{"id":2813,"date":"2016-07-04T09:35:40","date_gmt":"2016-07-04T12:35:40","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=2813"},"modified":"2016-07-04T09:35:40","modified_gmt":"2016-07-04T12:35:40","slug":"a-desvalorizacao-do-real-sera-suficiente-para-tirar-o-brasil-da-crise","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=2813","title":{"rendered":"A desvaloriza\u00e7\u00e3o do real ser\u00e1 suficiente para tirar o Brasil da crise?"},"content":{"rendered":"

A se confirmarem as expectativas, o bi\u00eanio 2015\/16 trar\u00e1 uma queda acumulada do PIB de 7,5%, ou quase 10% em termos per capita<\/em>. Em que pese mudan\u00e7as de metodologia ao longo do tempo, esta ser\u00e1, certamente, a maior retra\u00e7\u00e3o da economia brasileira, no m\u00ednimo, no per\u00edodo P\u00f3s-Guerra. H\u00e1 uma crise de confian\u00e7a, que vem impedindo a economia de reagir: desconfian\u00e7a em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 sustentabilidade das contas p\u00fablicas, \u00e0 evolu\u00e7\u00e3o da infla\u00e7\u00e3o e ao apoio pol\u00edtico que o presidente (seja o presidente interino, seja a presidente afastada) conseguir\u00e1 obter.<\/p>\n

Em grande parte decorrente dessa crise de confian\u00e7a (sem ignorar problemas externos), houve significativa deprecia\u00e7\u00e3o do real nos \u00faltimos anos: entre o primeiro semestre de 2014 (cota\u00e7\u00e3o m\u00e9dia de R$ 2,30) e os primeiros cinco meses de 2016 (cota\u00e7\u00e3o m\u00e9dia de R$ 3,70), o real depreciou-se em mais de 60%. Ser\u00e1 que essa mudan\u00e7a de pre\u00e7os relativos ser\u00e1 capaz de estimular nossa economia e tirar o Pa\u00eds da crise?<\/p>\n

V\u00e1rios analistas acreditam que sim. Segundo esse argumento, h\u00e1 uma capacidade ociosa decorrente de escassez de demanda. A deprecia\u00e7\u00e3o cambial torna nossas exporta\u00e7\u00f5es mais competitivas, bem como incentiva a produ\u00e7\u00e3o de nossa ind\u00fastria substituidora de importa\u00e7\u00f5es. O aumento da produ\u00e7\u00e3o industrial ir\u00e1, aos poucos, aumentando o n\u00edvel de emprego, gerando renda que se reverter\u00e1 em consumo, estimulando outras atividades, at\u00e9 que a economia retorne aos trilhos do crescimento.<\/p>\n

Entendemos que esse racioc\u00ednio esteja correto at\u00e9 certo ponto. Concordamos que o c\u00e2mbio poder\u00e1 contribuir para ocupar a capacidade ociosa atualmente existente. Mas, al\u00e9m de fric\u00e7\u00f5es importantes, no longo prazo, o atual modelo de econ\u00f4mico, que gera baixa poupan\u00e7a, \u00e9 incompat\u00edvel com c\u00e2mbio depreciado e altas taxas de crescimento. Seguem os argumentos.<\/p>\n

Em primeiro lugar, conforme frequentemente divulgado1<\/sup>, o Brasil \u00e9 muito fechado, de forma que o setor externo, mesmo crescendo bastante, teria pouca capacidade de alavancar a economia como um todo. Seria como esperar que o rabo abanasse o cachorro. H\u00e1 tamb\u00e9m fatores conjunturais que podem dificultar o avan\u00e7o de nossas exporta\u00e7\u00f5es, como o menor crescimento do com\u00e9rcio internacional observado nos \u00faltimos anos.<\/p>\n

