{"id":2337,"date":"2014-11-17T09:22:56","date_gmt":"2014-11-17T12:22:56","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=2337"},"modified":"2014-11-17T10:03:22","modified_gmt":"2014-11-17T13:03:22","slug":"como-fazer-um-ajuste-fiscal-no-governo-federal","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=2337","title":{"rendered":"Como fazer um ajuste fiscal no Governo Federal?"},"content":{"rendered":"
O Governo Federal est\u00e1 com grande desequil\u00edbrio em suas contas. De janeiro a setembro de 2014 o setor p\u00fablico (Uni\u00e3o, Estados e Munic\u00edpios) acumulou um d\u00e9ficit prim\u00e1rio de R$ 15,3 bilh\u00f5es, quando a meta fiscal para o ano era de super\u00e1vit\u00a0 de R$ 99 bilh\u00f5es. Temos, portanto, uma brecha de R$ 114,3 bilh\u00f5es (aproximadamente 2% do PIB) entre a inten\u00e7\u00e3o e a realidade. O d\u00e9ficit nominal (aquele que inclui as despesas com juros) j\u00e1 chegou a 4,9% do PIB, mais que o dobro dos 2,43% do PIB observados a menos de dois anos, em janeiro de 2013. A d\u00edvida bruta do governo geral, que era de 56,7% do PIB em dezembro de 2013,\u00a0 pulou para 61,7% do PIB em setembro de 2014 (5 pontos percentuais do PIB em menos de um ano!)1<\/sup>.<\/p>\n O desequil\u00edbrio fiscal deve ser considerado o problema n\u00famero um a ser enfrentado pelo Governo. O objetivo do presente texto \u00e9 apresentar as linhas gerais do ajuste de que necessita o pa\u00eds.<\/p>\n Deve-se observar, desde j\u00e1, que n\u00e3o necessariamente o ajuste aqui proposto representar\u00e1 sacrif\u00edcio \u00e0 parcela mais pobre da sociedade. \u00c9 equivocada a associa\u00e7\u00e3o entre racionaliza\u00e7\u00e3o de gastos p\u00fablicos e perdas para os mais pobres. Na verdade, como se ver\u00e1 adiante, boa parte do ajuste diz respeito a gastos p\u00fablicos que beneficiam os segmentos mais ricos da sociedade. H\u00e1 espa\u00e7o para um ajuste que n\u00e3o agrave a nossa elevada desigualdade de renda ou que piore os indicadores de pobreza.<\/p>\n A deteriora\u00e7\u00e3o da qualidade de vida dos pobres e miser\u00e1veis ocorrer\u00e1, isto sim, se n\u00e3o for feito qualquer ajuste. A alta infla\u00e7\u00e3o e o crescimento econ\u00f4mico pr\u00f3ximo a zero j\u00e1 est\u00e3o mostrando seus efeitos sobre essa parcela da sociedade: o n\u00famero de pessoas extremamente pobres parou de cair e j\u00e1 mostra inflex\u00e3o positiva (eram 10,08 milh\u00f5es em 2012 e passaram a 10,45 milh\u00f5es em 2013). O mesmo est\u00e1 ocorrendo com a desigualdade de renda, que interrompeu sua trajet\u00f3ria de queda e est\u00e1 estacionado em n\u00edvel ainda alto (\u00edndice de Gini de distribui\u00e7\u00e3o da renda domiciliar per capital em torno de 0,53 desde 2011)2<\/sup>.<\/p>\n Antes de listar as propostas de um ajuste fiscal, \u00e9 preciso compreender por que ele tem import\u00e2ncia vital para a retomada do crescimento e o controle da infla\u00e7\u00e3o. S\u00e3o v\u00e1rios os canais pelos quais o desequil\u00edbrio das contas p\u00fablicas prejudica a economia:<\/p>\n N\u00e3o se pode, portanto, brincar com desequil\u00edbrio fiscal no n\u00edvel em que ele se encontra. \u00c9 preciso lan\u00e7ar medidas de reequil\u00edbrio das contas p\u00fablicas. Acredito que um programa de ajuste deveria se apoiar em tr\u00eas pilares, que devem ser apresentados em conjunto (como um pacote) e postos em pr\u00e1tica simultaneamente:<\/p>\n RECUPERA\u00c7\u00c3O DA CREDIBILIDADE<\/strong><\/p>\n Esta dimens\u00e3o do programa de ajuste consistiria em acabar com a contabilidade criativa e dar transpar\u00eancia \u00e0 real situa\u00e7\u00e3o financeira do setor p\u00fablico. Algumas das medidas listadas a seguir agravariam os dados oficiais no curto prazo, simplesmente porque h\u00e1 d\u00e9ficit escondido nas contas p\u00fablicas. Mas uma pol\u00edtica fiscal cr\u00edvel deve resistir \u00e0 tenta\u00e7\u00e3o de produzir estat\u00edsticas que n\u00e3o reflitam a real situa\u00e7\u00e3o fiscal, sob pena de n\u00e3o conquistar o apoio dos agentes econ\u00f4micos. O simples fato de se anunciar o fim de procedimentos nocivos ao equil\u00edbrio fiscal \u2013 e atuar de acordo! – ainda que n\u00e3o represente melhora nas contas no curto prazo, j\u00e1 cria expectativa positiva em rela\u00e7\u00e3o ao futuro.