{"id":1920,"date":"2013-07-01T11:12:03","date_gmt":"2013-07-01T14:12:03","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=1920"},"modified":"2013-07-08T09:07:16","modified_gmt":"2013-07-08T12:07:16","slug":"a-petrobras-conseguira-explorar-plenamente-o-pre-sal","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=1920","title":{"rendered":"A Petrobras conseguir\u00e1 explorar plenamente o pr\u00e9-sal?"},"content":{"rendered":"
Em dezembro de 2010, com a publica\u00e7\u00e3o da Lei n\u00ba 12.351, a Petrobras tornou-se protagonista na explora\u00e7\u00e3o do petr\u00f3leo situado na camada do pr\u00e9-sal. Aquela Lei, al\u00e9m de instituir o regime de partilha, conferiu v\u00e1rias prerrogativas para a empresa, onde se pode destacar ter-se tornado operadora \u00fanica de todos os campos licitados, com participa\u00e7\u00e3o m\u00ednima de 30% nos cons\u00f3rcios, e a possibilidade de receber o direito de explora\u00e7\u00e3o de \u00e1reas sem necessitar passar por processos de licita\u00e7\u00e3o.<\/p>\n
Tamb\u00e9m em 2010, a Lei n\u00ba 12.276 cedeu onerosamente \u00e0 Petrobras o direito de explorar 5 bilh\u00f5es de barris de \u00f3leo equivalente (boe), no \u00e2mbito do processo de capitaliza\u00e7\u00e3o da empresa.<\/p>\n
N\u00e3o se sabe ao certo o tamanho do pr\u00e9-sal. As reservas provadas j\u00e1 atingem 15 bilh\u00f5es de boe, mas as estimativas mais pessimistas apontam para um m\u00ednimo de 30 bilh\u00f5es de boe, e as mais otimistas dizem que pode chegar a 100 bilh\u00f5es de boe. Em qualquer cen\u00e1rio, trata-se de uma imensa riqueza, que, para ser explorada, exige muito investimento.<\/p>\n
A Petrobras, operadora \u00fanica de todo o pr\u00e9-sal, ter\u00e1 f\u00f4lego para tanto? \u00c9 dif\u00edcil responder a essa pergunta, mas, mantido o quadro atual, o mais prov\u00e1vel \u00e9 que n\u00e3o.<\/p>\n
Alguns indicadores de rentabilidade da Petrobras mostram uma deteriora\u00e7\u00e3o de sua situa\u00e7\u00e3o financeira. A margem operacional, medida pela rela\u00e7\u00e3o entre o resultado operacional (que desconsidera o resultado financeiro e o pagamento de imposto de renda) e a receita l\u00edquida, era de 29,6% no in\u00edcio de 2006. Depois caiu para 21,3% no final de 2007, recuperou-se para 24,9% no final de 2009 e, a partir da\u00ed, vem caindo continuamente, chegando a 10,3% no 1\u00b0 trimestre deste ano.<\/p>\n
Outro indicador de rentabilidade, o retorno sobre o capital investido (ROIC, na sigla em ingl\u00eas), que consiste da rela\u00e7\u00e3o percentual entre o resultado operacional e o valor do capital investido na empresa, caiu de 29,2%, no in\u00edcio de 2006, para 18%, no in\u00edcio de 2009, 10,5%, no in\u00edcio de 2011, e 4,8%, no 1\u00b0 trimestre deste ano. O ROIC de 4,8% \u00e9 preocupante, pois indica que o retorno dos investimentos feitos na empresa est\u00e1 menor que seu custo de capta\u00e7\u00e3o.<\/p>\n