O maior problema que vemos, contudo, \u00e9 que a recupera\u00e7\u00e3o da atividade teria de vir via ind\u00fastria. Temos dois grandes setores exportadores. Um \u00e9 o produtor de commodities<\/em>, no qual temos vantagens comparativas. Uma deprecia\u00e7\u00e3o cambial certamente contribuir\u00e1 para aumentar as exporta\u00e7\u00f5es do agroneg\u00f3cio, mas, em larga medida, esse impacto tende a ser de menor import\u00e2ncia. Mesmo porque, nossa taxa de c\u00e2mbio \u00e9 fortemente influenciada pelo pre\u00e7o internacional de commodities<\/em>, de forma que h\u00e1 uma correla\u00e7\u00e3o negativa entre esse pre\u00e7o e o valor do real. Assim como a aprecia\u00e7\u00e3o cambial de meados da d\u00e9cada passada at\u00e9 o in\u00edcio desta foi, em parte, causada pelo boom<\/em> de commodities<\/em>, a deprecia\u00e7\u00e3o recente tamb\u00e9m est\u00e1 associada \u00e0 deteriora\u00e7\u00e3o de nossos termos de troca (sem preju\u00edzo do impacto causado por erros da pol\u00edtica econ\u00f4mica). Dessa forma, o pre\u00e7o em reais recebido pelos exportadores de commodities<\/em> tende a flutuar bem menos do que a taxa de c\u00e2mbio.<\/p>\n

O outro setor com potencial de exporta\u00e7\u00e3o \u00e9 a ind\u00fastria de transforma\u00e7\u00e3o. Em nosso entendimento, o principal obst\u00e1culo para que a deprecia\u00e7\u00e3o cambial leve ao crescimento sustent\u00e1vel da economia \u00e9 o fato de o Brasil adotar um modelo de baixa poupan\u00e7a, que imp\u00f5e s\u00e9rios limites ao crescimento da ind\u00fastria de transforma\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

N\u00e3o iremos discutir aqui por que nossa taxa de poupan\u00e7a \u00e9 baixa, mas cabe mostrar os principais n\u00fameros2<\/sup>. Em 2015, a taxa de poupan\u00e7a dom\u00e9stica (que constitui a soma da poupan\u00e7a do governo e com a do setor privado) atingiu o m\u00ednimo da d\u00e9cada, 14,4% do PIB. Desde 2010, a maior taxa observada ocorreu em 2011, quando atingiu 18,5% do PIB3<\/sup>. Para se ter uma base de compara\u00e7\u00e3o, de acordo com o World Economic Outlook <\/em>de abril de 2016, publicado pelo Fundo Monet\u00e1rio Internacional (FMI), em 2015, a taxa m\u00e9dia de poupan\u00e7a dos pa\u00edses emergentes foi de 31,4%. Na Am\u00e9rica Latina era de 17,6%4<\/sup> e, na \u00c1sia emergente, de 41,5%, n\u00e3o por acaso, a regi\u00e3o que cresce mais rapidamente no mundo!<\/p>\n

\u00c9 poss\u00edvel que, superadas algumas rigidezes de curto prazo, a ind\u00fastria de transforma\u00e7\u00e3o cres\u00e7a, ocupando a capacidade ociosa existente. Mas, uma vez que a economia passe a operar com plena capacidade, as perspectivas de crescimento s\u00e3o m\u00ednimas. Uma economia de baixa poupan\u00e7a implica baixo n\u00edvel de investimento para a economia como um todo. Mostraremos agora que isso \u00e9 particularmente verdadeiro para a ind\u00fastria de transforma\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

Para entender porque o modelo pr\u00f3-consumo\/baixa poupan\u00e7a tende a desestimular investimentos, devemos observar o movimento dos pre\u00e7os relativos. Quando os gastos da economia superam a sua produ\u00e7\u00e3o, a \u00fanica forma de atender ao excesso de demanda \u00e9 importando. Havendo condi\u00e7\u00f5es externas favor\u00e1veis (leia-se, com o mundo disposto a financiar o Brasil), os pre\u00e7os relativos se movimentam na dire\u00e7\u00e3o de garantir que o real se valorize, tornando as importa\u00e7\u00f5es mais baratas. A aprecia\u00e7\u00e3o do real se d\u00e1 por meio de mudan\u00e7a nos pre\u00e7os relativos entre bens comercializ\u00e1veis \u2013 chamaremos, para simplificar, de bens industriais \u2013 e de n\u00e3o comercializ\u00e1veis, que chamaremos, tamb\u00e9m para simplificar, de servi\u00e7os. N\u00e3o trataremos aqui do setor produtor de commodities<\/em>5<\/sup>, que tamb\u00e9m s\u00e3o comercializ\u00e1veis, porque, conforme j\u00e1 comentamos, o Brasil apresenta enormes vantagens comparativas em sua produ\u00e7\u00e3o, de forma que, mesmo havendo aprecia\u00e7\u00e3o da taxa de c\u00e2mbio, o Pa\u00eds permanece competitivo e mant\u00e9m elevados n\u00edveis de exporta\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

