{"id":2594,"date":"2015-09-02T09:17:07","date_gmt":"2015-09-02T12:17:07","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=2594"},"modified":"2015-09-02T09:17:07","modified_gmt":"2015-09-02T12:17:07","slug":"o-copom-e-a-dominancia-fiscal","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=2594","title":{"rendered":"O Copom e a Domin\u00e2ncia Fiscal"},"content":{"rendered":"
Nesta semana, o Banco Central ir\u00e1 se reunir para definir a taxa de juros b\u00e1sica da economia, que atualmente se encontra em 14,25% ao ano. A maior parte do mercado espera que o Copom mantenha inalterada a taxa de juros nesta reuni\u00e3o, assim como n\u00e3o fa\u00e7a qualquer altera\u00e7\u00e3o at\u00e9 o final do ano. Neste ano, o Banco Central elevou a taxa Selic de 11,75% para 14,25% ao ano, uma alta de 2,5 pontos percentuais. Em rela\u00e7\u00e3o aos indicadores de atividade, com a divulga\u00e7\u00e3o do p\u00e9ssimo resultado do PIB do 2\u00ba trimestre, o mercado reduziu a proje\u00e7\u00e3o do PIB para retra\u00e7\u00e3o de 2,3% do PIB neste ano e de retra\u00e7\u00e3o de 0,4% em 2016. Al\u00e9m disso, foi divulgada a eleva\u00e7\u00e3o da taxa de desemprego para 8,3% no 2\u00ba trimestre, maior taxa desde o in\u00edcio da s\u00e9rie em 2012.<\/p>\n
Em condi\u00e7\u00f5es normais, a decis\u00e3o de eleva\u00e7\u00e3o das taxas de juros pela autoridade monet\u00e1ria promove efeitos sobre a economia para combater a infla\u00e7\u00e3o por pelo menos tr\u00eas canais. O primeiro \u00e9 o impacto da Selic sobre as taxas de cr\u00e9dito ao consumidor e \u00e0s empresas. Por esse canal, o aumento tende a reduzir o consumo e os investimentos e, por conseguinte, o n\u00edvel da atividade econ\u00f4mica. O segundo canal \u00e9 sobre o c\u00e2mbio, onde o aumento da Selic torna as aplica\u00e7\u00f5es financeiras no pa\u00eds mais atrativas para o capital estrangeiro, incentiva o ingresso de capitais, tende a valorizar o real e, por conseguinte, reduz a press\u00e3o inflacion\u00e1ria. Por fim, existe o componente das expectativas. Por meio da credibilidade da autoridade monet\u00e1ria e seu comprometimento em alcan\u00e7ar as metas estabelecidas, a eleva\u00e7\u00e3o da taxa de juros diminui as expectativas de infla\u00e7\u00e3o futura e, consequentemente, reduz a press\u00e3o sobre reajustes de pre\u00e7os.<\/p>\n
Existe uma situa\u00e7\u00e3o, no entanto, em que a efetividade de parte dos canais da pol\u00edtica monet\u00e1ria deixa de funcionar. Trata-se da domin\u00e2ncia fiscal. O termo cunhado pelos economistas para descrever a circunst\u00e2ncia onde a pol\u00edtica monet\u00e1ria perde liberdade e a efetividade de sua estrat\u00e9gia por causa dos seus efeitos sobre as contas p\u00fablicas. Em uma situa\u00e7\u00e3o onde o n\u00edvel de endividamento \u00e9 elevado, h\u00e1 alto custo de carregamento e as contas p\u00fablicas n\u00e3o est\u00e3o equilibradas, o aumento da taxa de juros pode elevar a probabilidade de default<\/em> da d\u00edvida p\u00fablica, tornar o mercado de t\u00edtulos menos atrativo ao investidor estrangeiro ou local, causar deprecia\u00e7\u00e3o cambial e press\u00e3o inflacion\u00e1ria. Nessa circunst\u00e2ncia, a pol\u00edtica fiscal (e n\u00e3o a pol\u00edtica monet\u00e1ria) \u00e9 o melhor instrumento para controlar a infla\u00e7\u00e3o por meio da redu\u00e7\u00e3o das despesas p\u00fablicas.<\/p>\n Olivier Blanchard, Economista Chefe do FMI, publicou o artigo Fiscal Dominance And Inflation Targeting: Lessons From Brazil <\/em>em 2004, onde indica que o pa\u00eds se encontrou na situa\u00e7\u00e3o de domin\u00e2ncia fiscal na crise enfrentada pelo pa\u00eds em 2002 e 2003, ap\u00f3s as incertezas do processo eleitoral. De acordo com o autor, o fator determinante para a forma\u00e7\u00e3o da domin\u00e2ncia fiscal do per\u00edodo foi o elevado n\u00edvel de endividamento, sua composi\u00e7\u00e3o, com alta participa\u00e7\u00e3o de t\u00edtulos atrelados ao d\u00f3lar, e o ambiente de avers\u00e3o ao risco de investidores. Nessa circunst\u00e2ncia, o aumento dos juros provavelmente levou a uma deprecia\u00e7\u00e3o cambial.