Gr\u00e1fico 1 \u2013 Indicadores de rentabilidade da Petrobras<\/strong><\/p>\n Outro indicador financeiro que piorou nos \u00faltimos anos foi o n\u00edvel de endividamento. Entre 2008 e 2012, a d\u00edvida l\u00edquida triplicou, apesar de a empresa ter levantado dezenas de bilh\u00f5es de reais na sua opera\u00e7\u00e3o de capitaliza\u00e7\u00e3o em 2010. Ou seja, mesmo tendo feito uma venda bilion\u00e1ria de a\u00e7\u00f5es, a empresa ainda teve que ampliar seu endividamento.<\/p>\n Quando se compara o n\u00edvel de endividamento com o EBITDA1<\/sup> (que \u00e9 o resultado antes do pagamento de impostos, deprecia\u00e7\u00e3o e custos financeiros), a d\u00edvida l\u00edquida passou de 0,8 vezes o EBITDA do ano, em 2008, para 2,8 vezes, em 2012. A pr\u00f3pria Petrobras considera que um n\u00edvel confort\u00e1vel de endividamento seria de 2,5 vezes o EBITDA.<\/p>\n A perda de rentabilidade da empresa nos \u00faltimos anos refletiu-se no pre\u00e7o de suas a\u00e7\u00f5es. A Tabela 1 mostra que, desde 2008, as a\u00e7\u00f5es da Petrobras v\u00eam rendendo menos que o Ibovespa. J\u00e1 em rela\u00e7\u00e3o a seus pares, medido pelo Amex Oil Index<\/em>, a Petrobras somente teve desempenho melhor em 2009. Destaque-se que, desde 2010, enquanto o pre\u00e7o m\u00e9dio das a\u00e7\u00f5es das empresas petrol\u00edferas vem aumentando, o valor das a\u00e7\u00f5es da Petrobras s\u00f3 tem ca\u00eddo. Em junho de 2013, a cota\u00e7\u00e3o da a\u00e7\u00e3o da Petrobras encontra\u2013se nos n\u00edveis m\u00ednimos verificados desde a crise de 2008, cerca de 53% abaixo da cota\u00e7\u00e3o do final de 2009.<\/p>\n Tabela 1: Evolu\u00e7\u00e3o da cota\u00e7\u00e3o das a\u00e7\u00f5es da Petrobras, do Ibovespa e do Amex Oil Index (varia\u00e7\u00e3o %)<\/strong><\/p>\n Identificamos quatro motivos que explicam essa deteriora\u00e7\u00e3o das finan\u00e7as da empresa:<\/p>\n i) \u00a0Capitaliza\u00e7\u00e3o da empresa que gerou novas obriga\u00e7\u00f5es de explora\u00e7\u00e3o;<\/p>\n ii) Defasagem dos pre\u00e7os internos e externos de derivados de petr\u00f3leo;<\/p>\n iii) Obrigatoriedade de investimentos em refinarias;<\/p>\n iv) Pol\u00edticas de conte\u00fado local m\u00ednimo.<\/p>\n A seguir, descreveremos sucintamente cada um desses problemas.<\/p>\n I \u2013 A capitaliza\u00e7\u00e3o da Petrobras<\/p>\n Em 2009, o Poder Executivo enviou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei n\u00ba 5.941, que tinha por objetivo autorizar a capitaliza\u00e7\u00e3o da Petrobras. Tal capitaliza\u00e7\u00e3o era necess\u00e1ria dentro da l\u00f3gica de estatiza\u00e7\u00e3o da explora\u00e7\u00e3o do pr\u00e9-sal. Afinal, como a Petrobras passava a ser respons\u00e1vel por, no m\u00ednimo, 30% da explora\u00e7\u00e3o do pr\u00e9-sal, teria de ser capaz de obter recursos para os investimentos necess\u00e1rios. Para tanto, a capitaliza\u00e7\u00e3o traria dois benef\u00edcios: i) aumentaria de imediato o caixa da Petrobras; e ii) reduziria a rela\u00e7\u00e3o endividamento\/patrim\u00f4nio l\u00edquido, o que facilitaria a contrata\u00e7\u00e3o de novos empr\u00e9stimos pela estatal.