{"id":2466,"date":"2015-04-13T09:55:10","date_gmt":"2015-04-13T12:55:10","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=2466"},"modified":"2015-04-13T09:55:10","modified_gmt":"2015-04-13T12:55:10","slug":"o-que-voce-come-na-pascoa-e-mesmo-chocolate","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=2466","title":{"rendered":"O que voc\u00ea come na P\u00e1scoa \u00e9 mesmo chocolate?"},"content":{"rendered":"
Ao longo dos \u00faltimos meses de 2014, a produ\u00e7\u00e3o de chocolates ganhou destaque na imprensa brasileira, haja vista o risco de seu principal ingrediente, o cacau, desaparecer do mercado na d\u00e9cada de 20201<\/sup>. A retra\u00e7\u00e3o na oferta de cacau oriunda do Oeste da \u00c1frica, um dos principais polos fornecedores do produto no mundo, e o aumento da demanda por chocolates em pa\u00edses emergentes, a exemplo de China e Brasil, seriam os principais motivos para o risco supramencionado.<\/p>\n A consist\u00eancia dos argumentos referentes ao colapso da curva de oferta de cacau no m\u00e9dio e longo prazos \u00e9 question\u00e1vel, o que pode ser melhor elucidado em estudo a ser elaborado oportunamente. H\u00e1 n\u00fameros consistentes, contudo, que comprovam a expans\u00e3o da curva de demanda desse produto ao longo dos \u00faltimos anos, inclusive em territ\u00f3rio nacional. De acordo com dados do Target Group Index, do Ibope Media2<\/sup>, embora o consumo m\u00e9dio brasileiro ainda seja considerado baixo pelas empresas do setor\u00a0(algo pr\u00f3ximo de 2,3 quilos per capita<\/em> anuais), a expans\u00e3o desse mercado foi de 39% entre 2008 a 2012, tend\u00eancia ainda constatada atualmente. A ascens\u00e3o da festejada classe C \u00e9 uma das principais causas para a referida expans\u00e3o.<\/p>\n Mas ser\u00e1 que o chocolate consumido no Pa\u00eds \u00e9 de qualidade? A fim de responder adequadamente essa pergunta, apresentam-se, a seguir, quatro se\u00e7\u00f5es: 1) defini\u00e7\u00e3o conceitual de chocolate e de achocolatado; 2) compara\u00e7\u00e3o entre o percentual de cacau nos chocolates produzidos em territ\u00f3rio nacional e em alguns pa\u00edses desenvolvidos; 3) outros desafios constatados no mercado de chocolate brasileiro, em compara\u00e7\u00e3o ao que ocorre no mercado externo; e 4) considera\u00e7\u00f5es finais.<\/p>\n Defini\u00e7\u00e3o dos conceitos de chocolate e de achocolatado<\/strong><\/p>\n De acordo com a defini\u00e7\u00e3o3<\/sup> da Ag\u00eancia Nacional de Vigil\u00e2ncia Sanit\u00e1ria (Anvisa), chocolate \u00e9 \u201co produto obtido com base na mistura de derivados de cacau (Theobroma cacao L.), massa (ou pasta ou liquor) de cacau, cacau em p\u00f3 e\/ou manteiga de cacau, com outros ingredientes, contendo, no m\u00ednimo, 25% de s\u00f3lidos totais de cacau. O produto pode apresentar recheio, cobertura, formato e consist\u00eancia variados<\/em>\u201d.