{"id":2470,"date":"2015-04-15T12:33:01","date_gmt":"2015-04-15T15:33:01","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=2470"},"modified":"2015-04-15T12:33:01","modified_gmt":"2015-04-15T15:33:01","slug":"o-que-e-rotatividade-e-por-que-e-um-problema","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=2470","title":{"rendered":"O que \u00e9 rotatividade (e por que \u00e9 um problema)?"},"content":{"rendered":"

1. Introdu\u00e7\u00e3o<\/strong><\/p>\n

Muitos economistas t\u00eam apontado a produtividade como o principal problema da economia do pa\u00eds (discutida anteriormente no blog aqui<\/a> e aqui<\/a>). O crescimento da renda do trabalho nos \u00faltimos anos n\u00e3o foi acompanhado pelo crescimento da produtividade. A eleva\u00e7\u00e3o dos chamados \u201ccustos unit\u00e1rios do trabalho\u201d (sal\u00e1rio e encargos) sem o correspondente aumento da produtividade (quantidade de bens e servi\u00e7os produzidos por hora de trabalho) torna a economia brasileira menos competitiva perante outras economias emergentes \u2013 entre outras consequ\u00eancias. A rotatividade<\/strong> da economia brasileira \u00e9 considerada um problema, entre outras raz\u00f5es, por n\u00e3o permitir ganhos de produtividade.<\/p>\n

Em 2015, a rotatividade no mercado de trabalho ganhou espa\u00e7o no debate pol\u00edtico com a edi\u00e7\u00e3o da Medida Provis\u00f3ria n\u00ba 665, que alterou as regras do seguro-desemprego e do abono salarial (discuss\u00e3o introduzida aqui<\/a>). Por rotatividade, entende-se o desligamento do trabalhador de um posto de trabalho seguido pela realoca\u00e7\u00e3o em outro posto. Parte da rotatividade \u00e9 saud\u00e1vel e faz parte do matching<\/em> do mercado de trabalho (busca pelo trabalhador da ocupa\u00e7\u00e3o mais adequada, dadas as suas qualifica\u00e7\u00f5es; e busca pela empresa do funcion\u00e1rio mais adequado) .<\/p>\n

Entretanto, a rotatividade em nada ajuda quando \u00e9 visada pelo trabalhador a fim de auferir recursos como o seguro-desemprego, o FGTS, o aviso pr\u00e9vio, entre outros; frequentemente em conluio com o empregador e com um emprego no mercado informal. Em 2013, segundo o Dieese, a taxa de rotatividade l\u00edquida no mercado de trabalho brasileiro foi de 43% (valor m\u00ednimo entre o total de admiss\u00f5es e de desligamentos, exclu\u00eddos os casos de falecimento, aposentadoria, transfer\u00eancia e desligamento a pedido do trabalhador).\u00a0 A taxa \u00e9 cronicamente alta no Brasil: o tempo m\u00e9dio de perman\u00eancia no emprego no pa\u00eds (5 anos) \u00e9 menos da metade do que o de pa\u00edses como Alemanha, Fran\u00e7a e It\u00e1lia (quase 12 anos) 1<\/sup>.<\/p>\n

A alta taxa de rotatividade explicaria o aumento do n\u00famero de benefici\u00e1rios do seguro-desemprego justamente quando h\u00e1 mais vagas, o que permite a troca de postos. \u00a0De acordo com essa \u00f3tica, o redesenho de pol\u00edticas p\u00fablicas como o seguro-desemprego ou o FGTS pode estimular v\u00ednculos de trabalho mais duradouros, como \u00e9 poss\u00edvel que ocorra com a extens\u00e3o do prazo m\u00ednimo de trabalho para a primeira solicita\u00e7\u00e3o do seguro-desemprego (trazida pela MP n\u00ba 665\/2014)2<\/sup>.<\/p>\n

A constante troca de postos desestimula empregados e empregadores a investir nas rela\u00e7\u00f5es de trabalho, principalmente em qualifica\u00e7\u00e3o. Esse seria um dos fatores que explicariam a baixa produtividade da economia do pa\u00eds.<\/p>\n

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2. Discriminando a rotatividade: por tempo de servi\u00e7o, setor da economia, faixa et\u00e1ria, sexo e grau de instru\u00e7\u00e3o.<\/strong><\/p>\n

Rotatividade por tempo de servi\u00e7o <\/strong><\/p>\n

A identifica\u00e7\u00e3o da rotatividade por tempo de servi\u00e7o \u00e9 importante para entender as causas dos altos gastos com seguro-desemprego e as consequ\u00eancias das altera\u00e7\u00f5es trazidas pela MP 665\/2014.<\/p>\n

O Gr\u00e1fico 1 apresenta a distribui\u00e7\u00e3o dos desligamentos por tempo de servi\u00e7o, entre 2002 e 2013. Ao longo de todo o per\u00edodo, a maior parte dos desligamentos se d\u00e1 no in\u00edcio dos v\u00ednculos.<\/p>\n