<\/p>\n Ocorre que, em vez de a Uni\u00e3o simplesmente aportar capital na empresa, o que aumentaria o endividamento do setor p\u00fablico, optou-se pelo mecanismo de cess\u00e3o onerosa. A Uni\u00e3o, propriet\u00e1ria de todas as riquezas do subsolo, cederia onerosamente o direito de explora\u00e7\u00e3o de cinco bilh\u00f5es de barris e receberia, em troca, a\u00e7\u00f5es da empresa.<\/p>\n O contrato de cess\u00e3o onerosa foi firmado em 3 de setembro de 2010. A Petrobras pagou R$ 74,8 bilh\u00f5es pelo direito de explorar os cinco bilh\u00f5es de barris, sendo o pagamento feito por meio de a\u00e7\u00f5es. No total, a Petrobras emitiu 2.369 milh\u00f5es de a\u00e7\u00f5es ordin\u00e1rias e 1.901 milh\u00f5es de a\u00e7\u00f5es preferenciais, o que lhe rendeu R$ 120,25 bilh\u00f5es e se transformou na maior capitaliza\u00e7\u00e3o que j\u00e1 houve em todo o mundo. Tendo em vista que quase R$ 75 bilh\u00f5es foram gastos para a compra do direito de explora\u00e7\u00e3o, a capitaliza\u00e7\u00e3o rendeu, em caixa para a empresa, um total de R$ 45,5 bilh\u00f5es.<\/p>\n H\u00e1 motivos para questionar se a capitaliza\u00e7\u00e3o cumpriu o objetivo de aumentar a capacidade de investimento da Petrobras. Isso porque, em primeiro lugar, somente R$ 45 bilh\u00f5es dos R$ 120 bilh\u00f5es de aumento de capital social se transformaram em caixa da empresa. Em segundo lugar, porque, na opera\u00e7\u00e3o a Petrobras adquiriu o direito\/obriga\u00e7\u00e3o de explorar cinco bilh\u00f5es de boe. Assim, parte significativa do caixa gerado pode ser suficiente apenas para explorar essas novas \u00e1reas, n\u00e3o acrescentando recursos novos para explorar os campos para os quais j\u00e1 haviam sido firmados contratos de concess\u00e3o e, principalmente, para novos campos na \u00e1rea do pr\u00e9-sal.<\/p>\n De fato, considerando somente o caixa, a opera\u00e7\u00e3o de capitaliza\u00e7\u00e3o foi in\u00fatil: de acordo com o Plano de Investimentos para o per\u00edodo 2013-2017, a \u00e1rea de cess\u00e3o onerosa ir\u00e1 requerer investimentos de US$ 27,6 bilh\u00f5es, ou R$ 60,7 bilh\u00f5es, utilizando a cota\u00e7\u00e3o de R$ 2,20 por d\u00f3lar. Se fossem corrigidos pela Selic, os R$ 45 bilh\u00f5es arrecadados em 2010 valeriam, atualmente, R$ 58,6 bilh\u00f5es. Ou seja, todo o caixa gerado pelo processo de capitaliza\u00e7\u00e3o da Petrobras sequer seria suficiente para financiar os investimentos na \u00e1rea de cess\u00e3o onerosa durante o per\u00edodo 2013-2017.<\/p>\n Mas a capitaliza\u00e7\u00e3o, ao aumentar o capital social, tamb\u00e9m permite maior contrata\u00e7\u00e3o de empr\u00e9stimos, tendo em vista que os credores tendem a emprestar mais para empresas com maior patrim\u00f4nio l\u00edquido. Nesse sentido, a capitaliza\u00e7\u00e3o gerou folga adicional de cerca de R$ 35 bilh\u00f5es na capacidade de financiamento da estatal. Apesar de ser um n\u00famero elevad\u00edssimo, \u00e9 bem abaixo de suas necessidades de recursos. O Plano de Neg\u00f3cios e Gest\u00e3o (PNG) da empresa prev\u00ea investimentos de US$ 236,5 bilh\u00f5es para o quadri\u00eanio 2012-2016, ou US$ 47,3 bilh\u00f5es por ano.