{"id":2989,"date":"2017-04-24T10:31:50","date_gmt":"2017-04-24T13:31:50","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=2989"},"modified":"2017-04-24T10:33:18","modified_gmt":"2017-04-24T13:33:18","slug":"parte-2-o-que-te-contaram-errado-sobre-a-reforma-da-previdencia","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=2989","title":{"rendered":"Parte 2: O que te contaram errado sobre a reforma da Previd\u00eancia"},"content":{"rendered":"

Em texto anterior, discutimos no blog<\/a> os mitos sobre a reforma da Previd\u00eancia, como o de que ela faria as pessoas trabalharem at\u00e9 morrer (porque \u00e9 um erro neste debate considerar a expectativa de vida ao nascer<\/em>); o de que uma idade m\u00ednima prejudica o trabalhador mais pobre que come\u00e7a a trabalhar cedo (porque ele j\u00e1 tem idade m\u00ednima hoje); o de que ser\u00e3o precisos 49 anos de contribui\u00e7\u00e3o para aposentadoria integral (porque isso s\u00f3 seria preciso para uma minoria da popula\u00e7\u00e3o); e o de que a Seguridade Social em seu conjunto \u00e9 superavit\u00e1ria (porque essa conta esconde dados do funcionalismo p\u00fablico).<\/p>\n

Neste texto, analisamos mais quatro mitos difundidos sobre a reforma.<\/p>\n

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Mito: O problema previdenci\u00e1rio seria resolvido se o governo cobrasse as empresas devedoras da Previd\u00eancia.<\/strong><\/p>\n

N\u00e3o h\u00e1 o que defender a respeito de sonega\u00e7\u00e3o e inadimpl\u00eancia na Previd\u00eancia. Entretanto, quando se diz que as 500 maiores empresas devedoras da Previd\u00eancia devem mais de R$ 400 bilh\u00f5es, \u00e9 preciso ficar claro que:<\/p>\n

i) boa parte dos grandes devedores n\u00e3o s\u00e3o empresas;<\/p>\n

ii) entre as que de fato s\u00e3o, muitas est\u00e3o falidas, e o montante devido, al\u00e9m de irrecuper\u00e1vel, \u00e9 alto pela pr\u00f3pria incid\u00eancia de juros e corre\u00e7\u00e3o monet\u00e1ria;<\/p>\n

iii<\/em>) ainda que fosse recuper\u00e1vel, a d\u00edvida pagaria as despesas do INSS por apenas 9 meses.<\/p>\n

As empresas que n\u00e3o s\u00e3o empresas<\/em><\/p>\n

A respeito do primeiro ponto, h\u00e1 um evidente esfor\u00e7o de desinforma\u00e7\u00e3o quando se fala sobre as 500 maiores \u201cempresas\u201d que devem \u00e0 Previd\u00eancia. A 13\u00aa maior devedora, com R$ 550 milh\u00f5es, \u00e9 a Prefeitura de S\u00e3o Paulo. A lista cont\u00e9m ainda outras capitais como Salvador (44\u00aa, R$ 320 milh\u00f5es) e Manaus (54\u00aa, R$ 280 milh\u00f5es), e cidades como Guarulhos (11\u00aa, R$ 560 milh\u00f5es), Barcarena (62\u00aa, R$ 250 milh\u00f5es), Cabo Frio (66\u00ba, R$ 230 milh\u00f5es) e Campinas (77\u00aa, R$ 210 milh\u00f5es).<\/p>\n

\u00d3rg\u00e3os da Administra\u00e7\u00e3o Direta e Indireta de diversos entes tamb\u00e9m abundam na lista, como o 8\u00ba maior devedor, o Instituto Candango de Solidariedade (DF), (R$ 700 milh\u00f5es), e a 10\u00aa maior devedora, a Agespisa (PI), com R$ 590 milh\u00f5es.<\/p>\n

