{"id":2950,"date":"2017-02-02T12:38:02","date_gmt":"2017-02-02T15:38:02","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=2950"},"modified":"2017-02-03T12:12:52","modified_gmt":"2017-02-03T15:12:52","slug":"siga-o-lider-interesses-economicos-e-lideranca-partidaria-na-camara-dos-deputados","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=2950","title":{"rendered":"‘Siga o l\u00edder’: Interesses econ\u00f4micos e lideran\u00e7a partid\u00e1ria na C\u00e2mara dos Deputados"},"content":{"rendered":"

Conforme j\u00e1 discutido no blog \u201cLeis e N\u00fameros\u201d (http:\/\/leisenumeros.com.br\/<\/a>), os l\u00edderes partid\u00e1rios exercem um papel fundamental no presidencialismo de coaliz\u00e3o brasileiro, garantindo um \u00edndice de fidelidade partid\u00e1ria alto o suficiente para o governo sair vencedor na imensa maioria das vota\u00e7\u00f5es. Em se tratando de medidas provis\u00f3rias, os n\u00fameros indicam que o governo vence em 90% dos casos em que h\u00e1 vota\u00e7\u00f5es nominais. E isto acontece desde 2001.<\/p>\n

Os autores costumam analisar esse fato de duas formas diferentes. Uma corrente mais otimista (derivada dos trabalhos iniciais de Limongi & Figueiredo), acredita que, a despeito da ruidosa rela\u00e7\u00e3o midi\u00e1tica entre Executivo e Legislativo no Brasil, o presidencialismo de coaliz\u00e3o brasileiro funciona de modo suficiente para implementar reformas econ\u00f4micas e sociais, como aconteceu nos governos FHC e Lula.<\/p>\n

Por outro lado, estudiosos como os brasilianistas Scott Mainwaring e Barry Ames acreditam que nosso sistema \u00e9 bastante suscet\u00edvel a crises e apresenta um alto custo em termos de concess\u00f5es feitas pelo Executivo (cargos pol\u00edticos, emendas parlamentares e at\u00e9 corrup\u00e7\u00e3o) para garantir essa governabilidade. As crises vividas por Dilma Rousseff \u2013 como tamb\u00e9m enfrentaram Collor e, em certa medida, tamb\u00e9m Sarney \u2013 seria um exemplo.<\/p>\n

N\u00e3o considero que essas duas vis\u00f5es sejam antag\u00f4nicas, mas sim complementares para se analisar o sistema pol\u00edtico brasileiro. Realmente h\u00e1 grande preponder\u00e2ncia do Poder Executivo na defini\u00e7\u00e3o da agenda legislativa, assim como h\u00e1 um custo social bastante elevado para o governo superar as crises e amea\u00e7as de crise em sua base parlamentar.<\/p>\n

Considero, por\u00e9m, que essas an\u00e1lises perdem de vista um elemento muito importante:\u00a0na minha vis\u00e3o esse arranjo institucional de um Poder Executivo com superpoderes legislativos e l\u00edderes partid\u00e1rios com grande ascend\u00eancia sobre seus correligion\u00e1rios \u00e9 muito perme\u00e1vel \u00e0 influ\u00eancia de grandes grupos de interesses, sobretudo econ\u00f4micos.<\/p>\n

Partindo do pressuposto de que o Presidente da Rep\u00fablica define a agenda e acerta com os l\u00edderes dos v\u00e1rios partidos que constituem a base governista o que e quando ser\u00e1 levado a vota\u00e7\u00e3o, \u00e9 de se esperar que surja da\u00ed um problema de a\u00e7\u00e3o coletiva. De um lado, reformas que possam beneficiar a maioria silenciosa, mas que trazem preju\u00edzos a grupos organizados (reformas tribut\u00e1ria, previdenci\u00e1ria, pol\u00edtica, trabalhista, administrativa, etc.), t\u00eam baixa probabilidade de serem aprovadas, uma vez que encontrar\u00e3o resist\u00eancia de algum dos caciques da coaliz\u00e3o (este ponto foi levantado ainda em 1988 por S\u00e9rgio Abranches). Barry Ames, inclusive, questiona a import\u00e2ncia creditada \u00e0 elevada taxa de aprova\u00e7\u00e3o dos projetos do Executivo argumentando que esses n\u00fameros n\u00e3o levam em conta os casos em que o governo sequer consegue propor ao Congresso reformas que considera importantes, diante da rea\u00e7\u00e3o negativa dos l\u00edderes partid\u00e1rios.<\/p>\n

Por outro lado, grupos de interesses bem organizados conseguem ser ouvidos por ministros, assessores graduados do Presidente da Rep\u00fablica e pelos l\u00edderes partid\u00e1rios, aumentando a chance de ter seus pleitos inseridos na agenda legislativa governista \u2013 via MP, de prefer\u00eancia, ou algum projeto de lei com requerimento de urg\u00eancia.<\/p>\n