<\/p>\n O conceito4<\/sup> de achocolatado \u00e9 um pouco mais abrangente. Em sua apresenta\u00e7\u00e3o mais simples, o achocolatado cont\u00e9m, atualmente, cerca de 70% de sacarose ou de outros a\u00e7\u00facares e menos de 25% de cacau em p\u00f3. Outros ingredientes t\u00edpicos usados na formula\u00e7\u00e3o de achocolatados comerciais incluem extrato de malte, a\u00e7\u00facar e glicose, vitaminas e sais minerais como suplementos. Fortifica\u00e7\u00e3o de achocolatados com sais de ferro (fumarato ferroso, sulfato ferroso, pirofosfato f\u00e9rrico) vem sendo realizada com o intuito de diminuir o \u00edndice de anemia em crian\u00e7as e adolescentes.<\/p>\n N\u00e3o obstante a abrang\u00eancia do conceito de achocolatado, a legisla\u00e7\u00e3o brasileira define com clareza o que \u00e9 chocolate. Em que pese essas distin\u00e7\u00f5es, muitas vezes o mercado nacional disponibiliza ao p\u00fablico consumidor achocolatado como se chocolate fosse, argumento que ser\u00e1 melhor desenvolvido na se\u00e7\u00e3o 3.<\/p>\n Compara\u00e7\u00e3o do percentual m\u00ednimo de cacau entre o chocolate produzido no Brasil, nos Estados Unidos e em pa\u00edses europeus<\/strong><\/p>\n Como visto na se\u00e7\u00e3o anterior, o percentual m\u00ednimo de cacau exigido na fabrica\u00e7\u00e3o de chocolates em territ\u00f3rio nacional \u00e9 de 25%. Destaca-se, contudo, que essa \u00e9 a porcentagem exigida pela Anvisa desde 2005, porquanto, antes desse ano, exigia-se o m\u00ednimo de 32% de cacau na composi\u00e7\u00e3o total do produto5<\/sup>.<\/p>\n A redu\u00e7\u00e3o da quantidade m\u00ednima de cacau no chocolate brasileiro aumentou a defasagem da qualidade do produto nacional em rela\u00e7\u00e3o ao que se produz em alguns pa\u00edses desenvolvidos. No caso dos pa\u00edses da Uni\u00e3o Europeia, a Diretiva n.\u00ba 73\/241\/CEE, do Conselho Europeu, estabeleceu as defini\u00e7\u00f5es, bem como as regras comuns referentes \u00e0 composi\u00e7\u00e3o, \u00e0s caracter\u00edsticas de produ\u00e7\u00e3o, ao condicionamento e \u00e0 rotulagem dos produtos de cacau e de chocolate. De acordo com essa norma, chocolate \u00e9 o produto obtido do cacau e de a\u00e7\u00facares, contendo, no m\u00ednimo, 35% de mat\u00e9ria seca total de cacau, dos quais, pelo menos, 18% de manteiga de cacau e, no m\u00ednimo, 14% de mat\u00e9ria seca de cacau isenta de gordura \u2014 no caso de chocolate com flocos, o m\u00ednimo de cacau exigido \u00e9 de 32%6<\/sup>.<\/p>\n A compreens\u00e3o da quantidade m\u00ednima de cacau nos chocolates produzidos nos Estados Unidos demonstra-se um pouco mais complexa, pois se admitem, nesse pa\u00eds, duas subcategorias principais para o produto: a do chocolate ao leite e a do chocolate preto. Nesse contexto, enquanto o chocolate ao leite norte-americano pode ter o m\u00ednimo de 10% de cacau em sua composi\u00e7\u00e3o, a produ\u00e7\u00e3o do chocolate preto exige, pelo menos, 35% de cacau no alimento7<\/sup>.