At\u00e9 mesmo estatais federais aparecem entre os grandes devedores, como a Caixa Econ\u00f4mica Federal (14\u00aa maior devedora, R$ 550 milh\u00f5es), os Correios (32\u00ba maior devedor, R$ 380 milh\u00f5es) e o Banco do Brasil (76\u00ba, R$ 200 milh\u00f5es)<\/p>\n

Por que isso \u00e9 um problema no debate? A narrativa de que a d\u00edvida (\u201cd\u00edvida ativa\u201d) \u00e9 formada por grandes empresas passa a err\u00f4nea impress\u00e3o que o problema previdenci\u00e1rio poderia ser resolvido com recursos do setor privado. Entretanto, a grande participa\u00e7\u00e3o de entidades do pr\u00f3prio Estado revela que, caso a cobran\u00e7a da d\u00edvida ativa fosse melhorada, parte do fluxo de dinheiro se daria entre bolsos de uma mesma cal\u00e7a: por exemplo, de um ente do Estado para o outro. Evidentemente isso n\u00e3o significa que n\u00e3o seja justo que todos aqueles com d\u00edvida reconhecida paguem o que devem, sejam do setor privado ou n\u00e3o.<\/p>\n

As empresas falidas<\/em><\/p>\n

J\u00e1 o segundo ponto, a grande quantidade de empresas falidas, \u00e9 ilustrada pelo trio Varig, Vasp e Transbrasil: as tr\u00eas empresas a\u00e9reas est\u00e3o entre as seis maiores devedoras, todas com passivos de mais de R$ 1 bilh\u00e3o. No caso da Varig, a maior devedora da Previd\u00eancia, o valor se aproxima de R$ 4 bilh\u00f5es.<\/p>\n

H\u00e1 uma evidente dificuldade de recuperar recursos de empresas falidas, seja seu credor um banco ou a Previd\u00eancia.<\/p>\n

Figura 1 \u2013 Ativos da maior devedora da Previd\u00eancia<\/em><\/p>\n

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Adicionalmente, \u00e9 pertinente observar que o valor alto que algumas dessas empresas registram na lista de grandes devedores se deve \u00e0 pr\u00f3pria incid\u00eancia de juros e corre\u00e7\u00e3o monet\u00e1ria sobre os d\u00e9bitos, que v\u00e3o se somando ao longo dos anos, ainda que n\u00e3o sejam recuper\u00e1veis. Algumas das empresas da lista n\u00e3o est\u00e3o falidas h\u00e1 anos, mas h\u00e1 d\u00e9cadas.<\/p>\n

Dinheiro para pagar um benef\u00edcio por um m\u00eas<\/em><\/p>\n

Por isso, \u00e9 extremamente falacioso comparar o montante de R$ 430 bilh\u00f5es das 500 maiores devedoras com o d\u00e9ficit da Previd\u00eancia. Infelizmente, deste montante, apenas R$ 10 bilh\u00f5es \u00e9 classificado como de \u201calta chance de recupera\u00e7\u00e3o\u201d. O valor equivale \u00e0s despesas com aposentadoria por tempo de contribui\u00e7\u00e3o: em um m\u00eas<\/strong>. Argumento semelhante se aplica \u00e0 l\u00f3gica de que a reforma da Previd\u00eancia deve ser substitu\u00edda pelo combate \u00e0 corrup\u00e7\u00e3o, uma causa nobre, mas que \u00e9 incapaz de resolver os problemas do pa\u00eds: o departamento de propinas da Odebrecht movimentou em quase 10 anos o que o INSS gasta em 1 semana1<\/sup>.<\/p>\n

Assim chegamos ao terceiro ponto elencado acima. Ainda que toda a d\u00edvida ativa fosse recuperada, o valor seria suficiente para pagar todas despesas do INSS por apenas 9 meses. Este \u00e9 um importante equ\u00edvoco dos que apontam a d\u00edvida ativa como solu\u00e7\u00e3o para a Previd\u00eancia: em econom\u00eas, a d\u00edvida ativa \u00e9 um \u201cestoque\u201d, um valor acumulado referente ao passado, enquanto a despesa previdenci\u00e1ria \u00e9 um \u201cfluxo\u201d, que se repete no tempo.<\/p>\n

