{"id":33,"date":"2011-02-13T20:58:58","date_gmt":"2011-02-13T23:58:58","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=33"},"modified":"2012-01-04T01:24:18","modified_gmt":"2012-01-04T04:24:18","slug":"como-as-leis-e-o-poder-judiciario-afetam-a-economia","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=33","title":{"rendered":"Como as Leis e o Poder Judici\u00e1rio afetam a Economia?"},"content":{"rendered":"

As leis e as decis\u00f5es judiciais, juntamente com os instrumentos que obrigam todos os cidad\u00e3os a cumpri-los (pol\u00edcia, judici\u00e1rio, fiscaliza\u00e7\u00e3o sanit\u00e1ria, Receita Federal, ag\u00eancias reguladoras, etc. ), fornecem um conjunto de incentivos aos cidad\u00e3os e empresas, que t\u00eam reflexos sobre a efici\u00eancia das transa\u00e7\u00f5es econ\u00f4micas. Uma legisla\u00e7\u00e3o que estabele\u00e7a impostos muito elevados, por exemplo, representa um incentivo \u00e0 sonega\u00e7\u00e3o. Uma adequada lei de patentes, que proteja as inova\u00e7\u00f5es tecnol\u00f3gicas e gere lucros aos inventores, por sua vez, ser\u00e1 um incentivo para o desenvolvimento cient\u00edfico.<\/p>\n

H\u00e1 uma s\u00e9rie de situa\u00e7\u00f5es econ\u00f4micas que n\u00e3o podem ser deixadas ao livre arb\u00edtrio do mercado, precisando ser reguladas por lei e que, por isso, ficam sob a influ\u00eancia das leis e das institui\u00e7\u00f5es citadas acima. Por exemplo: \u00e9 preciso impor regras e penalidades para que as f\u00e1bricas n\u00e3o lancem nos rios e mares os dejetos gerados durante o processo produtivo; \u00e9 preciso criar impostos para financiar atividades que s\u00e3o importantes para a sociedade, mas que n\u00e3o d\u00e3o lucro e, por isso, n\u00e3o s\u00e3o oferecidas no mercado privado (constru\u00e7\u00e3o de estradas, saneamento b\u00e1sico, sa\u00fade preventiva, preserva\u00e7\u00e3o de florestas); \u00e9 preciso oferecer a toda a sociedade alguns bens e servi\u00e7os que, se deixados ao mercado, seriam acess\u00edveis apenas \u00e0s popula\u00e7\u00f5es de maior renda (educa\u00e7\u00e3o, sa\u00fade); \u00e9 preciso evitar a forma\u00e7\u00e3o de monop\u00f3lios e cart\u00e9is que prejudiquem a concorr\u00eancia e tornem os produtos mais caros e de menor qualidade. Tais fen\u00f4menos s\u00e3o conhecidos pelo termo gen\u00e9rico \u201cfalhas de mercado\u201d, que se refere a situa\u00e7\u00f5es em que o livre funcionamento do mercado leva a situa\u00e7\u00f5es socialmente indesej\u00e1veis.[1]<\/a><\/p>\n

Na pr\u00e1tica, as leis e institui\u00e7\u00f5es destinadas a corrigir falhas de mercado t\u00eam diversos graus de qualidade. Tanto podem ser eficazes na redu\u00e7\u00e3o das falhas de mercado, quanto podem introduzir distor\u00e7\u00f5es adicionais na economia. Nessa situa\u00e7\u00e3o, h\u00e1 leis editadas com o objetivo de congelar pre\u00e7os, prejudicando o equil\u00edbrio natural do mercado. O Plano Cruzado \u00e9 um exemplo t\u00edpico, pois, ao promover o congelamento de pre\u00e7os para combater uma hiperinfla\u00e7\u00e3o, n\u00e3o permitiu o ajuste dos valores de mercadorias sujeitas \u00e0 sazonalidade, gerando um desequil\u00edbrio de pre\u00e7os. Como resultado disso, vieram o desabastecimento de bens (ningu\u00e9m se dispunha a vender com preju\u00edzo ou perder oportunidades de lucro) e o surgimento de \u00e1gio para compra de produtos escassos, principalmente os que se encontravam na entressafra, como carne e leite.<\/p>\n

