{"id":3372,"date":"2020-11-24T08:39:34","date_gmt":"2020-11-24T11:39:34","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=3372"},"modified":"2020-11-25T10:56:02","modified_gmt":"2020-11-25T13:56:02","slug":"a-inflacao-da-pandemia-da-covid-19","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=3372","title":{"rendered":"A infla\u00e7\u00e3o da pandemia da Covid-19"},"content":{"rendered":"

Por Roberto Macedo<\/span><\/i><\/p>\n

No meu \u00faltimo artigo, h\u00e1 duas semanas<\/span>, argumentei que o notici\u00e1rio sobre as causas da maior infla\u00e7\u00e3o em 2020 \u00e9 limitado, em preju\u00edzo da compreens\u00e3o desse assunto. Tr\u00eas aspectos s\u00e3o enfatizados: o forte aumento dos pre\u00e7os de alimentos, como o arroz e o \u00f3leo de soja, e de pre\u00e7os industriais, este atribu\u00eddo a uma escassez de insumos utilizados pelo setor, e a taxa de c\u00e2mbio, em reais por d\u00f3lar, que subiu bastante neste ano.<\/span><\/p>\n

Na an\u00e1lise econ\u00f4mica, usualmente se distingue uma infla\u00e7\u00e3o de custos, como a dos aspectos citados, cabendo explicar por que aumentaram. E h\u00e1 a infla\u00e7\u00e3o de demanda, que pode ocorrer, por exemplo, quando um banco central amplia consideravelmente a oferta monet\u00e1ria e\/ou \u00e9 adotada uma pol\u00edtica fiscal que expanda com vigor os gastos p\u00fablicos. Essas fontes de infla\u00e7\u00e3o podem atuar conjuntamente.<\/span><\/p>\n

No artigo citado, enfoquei a infla\u00e7\u00e3o de demanda, muito importante por dois aspectos, o lado fiscal da pol\u00edtica macroecon\u00f4mica governamental e o lado monet\u00e1rio e credit\u00edcio da mesma pol\u00edtica. A pol\u00edtica fiscal tornou-se fortemente expansionista. Entre outras raz\u00f5es, pela ado\u00e7\u00e3o do aux\u00edlio emergencial e por outros disp\u00eandios para a sa\u00fade. Isso teve o seu lado monet\u00e1rio mais claro com o aux\u00edlio emergencial, pois foi pago em dinheiro ou creditado em contas, alcan\u00e7ando dezenas de milh\u00f5es de pessoas.<\/span><\/p>\n

Mostrei tamb\u00e9m n\u00fameros de grande dimens\u00e3o reveladores desse impacto monet\u00e1rio gerador de demanda. O papel-moeda em poder do p\u00fablico aumentou 35% entre mar\u00e7o e setembro de 2020, os dep\u00f3sitos banc\u00e1rios \u00e0 vista cresceram 25%, segundo o Banco Central, e esses aumentos foram significativos se comparados com os verificados em 2019, sem a covid-19. Ressaltei ainda as contas de poupan\u00e7a, cujo saldo total aumentou 18% entre mar\u00e7o e setembro de 2020, ou R$ 152 bilh\u00f5es. Pela primeira vez ultrapassou a imensa cifra de R$ 1 trilh\u00e3o.<\/span><\/p>\n

Outra fonte, o Fundo Garantidor de Cr\u00e9ditos, revelou que o aumento foi mais forte, de 55% (!), nas contas de saldo mensal at\u00e9 R$ 5 mil, indicando que parte do aux\u00edlio emergencial a\u00ed ficou. Essas contas s\u00e3o tamb\u00e9m utilizadas, em parte, como dep\u00f3sitos \u00e0 vista. E esse uso cresceu muito em 2020. Por exemplo, no m\u00eas de outubro, os dep\u00f3sitos na poupan\u00e7a passaram de R$ 218,1 bilh\u00f5es em 2019, para R$ 279,6 bilh\u00f5es em 2020; e as retiradas, de R$ 218,4 bilh\u00f5es para R$ 272,6 bilh\u00f5es no mesmo per\u00edodo.<\/span><\/p>\n

Ainda do lado monet\u00e1rio, houve tamb\u00e9m aumento consider\u00e1vel das concess\u00f5es de cr\u00e9dito, de apoio a pessoas f\u00edsicas e jur\u00eddicas. Segundo o Banco Central, o saldo da carteira de cr\u00e9dito livre aumentou expressivos 26,5% para pessoas jur\u00eddicas e 8,7% para pessoas f\u00edsicas, entre setembro de 2019 e setembro de 2020.<\/span><\/p>\n