As filantr\u00f3picas (pilantr\u00f3picas?) e o STF<\/em><\/p>\n

Um complicador adicional deve ser a recente decis\u00e3o do Supremo Tribunal Federal estabelecendo que os requisitos de imunidade previdenci\u00e1ria para entidades filantr\u00f3picas deveriam ter sido estabelecidos por uma lei complementar, e n\u00e3o por lei ordin\u00e1ria como foi feito. Parte dos devedores da Previd\u00eancia s\u00e3o justamente entidades que se consideravam isentas de pagar contribui\u00e7\u00e3o. Elas se consideram filantr\u00f3picas para fins previdenci\u00e1rios (ex: uma faculdade privada), mas n\u00e3o s\u00e3o assim consideradas pelos \u00f3rg\u00e3os competentes do governo. Quando n\u00e3o pagavam a Previd\u00eancia por \u201cterem\u201d isen\u00e7\u00e3o, eram consideradas devedoras. Com a decis\u00e3o do STF, suas d\u00edvidas agora poder\u00e3o n\u00e3o existir mais.<\/p>\n

Outros exageros<\/em><\/p>\n

Outros exageros nas mensagens denuncistas que circulam nas redes sobre os grandes devedores incluem considerar que as d\u00edvidas j\u00e1 est\u00e3o reconhecidas e prontas para cobran\u00e7a, quando boa parte ainda \u00e9 discutida na Justi\u00e7a (como a da Caixa Econ\u00f4mico Federal); e insinuar que o governo n\u00e3o busca recuperar os d\u00e9bitos para n\u00e3o incomodar os devedores. Este \u00faltimo tipo de insinua\u00e7\u00e3o tem sido comum no debate (como quando se diz que as contas da Previd\u00eancia n\u00e3o s\u00e3o auditadas). Na verdade, a soma anualmente recuperada desta d\u00edvida subiu de R$ 1,5 bilh\u00e3o em 2010 para R$ 4,1 bilh\u00f5es em 2016, quase tr\u00eas vezes mais.<\/p>\n

Se este pote de ouro ao fim do arco \u00edris n\u00e3o existe, por que este discurso persiste ao longo dos anos? Uma poss\u00edvel explica\u00e7\u00e3o j\u00e1 foi debatida aqui no blog<\/a> \u00a0e se relaciona com promessas de corpora\u00e7\u00f5es de funcion\u00e1rios p\u00fablicos feitas a agentes pol\u00edticos e \u00e0 sociedade. Neste caso, representantes de procuradores, a quem compete recuperar este dinheiro, sempre exageraram valores referentes \u00e0 d\u00edvida ativa ao mesmo tempo em que defendiam a import\u00e2ncia de receberem honor\u00e1rios indenizat\u00f3rios, isto \u00e9, um vantajoso complemento de remunera\u00e7\u00e3o que n\u00e3o se sujeita ao teto constitucional ou \u00e0 incid\u00eancia de Imposto de Renda. Em troca do aumento salarial, a sociedade recuperaria bilh\u00f5es da tal d\u00edvida.<\/p>\n

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Mito: A reforma \u00e9 baseada na compara\u00e7\u00e3o do Brasil com pa\u00edses ricos, que possuem outra realidade.<\/strong><\/p>\n

As regras de concess\u00e3o de benef\u00edcios previdenci\u00e1rios do Brasil n\u00e3o destoam apenas das de pa\u00edses ricos, mas tamb\u00e9m de pa\u00edses emergentes. Por exemplo, al\u00e9m do Brasil, apenas 12 pa\u00edses possuem aposentadoria por tempo de contribui\u00e7\u00e3o, isto \u00e9, uma aposentadoria sem idade m\u00ednima.<\/p>\n

A idade m\u00ednima proposta pelo governo para o Brasil na d\u00e9cada de 2030, de 65 anos, j\u00e1 \u00e9 a idade m\u00ednima hoje no Paraguai, no M\u00e9xico, na Argentina e no Chile. Isso evidentemente n\u00e3o significa que o pa\u00eds deva \u201cimport\u00e1-la\u201d, mas mostra que \u00e9 equivocado afirmar que as regras propostas s\u00f3 s\u00e3o compat\u00edveis com a de um pa\u00eds rico.<\/p>\n