<\/p>\n Tendo em vista o grau de endividamento e o caixa da empresa, pode-se concluir que a capacidade de investimento da Petrobras na \u00e1rea do pr\u00e9-sal encontra-se severamente limitada.<\/p>\n \u00c9 importante esclarecer que o processo de capitaliza\u00e7\u00e3o da empresa poderia ser feito de outra forma, o que liberaria mais recursos para a Petrobras investir nas \u00e1reas j\u00e1 contratadas e em futuras \u00e1reas de partilha. Como o governo n\u00e3o pretendia lan\u00e7ar t\u00edtulos p\u00fablicos, o que aumentaria seu endividamento, os recursos necess\u00e1rios para capitalizar a empresa poderiam ser obtidos via leil\u00e3o da \u00e1rea da cess\u00e3o onerosa. Esse mecanismo, inclusive, reduziria a probabilidade de o direito de explora\u00e7\u00e3o ser vendido abaixo do pre\u00e7o justo, o que \u00e9 algo a n\u00e3o ser descartado, tendo em vista a diverg\u00eancia de c\u00e1lculos apresentados entre as empresas certificadoras.<\/p>\n II – A defasagem de pre\u00e7os internos e externos de derivados do petr\u00f3leo<\/p>\n A principal causa da queda de rentabilidade da Petrobras foi a defasagem entre os pre\u00e7os dos derivados de petr\u00f3leo no Brasil e no exterior, que levou ao preju\u00edzo da atividade de refino de petr\u00f3leo e venda de derivados.<\/p>\n Segundo estimativas da pr\u00f3pria Petrobras, desde 2010, os pre\u00e7os dos derivados do petr\u00f3leo no Brasil t\u00eam se situado entre 10% e 20% abaixo dos cobrados no mercado internacional. Os n\u00fameros mais recentes, referentes a mar\u00e7o deste ano, mostram defasagem de cerca de 10%, ap\u00f3s os reajustes de pre\u00e7o da gasolina e do diesel ocorridos no in\u00edcio deste ano. Como desde ent\u00e3o a cota\u00e7\u00e3o do d\u00f3lar subiu cerca de 12% e a do petr\u00f3leo caiu aproximadamente 4%, a defasagem estaria agora (junho de 2013) em cerca de 18%, ou seja, a cota\u00e7\u00e3o m\u00e9dia dos derivados no Brasil \u00e9 cerca de 82% da cota\u00e7\u00e3o no exterior. Assim, o reajuste necess\u00e1rio para equalizar os pre\u00e7os seria de aproximadamente 22%.<\/p>\n O resultado dessa pol\u00edtica de conten\u00e7\u00e3o de pre\u00e7os \u00e9 uma queda substancial na lucratividade da Petrobras. Em 2011, a \u00e1rea de abastecimento da empresa (respons\u00e1vel pelo refino) gerou preju\u00edzo de R$ 10 bilh\u00f5es. Em 2012, o preju\u00edzo aumentou para R$ 23 bilh\u00f5es. O mau desempenho da \u00e1rea de abastecimento foi o principal fator explicativo da queda de R$ 12 bilh\u00f5es no lucro l\u00edquido e de R$ 8 bilh\u00f5es no EBITDA da Petrobras entre os dois anos.<\/p>\n As consequ\u00eancias do controle de pre\u00e7os dos derivados n\u00e3o podem ser menosprezadas. O governo, ao fixar pre\u00e7os muito baixos para os derivados, estimula o consumo, o que exige da Petrobras aumentar as importa\u00e7\u00f5es de petr\u00f3leo. Isso aumenta o preju\u00edzo da empresa, reduzindo o lucro e o EBITDA. A redu\u00e7\u00e3o do lucro, por sua vez, reduz o interesse dos acionistas em fazer futuros aportes de capital na empresa. J\u00e1 o menor EBITDA reduz o acesso a novos financiamentos ou os torna mais caros. Devido \u00e0 pol\u00edtica de fixa\u00e7\u00e3o do pre\u00e7o dos derivados abaixo do pre\u00e7o internacional, quanto maior for a import\u00e2ncia do setor de abastecimento na Petrobras, menor ser\u00e1 a capacidade de investimento em outras \u00e1reas, com destaque para a explora\u00e7\u00e3o do pr\u00e9-sal.