{"id":2632,"date":"2015-10-06T11:01:23","date_gmt":"2015-10-06T14:01:23","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=2632"},"modified":"2015-10-06T11:01:23","modified_gmt":"2015-10-06T14:01:23","slug":"devemos-tirar-a-petrobras-da-condicao-de-operadora-unica-no-pre-sal","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=2632","title":{"rendered":"Devemos tirar a Petrobras da condi\u00e7\u00e3o de operadora \u00fanica no Pr\u00e9-sal?"},"content":{"rendered":"

Encontra-se em discuss\u00e3o no Senado Federal o Projeto de Lei n\u00ba 131\/15, do Senador Jos\u00e9 Serra, que busca retirar a obrigatoriedade de que a Petrobras seja a \u00fanica empresa com a fun\u00e7\u00e3o de operar as atividades de explora\u00e7\u00e3o e produ\u00e7\u00e3o de petr\u00f3leo no pr\u00e9-sal. Essa foi uma imposi\u00e7\u00e3o da Lei de Partilha de Produ\u00e7\u00e3o (Lei n\u00ba 12.351\/10, art. 4\u00ba), institu\u00edda em 2010 para normatizar as explora\u00e7\u00f5es e a produ\u00e7\u00e3o de petr\u00f3leo no pr\u00e9-sal. No regime de Partilha vence uma licita\u00e7\u00e3o a empresa ou o cons\u00f3rcio de empresas que oferecer a maior parcela de excedente em \u00f3leo (lucro) \u00e0 Uni\u00e3o. Ao vencer um leil\u00e3o de \u00e1rea explorat\u00f3ria, a empresa deve, necessariamente, formar um cons\u00f3rcio com a Petrobras e com a empresa estatal Pr\u00e9-Sal Petr\u00f3leo S.A. (PPSA), de acordo com o artigo 20 da Lei de Partilha. No cons\u00f3rcio, a Petrobras assume a fun\u00e7\u00e3o de operadora das explora\u00e7\u00f5es de petr\u00f3leo e g\u00e1s (a empresa operadora \u00e9 a encarregada, em um campo de petr\u00f3leo, de contratar e executar todas as atividades econ\u00f4micas e tecnol\u00f3gicas relacionadas \u00e0s explora\u00e7\u00f5es e \u00e0 produ\u00e7\u00e3o; as demais empresas que com ela participam do cons\u00f3rcio atuam como investidoras, detendo pouco poder de decis\u00e3o).<\/p>\n

Observe-se que a pr\u00f3pria Petrobras nunca foi completamente favor\u00e1vel ao dispositivo da lei que a obriga a ser a operadora do campo, pois se uma determinada \u00e1rea petrol\u00edfera n\u00e3o estiver entre suas prioridades, ou apresentar menor interesse geol\u00f3gico, ainda assim ela ser\u00e1 obrigada a assumir a opera\u00e7\u00e3o da \u00e1rea, tendo de alocar recursos financeiros, equipamentos e pessoal especializado nas explora\u00e7\u00f5es, que poderiam ser mais produtivamente aplicados em outras \u00e1reas de seu maior interesse. Al\u00e9m disso, eventualmente, ter\u00e1 de trabalhar com s\u00f3cios que n\u00e3o escolheu e honrar e operar uma proposta econ\u00f4mica vencedora de uma licita\u00e7\u00e3o em que ela n\u00e3o participou de seu planejamento.<\/p>\n