Outro ponto importante na rela\u00e7\u00e3o entre a \u00e1rea jur\u00eddica e a econ\u00f4mica \u00e9 o \u201cdireito de propriedade\u201d, conceito jur\u00eddico que se refere ao fato de que o propriet\u00e1rio \u00e9 livre para usar seus bens como quiser (desde que dentro da lei) sem a interfer\u00eancia ou intromiss\u00e3o de outros. Direitos de propriedade que n\u00e3o s\u00e3o perfeitamente seguros desestimulam os investimentos, reduzindo o potencial de crescimento da economia. Produtores rurais que se sintam sob amea\u00e7a de invas\u00e3o de suas terras por movimentos de \u201csem-terra\u201d reduzir\u00e3o os investimentos em infraestrutura e melhoria da terra, pois temem o risco de perder esse investimento no caso de uma invas\u00e3o. Pa\u00edses que costumeiramente confiscam investimentos feitos por estrangeiros ou n\u00e3o pagam suas d\u00edvidas externas se tornam perigosos para os investidores internacionais e deixam de ser atrativos para empresas que poderiam ali se instalar, produzir e gerar empregos.<\/p>\n

O Teorema de Coase[2]<\/a> ensina que, se n\u00e3o houver custos de transa\u00e7\u00e3o, basta que os direitos de propriedade sejam bem definidos para que uma negocia\u00e7\u00e3o entre os interessados aconte\u00e7a e os recursos sejam utilizados da forma mais eficiente poss\u00edvel. Os custos de transa\u00e7\u00e3o s\u00e3o os gastos necess\u00e1rios \u00e0 realiza\u00e7\u00e3o de um neg\u00f3cio no mercado, como pagamento de taxas, advogados, corretores, cart\u00f3rios e outros envolvidos na transa\u00e7\u00e3o. Assim, para a literatura de An\u00e1lise Econ\u00f4mica do Direito, as leis deveriam ser elaboradas de forma a remover os obst\u00e1culos \u00e0 negocia\u00e7\u00e3o privada, reduzindo ao m\u00e1ximo os custos de transa\u00e7\u00e3o para melhorar o desempenho da economia. Essa deveria ser uma das principais fun\u00e7\u00f5es das institui\u00e7\u00f5es de forma geral (regramentos jur\u00eddicos, tribunais, etc).<\/p>\n

Tamb\u00e9m relevante \u00e9 o impacto da a\u00e7\u00e3o do Poder Judici\u00e1rio na economia. Uma importante distor\u00e7\u00e3o da Justi\u00e7a brasileira consiste no fato de que as disputas de baixo valor n\u00e3o chegam \u00e0s m\u00e3os dos ju\u00edzes, pois, se chegassem, as custas processuais e os honor\u00e1rios advocat\u00edcios consumiriam o cr\u00e9dito a receber. Esse problema foi resolvido em parte pelos juizados de pequenas causas, mas o problema ainda persiste. Em regra, a Justi\u00e7a s\u00f3 \u00e9 acionada se o valor do lit\u00edgio for alto ou quando o litigante possui uma estrutura jur\u00eddica permanente, como \u00e9 o caso das grandes empresas. Tal situa\u00e7\u00e3o coloca em desvantagem a camada mais baixa da sociedade, que v\u00ea sua pior condi\u00e7\u00e3o socioecon\u00f4mica ser perpetuada pela maneira de funcionar das institui\u00e7\u00f5es.<\/p>\n

Al\u00e9m disso, esse alto \u00edndice de exclus\u00e3o judicial tem efeitos sobre os contratos de cr\u00e9dito e os contratos trabalhistas, pois, como as empresas sabem da baixa possibilidade de recorrer \u00e0 Justi\u00e7a, n\u00e3o se preocupam com a formaliza\u00e7\u00e3o dos neg\u00f3cios, ou seja, existe um incentivo para o trabalho prec\u00e1rio (informalidade no mercado de trabalho) e para empr\u00e9stimos que passam ao largo do sistema financeiro tradicional (agiotagem).<\/p>\n