Se a demanda aumenta al\u00e9m da capacidade de oferta da economia, a tend\u00eancia \u00e9 o pre\u00e7o dos servi\u00e7os subir mais rapidamente do que o da ind\u00fastria. Afinal, por n\u00e3o serem comercializ\u00e1veis, os servi\u00e7os n\u00e3o sofrem concorr\u00eancia externa. Quando o pre\u00e7o dos servi\u00e7os sobe (em rela\u00e7\u00e3o ao dos bens industriais), os fatores produtivos se dirigem para o setor, fazendo com que sua participa\u00e7\u00e3o no PIB aumente, \u00e0 custa da participa\u00e7\u00e3o da ind\u00fastria de transforma\u00e7\u00e3o. O Gr\u00e1fico 1 mostra a evolu\u00e7\u00e3o dos pre\u00e7os relativos (mensurada pela rela\u00e7\u00e3o entre o deflator impl\u00edcito da ind\u00fastria de transforma\u00e7\u00e3o\/deflator impl\u00edcito do setor servi\u00e7os) e a participa\u00e7\u00e3o da ind\u00fastria de transforma\u00e7\u00e3o no PIB.<\/p>\n

Gr\u00e1fico 1: <\/strong>Evolu\u00e7\u00e3o da participa\u00e7\u00e3o da ind\u00fastria de transforma\u00e7\u00e3o no PIB e de seu pre\u00e7o relativo, 2001 a 2015.<\/p>\n

\"img_2813_1\"<\/p>\n

Entendemos que a dire\u00e7\u00e3o de causalidade vai no sentido de varia\u00e7\u00e3o dos pre\u00e7os relativos alterar a participa\u00e7\u00e3o da ind\u00fastria no PIB. Portanto, para entender o atual (fraco) desempenho da ind\u00fastria de transforma\u00e7\u00e3o, \u00e9 importante ver como os pre\u00e7os relativos evolu\u00edram nos anos recentes e por qu\u00ea.<\/p>\n

A queda dos pre\u00e7os relativos a partir de 2011 decorre da pol\u00edtica de expans\u00e3o de gastos e da baixa taxa de poupan\u00e7a, em um contexto de forte liquidez internacional de capitais, que viabilizaram o d\u00e9ficit crescente no balan\u00e7o de pagamentos.\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0 Conforme o Gr\u00e1fico 2 mostra, o per\u00edodo de forte queda de pre\u00e7os relativos, entre 2010 e 2014, foi acompanhado de aumento substancial no d\u00e9ficit em transa\u00e7\u00f5es correntes.<\/p>\n

Gr\u00e1fico 2: <\/strong>Saldo em transa\u00e7\u00f5es correntes (em USD milh\u00f5es) e pre\u00e7o relativo da ind\u00fastria de transforma\u00e7\u00e3o (base 2010 = 100), 2000 a 2015.<\/p>\n

\"img_2813_2\"<\/p>\n

O movimento de altera\u00e7\u00e3o de pre\u00e7os relativos se reverteu em 2015. Entretanto, conforme mostrou o Gr\u00e1fico 1, a ind\u00fastria de transforma\u00e7\u00e3o ainda n\u00e3o reagiu e continuou vendo reduzir sua participa\u00e7\u00e3o no PIB. N\u00e3o seria de se esperar que, com a deprecia\u00e7\u00e3o cambial, a ind\u00fastria de transforma\u00e7\u00e3o reagisse?<\/p>\n