A exig\u00eancia de operador \u00fanico j\u00e1 havia, antes mesmo da atual crise que envolve a Petrobras, diminu\u00eddo a atratividade para a participa\u00e7\u00e3o de outras empresas petroleiras na explora\u00e7\u00e3o do pr\u00e9-sal, em raz\u00e3o das limita\u00e7\u00f5es que encontram para compartilhar, com maior capacidade de decis\u00e3o, dos diversos aspectos envolvidos na condu\u00e7\u00e3o das explora\u00e7\u00f5es de um campo de petr\u00f3leo. Isso \u00e9 bem ilustrado pelo leil\u00e3o do campo de Libra, em outubro de 2013, em que n\u00e3o houve competi\u00e7\u00e3o, pois apenas um cons\u00f3rcio de empresas participou da licita\u00e7\u00e3o. Assim, o modelo de operador \u00fanico, al\u00e9m de n\u00e3o atender aos interesses da pr\u00f3pria Petrobras, n\u00e3o atrai n\u00famero expressivo de empresas petroleiras para os leil\u00f5es, situa\u00e7\u00e3o que n\u00e3o potencializa maiores excedentes em \u00f3leo oferecido \u00e0 Uni\u00e3o. Se for eliminada a obrigatoriedade de que a Petrobras atue como operadora \u00fanica, como pretende o PLS n\u00ba 131\/2015, maior n\u00famero de petroleiras nacionais e estrangeiras, privadas ou estatais, ser\u00e3o incentivadas a participar das licita\u00e7\u00f5es, trazendo tamb\u00e9m suas tecnologias, recursos f\u00edsicos e financeiros e novo impulso na produ\u00e7\u00e3o de petr\u00f3leo e na arrecada\u00e7\u00e3o de impostos. E a Petrobras poder\u00e1 decidir, segundo seus pr\u00f3prios interesses, se participa ou n\u00e3o de uma determinada licita\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

A Lei de Partilha determina ainda que a Petrobras deve participar do cons\u00f3rcio vencedor de cada licita\u00e7\u00e3o com recursos financeiros equivalentes a, no m\u00ednimo, 30% do capital do cons\u00f3rcio. Sabendo-se das atuais dificuldades financeiras da Companhia – que em raz\u00e3o do alto grau de endividamento foi obrigada a reduzir seus investimentos, nos pr\u00f3ximos cinco anos, de US$ 206,8 bilh\u00f5es para US$ 130,3 bilh\u00f5es, e diminuir seus campos de petr\u00f3leo que receber\u00e3o investimentos, de 30 campos inicialmente planejados para 22, entre 2015 e 2020 – dificilmente ter\u00e1 f\u00f4lego financeiro para assumir mais compromissos al\u00e9m dos que ela j\u00e1 tem no pr\u00e9-sal e em outras \u00e1reas. Isso \u00e9 mais verdadeiro depois que sua nota de cr\u00e9dito foi rebaixada pela Standard & Poor\u2019s, ocasionando a perda do grau de investimento e dificultando o levantamento de novos empr\u00e9stimos no mercado financeiro. Em raz\u00e3o das limita\u00e7\u00f5es financeiras e da necessidade de diminuir o elevado endividamento, a Petrobras decidiu concentrar seus investimentos no desenvolvimento de campos de petr\u00f3leo j\u00e1 descobertos, visando ao aumento da produ\u00e7\u00e3o, e reduzindo, ao mesmo tempo, os investimentos em explora\u00e7\u00f5es. Essa decis\u00e3o da Petrobras \u00e9 bastante coerente, uma vez que suas reservas de petr\u00f3leo e g\u00e1s, provadas ou estimadas, j\u00e1 alcan\u00e7am o expressivo montante de cerca de 45 bilh\u00f5es de barris, localizadas nos campos antigos e nos novos campos que descobriu no pr\u00e9-sal. Esse volume de reservas \u00e9 suficiente para a Petrobras produzir combust\u00edveis e demais derivados em suas refinarias por mais de 40 anos.<\/p>\n

Assim, novas licita\u00e7\u00f5es no pr\u00e9-sal, no regime de operador \u00fanico, ficam completamente dependentes da capacidade da Petrobras de mobilizar recursos para participar e arcar com todos os volumosos investimentos envolvidos nas explora\u00e7\u00f5es. Exceto pela crescente produ\u00e7\u00e3o que j\u00e1 vem sendo obtida no pr\u00e9-sal pela Petrobras e empresas a ela consorciadas, as demais reservas potenciais brasileiras permanecem ociosas, inexploradas, sem gerar renda e empregos. Isso ocorre num momento em que o Brasil precisa criar fatos novos na \u00e1rea econ\u00f4mica, para incentivar o aumento dos investimentos e colocar em produ\u00e7\u00e3o novas reservas do pr\u00e9-sal para a gera\u00e7\u00e3o de impostos, a serem aplicados na educa\u00e7\u00e3o e na sa\u00fade, como determinam as novas normas de aplica\u00e7\u00e3o dos royalties do petr\u00f3leo (Lei n\u00ba 12.858\/2013).<\/p>\n