<\/p>\n \u00c9 interessante avaliar por que o governo interv\u00e9m no pre\u00e7o dos derivados que saem da refinaria, mas n\u00e3o interv\u00e9m no pre\u00e7o da bomba de gasolina, que \u00e9 o que afeta diretamente o bolso do consumidor e, portanto, a infla\u00e7\u00e3o. A raz\u00e3o provavelmente est\u00e1 na estrutura de mercado.<\/p>\n Ao contr\u00e1rio da extra\u00e7\u00e3o e comercializa\u00e7\u00e3o, em que h\u00e1 v\u00e1rios participantes, a Petrobras det\u00e9m praticamente o monop\u00f3lio de refino do petr\u00f3leo no Brasil, respondendo por cerca de 98% da produ\u00e7\u00e3o. Gera-se ent\u00e3o um c\u00edrculo vicioso: a Uni\u00e3o, controladora da empresa, pode determinar o pre\u00e7o que bem entender para o derivado, ainda que esse pre\u00e7o n\u00e3o seja lucrativo. Isso gera incerteza para os investidores privados, que, dessa forma, n\u00e3o ir\u00e3o investir em refinarias. Com a aus\u00eancia de investidores privados, o monop\u00f3lio da Petrobras se refor\u00e7a e o governo se sente mais \u00e0 vontade para controlar o pre\u00e7o no refino.<\/p>\n \u00c9 interessante comparar a situa\u00e7\u00e3o do refino com a comercializa\u00e7\u00e3o final, um mercado bem mais competitivo, em que a Petrobras det\u00e9m participa\u00e7\u00e3o de 38%. Nesse caso, o controle sobre o pre\u00e7o final da gasolina ao consumidor, fixando-o abaixo do custo de produ\u00e7\u00e3o, al\u00e9m de gerar inevit\u00e1veis questionamentos judiciais por parte das empresas privadas que atuam no setor, levaria tamb\u00e9m ao desabastecimento no m\u00e9dio e longo prazos. Isso porque, com o setor privado saindo da atividade de comercializa\u00e7\u00e3o, a Petrobras (ou outra empresa estatal) teria de providenciar a oferta dos 62% de mercado que o setor privado atualmente prov\u00ea, o que pode ser invi\u00e1vel.<\/p>\n III \u2013 Obrigatoriedade de investimentos em refinarias<\/p>\n Vimos anteriormente que, em decorr\u00eancia de uma pol\u00edtica governamental de fixa\u00e7\u00e3o de pre\u00e7os, a atividade de refino vem sendo deficit\u00e1ria. Entretanto, mesmo na aus\u00eancia de interven\u00e7\u00e3o do governo, seria de se esperar que a atividade de refino tivesse menor lucratividade do que a de extra\u00e7\u00e3o.<\/p>\n De acordo com a teoria econ\u00f4mica, quando h\u00e1 barreiras \u00e0 entrada, reduz-se a competi\u00e7\u00e3o no setor e surge oportunidade de se auferirem lucros extraordin\u00e1rios, acima daqueles que normalmente se obt\u00e9m. Aplicando esses conceitos \u00e0 ind\u00fastria do petr\u00f3leo, a barreira \u00e0 entrada \u00e9 a licen\u00e7a de explora\u00e7\u00e3o. N\u00e3o basta uma empresa querer extrair petr\u00f3leo do fundo do mar, \u00e9 necess\u00e1rio, antes, obter uma licen\u00e7a para explor\u00e1-lo. Como essa licen\u00e7a n\u00e3o \u00e9 concedida para todos os que a desejarem2<\/sup>, cria-se uma barreira \u00e0 entrada de novos concorrentes. J\u00e1 para o refino, qualquer empresa com capacidade t\u00e9cnica e financeira, pode ser autorizada a atuar no setor, tornando-o mais competitivo que a extra\u00e7\u00e3o.