Conclu\u00ed afirmando que essa forte expans\u00e3o dos meios de pagamento pesou e continuar\u00e1 pesando na infla\u00e7\u00e3o de 2020. Acrescento que essa expans\u00e3o coincidiu com forte queda do produto interno bruto (PIB), que foi de 2,5% no primeiro trimestre 2020 e de 9,7% no segundo. Assim, o grande aumento dos meios de pagamento, revelador de um tamb\u00e9m amplo aumento da demanda, encontrou a oferta em queda por causa do menor PIB, provocando assim press\u00f5es inflacion\u00e1rias.<\/span><\/p>\n

A previs\u00e3o da infla\u00e7\u00e3o em 2020, medida pelo IPCA do IBGE, continuou subindo nas duas \u00faltimas semanas, como ocorre ininterruptamente h\u00e1 14, segundo o boletim semanal\u00a0<\/span>Focus<\/span><\/i>, do Banco Central. O \u00faltimo boletim, da semana passada, previa 3,25%. Em 5\/6\/2020 a previs\u00e3o era de 1,53%, e havia ca\u00eddo desde o in\u00edcio do ano. Ou seja, a previs\u00e3o mais do que dobrou desde junho.<\/span><\/p>\n

Recentemente, o Banco Central divulgou seu\u00a0<\/span>Boletim Regional<\/span><\/i>\u00a0trimestral, de outubro, que reconhece o efeito dos programas de transfer\u00eancia de renda sobre a infla\u00e7\u00e3o, conforme estes trechos: \u201cA pandemia da Covid-19 tem influenciado a infla\u00e7\u00e3o e os pre\u00e7os (..,) desde mar\u00e7o (…) a deprecia\u00e7\u00e3o cambial, os programas de transfer\u00eancia de renda e o aumento dos gastos com alimenta\u00e7\u00e3o no domic\u00edlio pressionaram os pre\u00e7os dos alimentos. (…) a an\u00e1lise evidencia infla\u00e7\u00e3o de alimentos mais elevada no Norte e no Nordeste, inclusive para a faixa de renda mais baixa, o que sugere algum efeito do aux\u00edlio emergencial (…), mais significativo nessas regi\u00f5es, sobre a demanda desses produtos\u201d.<\/span><\/p>\n

Usando esse diagn\u00f3stico para especular quanto ao futuro da infla\u00e7\u00e3o, a press\u00e3o inflacion\u00e1ria ter\u00e1 uma queda neste e no pr\u00f3ximo trimestre com a redu\u00e7\u00e3o e elimina\u00e7\u00e3o do aux\u00edlio, mais a expans\u00e3o do PIB, que voltou a crescer no terceiro trimestre deste ano, queda que poder\u00e1 ser arrefecida se o dinheiro acumulado em 2020 nas contas de poupan\u00e7a, ou de outras formas, for usado para consumo.<\/span><\/p>\n

Passando a outros fatores, se o governo federal n\u00e3o tomar nos pr\u00f3ximos tr\u00eas meses medidas efetivas para reduzir sensivelmente o d\u00e9ficit fiscal, que aumentou enormemente em 2020, isso poder\u00e1 contribuir para agravar as preocupa\u00e7\u00f5es quanto ao financiamento da d\u00edvida p\u00fablica, criando press\u00f5es sobre o c\u00e2mbio e sobre as pr\u00f3prias expectativas de infla\u00e7\u00e3o, que tamb\u00e9m poder\u00e3o contribuir para agrav\u00e1-la.<\/span><\/p>\n

Roberto Macedo<\/i><\/b> \u00e9 economista (UFMG, USP e\u00a0Harvard), professor s\u00eanior da USP e membro do Instituto Fernand Braudel.<\/span><\/i><\/p>\n

Artigo publicado no jornal <\/span><\/i>O Estado de S. Paulo<\/i><\/b>, em 19 de novembro de 2020.<\/span><\/i><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Banco Central tamb\u00e9m apontou efeito da maior demanda sobre o aumento inflacion\u00e1rio. <\/p>\n","protected":false},"author":125,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"_monsterinsights_skip_tracking":false,"_monsterinsights_sitenote_active":false,"_monsterinsights_sitenote_note":"","_monsterinsights_sitenote_category":0,"footnotes":""},"categories":[781,7,776],"tags":[],"class_list":["post-3372","post","type-post","status-publish","format-standard","hentry","category-coronavirus-economia","category-inflacao-juros-e-taxa-de-cambio","category-reproducoes"],"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/posts\/3372","targetHints":{"allow":["GET"]}}],"collection":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/users\/125"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Fcomments&post=3372"}],"version-history":[{"count":1,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/posts\/3372\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":3373,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=\/wp\/v2\/posts\/3372\/revisions\/3373"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Fmedia&parent=3372"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Fcategories&post=3372"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/index.php?rest_route=%2Fwp%2Fv2%2Ftags&post=3372"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}