<\/p>\n As principais medidas nessa \u00e1rea seriam:<\/p>\n AJUSTE DE CURTO PRAZO<\/strong><\/p>\n As medidas de curto prazo s\u00e3o aquelas voltadas a produzir aumento de receita e redu\u00e7\u00e3o de despesa com reflexo imediato nas contas governamentais:<\/p>\n AJUSTE DE LONGO PRAZO<\/strong><\/p>\n CONCLUS\u00d5ES<\/strong><\/p>\n Os pontos aqui esbo\u00e7ados, se adotados em conjunto, dariam aos agentes econ\u00f4micos uma perspectiva de equil\u00edbrio, efici\u00eancia e transpar\u00eancia das contas p\u00fablicas no longo prazo. Isso atuaria no sentido de conter a infla\u00e7\u00e3o e o d\u00e9ficit no balan\u00e7o de pagamentos. Estimularia os investimentos, permitiria a redu\u00e7\u00e3o da taxa de juros de equil\u00edbrio e resultaria em maior crescimento econ\u00f4mico.<\/p>\n Resta, como desafio, argumentar que este n\u00e3o seria um \u201cpacote de arrocho\u201d com consequ\u00eancias negativas aos mais pobres.<\/p>\n Uma breve revis\u00e3o das principais medidas propostas permite constatar que muitas delas, na verdade, desconcentram a renda. \u00c9 o caso das pol\u00edticas que visam restringir as altas remunera\u00e7\u00f5es do Poder Judici\u00e1rio, e praticar uma pol\u00edtica salarial no setor p\u00fablico mais pr\u00f3xima do que se paga no setor privado. Conter a expans\u00e3o do efetivo de servidores p\u00fablicos tamb\u00e9m atuar\u00e1 no sentido da redistribui\u00e7\u00e3o. Parte significativa do funcionalismo est\u00e1 entre os 5% mais ricos do pa\u00eds.<\/p>\n A ado\u00e7\u00e3o de pol\u00edticas voltadas a estimular os servidores p\u00fablicos a serem mais eficientes, bem como os modelos alternativos de presta\u00e7\u00e3o de servi\u00e7os de sa\u00fade e educa\u00e7\u00e3o, resultaria em melhores servi\u00e7os prestados aos mais pobres, que s\u00e3o os maiores usu\u00e1rios desses servi\u00e7os, visto que os mais ricos h\u00e1 muito migraram para os servi\u00e7os privados.<\/p>\n Igual efeito ter\u00e1 a reforma da previd\u00eancia, pois em sua conforma\u00e7\u00e3o atual, o sistema de benef\u00edcios \u00e9 apropriado majoritariamente pela classe m\u00e9dia, em detrimento dos mais pobres. Os projetos de mudan\u00e7as avulsas no sistema previdenci\u00e1rio (na dire\u00e7\u00e3o contr\u00e1ria \u00e0 do ajuste das contas), que aos poucos v\u00e3o sendo aprovados no Congresso, tamb\u00e9m s\u00e3o, muitas vezes, direcionados a grupos de press\u00e3o de classe m\u00e9dia, tendo um custo equivalente ao necess\u00e1rio para tirar um grande contingente de fam\u00edlias da mis\u00e9ria.<\/p>\n A focaliza\u00e7\u00e3o das pol\u00edticas sociais tamb\u00e9m seria um instrumento de fazer mais e melhor em favor dos mais pobres, eliminando-se os \u201cvazamentos\u201d de benef\u00edcios que hoje v\u00e3o para a classe m\u00e9dia.<\/p>\n Tamb\u00e9m no caso dos investimentos em infraestrutura \u00e9 poss\u00edvel buscar um enfoque pr\u00f3-pobre. Um adequado planejamento e hierarquiza\u00e7\u00e3o de prioridades levaria ao aumento de investimentos em \u00e1reas como saneamento b\u00e1sico, remo\u00e7\u00e3o de habita\u00e7\u00f5es de \u00e1reas de risco para conjuntos habitacionais populares e melhorias nos investimentos e gest\u00e3o do transporte p\u00fablico. S\u00e3o evidentes os benef\u00edcios aos mais pobres e \u00e0 classe m\u00e9dia.