Se este racioc\u00ednio estiver correto, tendem a prosperar no Congresso as propostas que trazem consigo benef\u00edcios concentrados e custos dilu\u00eddos perante a sociedade. Reformas com ganhos difusos e preju\u00edzos concentrados t\u00eam poucas chances de ser aprovadas.<\/p>\n

Analisando as contribui\u00e7\u00f5es de campanha, conseguimos apresentar algumas evid\u00eancias para esse racioc\u00ednio. Afinal, elas s\u00e3o um meio utilizado pelos grupos de interesse para obter acesso privilegiado perante os l\u00edderes partid\u00e1rios e representantes do Executivo e, assim, barrar propostas que os prejudiquem e aprovar projetos que melhorem seu\u00a0status quo<\/em>. Para testar essa hip\u00f3tese, calculei o volume m\u00e9dio de doa\u00e7\u00f5es recebidas pelos l\u00edderes partid\u00e1rios provenientes de empresas e o comparei com o dos demais deputados que exerceram mandatos nas \u00faltimas legislaturas. O resultado consta no gr\u00e1fico abaixo:<\/p>\n

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Como visto, com exce\u00e7\u00e3o da 52\u00aa Legislatura (2003 a 2006), as doa\u00e7\u00f5es recebidas pelos l\u00edderes s\u00e3o superiores \u00e0s dos demais deputados. A diferen\u00e7a entre os dois grupos \u00e9 estatisticamente relevante para a 53\u00aa Legislatura (2007\/2010, num n\u00edvel de signific\u00e2ncia inferior a 5%) e para a 54\u00aa Legislatura (2010\/2014, com n\u00edvel de signific\u00e2ncia inferior a 1%).\u00a0Embora os l\u00edderes tenham recebido a mais que os demais deputados na elei\u00e7\u00e3o de 2014, a diferen\u00e7a entre os dois grupos n\u00e3o se mostrou estatisticamente relevante.<\/p>\n

Algu\u00e9m poderia argumentar, no entanto, que os doadores de campanha, no momento de decidir o quanto destinar a cada candidato, n\u00e3o t\u00eam como prever se aquele candidato vencer\u00e1 as elei\u00e7\u00f5es ou, muito menos, tornar-se um l\u00edder partid\u00e1rio. Acontece que os l\u00edderes partid\u00e1rios geralmente s\u00e3o pol\u00edticos mais experientes e \u201cprofissionais\u201d do que os demais \u2013 a diferencia\u00e7\u00e3o entre alto e baixo clero, comum no ambiente parlamentar, n\u00e3o \u00e9 apenas figura de ret\u00f3rica. Os dados demonstram que l\u00edderes partid\u00e1rios tendem a desenvolver carreiras mais longas no Legislativo, como atestam as taxas de reelei\u00e7\u00e3o observadas nos \u00faltimos anos:<\/p>\n

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Diante de um cen\u00e1rio em que l\u00edderes partid\u00e1rios t\u00eam grande ascend\u00eancia sobre seus correligion\u00e1rios e alcan\u00e7am visibilidade midi\u00e1tica suficiente para desfrutar de maiores chances de reelei\u00e7\u00e3o, \u00e9 de se esperar, ent\u00e3o, que eles atraiam mais doa\u00e7\u00f5es privadas nas elei\u00e7\u00f5es seguintes. E \u00e9 isso que o gr\u00e1fico abaixo demonstra: l\u00edderes partid\u00e1rios que decidem buscar a reelei\u00e7\u00e3o na C\u00e2mara dos Deputados recebem mais contribui\u00e7\u00f5es de empresas do que seus pares. Nas tr\u00eas \u00faltimas elei\u00e7\u00f5es, a diferen\u00e7a entre as doa\u00e7\u00f5es m\u00e9dias dos l\u00edderes e dos demais deputados mostrou-se estatisticamente relevante com n\u00edveis de signific\u00e2ncia de 10% (2006), 5% (2010) e 1% (2014).<\/p>\n

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Embora ainda sejam necess\u00e1rios outros dados para comprovar a tese de que o presidencialismo de coaliz\u00e3o brasileiro favorece grupos de interesse e, em \u00faltima inst\u00e2ncia, a concentra\u00e7\u00e3o de renda, os dados acima parecem indicar que a posi\u00e7\u00e3o chave desempenhada pelos l\u00edderes partid\u00e1rios nesse arranjo institucional \u00e9 explorada pelo setor privado via doa\u00e7\u00f5es eleitorais. O dinheiro empresarial, nesse caso, \u201csegue o l\u00edder\u201d \u2013 e \u00e9 bastante problem\u00e1tico se o comportamento desses l\u00edderes, no exerc\u00edcio de suas atribui\u00e7\u00f5es, seguir o dinheiro.<\/p>\n

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Artigo originalmente publicado em Leis e N\u00fameros (http:\/\/leisenumeros.com.br\/2016\/03\/siga-o-lider-interesses-economicos-e-lideranca-partidaria-na-camara-dos-deputados\/<\/a>)<\/em><\/p>\n

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