Outro problema \u00e9 a morosidade do Poder Judici\u00e1rio. Em m\u00e9dia, demora-se anos para que se consiga uma decis\u00e3o final. Essa dificuldade de receber cr\u00e9ditos na Justi\u00e7a afeta diretamente a conjuntura econ\u00f4mica, pois propicia uma taxa de juros mais elevada. Como n\u00e3o h\u00e1 seguran\u00e7a judici\u00e1ria de que o cr\u00e9dito ser\u00e1 recuperado rapidamente, a tend\u00eancia \u00e9 que j\u00e1 se inclua na taxa de juros um adicional para cobrir as perdas com cr\u00e9ditos n\u00e3o pagos. Isso tem consequ\u00eancias extremamente negativas para a economia: diminui\u00e7\u00e3o dos investimentos, cr\u00e9dito mais caro ou, ainda, restri\u00e7\u00e3o ao cr\u00e9dito.<\/p>\n

O problema n\u00e3o \u00e9 privil\u00e9gio da recupera\u00e7\u00e3o de contratos de cr\u00e9dito. A mesma situa\u00e7\u00e3o se repete em lit\u00edgios da \u00e1rea c\u00edvel como pagamento de verbas indenizat\u00f3rias.<\/p>\n

No entanto, avan\u00e7os est\u00e3o acontecendo. Um exemplo atual pode ser encontrado no mercado de loca\u00e7\u00e3o de im\u00f3veis. Foram promovidas altera\u00e7\u00f5es na Lei do Inquilinato com a publica\u00e7\u00e3o da Lei 12.112, de 2009. O objetivo foi conceder mais seguran\u00e7a aos propriet\u00e1rios dos im\u00f3veis urbanos. Depois dessa mudan\u00e7a na legisla\u00e7\u00e3o, \u00e9 mais habitual que os locadores tenham sucesso r\u00e1pido em a\u00e7\u00f5es de despejo por falta de pagamento do aluguel. \u00a0Essa sistem\u00e1tica traz mais tranquilidade ao mercado e seguran\u00e7a para quem investe em im\u00f3veis para loca\u00e7\u00e3o, que resulta em maior oferta de im\u00f3veis e redu\u00e7\u00e3o do valor m\u00e9dio do aluguel, beneficiando o inquilino que paga em dia suas obriga\u00e7\u00f5es.<\/p>\n

Em conclus\u00e3o, uma pol\u00edtica de desenvolvimento nacional n\u00e3o passa apenas pelas vari\u00e1veis macroecon\u00f4micas como infla\u00e7\u00e3o, juros ou taxa de investimento. \u00c9 importante considerar tamb\u00e9m o impacto da legisla\u00e7\u00e3o e do funcionamento das institui\u00e7\u00f5es sobre o comportamento de indiv\u00edduos e empresas. A an\u00e1lise econ\u00f4mica do direito afeta \u00e1reas t\u00e3o distintas quanto a flexibilidade do mercado de trabalho, o aperfei\u00e7oamento do mercado de cr\u00e9dito e do sistema financeiro, a melhoria da tributa\u00e7\u00e3o e do ambiente de neg\u00f3cios. Todos esses t\u00f3picos dependem de aprova\u00e7\u00e3o de leis. Elas \u00e9 que, se bem desenhadas, fornecer\u00e3o os incentivos corretos para que indiv\u00edduos e empresas, ao buscarem o melhor para si, tamb\u00e9m atuem de forma eficiente.<\/p>\n

Por fim, cabe enfatizar a necessidade de redu\u00e7\u00e3o do custo de resolu\u00e7\u00e3o de conflitos. Isso se consegue com uma reforma do Poder Judici\u00e1rio. Tal aprimoramento vem sendo realizado paulatinamente, como os novos C\u00f3digos de Processo Penal e Civil aprovados recentemente no Senado.<\/p>\n

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