Enquanto isso, no mundo, as explora\u00e7\u00f5es avan\u00e7am em novas fronteiras petrol\u00edferas, pois as empresas petroleiras realizam seu planejamento olhando muitos anos \u00e0 frente, na expectativa de que os pre\u00e7os do petr\u00f3leo j\u00e1 ter\u00e3o se elevado quando novos campos descobertos estiveram em produ\u00e7\u00e3o, daqui a cinco ou mais anos. Exemplos do prosseguimento das explora\u00e7\u00f5es mundiais, mesmo com os pre\u00e7os internacionais do petr\u00f3leo abaixo de US$ 60, encontram-se no Golfo do M\u00e9xico, onde foram realizadas ofertas, em agosto deste ano, para 33 blocos explorat\u00f3rios localizados em \u00e1guas profundas de at\u00e9 3.340 metros na parte norte-americana do Golfo.<\/p>\n

Tamb\u00e9m na se\u00e7\u00e3o do Golfo pertencente ao M\u00e9xico foram realizadas este ano duas licita\u00e7\u00f5es de \u00e1reas explorat\u00f3rias, ap\u00f3s o recente processo de abertura da ind\u00fastria do petr\u00f3leo do pa\u00eds aos investidores privados, depois de 75 anos de monop\u00f3lio da empresa estatal Pemex.<\/p>\n

Na Inglaterra, a autoridade de petr\u00f3leo do pa\u00eds anunciou, em julho, a concess\u00e3o de 41 novas licen\u00e7as de explora\u00e7\u00e3o no Mar do Norte, em um programa de explora\u00e7\u00f5es com gastos no valor total de 4 bilh\u00f5es de euros para revitalizar a produ\u00e7\u00e3o de petr\u00f3leo naquela regi\u00e3o. Outros pa\u00edses que realizaram licita\u00e7\u00f5es de \u00e1reas explorat\u00f3rias este ano foram a Bulg\u00e1ria, para procurar g\u00e1s natural no Mar Negro, como forma de se livrar da depend\u00eancia do g\u00e1s fornecido pela R\u00fassia, e a Irlanda, entre muitos outros.<\/p>\n

O Brasil, que somente descobriu petr\u00f3leo em 1939 (em Lobato, na Bahia), com atraso de 80 anos ap\u00f3s o in\u00edcio das explora\u00e7\u00f5es comerciais no mundo (na Pensilv\u00e2nia, em 1859), deveria refletir sobre esta experi\u00eancia da hist\u00f3ria: em 1871, o governo imperial de dom Pedro II, para incentivar as explora\u00e7\u00f5es de petr\u00f3leo e outros minerais, expediu o Aviso n\u00ba 53, do Minist\u00e9rio da Agricultura, Com\u00e9rcio e Obras P\u00fablicas, definindo que os dep\u00f3sitos minerais localizados em terras particulares constitu\u00edam propriedade do Estado e, portanto, podiam ser explorados por aqueles que recebessem licen\u00e7as de explora\u00e7\u00e3o do governo \u201cuma vez que n\u00e3o era de conveni\u00eancia p\u00fablica que as riquezas do mencionado solo jazam sepultadas nas entranhas da terra, quando empreendedores ativos e capitais suficientes aparecem para as aproveitar eficazmente\u201d (Mattos Dias e Quaglino, A Quest\u00e3o do Petr\u00f3leo no Brasil \u2013 Uma Hist\u00f3ria da Petrobras, 1993).<\/p>\n

