{"id":2567,"date":"2015-07-13T14:17:32","date_gmt":"2015-07-13T17:17:32","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=2567"},"modified":"2015-07-13T14:17:32","modified_gmt":"2015-07-13T17:17:32","slug":"a-reforma-politica-reforma-os-politicos","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=2567","title":{"rendered":"A reforma pol\u00edtica reforma os pol\u00edticos?"},"content":{"rendered":"

A pol\u00edtica sem romance. \u00c9 assim que o Nobel James Buchanan define a teoria da escolha racional, em que os pol\u00edticos s\u00e3o racionais<\/em> como os consumidores da microeconomia: buscam a pr\u00f3pria satisfa\u00e7\u00e3o, atuando para alcan\u00e7ar objetivos pr\u00f3prios, n\u00e3o necessariamente os da sociedade que os elegeu. Esse entendimento \u00e9 \u00fatil para uma an\u00e1lise econ\u00f4mica da reforma pol\u00edtica, com resultados pouco otimistas em rela\u00e7\u00e3o \u00e0s mudan\u00e7as propostas.<\/p>\n

Outro instrumento \u00fatil \u00e9 a teoria econ\u00f4mica do crime, do tamb\u00e9m Nobel Gary Becker. Por essa teoria, um criminoso pesa os ganhos e perdas esperados com um crime antes de comet\u00ea-lo. Essa no\u00e7\u00e3o pode parecer sofisticada para crimes comuns, mas \u00e9 aceita para crimes de colarinho branco, associados \u00e0 pol\u00edtica. Deltan Dallagnol, o procurador da Lava Jato, defende justamente que a corrup\u00e7\u00e3o \u00e9 um crime racional, sendo necess\u00e1rio para combat\u00ea-la aumentar seus riscos.<\/p>\n

Assim, a economia joga luz sobre as principais propostas de reforma pol\u00edtica, como o financiamento p\u00fablico de campanha. A proposta se baseia na l\u00f3gica que o custo das campanhas induz os pol\u00edticos a se corromperem. Empres\u00e1rios financiariam esses pol\u00edticos com a expectativa de, ajudando a eleg\u00ea-los, serem favorecidos em um seu mandato.\u00a0 Aos pol\u00edticos restaria se renderem a essa din\u00e2mica, sob risco de n\u00e3o se elegerem.<\/p>\n

Como o financiamento p\u00fablico afeta os incentivos dados ao mau pol\u00edtico e ao mau empres\u00e1rio? Os ganhos e perdas esperados de cada um s\u00e3o alterados ao continuarem se valendo desse mecanismo, agora ilegal? Na teoria dos jogos, essa din\u00e2mica pode ser entendida como um jogo simult\u00e2neo, em que o pol\u00edtico e o empres\u00e1rio decidem se optam por aceitar ou fazer uma doa\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

Por essa l\u00f3gica, fica claro que as chances de mudan\u00e7as positivas com o financiamento p\u00fablico s\u00e3o pequenas, dando vaz\u00e3o a pr\u00e1ticas como o caixa-dois ou o soft money<\/em> (financiamento indireto). Se a vota\u00e7\u00e3o de um candidato \u00e9 de fato dependente dos seus gastos, o payoff<\/em> da doa\u00e7\u00e3o ilegal ser\u00e1 alt\u00edssimo: no financiamento p\u00fablico, na margem, recursos adicionais seriam essenciais para o candidato. Esse ganho esperado seria maior do que sem o financiamento p\u00fablico, porque o er\u00e1rio n\u00e3o ser\u00e1 capaz de arcar com o valor bilion\u00e1rio das campanhas. Por isso, o financiamento p\u00fablico pode vir com um teto de gastos.\u00a0 A distribui\u00e7\u00e3o dos recursos, que pode ser igualit\u00e1ria, tamb\u00e9m limita as despesas.\u00a0 Marginalmente o ganho esperado com a doa\u00e7\u00e3o cresceria.<\/p>\n

Na outra ponta do jogo, a do empres\u00e1rio, tamb\u00e9m h\u00e1 ganhos em fazer a doa\u00e7\u00e3o irregular. \u00c9 ing\u00eanuo supor que para manter seus lucros com o governo o mau empres\u00e1rio se tornaria mais competitivo, produtivo. A doa\u00e7\u00e3o permaneceria sendo vantajosa, e mais ainda se o financiamento p\u00fablico reduzir a oferta<\/em> de pol\u00edticos que podem ser comprados, tornando o payoff<\/em> da doa\u00e7\u00e3o maior.<\/p>\n

