que pode ser entendida como caracter\u00edstica de custos afundados, constitui uma barreira \u00e0 entrada quando se limitam as duas possibilidades de afretamento acima.<\/p>\n Ap\u00f3s a flexibiliza\u00e7\u00e3o dos dois tipos principais de afretamento, a segunda grande mudan\u00e7a prevista no texto aprovado da BR do Mar foi a redu\u00e7\u00e3o da al\u00edquota do Adicional de Frete de Marinha Mercante, o AFRMM, tributo que alimenta o Fundo de Marinha Mercante.<\/p>\n Atualmente, a al\u00edquota do AFRMM \u00e9 de 25% na navega\u00e7\u00e3o de longo curso, 10% na cabotagem; e 40% na navega\u00e7\u00e3o fluvial e lacustre, quando do transporte de gran\u00e9is l\u00edquidos nas regi\u00f5es Norte e Nordeste. A proposta aprovada pela C\u00e2mara dos Deputados reduziu e uniformizou as al\u00edquotas do AFRMM em 8%, o que tende a reduzir o chamado custo Brasil nesses servi\u00e7os. Al\u00e9m disso, a uniformiza\u00e7\u00e3o gera mais neutralidade na pol\u00edtica setorial, evitando que uma atividade aquavi\u00e1ria seja mais gravada, em benef\u00edcios de outras. Desde 1997, a lei prev\u00ea n\u00e3o incid\u00eancia de AFRMM para cargas cuja origem ou destino seja porto localizado na regi\u00e3o Norte ou Nordeste. Esse benef\u00edcio foi prorrogado, no projeto aprovado, at\u00e9 2027, para as navega\u00e7\u00f5es de cabotagem e fluvial.<\/p>\n O AFRMM \u00e9 um subs\u00eddio cruzado que onera o pre\u00e7o do servi\u00e7o de navega\u00e7\u00e3o para os contratantes, ao passo que gera recursos para a constru\u00e7\u00e3o de embarca\u00e7\u00f5es ou sua amplia\u00e7\u00e3o nos estaleiros nacionais. O governo brasileiro nunca realizou estudos quantitativos s\u00e9rios de custo e de benef\u00edcio para avaliar o resultado econ\u00f4mico e social dessa pol\u00edtica. Na falta deles, a discuss\u00e3o legislativa abra\u00e7ou a hip\u00f3tese bastante razo\u00e1vel de que o Adicional n\u00e3o precisa mais ter o tamanho que tinha, dado o \u00f4nus que imp\u00f5e \u00e0 produ\u00e7\u00e3o de bens e o volumoso estoque de recursos (cerca de R$ 20 bilh\u00f5es) de que disp\u00f5e o Fundo de Marinha Mercante, respons\u00e1vel pelo financiamento das atividades de constru\u00e7\u00e3o naval.<\/p>\n Concluindo, a BR do Mar promove avan\u00e7os importantes ao colocar a competi\u00e7\u00e3o no centro da pol\u00edtica p\u00fablica para a cabotagem. A maior barreira para crescer neste setor s\u00e3o as r\u00edgidas regras de afretamento existentes, o que torna o mercado mais concentrado, a competi\u00e7\u00e3o menor e os pre\u00e7os maiores do que poderiam ser neste servi\u00e7o. A flexibiliza\u00e7\u00e3o dos afretamentos a tempo e a casco nu poder\u00e1 gerar uma verdadeira revolu\u00e7\u00e3o no transporte mar\u00edtimo brasileiro, com transbordamentos generalizados para os setores que demandam o transporte de carga em suas cadeias produtivas. Constitui redu\u00e7\u00e3o na veia do custo Brasil, com aumento da produtividade geral do pa\u00eds.<\/p>\n Com a palavra, agora, o Senado.<\/p>\n <\/p>\n C\u00e9sar Mattos<\/strong> \u00e9 consultor legislativo da C\u00e2mara dos Deputados e doutor em Economia.<\/p>\n Sandro Gon\u00e7alves<\/strong> \u00e9 consultor legislativo da C\u00e2mara dos Deputados e mestre em Transportes.<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" A vers\u00e3o aprovada ap\u00f3s intensa discuss\u00e3o no Plen\u00e1rio da C\u00e2mara manteve a linha mestra do texto original do Poder Executivo: ampliar a concorr\u00eancia no setor.<\/p>\n","protected":false},"author":147,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"_monsterinsights_skip_tracking":false,"_monsterinsights_sitenote_active":false,"_monsterinsights_sitenote_note":"","_monsterinsights_sitenote_category":0,"footnotes":""},"categories":[1,254,776],"tags":[],"class_list":["post-3377","post","type-post","status-publish","format-standard","hentry","category-outros","category-a-regulacao","category-reproducoes"],"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/posts\/3377","targetHints":{"allow":["GET"]}}],"collection":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/users\/147"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Fcomments&post=3377"}],"version-history":[{"count":0,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/posts\/3377\/revisions"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Fmedia&parent=3377"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Fcategories&post=3377"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Ftags&post=3377"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}\n\n
\n Afretamento por Tempo pela Lei 9.432\/97<\/td>\n Afretamento por Tempo pela \u201cBR do Mar\u201d<\/td>\n<\/tr>\n \n i)\u00a0inexistir ou estiver indispon\u00edvel embarca\u00e7\u00e3o de bandeira brasileira do tipo e porte adequados para o transporte ou apoio pretendido;<\/p>\n i) para ampliar tonelagem de porte bruto das embarca\u00e7\u00f5es pr\u00f3prias efetivamente operantes;<\/p>\n \n\n
\n Afretamento a Casco Nu pela Lei 9.432\/97<\/td>\n Afretamento a Casco Nu pela \u201cBR do Mar\u201d<\/td>\n<\/tr>\n \n Limitado ao dobro da tonelagem de porte bruto das embarca\u00e7\u00f5es, de tipo semelhante, por ela encomendadas a estaleiro brasileiro instalado no Pa\u00eds, com contrato de constru\u00e7\u00e3o em efic\u00e1cia<\/u>, adicionado de metade da tonelagem de porte bruto das embarca\u00e7\u00f5es brasileiras de sua propriedade,<\/u> ressalvado o direito ao afretamento de pelo menos uma embarca\u00e7\u00e3o de porte equivalente<\/td>\n Autoriza o afretamento de uma embarca\u00e7\u00e3o estrangeira a casco nu, com suspens\u00e3o de bandeira, para navega\u00e7\u00e3o de cabotagem, independentemente de contrato de constru\u00e7\u00e3o em efic\u00e1cia <\/u>ou de propriedade de embarca\u00e7\u00e3o brasileira.<\/p>\n