{"id":3294,"date":"2020-08-12T14:19:19","date_gmt":"2020-08-12T17:19:19","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=3294"},"modified":"2020-08-14T14:48:39","modified_gmt":"2020-08-14T17:48:39","slug":"equivocos-na-analise-do-emprego","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=3294","title":{"rendered":"Equ\u00edvocos na an\u00e1lise do emprego"},"content":{"rendered":"

Abordarei alguns equ\u00edvocos conceituais e anal\u00edticos \u00e0s vezes cometidos por jornalistas. Assim, por muito tempo ouvi o \u00e2ncora do Jornal Nacional afirmar que o Produto Interno Bruto (PIB) \u00e9 a soma das riquezas do Pa\u00eds. Na verdade, o PIB \u00e9 o valor da produ\u00e7\u00e3o de bens e servi\u00e7os de um pa\u00eds num determinado per\u00edodo de tempo, em geral um ano ou um trimestre. O PIB mede o valor do fluxo dessa produ\u00e7\u00e3o num desses per\u00edodos. J\u00e1 as riquezas de um pa\u00eds s\u00e3o o que foi acumulado ao longo da Hist\u00f3ria. \u00c9 como um estoque, que at\u00e9 se deprecia.<\/span><\/p>\n

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Explico: olhando atentamente pela janela do pr\u00e9dio onde moro, vejo muitos pr\u00e9dios constru\u00eddos no passado que fazem parte dessa riqueza do Pa\u00eds. Mas s\u00f3 um em constru\u00e7\u00e3o, que faz parte do PIB do ano corrente, e como sua obra come\u00e7ou em anos anteriores, tamb\u00e9m integrou o PIB desses anos, nas partes constru\u00eddas em cada um deles.<\/span><\/p>\n

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Passo aos dados de emprego, objeto de equ\u00edvocos anal\u00edticos que continuam. Especificamente, dos dados mensalmente divulgados pelo governo federal e oriundos do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que cobre o emprego formal, e dos trimestrais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estat\u00edstica (IBGE), que abrangem tamb\u00e9m o mercado informal. Quanto ao Caged, seus dados eram obtidos por meio de um formul\u00e1rio preenchido mensalmente pelas institui\u00e7\u00f5es empregadoras. Recentemente surgiu o que a fonte chama de \u201cnovo Caged\u201d, ou seja, \u201ca gera\u00e7\u00e3o das estat\u00edsticas do emprego formal por meio de informa\u00e7\u00f5es captadas dos sistemas eSocial, Caged e Empregador Web\u201d. Seus n\u00fameros s\u00e3o limitados aos de empregados admitidos e aos desligamentos \u2013 neste caso, sem distinguir os demitidos dos que pediram demiss\u00e3o \u2013, bem como ao saldo mensal ou \u00e0 diferen\u00e7a entre o primeiro e o segundo n\u00famero.<\/span><\/p>\n

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H\u00e1 anos jornalistas v\u00eam extrapolando conceitualmente na sua an\u00e1lise e passaram a falar tamb\u00e9m de vagas e postos de trabalho, n\u00e3o cobertos por esses dados. S\u00e3o comuns manchetes e textos que incluem frases como esta: no per\u00edodo foram criados tantos postos de trabalho, ou vagas, quando o referido saldo \u00e9 positivo; ou destru\u00eddos ou eliminados em caso contr\u00e1rio.<\/span><\/p>\n

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Como se pode falar de vagas destru\u00eddas, se o que existia eram empregos, que cessaram, e n\u00e3o vagas? Ademais, no caso dos desligamentos, como a rotatividade de m\u00e3o de obra \u00e9 muito alta no Brasil, muitos teriam pedido demiss\u00e3o, caso em que suas vagas, a crit\u00e9rio do empregador, podem ter permanecido e, assim, n\u00e3o foram eliminadas. E mais: de modo geral, empregadores podem ter at\u00e9 aberto e reaberto vagas para em seguida contratarem substitutos para todos ou parte dos que foram desligados. Ou para novos empregos. Mas n\u00e3o se pode falar sobre vagas, pois n\u00e3o h\u00e1 dados sobre elas.<\/span><\/p>\n

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Postos de trabalho tampouco significam o mesmo que empregos. O que s\u00e3o postos de trabalho? J\u00e1 visitei f\u00e1bricas, e me lembro tamb\u00e9m das atribula\u00e7\u00f5es de Charlie Chaplin no filme <\/span>Tempos Modernos<\/i><\/b>. Numa linha de montagem de autom\u00f3veis, por exemplo, h\u00e1, nos seus postos, v\u00e1rios respons\u00e1veis pela coloca\u00e7\u00e3o de autope\u00e7as \u00e0 medida que o corpo do carro vai andando nessa linha. Por exemplo, j\u00e1 vi um empregado que encaixava os pneus nas roscas em que seriam parafusados, e outro que colocava e apertava as porcas nessas roscas. Ora, na presente crise a produ\u00e7\u00e3o caiu, mas n\u00e3o a zero. Com isso a velocidade da linha de montagem foi reduzida, empregados foram dispensados, mas seus postos n\u00e3o foram fechados, pois os trabalhadores que restaram podem desempenhar o trabalho exigido por mais de um posto. No mesmo exemplo, um s\u00f3 colocando as rodas e as parafusando. Portanto, como no caso das vagas, os postos de trabalho n\u00e3o podem ser usados como sin\u00f4nimo de empregos.<\/span><\/p>\n

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Isso n\u00e3o se limita a plantas industriais. Sei de um bar em S\u00e3o Paulo em que havia v\u00e1rios atendentes em seus postos de trabalho: um no caixa, outro cuidando de sucos, bebidas e vitaminas, outro fazendo sandu\u00edches, esfihas e outros assados, mais um lavando pratos, talheres e demais utens\u00edlios e dois ou tr\u00eas atendentes de balc\u00e3o. Com a crise, soube que alguns sa\u00edram, mas os restantes estenderam seu trabalho aos postos dos que partiram. N\u00e3o houve fechamento de vagas, pois n\u00e3o existiam, nem extin\u00e7\u00e3o de postos de trabalho.<\/span><\/p>\n

Note-se, tamb\u00e9m, que a condi\u00e7\u00e3o de empregado, ou n\u00e3o, \u00e9 um atributo do trabalhador, enquanto vagas e postos de trabalhos s\u00e3o atributos do processo produtivo. Seria at\u00e9 interessante analisar estes \u00faltimos atributos, como ao tomar o n\u00famero de vagas como indicador antecedente das varia\u00e7\u00f5es do emprego, mas n\u00e3o h\u00e1 dados a esse respeito.<\/span><\/p>\n

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Os dados do IBGE medem diversas vari\u00e1veis, como o n\u00famero de empregados e de desempregados, neste caso tamb\u00e9m sem distinguir quem foi demitido e quem pediu demiss\u00e3o, e tampouco h\u00e1 qualquer refer\u00eancia a vagas e postos de trabalho.<\/span><\/p>\n

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Em s\u00edntese, fala-se muito do n\u00famero de vagas e de postos de trabalho, mas nos dois casos sem fundamento em dados.<\/span><\/p>\n

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Artigo publicado no jornal <\/span><\/i>O Estado de S. Paulo<\/i><\/b>, em 6 de agosto de 2020.<\/span><\/i><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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