Resta analisar o outro componente do comportamento estrat\u00e9gico dos jogadores: as perdas esperadas. Ao engajarem na pr\u00e1tica ilegal, o pol\u00edtico e o empres\u00e1rio t\u00eam como perda a expectativa de puni\u00e7\u00e3o, que por sua vez \u00e9 determinada pela probabilidade da a\u00e7\u00e3o ser descoberta e punida, e pelo tamanho da pena. No caso do pol\u00edtico, um componente adicional da perda esperada \u00e9 a puni\u00e7\u00e3o do eleitor.<\/p>\n

O problema \u00e9 que o financiamento p\u00fablico por si n\u00e3o aumenta a perda esperada, que s\u00f3 seria majorada com o fortalecimento das institui\u00e7\u00f5es de fiscaliza\u00e7\u00e3o e controle, o endurecimento da legisla\u00e7\u00e3o penal e a conscientiza\u00e7\u00e3o do eleitor. A an\u00e1lise econ\u00f4mica evidencia que o financiamento p\u00fablico aumenta os ganhos esperados de uma doa\u00e7\u00e3o irregular e tamb\u00e9m n\u00e3o tem qualquer efeito sob as perdas esperadas. Se os ganhos esperados s\u00e3o altos e as perdas pequenas, as doa\u00e7\u00f5es ocorrer\u00e3o. Em econom\u00eas, \u00e9 o equil\u00edbrio de Nash.<\/p>\n

A mesma l\u00f3gica um comportamento estrat\u00e9gico por um pol\u00edtico que visa a objetivos pr\u00f3prios pode ser ampliada para outras ideias da reforma pol\u00edtica, como a proibi\u00e7\u00e3o da reelei\u00e7\u00e3o (a m\u00e3e de todas as corrup\u00e7\u00f5es, para Joaquim Barbosa). Consoante com a teoria de political business cycles<\/em>, a proibi\u00e7\u00e3o impediria o uso da m\u00e1quina para fins eleitorais. Em tese.<\/p>\n

Entretanto, o mau pol\u00edtico que usaria a m\u00e1quina para se reeleger pode continuar usando-a para outros objetivos. A proibi\u00e7\u00e3o o impede de se candidatar ao mesmo cargo, mas n\u00e3o de participar das elei\u00e7\u00f5es. Nesse caso, ele ainda dependeria da sua popularidade e apoio pol\u00edtico, podendo contar com o direcionamento do governo.<\/p>\n

Cabe lembrar que a proibi\u00e7\u00e3o da reelei\u00e7\u00e3o no Executivo j\u00e1 existe no Brasil, depois de dois mandatos. Mesmo assim, foram frequentes casos de prefeitos que buscaram um terceiro mandato em munic\u00edpio vizinho, ou de governadores que participam das elei\u00e7\u00f5es para o Legislativo.<\/p>\n

Para manter seus interesses, o mau pol\u00edtico pode ainda usar um poste<\/em>. Essa pr\u00e1tica j\u00e1 \u00e9 comum hoje: o lan\u00e7amento de vice ou secret\u00e1rio de governo como candidato, que sozinho n\u00e3o tem densidade eleitoral, cuja plataforma eleitoral est\u00e1 associada \u00e0 m\u00e1quina, e escolhido pelo pr\u00f3prio governante. Isso sugere uma baixa efetividade da mudan\u00e7a.<\/p>\n

As medidas propostas no \u00e2mbito da reforma parecem partir da premissa de que o criminoso n\u00e3o \u00e9 culpado pela corrup\u00e7\u00e3o, mas v\u00edtima do sistema que o corrompe. O que parece existir, por\u00e9m, \u00e9 um equil\u00edbrio de sele\u00e7\u00e3o adversa<\/em>, em que a percep\u00e7\u00e3o da pol\u00edtica como um lugar f\u00e9rtil para a corrup\u00e7\u00e3o e hostil aos honestos atrai maus candidatos e repele os bons, alimentando um ciclo vicioso.<\/p>\n

Conforme a an\u00e1lise com a teoria econ\u00f4mica feita, para quebrar o ciclo, \u00e9 necess\u00e1rio aumentar a perda esperada das m\u00e1s pr\u00e1ticas, de modo que maus pol\u00edticos e empres\u00e1rios sejam punidos pelas institui\u00e7\u00f5es e pelo eleitor. Logo, vale mais o apoio ao pacote anticorrup\u00e7\u00e3o do Minist\u00e9rio P\u00fablico Federal do que a algumas das propostas da reforma pol\u00edtica. N\u00e3o se pode esperar muito da reforma<\/em> porque n\u00e3o h\u00e1 bala de prata para vencer a corrup\u00e7\u00e3o. Pol\u00edtica n\u00e3o \u00e9 romance.<\/p>\n

 <\/p>\n

Download:<\/strong><\/p>\n