{"id":2580,"date":"2015-08-18T10:07:54","date_gmt":"2015-08-18T13:07:54","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=2580"},"modified":"2015-08-18T10:07:54","modified_gmt":"2015-08-18T13:07:54","slug":"a-operacao-lava-jato-reduz-o-crescimento-economico","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=2580","title":{"rendered":"A Opera\u00e7\u00e3o Lava-Jato reduz o crescimento econ\u00f4mico?"},"content":{"rendered":"

H\u00e1 quem afirme que a Opera\u00e7\u00e3o Lava-Jato prejudica o crescimento econ\u00f4mico, argumentando que as grandes empresas que est\u00e3o sob investiga\u00e7\u00e3o entraram em dificuldade financeira. Os bancos lhes negam cr\u00e9dito, os parceiros comerciais se afastaram. Os pre\u00e7os de suas a\u00e7\u00f5es despencam. O risco de se tornarem inabilitadas a participar de obras p\u00fablicas reduz suas perspectivas futuras. A dificuldade financeira se alastra, pois seus fornecedores acumulam cr\u00e9ditos n\u00e3o recebidos. Milhares de empregos s\u00e3o perdidos. Reduz-se o n\u00famero de empresas tecnicamente capazes a fazer importantes obras de infraestrutura. O resultado \u00e9 menos crescimento.<\/p>\n

Seria importante, ent\u00e3o, “punir pessoas culpadas, mas preservar as empresas”, para mitigar os efeitos negativos sobre a atividade econ\u00f4mica. Ou, at\u00e9 mesmo, restringir o alcance das investiga\u00e7\u00f5es a bem da sa\u00fade econ\u00f4mica do pa\u00eds.<\/p>\n

O problema dessa interpreta\u00e7\u00e3o \u00e9 que crescimento econ\u00f4mico deve ser entendido como um processo de m\u00e9dio e longo prazo. Um pa\u00eds s\u00f3 entra no clube dos desenvolvidos se crescer muitos anos seguidos a taxas razo\u00e1veis. A literatura econ\u00f4mica mostra que isso s\u00f3 acontece nas na\u00e7\u00f5es que t\u00eam “boas institui\u00e7\u00f5es”, ou seja, normas de conduta social que favore\u00e7am o investimento, a coopera\u00e7\u00e3o, a criatividade, a livre iniciativa, a igualdade de oportunidades e o esfor\u00e7o individual.<\/p>\n

Os fatos apurados pela Lava-Jato atentam diretamente contra importantes institui\u00e7\u00f5es e, por isso, minam as possibilidades de crescimento de longo prazo. Agridem os direitos de propriedade, pois os atos de corrup\u00e7\u00e3o expropriam o patrim\u00f4nio dos contribuintes, dos acionistas minorit\u00e1rios das empresas envolvidas e dos associados de fundos de pens\u00e3o onde houve fraudes.<\/p>\n

Isso reduz a sensa\u00e7\u00e3o de seguran\u00e7a de quem tem poupan\u00e7a para investir. Quando os direitos de propriedade est\u00e3o sob risco, as pessoas preferem consumir suas rendas a correr o risco de poupar e serem expropriadas. Os poupadores de outros pa\u00edses preferem investir em outros lugares. Oresultado \u00e9 menos poupan\u00e7a dispon\u00edvel para financiar investimento e crescimento.<\/p>\n

A sensa\u00e7\u00e3o de que h\u00e1 corrup\u00e7\u00e3o sem puni\u00e7\u00e3o reduz a coes\u00e3o social, que pode ser definida como o conjunto de valores e cren\u00e7as que levam os indiv\u00edduos de uma sociedade a cooperar, ajudando a sociedade a resolver seus problemas de a\u00e7\u00e3o coletiva. Se eu sei que h\u00e1 corruptos sangrando o er\u00e1rio, passo a considerar que n\u00e3o \u00e9 justo pagar impostos, e a sonega\u00e7\u00e3o se torna socialmente aceit\u00e1vel. Por que devo ser honesto nos meus neg\u00f3cios e na minha conduta pessoal se o pa\u00eds \u00e9 governado por “big bosses” que cometem erros muito maiores? Resulta da\u00ed o generalizado desrespeito aos contratos, \u00e0s leis e \u00e0s mais triviais civilidades cotidianas.<\/p>\n