Ainda assim, o processo de envelhecimento populacional do Brasil \u00e9 tal que a OCDE estima que nas pr\u00f3ximas d\u00e9cadas a expectativa de sobrevida de uma idosa brasileira ser\u00e1 at\u00e9 ligeiramente superior a de uma americana ou de uma dinamarquesa \u2013 pa\u00edses muito mais ricos.<\/p>\n

Apesar disso, de fato medidas de \u201cexpectativa de sobrevida com sa\u00fade\u201d dos brasileiros n\u00e3o acompanham a de nacionais de outros pa\u00edses. \u00c9 evidente que deixam muito a desejar no Brasil a sa\u00fade p\u00fablica, a mobilidade e a acessibilidade, entre outras pol\u00edticas p\u00fablicas voltadas aos idosos.<\/p>\n

Uma reflex\u00e3o que \u00e9 pertinente, por\u00e9m, \u00e9 se n\u00e3o reformar a Previd\u00eancia \u00e9 de fato o caminho para melhorar essa situa\u00e7\u00e3o. Com o crescimento do gasto previdenci\u00e1rio, n\u00e3o estamos condenando, por exemplo, o Sistema \u00danico de Sa\u00fade (SUS) a ter menos recursos do que poderia para atender idosos, cujas interna\u00e7\u00f5es s\u00e3o mais frequentes e duram mais? O caminho para a \u201cexpectativa de sobrevida com sa\u00fade\u201d n\u00e3o pode ser somente o aumento de gastos com Previd\u00eancia, \u00e0s custas da sa\u00fade ou do saneamento b\u00e1sico, por exemplo.<\/p>\n

Finalmente, \u00e9 \u00fatil apresentar a idade para aposentadoria em outros pa\u00edses, comparando-a com uma vers\u00e3o difundida em mensagens pela Internet.<\/p>\n

Figura 2 \u2013 Idade m\u00ednima falsa e verdadeira para pa\u00edses selecionados <\/em><\/p>\n

\"\"<\/p>\n

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Mito: A reforma n\u00e3o resolve o problema e melhor seria mudar para um sistema de contas individuais capitalizadas. <\/strong><\/p>\n

Neste debate, frequentemente defende-se que, em vez de modificar os par\u00e2metros do sistema (idade, tempo de contribui\u00e7\u00e3o), melhor seria transformar o regime de reparti\u00e7\u00e3o em um regime de capitaliza\u00e7\u00e3o. Isto \u00e9, mudar de um regime em que os trabalhadores em atividade pagam contribui\u00e7\u00f5es que financiam os benef\u00edcios dos inativos (aposentadorias, pens\u00f5es, aux\u00edlios) para um sistema em que cada um poupa para seu pr\u00f3prio benef\u00edcio, depositando a contribui\u00e7\u00e3o em contas para serem aplicadas no mercado financeiro. \u00a0Tal proposta \u00e9 considerada invi\u00e1vel pelos significativos custos de transi\u00e7\u00e3o<\/strong> que implica.<\/p>\n

O custo de transi\u00e7\u00e3o ocorre porque, enquanto as contribui\u00e7\u00f5es dos trabalhadores da ativa seriam separadas individualmente e capitalizadas, as despesas com os atuais benefici\u00e1rios (aposentadorias, pens\u00f5es, aux\u00edlios) deveriam continuar sendo pagas. Caso nenhuma transi\u00e7\u00e3o fosse empregada, a perda de arrecada\u00e7\u00e3o seria da ordem de R$ 350 bilh\u00f5es em 2016. Com a Uni\u00e3o em delicada trajet\u00f3ria de endividamento e incapaz deproduzir sequer superavits<\/em> prim\u00e1rios, uma mudan\u00e7a abrupta do regime amea\u00e7aria apr\u00f3pria solv\u00eancia do Estado brasileiro.<\/p>\n

