{"id":2901,"date":"2016-10-26T09:41:33","date_gmt":"2016-10-26T12:41:33","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=2901"},"modified":"2016-10-26T09:41:33","modified_gmt":"2016-10-26T12:41:33","slug":"como-as-corporacoes-de-elite-moldam-o-pensamento-economico-do-pais","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=2901","title":{"rendered":"Como as corpora\u00e7\u00f5es de elite moldam o pensamento econ\u00f4mico do pa\u00eds?"},"content":{"rendered":"
1. O ajuste fiscal \u00e9 uma farsa. N\u00e3o seria preciso se o governo buscasse recuperar a d\u00edvida ativa. O rombo de R$ 180 bi \u00e9 fichinha perto da d\u00edvida trilion\u00e1ria dos grandes devedores. Veja o soneg\u00f4metro. Em vez de fazer o ajuste, o governo deve investir nos procuradores capazes de recuperar esse dinheiro. Eles devem receber honor\u00e1rios para isso, como no setor privado (mas mantendo o sal\u00e1rio fixo).<\/p>\n
\u00c9 preciso aprovar a PEC que torna o sal\u00e1rio dos advogados p\u00fablicos igual a 90% do dos ministros do STF. A Constitui\u00e7\u00e3o tem que ser alterada para que esses \u00f3rg\u00e3os tenham autonomia financeira. A carreira deve ser valorizada para que a d\u00edvida seja recuperada: n\u00e3o precisa de ajuste fiscal. O or\u00e7amento do \u00f3rg\u00e3o com essa miss\u00e3o deve ser o dobro.<\/p>\n
2. N\u00e3o existe d\u00e9ficit na Previd\u00eancia: a reforma \u00e9 desnecess\u00e1ria. Em parte porque h\u00e1 centenas de bilh\u00f5es de d\u00edvida ativa decorrente de sonega\u00e7\u00e3o. Deve-se em vez de reformar a Previd\u00eancia investir no combate \u00e0 sonega\u00e7\u00e3o. Pode-se criar para auditores fiscais b\u00f4nus por produtividade. Ou, como os advogados, vincular sal\u00e1rios aos do STF.<\/p>\n
3. A reforma trabalhista n\u00e3o precisa ser feita. A legisla\u00e7\u00e3o trabalhista n\u00e3o \u00e9 r\u00edgida: a culpa de dezenas de milh\u00f5es de trabalhadores informais \u00e9 da falta de fiscaliza\u00e7\u00e3o. Qualquer flexibiliza\u00e7\u00e3o \u00e9 preju\u00edzo para o trabalhador. Deve-se dotar a carreira de auditores do trabalho de condi\u00e7\u00f5es para combater o problema. Entre outras, al\u00e9m de mais funcion\u00e1rios, \u00e9 premente o b\u00f4nus de produtividade (a fiscaliza\u00e7\u00e3o da informalidade tamb\u00e9m traz ganhos de arrecada\u00e7\u00e3o) e a vincula\u00e7\u00e3o do sal\u00e1rio ao teto.<\/p>\n
4. Querem extinguir direitos trabalhistas da Constitui\u00e7\u00e3o e tamb\u00e9m a Justi\u00e7a do Trabalho. A quem interessa uma legisla\u00e7\u00e3o trabalhista mais simples e menos lit\u00edgios? Ao patronato. \u00c9 natural que para proteger o trabalhador a legisla\u00e7\u00e3o seja complexa e precise de alta qualifica\u00e7\u00e3o para ser bem entendida. A Justi\u00e7a trabalhista deve ser forte e n\u00e3o sofrer cortes or\u00e7ament\u00e1rios. \u00c9 ela, e n\u00e3o a legisla\u00e7\u00e3o trabalhista, que \u00e9 capaz de regular as rela\u00e7\u00f5es de trabalho para que o mercado de trabalho funcione bem.<\/p>\n