A resposta seria afirmativa se a deprecia\u00e7\u00e3o cambial implicasse mudan\u00e7a de pre\u00e7os relativos. Em verdade, a rela\u00e7\u00e3o de pre\u00e7os comercializ\u00e1veis\/n\u00e3o comercializ\u00e1veis \u00e9 a mensura\u00e7\u00e3o correta da taxa de c\u00e2mbio, se o objetivo \u00e9 avaliar as condi\u00e7\u00f5es de competitividade da ind\u00fastria. O Gr\u00e1fico 2 mostrou que houve, de fato, uma pequena melhora nos pre\u00e7os relativos em 2015 (3,5%), mas foi substancialmente inferior \u00e0 deprecia\u00e7\u00e3o cambial (acima de 30%, em termos nominais, comparando m\u00e9dia de um ano em rela\u00e7\u00e3o ao ano anterior, ou de quase 20%, quando se deduz, da deprecia\u00e7\u00e3o nominal, a infla\u00e7\u00e3o medida pelo IPCA)6<\/sup>.<\/p>\n

Esse comportamento dos pre\u00e7os relativos \u00e9, em certa medida surpreendente, porque, para uma economia sem imperfei\u00e7\u00f5es de mercado, o pre\u00e7o dos bens comercializ\u00e1veis deveria se igualar ao pre\u00e7o internacional convertido na moeda dom\u00e9stica. Com a forte deprecia\u00e7\u00e3o cambial ocorrida, dever\u00edamos esperar, portanto, que o pre\u00e7o dos produtos industriais se elevasse fortemente em rela\u00e7\u00e3o ao dos servi\u00e7os. Como isso n\u00e3o ocorreu, ou seja, como a infla\u00e7\u00e3o dos produtos industriais foi bem mais baixa do que a deprecia\u00e7\u00e3o cambial, podemos concluir que esse setor n\u00e3o \u00e9 t\u00e3o comercializ\u00e1vel como se poderia supor a priori<\/em>. H\u00e1 fric\u00e7\u00f5es que impedem o ajuste dos pre\u00e7os dom\u00e9sticos.<\/p>\n

Essas fric\u00e7\u00f5es podem decorrer de v\u00e1rios fatores. As empresas podem ter \u201cdesaprendido\u201d a exportar. Ao contr\u00e1rio do setor de commodities<\/em>, que fornece um bem homog\u00eaneo, a ind\u00fastria precisa convencer seus potenciais compradores que seu produto \u00e9 melhor do que o do concorrente. Muitas vezes a exporta\u00e7\u00e3o s\u00f3 \u00e9 viabilizada se vier acompanhada de financiamento, o que est\u00e1 muito dif\u00edcil diante da atual conjuntura, com dificuldade de amplia\u00e7\u00e3o dos cr\u00e9ditos do BNDES e eleva\u00e7\u00e3o do risco Brasil, que encarece o empr\u00e9stimo de empresas brasileiras no exterior. \u00c9 tamb\u00e9m necess\u00e1rio organizar a log\u00edstica, que envolve n\u00e3o somente os contratos de transportes, seguros, etc, como tamb\u00e9m lidar com as burocracias, do Brasil e do pa\u00eds importador.<\/p>\n

Outros fatores que v\u00eam impedindo a retomada da produ\u00e7\u00e3o industrial para exporta\u00e7\u00e3o incluem a deprecia\u00e7\u00e3o cambial que tamb\u00e9m alcan\u00e7ou nossos vizinhos latino-americanos (ainda que em menor escala do que o Brasil), importantes importadores de nossa ind\u00fastria. Adicionalmente, h\u00e1 evid\u00eancias aned\u00f3ticas de que algumas empresas estavam com estoques elevados ou que estavam presas por contratos de importa\u00e7\u00e3o em vigor quando se iniciou esse ciclo de deprecia\u00e7\u00e3o do Real. Essas empresas estariam reduzindo os estoques, mas, em fun\u00e7\u00e3o da crise econ\u00f4mica, esse processo est\u00e1 mais lento do que o esperado. A crise, portanto, tem dificultado a altera\u00e7\u00e3o de pre\u00e7os relativos por meio de dois canais: dificuldade para redu\u00e7\u00e3o de estoques e dificuldade para repassar o aumento de custos para os consumidores.<\/p>\n