Adicionalmente, como a Previd\u00eancia Social \u00e9 caracterizada pela solidariedade entre grupos, um regime de capitaliza\u00e7\u00e3o necessariamente implicaria perdas e regras mais duras do que as da proposta de reforma da Previd\u00eancia para grupos que s\u00e3o \u201csubsidiados\u201d no atual sistema. Entre eles, mulheres, servidores p\u00fablicos, professores, policiais, trabalhadores rurais e aqueles que recebem benef\u00edcios vinculados ao sal\u00e1rio m\u00ednimo. Mantidas as al\u00edquotas de contribui\u00e7\u00e3o atuais, todos esses grupos provavelmente receberiam menos em um regime de capitaliza\u00e7\u00e3o do que no regime atual.<\/p>\n

A principal proposta para um regime de capitaliza\u00e7\u00e3o presente neste debate \u00e9 a dos pesquisadores da USP, apoiada recentemente pelo Movimento Brasil Livre (MBL). Eles prop\u00f5em a cria\u00e7\u00e3o de um sistema misto, mantendo o regime de reparti\u00e7\u00e3o para valores menores e instituindo uma camada de capitaliza\u00e7\u00e3o obrigat\u00f3ria para valores maiores. Cabe observar que, apesar da transi\u00e7\u00e3o proposta pelo modelo, ainda h\u00e1 perda de arrecada\u00e7\u00e3o (custo de transi\u00e7\u00e3o).<\/p>\n

O professor H\u00e9lio Zylberstajn sugere que a transi\u00e7\u00e3o seja financiada ou pelos jovens que estariam no novo modelo, pagando uma contribui\u00e7\u00e3o dobrada (para o modelo antigo e para o novo) ou pelos atuais benefici\u00e1rios, que teriam descontos em seus benef\u00edcios, como aposentadorias. Fica evidente que n\u00e3o h\u00e1 solu\u00e7\u00e3o f\u00e1cil para esta transi\u00e7\u00e3o, seja ela financiada pela Uni\u00e3o, pelos novos segurados ou pelos atuais benefici\u00e1rios.<\/p>\n

Por fim, cabe ressaltar que o risco demogr\u00e1fico presente na reparti\u00e7\u00e3o n\u00e3o est\u00e1 totalmente ausente em um regime de capitaliza\u00e7\u00e3o. Uma boa remunera\u00e7\u00e3o das contas pressup\u00f5e a transfer\u00eancia de ativos da gera\u00e7\u00e3o que se aposenta para a gera\u00e7\u00e3o seguinte, ou seja, esse regime tamb\u00e9m \u00e9 afetado pela transi\u00e7\u00e3o demogr\u00e1fica.<\/p>\n

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Mito: A principal despesa do governo n\u00e3o \u00e9 a Previd\u00eancia e sim os juros, e \u00e9 ela que deveria ser combatida.<\/strong><\/p>\n

Respondendo em 2017 por 57% do total, a Previd\u00eancia \u00e9 o principal componente da despesa prim\u00e1ria da Uni\u00e3o<\/strong>.\u00a0 De maneira simplificada, a despesa prim\u00e1ria \u00e9 a despesa financiada com a arrecada\u00e7\u00e3o detributos (impostos, contribui\u00e7\u00f5es). J\u00e1 os juros e a amortiza\u00e7\u00e3o da d\u00edvida s\u00e3o despesas financeiras, que t\u00eam sido na pr\u00e1tica financiadas pela emiss\u00e3o de d\u00edvida nova e n\u00e3o de tributos.<\/p>\n

