{"id":2696,"date":"2015-12-07T08:32:27","date_gmt":"2015-12-07T11:32:27","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=2696"},"modified":"2015-12-07T08:38:02","modified_gmt":"2015-12-07T11:38:02","slug":"capacidade-de-investir-com-recursos-proprios-dos-estados","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=2696","title":{"rendered":"Capacidade de investir com recursos pr\u00f3prios dos estados"},"content":{"rendered":"

O presente trabalho tem o objetivo de mensurar a capacidade fiscal dos estados brasileiros de investir com recursos pr\u00f3prios. A ideia desse indicador \u00e9 complementar a informa\u00e7\u00e3o trazida pelo resultado prim\u00e1rio, adicionando na avalia\u00e7\u00e3o um crit\u00e9rio qualitativo do perfil da receita e do gasto p\u00fablico.<\/p>\n

O resultado prim\u00e1rio \u00e9 definido como a diferen\u00e7a entre as receitas e as despesas n\u00e3o financeiras do governo. De uma forma simplificada, ele indica o quanto sobra das receitas fruto do esfor\u00e7o fiscal (ex. tribut\u00e1rias) ap\u00f3s o pagamento das despesas n\u00e3o financeiras (ex. pessoal, custeio e investimentos) com o objetivo de honrar os compromissos de pagamento da d\u00edvida (veja mais nesse site sobre o conceito de resultado prim\u00e1rio clicando aqui<\/a>).<\/p>\n

Para melhorar o resultado prim\u00e1rio, por exemplo, tanto faz o governo cortar despesas de pessoal ou de investimentos. O impacto fiscal ser\u00e1 o mesmo, por\u00e9m, o impacto econ\u00f4mico \u00e9 completamente diferente. Boa parte dos investimentos serve para ampliar e modernizar a infraestrutura, elevando a capacidade de crescimento futuro do pa\u00eds por meio da redu\u00e7\u00e3o dos custos de congestionamento e do aumento da competitividade e da produtividade da economia como um todo.<\/p>\n

Ademais, \u00e9 importante estimar um indicador fiscal que consiga captar, de alguma forma, a \u201cmargem de manobra\u201d que os governos t\u00eam para honrar suas obriga\u00e7\u00f5es financeiras. Uma caracter\u00edstica peculiar do Brasil em rela\u00e7\u00e3o a outros pa\u00edses \u00e9 o n\u00edvel de rigidez or\u00e7ament\u00e1ria. Quando o governo decide ampliar o tamanho do estado no per\u00edodo de \u201cvacas gordas\u201d, dificilmente ele consegue reduzir quando \u201cas vacas est\u00e3o magras\u201d, pelas v\u00e1rias regras inflex\u00edveis que regem o setor p\u00fablico brasileiro.<\/p>\n

Dessa forma, este trabalho sugere um indicador para medir qualitativamente como est\u00e1 a situa\u00e7\u00e3o fiscal a partir da capacidade de investir dos entes. Al\u00e9m disso, esse indicador revela o grau de discricionariedade que o ente disp\u00f5e para gerenciar as contas p\u00fablicas.<\/p>\n

Para a estimativa desse indicador, parte-se das informa\u00e7\u00f5es da classifica\u00e7\u00e3o econ\u00f4mica das receitas e despesas constantes no Relat\u00f3rio Resumido de Execu\u00e7\u00e3o Or\u00e7ament\u00e1ria dos estados. Por\u00e9m, \u00e9 necess\u00e1rio fazer uma ressalva importante. Ainda n\u00e3o existe uma padroniza\u00e7\u00e3o bem estabelecida no registro cont\u00e1bil dos entes subnacionais. Trata-se de uma lacuna na legisla\u00e7\u00e3o para aplica\u00e7\u00e3o dos limites estabelecidos na LRF de forma apropriada. Observa-se, para alguns entes e para algumas situa\u00e7\u00f5es, o registro inapropriado de algumas opera\u00e7\u00f5es que ajudam a melhorar artificialmente os indicadores fiscais. Este trabalho utilizou a informa\u00e7\u00e3o oficial constante nos balan\u00e7os.<\/p>\n