<\/p>\n O tema da domin\u00e2ncia fiscal est\u00e1 muito presente das discuss\u00f5es econ\u00f4micas no p\u00f3s-crise 2008. Como v\u00e1rios pa\u00edses tiveram que se endividar fortemente para evitar o colapso do sistema econ\u00f4mico, h\u00e1 preocupa\u00e7\u00e3o sobre a solv\u00eancia das contas p\u00fablicas no momento em que os bancos centrais tiverem que aumentar juros novamente. Michael Woodford no seu artigo Fiscal Requirements for Price Stability<\/em> analisa o papel da pol\u00edtica fiscal na determina\u00e7\u00e3o da estabilidade inflacion\u00e1ria. Chega-se a um regime \u00f3timo em combinar uma regra de Taylor (regra que define a pol\u00edtica de juros com base no desvio da infla\u00e7\u00e3o em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 meta e no hiato do produto) para a pol\u00edtica monet\u00e1ria com uma meta de comprometimento para o d\u00e9ficit nominal como regra fiscal.<\/p>\n Analisando a atual conjuntura do Brasil, observa-se que, em rela\u00e7\u00e3o a alguns indicadores, o pa\u00eds est\u00e1 mais preparado para enfrentar crises que no ano de 2002. Primeiro, o Tesouro Nacional realizou um importante trabalho de reduzir a participa\u00e7\u00e3o da d\u00edvida atrelada ao d\u00f3lar nos \u00faltimos anos, o que deixou a d\u00edvida menos vulner\u00e1vel a varia\u00e7\u00f5es cambiais. Ademais, o montante de reservas internacionais acumuladas hoje \u00e9 bem superior. No caso da pol\u00edtica monet\u00e1ria, o choque de juros implementado pelo Banco Central para o processo de retomada da converg\u00eancia da infla\u00e7\u00e3o \u00e0 meta, neste ciclo, foi bem inferior ao necess\u00e1rio em 2003, quando a Selic chegou a atingir 26,5% a.a.<\/p>\n No entanto, h\u00e1 outros fatores fiscais que s\u00e3o mais desafiadores neste ciclo em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 crise de 2002. Primeiramente, a situa\u00e7\u00e3o fiscal brasileira se encontra em um processo cont\u00ednuo de deteriora\u00e7\u00e3o desde 2011, sem que se tivesse tomado medidas efetivas para mitiga-lo. Acumulou-se um montante enorme de despesas represadas que teve seu processo de regulariza\u00e7\u00e3o iniciado no final de 2014. Em rela\u00e7\u00e3o \u00e0s receitas, o baixo dinamismo econ\u00f4mico traz um cen\u00e1rio futuro desafiador para esse componente. Quanto ao perfil do gasto p\u00fablico, as despesas obrigat\u00f3rias assumiram uma tend\u00eancia expansionista recente que surpreendeu v\u00e1rios analistas. Destaco as despesas previdenci\u00e1rias, que muitos imaginavam que era um problema apenas de m\u00e9dio-prazo, mas que resolver bater em nossa porta j\u00e1 neste ano.<\/p>\n Por fim, e talvez o mais importante, a forte crise pol\u00edtica que vivemos neste momento \u00e9 um fator de forte instabilidade. Por um lado, o regime \u201cpresidencialista de coalis\u00e3o\u201d mostra sinais de esgotamento, por outro, a baixa popularidade do governo faz com que os parlamentares se distanciem da agenda governamental, votando, inclusive, medidas que deterioram a situa\u00e7\u00e3o fiscal, como na vota\u00e7\u00e3o do fim do fator previdenci\u00e1rio e nas propostas de aumento salarial dos servidores p\u00fablicos. Dessa forma, o necess\u00e1rio processo de ajuste fiscal torna-se extremamente custoso e eleva o n\u00edvel de incerteza dos agentes econ\u00f4micos.<\/p>\n \u00c9 nesse ambiente de deteriora\u00e7\u00e3o fiscal, com o d\u00e9ficit nominal atingindo 8,8% do PIB em 12 meses, sem perspectivas de o Congresso cooperar e elevado n\u00edvel de incerteza dos agentes econ\u00f4micos que a situa\u00e7\u00e3o de domin\u00e2ncia fiscal pode ocorrer. Essa \u00e9 uma avalia\u00e7\u00e3o que deve estar na mesa na reuni\u00e3o do Copom desta semana. Como a atividade econ\u00f4mica j\u00e1 se encontra em retra\u00e7\u00e3o e o desemprego em alta, ser\u00e1 que o aumento ou manuten\u00e7\u00e3o da taxa Selic neste patamar ir\u00e1 contribuir para reduzir as expectativas de infla\u00e7\u00e3o ou para gerar mais incertezas sobre as condi\u00e7\u00f5es de solv\u00eancia da pol\u00edtica fiscal? No meu ponto de vista, essa \u00e9 a quest\u00e3o mais importante da agenda monet\u00e1ria nos pr\u00f3ximos meses.<\/p>\n <\/p>\n Download:<\/strong><\/p>\n