Por fim, o processo de sucateamento pela qual passou a ind\u00fastria nacional nos \u00faltimos anos traz consequ\u00eancias mais fortes para o futuro, al\u00e9m daquela j\u00e1 mencionada de terem desaprendido a exportar. Aumentar a produ\u00e7\u00e3o para exportar requer investimentos, e ningu\u00e9m quer investir diante do clima de inseguran\u00e7a que existe, tanto em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 capacidade de o governo pagar a d\u00edvida, quanto em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 pol\u00edtica monet\u00e1ria. O fortalecimento do d\u00f3lar pode vir a ser acompanhado de aumentos da infla\u00e7\u00e3o, em uma escalada inflacion\u00e1ria como a da d\u00e9cada de 1980, que anula a deprecia\u00e7\u00e3o do c\u00e2mbio real ocorrida nos \u00faltimos dois anos.<\/p>\n

Dessa forma, nossas perspectivas para o setor exportador, em particular para a ind\u00fastria, \u00e9 que h\u00e1 espa\u00e7o para crescimento no m\u00e9dio prazo, \u00e0 medida que algumas fric\u00e7\u00f5es sejam suavizadas e que se ocupe a capacidade ociosa. Com ou sem escalada inflacion\u00e1ria, o mundo est\u00e1 menos disposto a financiar o Brasil, o que significa que, por um bom horizonte, deveremos nos adaptar a conviver com d\u00e9ficits em transa\u00e7\u00f5es correntes mais baixos. Isso implica real mais depreciado.<\/p>\n

Somos, entretanto, c\u00e9ticos em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 possibilidade de o setor exportador puxar a economia, permitindo-a sair da recess\u00e3o e atingir novos patamares de crescimento, a exemplo do que ocorre no Leste Asi\u00e1tico. Sem altera\u00e7\u00f5es profundas nas contas p\u00fablicas ou no comportamento do setor privado, que levem \u00e0 maior taxa de poupan\u00e7a, o crescimento concomitante da ind\u00fastria de transforma\u00e7\u00e3o e das exporta\u00e7\u00f5es \u00e9 contradit\u00f3rio. Para a ind\u00fastria (e o pa\u00eds) crescer, \u00e9 necess\u00e1rio investir. Com baixa taxa de poupan\u00e7a dom\u00e9stica, o investimento somente ser\u00e1 viabilizado com d\u00e9ficits substanciais em conta corrente. Mesmo que o mundo esteja disposto a financiar perenemente tais d\u00e9ficits, eles somente ocorrer\u00e3o se houver uma mudan\u00e7a de pre\u00e7os relativos em favor dos bens n\u00e3o comercializ\u00e1veis, ou seja, em detrimento da ind\u00fastria. Mas, sem pre\u00e7os relativos favor\u00e1veis, a ind\u00fastria n\u00e3o ser\u00e1 competitiva, e n\u00e3o poder\u00e1 crescer.<\/p>\n

Sendo assim, o m\u00e1ximo que se pode esperar da atual deprecia\u00e7\u00e3o cambial \u00e9 que ela permitir\u00e1 que a ind\u00fastria cres\u00e7a no curto prazo, ocupando a capacidade ociosa existente. Uma vez ocupada, a tend\u00eancia ser\u00e1 o pa\u00eds voltar a crescer \u00e0s taxas med\u00edocres que vinha crescendo antes da crise, entre 0% e 2%, que \u00e9 uma estimativa para o nosso PIB potencial.<\/p>\n

Apesar de ser de dif\u00edcil mensura\u00e7\u00e3o, h\u00e1 evid\u00eancias muito fortes de que a taxa de crescimento do PIB potencial est\u00e1 abaixo de 2%. O ano de 2014 foi emblem\u00e1tico para corroborar essa conclus\u00e3o: o Pa\u00eds j\u00e1 vinha de per\u00edodos de crescimento med\u00edocre (o crescimento anual m\u00e9dio no primeiro governo Dilma foi de 2,2%); a Utiliza\u00e7\u00e3o da Capacidade Instalada, medida pela Funda\u00e7\u00e3o Get\u00falio Vargas, situou-se acima da m\u00e9dia hist\u00f3rica (83,3% ante 81,6%); a taxa de desemprego atingiu o m\u00ednimo hist\u00f3rico em dezembro daquele ano (4,3%); e o Pa\u00eds se encontrava em vias de sofrer racionamento de \u00e1gua e energia. Ou seja, os fatores de produ\u00e7\u00e3o estavam plenamente ocupados e, ainda assim, a economia cresceu apenas 0,1% em 2014. Esse resultado, aparentemente paradoxal, s\u00f3 pode ser explicado se a taxa de crescimento potencial da economia for igualmente baixa.<\/p>\n