<\/p>\n Os n\u00fameros parecem confirmar a teoria. Nos Estados Unidos, de janeiro a maio de 2013, a margem bruta3<\/sup> m\u00e9dia das refinarias foi de 18%4<\/sup>. Registre-se que, em 2013, as refinarias t\u00eam obtido maior margem do que em anos anteriores devido ao aumento da demanda, via exporta\u00e7\u00f5es. De acordo com a Petrobras5<\/sup>, a margem l\u00edquida das principais companhias de petr\u00f3leo na atividade de explora\u00e7\u00e3o era em torno de 25%. Para a Petrobras, a margem era ainda maior, acima de 40%!<\/p>\n Dos resultados acima, pode-se inferir que, se a Petrobras fosse uma empresa privada, provavelmente iria dirigir todos os seus esfor\u00e7os para as atividades de explora\u00e7\u00e3o e produ\u00e7\u00e3o. Ocorre que seu controlador, a Uni\u00e3o, imp\u00f5e investimentos tamb\u00e9m em refinarias, que v\u00eam gerando d\u00e9ficits em fun\u00e7\u00e3o do controle de pre\u00e7os. De qualquer maneira, mesmo na melhor das hip\u00f3teses, se o mercado de gasolina fosse livre, o retorno das refinarias tenderia a ser mais baixo do que o da atividade de explora\u00e7\u00e3o e produ\u00e7\u00e3o.<\/p>\n O plano de investimentos da Petrobras para o per\u00edodo 2013-2017 prev\u00ea que, dos US$ 236,7 bilh\u00f5es a serem investidos, 27,4% (ou seja, US$ 64,8 bilh\u00f5es) ser\u00e3o direcionados para as atividades chamadas de downstream<\/em>. Desse total, US$ 33,2 bilh\u00f5es ser\u00e3o aplicados diretamente na expans\u00e3o da capacidade de refino. Obviamente, todos esses recursos a serem investidos nas atividades dowstream<\/em> poderiam ser aplicados nas atividades de explora\u00e7\u00e3o e produ\u00e7\u00e3o, mais lucrativas.<\/p>\n Da forma como o mercado se encontra estruturado, n\u00e3o resta op\u00e7\u00e3o para o controlador exceto a de impor a constru\u00e7\u00e3o de refinarias para a Petrobras. O ideal, entretanto, seria viabilizar maior participa\u00e7\u00e3o do capital privado no refino, mas, para tanto, seria necess\u00e1rio que o governo desse garantias para potenciais interessados de que n\u00e3o regularar\u00e1 o pre\u00e7o da gasolina ou de que permitir\u00e1 \u00e0s empresas exportar livremente os derivados. Se o governo entender que \u00e9 necess\u00e1rio baratear o pre\u00e7o da gasolina ou de outros derivados, deve faz\u00ea-lo por meio de subs\u00eddios. \u00c9 a forma mais transparente de regular pre\u00e7os, fazendo com que toda a sociedade, por meio do Congresso Nacional quando da discuss\u00e3o do or\u00e7amento, possa avaliar o melhor uso dos recursos p\u00fablicos, comparando as vantagens de reduzir o pre\u00e7o da gasolina e de outros derivados do petr\u00f3leo frente a outros gastos p\u00fablicos, como educa\u00e7\u00e3o, sa\u00fade, infraestrutura ou gastos sociais.