Para explicar o c\u00e1lculo do indicador, \u00e9 necess\u00e1rio entender alguns conceitos da classifica\u00e7\u00e3o econ\u00f4mica das receitas e despesas (Manual T\u00e9cnico de Or\u00e7amento 2015, MPOG).<\/p>\n

Do lado das receitas:<\/p>\n

Receitas Correntes:<\/strong> s\u00e3o as receitas que aumentam as disponibilidades financeiras do Estado, em geral com efeito positivo sobre o Patrim\u00f4nio L\u00edquido, e constituem instrumento para financiar as pol\u00edticas p\u00fablicas. Classificam-se como correntes as receitas provenientes de tributos; de contribui\u00e7\u00f5es; da explora\u00e7\u00e3o do patrim\u00f4nio estatal (Patrimonial); da explora\u00e7\u00e3o de atividades econ\u00f4micas, etc.<\/p>\n

Receitas de Capital:<\/strong> s\u00e3o as provenientes da realiza\u00e7\u00e3o de recursos financeiros oriundos da constitui\u00e7\u00e3o de d\u00edvidas; convers\u00e3o, em esp\u00e9cie, de bens e direitos; recebimento de recursos de outras pessoas de direito p\u00fablico ou privado.<\/p>\n

Do ponto de vista da sustentabilidade fiscal, \u00e9 mais importante o ente ter mais receitas correntes que de capital, uma vez que as correntes est\u00e3o sob controle da administra\u00e7\u00e3o estadual e n\u00e3o geram obriga\u00e7\u00e3o futura. Boa parte das receitas de capital s\u00e3o fruto do endividamento ou da venda de ativos, algo que n\u00e3o \u00e9 sustent\u00e1vel se utilizado em excesso.<\/p>\n

Do lado das despesas:<\/p>\n

Despesas Correntes:<\/strong> s\u00e3o aquelas que n\u00e3o contribuem, diretamente, para a forma\u00e7\u00e3o ou aquisi\u00e7\u00e3o de um bem de capital. Exemplo: pessoal, juros e encargos e custeio.<\/p>\n

Despesas de Capital:<\/strong> s\u00e3o aquelas que contribuem, diretamente, para a forma\u00e7\u00e3o ou aquisi\u00e7\u00e3o de um bem de capital. Exemplo: investimentos, invers\u00f5es financeiras ou amortiza\u00e7\u00f5es da d\u00edvida.<\/p>\n

Em rela\u00e7\u00e3o ao perfil do gasto, de maneira geral, \u00e9 interessante ter uma participa\u00e7\u00e3o maior das despesas de capital que das despesas correntes j\u00e1 que as despesas de capital est\u00e3o associadas \u00e0 cria\u00e7\u00e3o ou aquisi\u00e7\u00e3o de ativos para a sociedade (investimentos ou invers\u00f5es financeiras) ou para amortizar d\u00edvidas e reduzir suas obriga\u00e7\u00f5es financeiras. Uma exce\u00e7\u00e3o a essa l\u00f3gica s\u00e3o as despesas em educa\u00e7\u00e3o, que em grande parte \u00e9 com pessoal e promove efeitos econ\u00f4micos important\u00edssimos de longo prazo.<\/p>\n

Figura 1: Classifica\u00e7\u00e3o Econ\u00f4mica das Receitas e Despesas<\/strong><\/p>\n

\"img_2696_1\"<\/a><\/p>\n

A capacidade de investir com recursos pr\u00f3prios \u00e9 calculada da seguinte forma:<\/p>\n