Da mesma forma, atualmente, segundo a Constitui\u00e7\u00e3o Federal, e de acordo com a Lei de Partilha, as reservas de petr\u00f3leo s\u00e3o de propriedade da Uni\u00e3o, e mesmo depois que jazidas de petr\u00f3leo ou g\u00e1s s\u00e3o descobertas pelas empresas, as reservas continuam de propriedade da Uni\u00e3o. As empresas exploradoras t\u00eam o direito de receber uma parte do petr\u00f3leo que produzirem, correspondente aos custos incorridos, aos royalties pagos e a uma parcela dos lucros. Para garantir informa\u00e7\u00f5es seguras sobre os volumes produzidos pelas empresas, as opera\u00e7\u00f5es de produ\u00e7\u00e3o de petr\u00f3leo s\u00e3o supervisionadas pela estatal PPSA, encarregada da gest\u00e3o dos contratos de explora\u00e7\u00e3o firmados pelas empresas com a Uni\u00e3o, e com poder de veto sobre as decis\u00f5es das empresas relativas \u00e0s explora\u00e7\u00f5es e \u00e0 produ\u00e7\u00e3o. Ou seja, os instrumentos regulat\u00f3rios e o monitoramento da produ\u00e7\u00e3o por \u00f3rg\u00e3os do governo j\u00e1 atendem aos interesses do Brasil no pr\u00e9-sal.<\/p>\n

A altera\u00e7\u00e3o proposta pelo PLS 131\/2015 pode contribuir para dinamizar o setor de petr\u00f3leo, desde que haja continuidade nos leil\u00f5es de \u00e1reas no pr\u00e9-sal, e aumentar a participa\u00e7\u00e3o de empresas de capital nacional nas explora\u00e7\u00f5es, em associa\u00e7\u00e3o com empresas estrangeiras ou com a pr\u00f3pria Petrobras, que poderia participar das licita\u00e7\u00f5es como uma decis\u00e3o livre, sem a imposi\u00e7\u00e3o de que atue como operador \u00fanico. Novas \u00e1reas explorat\u00f3rias elevam a demanda para os equipamentos submarinos e os diversos servi\u00e7os de instala\u00e7\u00f5es submarinas que passaram a ser oferecidos no Brasil para atender \u00e0 Pol\u00edtica de Conte\u00fado Local, al\u00e9m dos novos estaleiros implantados para a constru\u00e7\u00e3o de navios e plataformas de petr\u00f3leo. Novas \u00e1reas em explora\u00e7\u00e3o aumentam ainda a procura pelos servi\u00e7os de pesquisa fornecidos pelo grande n\u00famero de centros de pesquisa e tecnologia que se instalaram na Ilha do Fund\u00e3o, Rio de Janeiro, e em outros estados, especificamente para atender aos desafios tecnol\u00f3gicos do pr\u00e9-sal.<\/p>\n

Numa vis\u00e3o de longo prazo da ind\u00fastria de petr\u00f3leo no Brasil, observa-se que desde o primeiro leil\u00e3o de \u00e1reas explorat\u00f3rias, em 1999, empresas brasileiras e de v\u00e1rios pa\u00edses v\u00eam investindo no setor, sejam como operadoras ou como investidoras. No per\u00edodo 1999\/2013, nos 12 leil\u00f5es realizados, as petroleiras estrangeiras venceram 129 vezes, e \u00a0as nacionais, 88 vezes. Como resultado, entre as atuais 10 maiores empresas produtoras operadoras de petr\u00f3leo encontram-se a Petrobras, 6 empresas estrangeiras e 3 brasileiras de capital privado. Entre os motivos para a menor presen\u00e7a das empresas de capital nacional encontra-se o longo per\u00edodo do monop\u00f3lio, que impediu o surgimento de petroleiras nacionais, pois somente ap\u00f3s a abertura do setor de petr\u00f3leo, em 1995, come\u00e7aram a ser organizadas para atuar no setor. A pr\u00f3pria Petrobras desenvolve parcerias com dezenas de empresas nacionais e estrangeiras e nem sempre ela \u00e9 a operadora: de um total de 82 acordos de parceria que ela det\u00e9m nas explora\u00e7\u00f5es, em 24 parcerias ela n\u00e3o \u00e9 a operadora, participando apenas como investidora nos campos de petr\u00f3leo; por\u00e9m, sua hegemonia na ind\u00fastria do petr\u00f3leo \u00e9 um fato inconteste, pois ela produz atualmente 92% de todo o petr\u00f3leo extra\u00eddo e 99% de todos os derivados de petr\u00f3leo produzidos no Pa\u00eds.<\/p>\n

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