<\/p>\n IV \u2013 Exig\u00eancia de conte\u00fado local m\u00ednimo<\/p>\n Desde a abertura da atividade de explora\u00e7\u00e3o do petr\u00f3leo ao setor privado em 1997, tem havido uma preocupa\u00e7\u00e3o em garantir um conte\u00fado local (CL) m\u00ednimo. Essa preocupa\u00e7\u00e3o \u00e9 usualmente justificada de duas formas. Em primeiro lugar, existe o argumento no n\u00edvel macroecon\u00f4mico, de que a demanda por insumos e equipamentos produzidos no Brasil sustenta a demanda agregada dom\u00e9stica, al\u00e9m de evitar que a riqueza do petr\u00f3leo se esvaia para outros pa\u00edses. Do ponto de vista microecon\u00f4mico, as pol\u00edticas de CL seriam essenciais para o desenvolvimento de uma ind\u00fastria nacional tecnologicamente avan\u00e7ada, o que, no m\u00e9dio prazo, em decorr\u00eancia das externalidades positivas geradas, repercutiria favoravelmente sobre a produtividade da ind\u00fastria como um todo.<\/p>\n N\u00e3o cabe aqui discutir a pertin\u00eancia dos argumentos pela defesa de CL m\u00ednimo. Vale, contudo, alertar que est\u00e3o longe de serem consensuais. Do ponto de vista macroecon\u00f4mico, o que sustenta a demanda agregada s\u00e3o as pol\u00edticas monet\u00e1ria e fiscal. Os recursos alocados na produ\u00e7\u00e3o de equipamentos para a ind\u00fastria petroleira, na aus\u00eancia de pol\u00edticas protecionistas, estariam empregados em outros setores, sustentando a demanda agregada da mesma forma. Em rela\u00e7\u00e3o ao desenvolvimento tecnol\u00f3gico, cabe questionar nossas vantagens comparativas em produzir itens com alto conte\u00fado tecnol\u00f3gico e, principalmente, qual a melhor pol\u00edtica. Muito provavelmente, uma pol\u00edtica de subs\u00eddios (que poderiam ser financiados com o aumento da arrecada\u00e7\u00e3o governamental, conforme argumentaremos \u00e0 frente) seria mais eficiente.<\/p>\n Mesmo que a exig\u00eancia de CL m\u00ednimo seja defens\u00e1vel, n\u00e3o podem ser ignorados seus impactos negativos sobre a Petrobras, pelo menos no curto e m\u00e9dio prazos, que se traduzem em maior custo de aquisi\u00e7\u00e3o de insumos e equipamentos. Esse custo parece ser ignorado pela pr\u00f3pria empresa, talvez refletindo mais os interesses de seu controlador (a Uni\u00e3o).<\/p>\n Por exemplo, em maio de 2012, o blog da Petrobras \u201cFatos e Dados\u201d publicou mat\u00e9ria enaltecendo a entrega do navio Jo\u00e3o C\u00e2ndido \u2013 o primeiro constru\u00eddo no Nordeste para o Programa de Moderniza\u00e7\u00e3o e Expans\u00e3o da Frota (PROMEF) \u2013 para a Transpetro, subsidi\u00e1ria da Petrobras respons\u00e1vel pelo transporte do petr\u00f3leo. Na reportagem, destaca-se o investimento de R$ 10,8 bilh\u00f5es do Promef, o elevado \u00edndice de conte\u00fado local do navio (70%, ante uma meta inicial de 65%) e a gera\u00e7\u00e3o de 60 mil empregos nos estaleiros6<\/sup>. N\u00e3o houve qualquer men\u00e7\u00e3o ao custo que a Petrobras incorreria se tivesse adquirido o navio de um fornecedor estrangeiro.