<\/p>\n Outros desafios constatados no mercado brasileiro de chocolates<\/strong><\/p>\n Al\u00e9m do baixo teor de cacau exigido nos chocolates pela legisla\u00e7\u00e3o brasileira, outro desafio constatado diz respeito ao fato de que o m\u00ednimo legal n\u00e3o tem sido respeitado por v\u00e1rios produtores no Pa\u00eds. De acordo com o Presidente da Associa\u00e7\u00e3o de Turismo de Ilh\u00e9us (BA)8<\/sup>, senhor Marco Lessa, um em cada tr\u00eas chocolates comuns vendidos no Brasil, produzidos pelas grandes ind\u00fastrias, n\u00e3o pode ter o nome de chocolate porque n\u00e3o \u00e9 feito com o percentual m\u00ednimo de cacau estabelecido pela Anvisa. Diante desse desafio, a Associa\u00e7\u00e3o Brasileira da Ind\u00fastria de Chocolate, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados (Abicab) classifica os produtos feitos com menos de 25% de cacau como produtos com “sabor de chocolate”, os quais s\u00e3o ricos em a\u00e7\u00facares e gorduras, muitos dos quais de baixa qualidade.<\/p>\n De acordo com o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec)9<\/sup>, das oito marcas de chocolates mais vendidas no Brasil \u2014 Arcor, Brasil Cacau, Cacau Show, Garoto, Hershey’s, Kopenhagen, Lacta e Nestl\u00e9 \u2014 a maioria n\u00e3o informa, no r\u00f3tulo, a quantidade de cacau no produto. Nesse contexto, \u00e9 poss\u00edvel que seja mais significativa a quantidade de chocolates com percentual de cacau inferior a 25% do total.<\/p>\n Ainda em conson\u00e2ncia com o Idec, entre os chocolates ao leite, apenas os da Cacau Show t\u00eam o percentual de cacau estampado na embalagem. O teor de cacau tamb\u00e9m n\u00e3o \u00e9 estampado nas embalagens de muitos chocolates meio amargos e amargos: dos oito chocolates meio amargos pesquisados, apenas tr\u00eas t\u00eam a informa\u00e7\u00e3o no r\u00f3tulo: Cacau Show, Hershey’s e Arcor. Entre as marcas de chocolate amargo, duas n\u00e3o t\u00eam o dado: a Kopenhagen (tabletes de 40g e 85g) e a Brasil Cacau (tabletes de 20g e 100g), sendo ambas pertencentes ao mesmo grupo.<\/p>\n A situa\u00e7\u00e3o \u00e9 bastante diferente entre v\u00e1rios chocolates importados vendidos no Brasil. A pesquisa do Idec supramencionada analisou os r\u00f3tulos de seis marcas importadas (Casino Lait D\u00e9gustation, Guylian, Lindt Swiss Classic, Milka, Nestl\u00e9 Crunch e Ritter Sport) e constatou que todos apresentam o teor de cacau, mesmo que em letras reduzidas ou no verso das embalagens.<\/p>\n Considera\u00e7\u00f5es finais<\/strong><\/p>\n O percentual m\u00ednimo de cacau nos chocolates brasileiros \u00e9 um dos desafios para que o Pa\u00eds seja competitivo no mercado internacional do produto. Diante dessa realidade, h\u00e1 debate na C\u00e2mara Setorial do Cacau do Minist\u00e9rio da Agricultura10<\/sup> para que a legisla\u00e7\u00e3o estabele\u00e7a o m\u00ednimo de 35% de cacau no chocolate produzido no Brasil, quantidade que j\u00e1 tem sido observada em pa\u00edses europeus, como mencionado neste estudo.