Gr\u00e1fico 1 \u2013 Distribui\u00e7\u00e3o dos desligamentos por tempo de servi\u00e7o \u2013 2002-2013<\/p>\n

\"img_2470_1\"
\n<\/a>Fonte: Dieese (2014), com base em dados da Rela\u00e7\u00e3o Anual de Informa\u00e7\u00f5es Sociais (Rais) do MTE.<\/em><\/p>\n

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Um indicador sofisticado, no mesmo sentido, \u00e9 apresentado no Gr\u00e1fico 2, que relaciona a probabilidade de desligamento com o tempo de servi\u00e7o em pequenas empresas3<\/sup>.<\/p>\n

Gr\u00e1fico 2 \u2013 Probabilidade de desligamento (eixo vertical) e tempo de servi\u00e7o em meses (eixo horizontal)<\/p>\n

\"img_2470_2\"
\n<\/a>Fonte: Gonzaga e Pinto (2014)4<\/sup>.<\/em><\/p>\n

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Observa-se que nas pequenas empresas a probabilidade de desligamento tem um pico aos tr\u00eas meses de servi\u00e7o (per\u00edodo do contrato de experi\u00eancia) e tem logo depois queda, com exce\u00e7\u00e3o de um pico ao redor de 6 meses, exatamente a car\u00eancia para o seguro-desemprego antes da MP 665\/2014.<\/p>\n

Rotatividade por setores da economia<\/strong><\/p>\n

Os setores com maior rotatividade s\u00e3o o de constru\u00e7\u00e3o civil, pela contrata\u00e7\u00e3o por empreitada, e o agropecu\u00e1rio, pela sazonalidade na colheita e plantio. O setor de com\u00e9rcio e servi\u00e7os tamb\u00e9m possui alta rotatividade, explicada, parcialmente, tamb\u00e9m pela sazonalidade da atividade (ex: festas de fim de ano).<\/p>\n

Rotatividade por faixa et\u00e1ria<\/strong><\/p>\n

A rotatividade \u00e9 maior entre os jovens. Segundo o Dieese (2014), quase metade (48,5%) dos desligamentos em 2013 se deram entre trabalhadores com menos de 29 anos, apesar de eles corresponderem a apenas 36% dos v\u00ednculos.<\/p>\n

Entretanto, estudo de 2013 publicado pelo Ipea, observando o mesmo fato, constatou tamb\u00e9m que\u00a0 os jovens s\u00e3o maioria nas contrata\u00e7\u00f5es, conforme o Gr\u00e1fico 3. No per\u00edodo analisado, 93% dos \u201cjovens\u201d empregados tinham sido contratados naquele ano, o que aconteceu em apenas 43% no caso dos \u201cadultos\u201d. O Gr\u00e1fico apresenta no eixo vertical a taxa de admiss\u00e3o (contrata\u00e7\u00e3o) e no eixo horizontal a taxa de desligamento (separa\u00e7\u00e3o).<\/p>\n

Gr\u00e1fico 3 \u2013 Taxa de admiss\u00e3o e desligamentos para jovens e adultos \u2013 (1996-2010)<\/p>\n

\"img_2470_3\"<\/a>
\nFonte: Courseil \u00a0et. al (2014)5<\/sup>, com base em dados da Rela\u00e7\u00e3o Anual de Informa\u00e7\u00f5es Sociais (Rais) do MTE.<\/em><\/p>\n

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Tal fato poderia sugerir que os jovens n\u00e3o t\u00eam dificuldade de serem contratados, argumento que, se aceito, vai contra a cr\u00edtica de que as medidas da MP no<\/sup> 665\/2014 colocar\u00e3o os trabalhadores em vulnerabilidade. Os autores observam, ainda, que os jovens s\u00e3o contratados em setores de maior rotatividade, como a constru\u00e7\u00e3o civil, com\u00e9rcio e servi\u00e7os.<\/p>\n

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3. Propostas de combate \u00e0 rotatividade<\/strong><\/p>\n

Apresentamos algumas propostas normalmente levantadas no debate.<\/p>\n

3.1. Medidas focadas no comportamento do trabalhador: redesenho do FGTS e do seguro-desemprego<\/strong><\/p>\n

A vis\u00e3o dominante dos especialistas \u00e9 que \u00e9 premente redesenhar o FGTS e o seguro-desemprego.<\/p>\n

3.1.1. FGTS<\/strong><\/p>\n

Gonzaga (2003)6<\/sup> avalia que o FGTS cria dois incentivos perversos: a remunera\u00e7\u00e3o do saldo do Fundo abaixo dos juros de mercado e o fato de a multa sobre o valor do Fundo ser paga diretamente ao trabalhador. Ambos os incentivos dariam ensejo ao desligamento do trabalhador. O saque do FGTS estaria associado \u00e0 maioria dos desligamentos no Brasil (que tamb\u00e9m atinge o mesmo p\u00fablico do seguro-desemprego).<\/p>\n