Como toda despesa da Uni\u00e3o precisa ser autorizada pelo Congresso Nacional, as despesas financeiras tamb\u00e9m constam do or\u00e7amento, o que leva algumas fontes a equivocadamente concluir que recursos que poderiam, por exemplo, ser usados na Previd\u00eancia, est\u00e3o sendo usados para pagar a d\u00edvida p\u00fablica (ou os juros dela). \u00c9 esta a vis\u00e3o, por exemplo, do movimento \u201cAuditoria Cidad\u00e3 da D\u00edvida\u201d. No entanto, isso s\u00f3 poderia ocorrer, parcialmente, nos anos em que o governo consegue fazer super\u00e1vit prim\u00e1rio, o que n\u00e3o ocorre desde 2013 e pode voltar a ocorrer somente em 2021 \u2013 mesmo com uma reforma da Previd\u00eancia. Ainda assim, o objetivo destes superavits \u00e9 justamente reduzir a d\u00edvida.<\/p>\n

Uma maneira de entender porque \u00e9 falacioso o infame gr\u00e1fico do movimento \u201cAuditoria Cidad\u00e3 da D\u00edvida\u201d denunciando que quase 50% das despesas<\/em> \u00e9 usada para pagar juros da d\u00edvida \u00e9 usar a mesma metodologia para criar um gr\u00e1fico das receitas<\/em> da Uni\u00e3o. Caso mistur\u00e1ssemos as receitas prim\u00e1rias e financeiras, como a Auditoria faz com as despesas prim\u00e1rias e financeiras, ter\u00edamos que a maior receita da Uni\u00e3o \u00e9 justamente a emiss\u00e3o da d\u00edvida, com uma percentagem do total maior do que tem a pr\u00f3pria despesa com a d\u00edvida \u2013 exatamente por conta dos d\u00e9ficits prim\u00e1rios (emiss\u00e3o de d\u00edvida financiando despesas prim\u00e1rias como previd\u00eancia, sa\u00fade, etc).<\/p>\n

Existe ainda no debate a vis\u00e3o de que a trajet\u00f3ria ascendente da d\u00edvida p\u00fablica federal deveria ser combatida com a redu\u00e7\u00e3o das despesas financeiras, e n\u00e3o prim\u00e1rias.A esse respeito, sem adere\u00e7ar as consequ\u00eancias adversas de uma redu\u00e7\u00e3o for\u00e7ada das taxas de juros ou de renegocia\u00e7\u00e3o (calote parcial) da d\u00edvida p\u00fablica, \u00e9 preciso ficar claro que a reforma da Previd\u00eancia afeta duplamente as despesas financeiras com a d\u00edvida, tendendo a reduzi-las significativamente nos pr\u00f3ximos anos. <\/strong>N\u00e3o apenas a reforma tende a provocar expressiva melhora no resultado prim\u00e1rio (d\u00edvida nova), como tende a atenuar as taxas de juros que incidem sobre o estoque de d\u00edvida, ao reduzir o risco de insolv\u00eancia do Estado.<\/p>\n

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Considera\u00e7\u00f5es finais<\/strong><\/p>\n

Idealmente, em uma democracia madura, uma reforma significativa como a da Previd\u00eancia seria discutida em elei\u00e7\u00f5es gerais, momento em que a sociedade se mobiliza para discutir o futuro. Como essa n\u00e3o foi a op\u00e7\u00e3o de nenhuma das chapas disputando as \u00faltimas elei\u00e7\u00f5es presidenciais no Brasil, restou ao pa\u00eds ter que discutir a reforma de maneira apressada na beira do precip\u00edcio. A era das redes sociais, em que a informa\u00e7\u00e3o corre sem filtro, nem sempre ajuda neste caso, contribuindo para rumores e desinforma\u00e7\u00e3o. Se a qualidade do debate n\u00e3o melhorar, a reforma da Previd\u00eancia pode acabar sendo aprovada com pouco convencimento do Pa\u00eds, e pronta para ser desfeita nos pr\u00f3ximos anos.<\/p>\n

1<\/sup> Proporcionalmente, uma vez que os pagamentos do INSS n\u00e3o s\u00e3o di\u00e1rios. A despesa anual com benef\u00edcios do RGPS foi de R$ 515 bilh\u00f5es. O departamento de opera\u00e7\u00f5es estruturadas da Odebrecht movimentou em 9 anos R$ 11 bilh\u00f5es.<\/p>\n

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