Capacidade de \u00a0Investir com \u00a0Recursos Pr\u00f3prios =\u00a0 Rec. Correntes (-) Desp correntes (-) Amortiza\u00e7\u00f5es (-) Inv. Financeiras (Finc.)1<\/sup> (-) Restos a pagar inscritos para despesas correntes (+) Restos a pagar cancelados para despesas correntes<\/p>\n

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Ou seja, o indicador mede o que sobra da arrecada\u00e7\u00e3o pr\u00f3pria (sem depender do endividamento, aliena\u00e7\u00e3o de ativos ou transfer\u00eancias para investimentos do governo federal), ap\u00f3s o pagamento das obriga\u00e7\u00f5es correntes e das amortiza\u00e7\u00f5es da d\u00edvida, para realizar despesas de investimentos e invers\u00f5es financeiras prim\u00e1rias (aquisi\u00e7\u00e3o de ativos). Trata-se de uma aproxima\u00e7\u00e3o do grau de discricionariedade (\u201cmargem de manobra\u201d) que o governo disp\u00f5e para honrar seus compromissos e realizar despesas de acordo com suas prioridades.<\/p>\n

Ademais, \u00e9 importante que esse indicador capte as restri\u00e7\u00f5es financeiras que os entes passam. Ao contr\u00e1rio do governo federal, que tem capacidade mais frouxa de elevar seu endividamento, os estados e munic\u00edpios precisam de autoriza\u00e7\u00e3o da uni\u00e3o para se endividar e, dessa forma, qualquer eventual necessidade de caixa inviabiliza a execu\u00e7\u00e3o da despesa. Assim, o indicador tamb\u00e9m incluiu os compromissos da execu\u00e7\u00e3o or\u00e7ament\u00e1ria de exerc\u00edcios anteriores que ainda precisam ser pagos neste ano, os chamados restos a pagar.<\/p>\n

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Figura 1: Capacidade de Investir com Recursos Pr\u00f3prios, em % da Rec. Prim\u00e1rias (Dados acumulados at\u00e9 o 4\u00ba Bimestre)<\/strong><\/p>\n

\u00a0\"img_2696_2\"<\/a><\/strong><\/p>\n

As estimativas revelam que a capacidade dos estados em investir com recursos pr\u00f3prios est\u00e1 negativa em 2%, no total at\u00e9 o 4\u00ba bimestre deste ano. Trata-se de uma situa\u00e7\u00e3o de \u201cstress financeiro\u201d grave. Dos 27 estados, apenas 3 estados possuem o indicador de capacidade de investir com recursos pr\u00f3prios acima de 10%, n\u00edvel minimamente razo\u00e1vel. Dessa forma, pode-se esperar a tend\u00eancia de atraso no pagamento das obriga\u00e7\u00f5es dos entes em pior situa\u00e7\u00e3o financeira, n\u00e3o apenas para fornecedores, mas at\u00e9 para a folha de pagamento.<\/p>\n

Revela-se que a situa\u00e7\u00e3o fiscal \u00e9 complexa e necessita de uma ampla agenda de reformas para seu equacionamento:<\/p>\n

1\u00ba) Refor\u00e7o do marco legal existente: restri\u00e7\u00e3o dos limites de endividamento, de concess\u00e3o de garantias do governo federal, de permiss\u00e3o das excepcionalidades das garantias dos empr\u00e9stimos e brecha legal que permite a concess\u00e3o de aumentos salariais com repercuss\u00f5es no mandato posterior.<\/p>\n

2\u00ba) Falta de padroniza\u00e7\u00e3o dos crit\u00e9rios para aplica\u00e7\u00e3o dos limites da LRF: cada estado interpreta a lei e seus limites de uma forma diferente e, por vezes, oportunista. Deve-se dar especial aten\u00e7\u00e3o ao limite de despesa dos poderes e \u00f3rg\u00e3os com autonomia or\u00e7ament\u00e1ria, como o Judici\u00e1rio, o Minist\u00e9rio P\u00fablico, a Defensoria P\u00fablica e o Legislativo.<\/p>\n