Onde n\u00e3o h\u00e1 expectativa de que acordos sejam cumpridos e regras de conviv\u00eancia respeitadas, muitos investimentos produtivos e geradores de renda deixam de ser feitos. \u00c9 muito dif\u00edcil trabalhar em locais onde n\u00e3o se pode confiar nos outros. Tamb\u00e9m n\u00e3o vale a pena estudar e se tornar produtivo, pois quem ganha dinheiro \u00e9 quem tem est\u00f4mago para praticar “malfeitos”. A civilidade cede lugar \u00e0 lei da selva. Isso \u00e9 muito mais nocivo para o crescimento de longo prazo que “a perda de 1 ponto do PIB” em fun\u00e7\u00e3o do desemprego em empresas corruptas.<\/p>\n

Nesse ambiente envenenado, tampouco se pode fazer reformas necess\u00e1rias ao desenvolvimento, pois os indiv\u00edduos se tornam resistentes a fazer sacrif\u00edcios pessoais em nome da coletividade. Posso at\u00e9 concordar que aposentadoria precoce \u00e9 uma regra que precisa ser mudada, a bem do equil\u00edbrio fiscal e do crescimento. Mas porque vou aceitar uma reforma que posterga minha aposentadoria quando sei que h\u00e1 gente roubando a previd\u00eancia e que permanece impune?<\/p>\n

A Lava-Jato deve ser vista como a afirma\u00e7\u00e3o de princ\u00edpios fundamentais de uma sociedade saud\u00e1vel: a lei vale para todos; a corrup\u00e7\u00e3o n\u00e3o deve ser tolerada; o crime deve ser punido. Conden\u00e1-la, em fun\u00e7\u00e3o dos efeitos colaterais que provoca, equivale a dizer que um paciente com c\u00e2ncer n\u00e3o deve se submeter a quimioterapia para n\u00e3o sofrer enjoo ou correr o risco de infec\u00e7\u00f5es oportunistas. Por piores que sejam esses efeitos, n\u00e3o h\u00e1 sa\u00edda sem a quimioterapia.<\/p>\n

O risco que a Lava-Jato encerra n\u00e3o \u00e9 a perda de pontos percentuais do PIB. O risco real \u00e9 o nosso sistema democr\u00e1tico n\u00e3o aguentar o impacto das revela\u00e7\u00f5es. A descren\u00e7a nos tr\u00eas Poderes e nos partidos pol\u00edticos pode abrir espa\u00e7o para “salvadores da p\u00e1tria”, que surgiriam como infec\u00e7\u00f5es oportunistas ao longo do tratamento, e que poderiam levar a resultados t\u00e3o ruins quanto o pr\u00f3prio c\u00e2ncer.<\/p>\n

Com o intuito de “passar o pa\u00eds a limpo”, alguns novos personagens, n\u00e3o identificados como “pol\u00edticos tradicionais”, podem se eleger com propostas que suprimam o funcionamento das institui\u00e7\u00f5es democr\u00e1ticas. O pa\u00eds j\u00e1 viu esse filme e sabemos que tal op\u00e7\u00e3o n\u00e3o \u00e9 promissora.<\/p>\n

O desafio \u00e9 nos mantermos nos trilhos da legalidade e aguentar o tranco at\u00e9 o final das investiga\u00e7\u00f5es. Precisamos, tamb\u00e9m, aproveitar a como\u00e7\u00e3o nacional e a fragilidade dos grupos que patrocinam interesses escusos para aprovar reformas importantes que melhorem a qualidade de nossas institui\u00e7\u00f5es. Poder\u00edamos come\u00e7ar com uma nova rodada de privatiza\u00e7\u00f5es que retirassem decis\u00f5es empresariais da \u00f3rbita de interesse pol\u00edticos; bem como fazer melhorias nas regras de governan\u00e7a das empresas estatais e dos fundos de pens\u00e3o, dois focos de m\u00e1 gest\u00e3o e corrup\u00e7\u00e3o, assim como reduzir a influ\u00eancia pol\u00edtica sobre as ag\u00eancias reguladoras. Importante tamb\u00e9m seria aumentar a probabilidade de puni\u00e7\u00e3o e o tamanho da pena e da expropria\u00e7\u00e3o de recursos dos condenados por corrup\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

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Reprodu\u00e7\u00e3o, com algumas poucas altera\u00e7\u00f5es, de texto publicado na coluna de opini\u00e3o do Valor Econ\u00f4mico, em 14 de agosto de 2015.<\/em><\/p>\n

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