Dessa forma, a retomada das exporta\u00e7\u00f5es pode ajudar o Pa\u00eds a ocupar a atual capacidade ociosa. Mas isso significa voltar a crescer a taxas med\u00edocres, de at\u00e9 2% ao ano. Para que o Pa\u00eds possa crescer a taxas mais elevadas de forma sustent\u00e1vel, ser\u00e1 necess\u00e1rio implementar reformas estruturais que alterem o modelo econ\u00f4mico atualmente adotado, na dire\u00e7\u00e3o de aumento da poupan\u00e7a p\u00fablica e de menor interven\u00e7\u00e3o no setor privado.<\/p>\n

 <\/p>\n

Este artigo \u00e9 um resumo da se\u00e7\u00e3o final do cap\u00edtulo intitulado \u201cA crise atual: raz\u00f5es e perspectivas de recupera\u00e7\u00e3o via ajuste cambial\u201d, publicado no livro \u201cO Dia do Ju\u00edzo Fiscal\u201d, que tamb\u00e9m contou com a co-autoria de Marcos Jos\u00e9 Mendes. O livro foi apresentado no F\u00f3rum Nacional, patrocinado pelo Instituto Nacional de Altos Estudos, em maio de 2016, no Rio de Janeiro, e est\u00e1 dispon\u00edvel para download em <\/em>http:\/\/www.raulvelloso.com.br\/o-dia-do-juizo-fiscal\/<\/em><\/a>.\u00a0<\/em><\/p>\n

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1<\/sup> Ver http:\/\/www.dgabc.com.br\/Noticia\/1554042\/setor-externo-tem-pouco-potencial-como-alavanca-do-pib-diz-economista-da-fgv<\/a> e http:\/\/exame.abril.com.br\/economia\/noticias\/com-dolar-tao-alto-as-exportacoes-podem-salvar-o-brasil<\/a>. Esses textos mencionam outros aspectos que podem reduzir o impacto do c\u00e2mbio sobre a recupera\u00e7\u00e3o da economia, como a deprecia\u00e7\u00e3o de outras moedas frente ao d\u00f3lar.<\/p>\n

2<\/sup> O leitor interessado poder\u00e1 ler o artigo original.<\/p>\n

3<\/sup> O IBGE revisa frequentemente as estat\u00edsticas do PIB e, para a taxa de poupan\u00e7a, apresenta dados que retroagem somente at\u00e9 2010. Segundo as estat\u00edsticas mais recentes, do 1\u00ba trimestre de 2016, a taxa de poupan\u00e7a em 2011 havia sido de 18,5% do PIB.<\/p>\n

4<\/sup> Esse valor est\u00e1 influenciado pela baixa taxa de poupan\u00e7a brasileira. Se supusermos que nosso PIB corresponde a cerca de 30% do PIB latino-americano, a taxa de poupan\u00e7a do continente seria em torno de 19%, se excluirmos o Brasil.<\/p>\n

5<\/sup> Em verdade, parte importante das commodities<\/em> \u00e9 formada por bens industrializados ou semi-industrializados, como o a\u00e7o, farelo de soja, a\u00e7\u00facar e o suco de laranja.<\/p>\n

6<\/sup> Esse resultado \u00e9 robusto para outras mensura\u00e7\u00f5es de pre\u00e7os relativos, por exemplo, infla\u00e7\u00e3o dos comercializ\u00e1veis\/infla\u00e7\u00e3o dos n\u00e3o comercializ\u00e1veis.<\/p>\n

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Download:<\/strong><\/p>\n