3\u00ba) Reformas estruturais do gasto p\u00fablico: reduzindo o comprometimento das despesas de pessoal por meio da melhor aplicabilidade dos crit\u00e9rios de exonera\u00e7\u00e3o (CF e LRF), redu\u00e7\u00e3o da jornada de trabalho, normatiza\u00e7\u00e3o do direito de greve dos servidores, crit\u00e9rios de reajuste salarial. Ademais, \u00e9 necess\u00e1rio revisar as regras de aposentadorias dos servidores, de forma a estabelecer idade m\u00ednima de 65 para homens e mulheres, revis\u00e3o de aposentadorias especiais para algumas categorias e revis\u00e3o do sistema de pens\u00f5es. Flexibilizar os crit\u00e9rios de aplica\u00e7\u00e3o m\u00ednima das despesas de custeio para torna-la mais flex\u00edvel e permitir a ado\u00e7\u00e3o do car\u00e1ter antic\u00edclico da pol\u00edtica fiscal.<\/p>\n

4\u00ba) Reforma nas regras or\u00e7ament\u00e1rias (Relat\u00f3rio do PLS 229\/2009): buscar o realismo or\u00e7ament\u00e1rio, elevar a capacidade de planejamento do espa\u00e7o fiscal de m\u00e9dio prazo, estabelecer fundamenta\u00e7\u00e3o t\u00e9cnica para a elabora\u00e7\u00e3o de projetos de investimentos, limita\u00e7\u00e3o das despesas de restos a pagar para a disponibilidade financeira em todos os anos do mandato, refor\u00e7o t\u00e9cnico dos instrumentos de avalia\u00e7\u00e3o dos programas (ex-ante e ex-post<\/em>) e converg\u00eancia da contabilidade aos padr\u00f5es internacionais.<\/p>\n

5\u00ba) Reformas gerenciais: focar nas atividades essenciais do estado, focar no atendimento ao cidad\u00e3o (front office), integrar melhor a formula\u00e7\u00e3o e a execu\u00e7\u00e3o, fus\u00e3o de \u00f3rg\u00e3o p\u00fablicos, controle e avalia\u00e7\u00e3o por meio do di\u00e1logo permanente, compartilhamento dos servi\u00e7os de suporte, adotar novas tecnologias nos sistemas de compras e melhorar coordena\u00e7\u00e3o entre \u00f3rg\u00e3os do governo.<\/p>\n

N\u00e3o h\u00e1 d\u00favidas que os desafios s\u00e3o grandes e a agenda de reformas necess\u00e1rias envolve paradigmas consolidados na sociedade brasileira. Dado que nossa carga tribut\u00e1ria se aproxima de 40% do PIB, o caminho f\u00e1cil da eleva\u00e7\u00e3o de tributos mostra-se cada vez mais restrito. O tamanho do setor p\u00fablico e sua inefici\u00eancia est\u00e1 chegando ao limite. Se n\u00e3o adotarmos medidas estruturais para resolvermos os problemas, estaremos em uma tend\u00eancia crescente de eleva\u00e7\u00e3o da carga tribut\u00e1ria ou estarmos sempre fadados a reviver momentos de crise como o atual.<\/p>\n

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1<\/sup> Invers\u00f5es financeiras s\u00e3o despesas que abrangem os gastos com aquisi\u00e7\u00e3o de im\u00f3veis em utiliza\u00e7\u00e3o, aquisi\u00e7\u00e3o de bens para revenda, aquisi\u00e7\u00e3o de t\u00edtulos de cr\u00e9dito de t\u00edtulos representativos de capital j\u00e1 integralizado, constitui\u00e7\u00e3o ou aumento de capital de empresas concess\u00e3o de empr\u00e9stimos, entre outros.<\/p>\n

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