<\/p>\n A ado\u00e7\u00e3o de monitoramento e avalia\u00e7\u00e3o de programas p\u00fablicos de forma sistem\u00e1tica deixaria claro para a sociedade os programas que, embora aparentem gerar muitos benef\u00edcios, t\u00eam custos elevados. Se submetidas a avalia\u00e7\u00f5es desse tipo, iniciativas do chamado Sistema S, que consomem em torno de R$ 15 bilh\u00f5es por ano, provavelmente se mostrariam caras e ineficientes. O uso dos recursos do imposto sindical e dos programas de treinamento financiados pelo Minist\u00e9rio do Trabalho tamb\u00e9m ficaria mais claro, podendo-se aferir at\u00e9 que ponto s\u00e3o os trabalhadores ou uma elite sindical que se beneficia dos recursos.<\/p>\n A conten\u00e7\u00e3o no ritmo de crescimento do sal\u00e1rio m\u00ednimo n\u00e3o pode ser vista como uma medida de \u201carrocho\u201d contra os pobres. Afinal, em algum momento do tempo o sal\u00e1rio m\u00ednimo ter\u00e1 que parar de subir acima dos demais sal\u00e1rios. Do contr\u00e1rio, no longo prazo ele se tornar\u00e1 um \u201csal\u00e1rio m\u00e1ximo\u201d. Os ganhos em termos de redu\u00e7\u00e3o da pobreza e da desigualdade, decorrentes do reajuste do sal\u00e1rio m\u00ednimo acima da infla\u00e7\u00e3o tendem a ser cada vez menores. Primeiro, porque passar\u00e3o a pressionar a infla\u00e7\u00e3o e retirar renda dos mais pobres.Segundo, porque esse sal\u00e1rio passar\u00e1 a ser cada vez mais pesado para as empresas, desestimulando a contrata\u00e7\u00e3o de trabalhadores pobres menos qualificados (com produtividade abaixo da remunera\u00e7\u00e3o m\u00ednima). Ademais, a medida proposta n\u00e3o \u00e9 de redu\u00e7\u00e3o do valor real do sal\u00e1rio m\u00ednimo, e sim de modera\u00e7\u00e3o na sua taxa de crescimento real.<\/p>\n Por fim, mas n\u00e3o menos importante, o fim dos bilion\u00e1rios subs\u00eddios concedidos pelo Tesouro a grandes empresas, por meio de financiamentos do BNDES e o fim dos subs\u00eddios impl\u00edcitos nas desonera\u00e7\u00f5es de IPI e folha de pagamentos deixar\u00e3o de carrear bilh\u00f5es de reais para o topo da pir\u00e2mide de renda.<\/p>\n ____________________<\/p>\n 1<\/sup> Fonte dos dados: Banco Central do Brasil, Nota para a Imprensa, out 2014. Download:<\/strong><\/p>\n\n
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\n2<\/sup> Fonte de dados: www.ipeadata.gov.br<\/a>
\n3<\/sup> Fonte dos dados: Banco Central do Brasil. Nota para a Imprensa, out. 2014.
\n4<\/sup> Fonte dos dados: Banco Central do Brasil. Nota para a Imprensa, out. 2014.
\n5<\/sup> Fonte dos dados: Secretaria do Tesouro Nacional. Resultado do Tesouro \u2013 S\u00e9rie hist\u00f3rica.
\n6<\/sup> Valor Econ\u00f4mico, 17\/11\/2014.
\n7<\/sup> http:\/\/economia.estadao.com.br\/noticias\/geral,arrecadacao-do-refis-frustra-governo-e-deixa-meta-fiscal-mais-distante-imp-,1555788<\/a>
\n8<\/sup> Fontes: Banco Central do Brasil e Banco Ita\u00fa (2013). \u201cContas p\u00fablicas: dimensionando o impacto das opera\u00e7\u00f5es n\u00e3o recorrentes\u201d.
\n9<\/sup> Fonte: Receita Federal do Brasil \u2013 Desonera\u00e7\u00f5es institu\u00eddas.
\n10<\/sup> Fonte: Valor Econ\u00f4mico, 2\/6\/14.
\n11<\/sup> Fonte: O Globo 7\/10\/14.
\n12<\/sup> Fonte: Folha de S. Paulo 5\/11\/14.
\n13<\/sup> Fonte: www.ipeadata.gov.br
\n14<\/sup> Fonte: http:\/\/epocanegocios.globo.com\/Informacao\/Acao\/noticia\/2014\/11\/caixa-repassa-r-5-bilhoes-em-creditos-podres.html<\/a>
\n15<\/sup> Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional. Resultado do Tesouro Nacional
\n16<\/sup> Estimativas de Marcelo Caetano, com base em dados do IBGE.
\n17<\/sup> Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional. Resultado do Tesouro Nacional
\n18<\/sup> Fonte: Projeto de Lei de Diretrizes Or\u00e7ament\u00e1rias 2015.<\/p>\n