<\/p>\n A falta de informa\u00e7\u00f5es completas nos r\u00f3tulos dos chocolates e dos achocolatados tamb\u00e9m foi objeto de an\u00e1lise recente do Congresso Nacional. A tramita\u00e7\u00e3o do Projeto de Lei da C\u00e2mara Federal n\u00ba 851, de 201111<\/sup>, possibilitou a essa casa parlamentar debater a proibi\u00e7\u00e3o dos termos \u201cchocolate\u201d, \u201cchocolate branco\u201d e \u201cachocolatado\u201d em r\u00f3tulos de produtos que n\u00e3o contenham uma quantidade m\u00ednima de cacau em sua composi\u00e7\u00e3o. Ademais, sugeriu-se, quando da tramita\u00e7\u00e3o desse projeto na Comiss\u00e3o de Defesa do Consumidor da C\u00e2mara, que os produtos denominados \u201cchocolate\u201d, \u201cchocolate branco\u201d e \u201cachocolatado\u201d divulgassem, em suas embalagens e na publicidade, informa\u00e7\u00e3o sobre o percentual de cacau e seus derivados contido na composi\u00e7\u00e3o \u2014 na embalagem, a informa\u00e7\u00e3o deveria ser grafada em tamanho superior a 1\/3 do tamanho da fonte utilizada para grafar a marca do produto.<\/p>\n Diante do exposto, entende-se que \u00e9 poss\u00edvel avan\u00e7ar na legisla\u00e7\u00e3o referente aos chocolates brasileiros, seja no que diz respeito ao percentual m\u00ednimo de cacau no produto, seja no que tange \u00e0s informa\u00e7\u00f5es que devem constar do r\u00f3tulo do chocolate. A quest\u00e3o n\u00e3o \u00e9 proibir produtos com baixo teor de cacau, mas informar corretamente ao consumidor se aquilo que consome \u00e9 chocolate ou se \u00e9 algo que se assemelha ao chocolate. O poder p\u00fablico e a sociedade civil organizada podem apresentar importantes contribui\u00e7\u00f5es nesse processo.<\/p>\n <\/p>\n Esse texto foi publicado originalmente como Boletim Legislativo n\u00ba 24 da Consultoria Legislativa do Senado. Dispon\u00edvel em http:\/\/www12.senado.gov.br\/publicacoes\/estudos-legislativos\/tipos-de-estudos\/boletins-legislativos\/bol24<\/a> <\/em><\/p>\n O autor agradece os coment\u00e1rios do colega de trabalho, Eduardo Sim\u00e3o de Souza Vieira, Consultor Legislativo do Senado Federal.<\/p>\n <\/p>\n ________________<\/p>\n 1<\/sup> Ver http:\/\/observador.pt\/2014\/11\/17\/alerta-global-o-chocolate-esta-esgotar-se\/<\/a>.<\/p>\n 2<\/sup> Mat\u00e9ria dispon\u00edvel em http:\/\/www.dci.com.br\/comercio\/brasil-e-o-quarto-maior-consumidor-de-chocolates-do-mundo-id289053.html<\/a>.<\/p>\n 3<\/sup> Dispon\u00edvel em http:\/\/portal.anvisa.gov.br\/wps\/portal\/anvisa\/home<\/a>.<\/p>\n 4<\/sup> Dispon\u00edvel em VARNAM, A.H.; SUTHERLAND, J. P. Bebidas: <\/em>tecnolog\u00eda, qu\u00edmica y microbiolog\u00eda. Zaragoza: Ed. Acribia, S.A, 1997. v.2, p. 289-294.<\/p>\n 5<\/sup> Ver http:\/\/www.anvisa.gov.br\/anvisalegis\/resol\/12_78_chocolate.htm<\/a>.<\/p>\n 6<\/sup> Ver http:\/\/www.iapmei.pt\/iapmei-leg-03.php?lei=2126<\/a>.<\/p>\n 7<\/sup> Ver http:\/\/delicitas.com.br\/tipos-de-chocolate\/#.VM-0DWd0xjo<\/a> e http:\/\/www.thestoryofchocolate.com \/Savor\/content.cfm?ItemNumber=3454<\/a>.<\/p>\n 8<\/sup> Dispon\u00edvel em http:\/\/economia.uol.com.br\/noticias\/redacao\/2013\/07\/10\/1-em-3-chocolates-nao-e-chocolate-real-por-falta-de-cacau-diz-produtor.htm<\/a>.<\/p>\n 9<\/sup> Ver http:\/\/oglobo.globo.com\/economia\/defesa-do-consumidor\/maioria-dos-chocolates-nao-informa-sobre-quantidade-de-cacau-no-rotulo-diz-pesquisa-do-idec-7901172<\/a>.<\/p>\n