Argumentos como os desses quatro exemplos s\u00e3o muito populares em Bras\u00edlia, pois simultaneamente: a<\/em>) descartam medidas impopulares para fazer o pa\u00eds crescer (ajuste fiscal, reformas); b<\/em>) apresentam alternativas f\u00e1ceis (ex: uma reserva de dinheiro prontamente dispon\u00edvel), com uma narrativa de mocinhos contra vil\u00f5es indefens\u00e1veis (sonegadores, patr\u00f5es); e c<\/em>) servem aos interesses corporativistas de um grupo de servidores p\u00fablicos.<\/p>\n Esse \u00e9 o lado pouco discutido do poder das corpora\u00e7\u00f5es p\u00fablicas: o de como podem moldar o pensamento econ\u00f4mico do pa\u00eds (o lado conhecido foi amplamente discutido nos \u00faltimos meses, quando dezenas emplacaram aumentos salariais em meio \u00e0 crise fiscal.)<\/p>\n As solu\u00e7\u00f5es apresentadas por corpora\u00e7\u00f5es s\u00e3o sedutoras: por vezes parecem quase m\u00e1gicas. Tipicamente n\u00e3o possuem controv\u00e9rsias, j\u00e1 que, quando apresentam perdedores, normalmente s\u00e3o vil\u00f5es (quem vai defender sonegador?). T\u00eam apelo tamb\u00e9m pelo ar cient\u00edfico porque, em tese, s\u00e3o propostas por especialistas da \u00e1rea, embora normalmente n\u00e3o tenham sido avaliadas em revistas acad\u00eamicas ou congressos especializados: saem direto dos sindicatos para a Esplanada, o Congresso Nacional e a imprensa.<\/p>\n Certamente t\u00eam m\u00e9ritos. N\u00e3o h\u00e1 absolutamente nada a se defender em sonegadores ou em patr\u00f5es que exploram trabalhadores. A quest\u00e3o \u00e9 a simplifica\u00e7\u00e3o do debate. Por exemplo, entre os grandes devedores da d\u00edvida ativa est\u00e3o empresas falidas, estatais, ou aquelas que devem porque h\u00e1 alguma relevante controv\u00e9rsia jur\u00eddica n\u00e3o resolvida: n\u00e3o est\u00e3o l\u00e1 simplesmente porque uma carreira n\u00e3o \u00e9 \u201cvalorizada\u201d. Solu\u00e7\u00f5es mais complexas para um problema, nesse caso medidas do ajuste fiscal, podem ficar em segundo plano ou serem percebidas como mera iniciativa de algum \u201cvil\u00e3o\u201d (mercado, neoliberais).<\/p>\n Essas solu\u00e7\u00f5es servem para, al\u00e9m de justificar os leg\u00edtimos pleitos das corpora\u00e7\u00f5es, aproxima-las de agentes pol\u00edticos. As evid\u00eancias apresentadas viram insumo para o discurso pol\u00edtico, pelo apelo junto aos eleitores. H\u00e1 uma simbiose. Nos sites das corpora\u00e7\u00f5es1<\/sup>, \u00e9 f\u00e1cil encontrar relatos de reuni\u00f5es com pol\u00edticos, com a pauta misturando a defesa de algum direito difuso ou coletivo (contra algum projeto de reforma estrutural) e a valoriza\u00e7\u00e3o da carreira (a favor de algum projeto concedendo vantagens remunerat\u00f3rias).<\/p>\n Como esses argumentos v\u00e3o contaminar a opini\u00e3o p\u00fablica nos pr\u00f3ximos meses? De um lado, as corpora\u00e7\u00f5es v\u00e3o surgindo com for\u00e7a como as primeiras vencedoras do impeachment<\/em>. De outro, as medidas do governo que se avizinham ser\u00e3o impopulares.\u00a0 Ser\u00e3o mais atraentes propostas manique\u00edstas que tenham culpados para se apontar, como as da intelligentsia brasiliense. Entre elas, as baseadas em ideias como a de que n\u00e3o existe d\u00e9ficit na Previd\u00eancia ou a da lenda urbana de que o governo gasta 40% dos impostos com juros da d\u00edvida p\u00fablica \u2013 duas ideias populares no debate que s\u00e3o cria\u00e7\u00f5es principalmente de servidores de carreira de elite. Por\u00e9m, as solu\u00e7\u00f5es realmente destinadas a recuperar a trajet\u00f3ria do pa\u00eds rumo ao desenvolvimento s\u00e3o muito mais complexas. Vamos resistir \u00e0 tenta\u00e7\u00e3o do pensamento m\u00e1gico?<\/p>\n <\/p>\n _______________<\/p>\n 1<\/sup> Os argumentos 1 a 4 foram diretamente retirados de p\u00e1ginas institucionais.<\/p>\n <\/p>\n Download:<\/strong><\/p>\n