<\/p>\n Mas h\u00e1 fortes evid\u00eancias de que a pol\u00edtica de CL m\u00ednimo imp\u00f5e custos n\u00e3o desprez\u00edveis para o setor. Em fevereiro deste ano, a Petrobras solicitou \u00e0 Ag\u00eancia Nacional de Petr\u00f3leo, G\u00e1s Natural e Biocombust\u00edveis (ANP) o relaxamento dos r\u00edgidos crit\u00e9rios de conte\u00fado local. Em seu pedido, argumentou que em 34 itens relacionados \u00e0 explora\u00e7\u00e3o onshore<\/em> e offshore<\/em> n\u00e3o havia oferta local dispon\u00edvel.<\/p>\n O maior risco \u00e9 de n\u00e3o haver fornecedor nacional capaz de oferecer o equipamento ou servi\u00e7o demandado pela empresa petroleira com pre\u00e7o, prazo e qualidade adequados. Esse risco torna-se maior diante do forte aumento da demanda. Em 2005, por exemplo, o investimento da Petrobras foi de US$ 6 bilh\u00f5es. Para 2016, a demanda estimada, considerando CL de 55%, \u00e9 de US$ 18 bilh\u00f5es.<\/p>\n A Organiza\u00e7\u00e3o Nacional da Ind\u00fastria do Petr\u00f3leo (Onip) contratou a empresa de consultoria Booz & Co. para avaliar a competitividade dos fornecedores nacionais para a ind\u00fastria de petr\u00f3leo. As conclus\u00f5es do estudo mostram que a competitividade da ind\u00fastria nacional \u00e9 muito baixa, elevando o custo da pol\u00edtica de CL. Em rela\u00e7\u00e3o aos pa\u00edses em desenvolvimento, temos desvantagens no que diz respeito ao custo da mat\u00e9ria-prima e componentes b\u00e1sicos, ao custo de m\u00e3o de obra e aos impostos. J\u00e1 em rela\u00e7\u00e3o aos pa\u00edses desenvolvidos, perdemos na produtividade do processo de<\/p>\n manufatura (incluindo tecnologia e capacita\u00e7\u00e3o de m\u00e3o de obra), no custo de capital, nos impostos e na escala.<\/p>\n Em consequ\u00eancia de nossa baixa competitividade, o fornecedor nacional tem um custo mais elevado. Por exemplo, uma caldeira naval brasileira custa 48% a mais que uma chinesa e uma bomba sea water lift<\/em> nacional \u00e9 49% mais cara do que a equivalente norte-americana. Ao fazerem cota\u00e7\u00f5es de jaqueta, m\u00f3dulo deck e esteiras e condutores, observou-se que o produtor nacional pedia pre\u00e7os 80%, 20% e 200% maior que do concorrente estrangeiro! Adicionalmente, enquanto as cota\u00e7\u00f5es de fornecedores estrangeiros apresentaram dispers\u00e3o de 8%, as dos fornecedores nacionais tiveram dispers\u00e3o de 110%! De acordo com o estudo, o custo adicional de contratar um fornecedor nacional variou de 188% a 456%.<\/p>\n N\u00e3o encontramos qualquer avalia\u00e7\u00e3o que explicitasse os custos, mas h\u00e1 fortes evid\u00eancias de que eles n\u00e3o s\u00e3o nada desprez\u00edveis. Se considerarmos que as compras de fornecedores locais por parte da Petrobras atingir\u00e3o US$ 18 bilh\u00f5es a partir de 2016, e que tais compras custam 50% a mais do que as realizadas no exterior, estamos falando em um custo adicional de US$ 6 bilh\u00f5es anuais. Ou seja, a Petrobras poderia despender US$ 12 bilh\u00f5es, em vez dos US$ 18 bilh\u00f5es programados. Essa diferen\u00e7a de US$ 6 bilh\u00f5es poderia ser utilizada para expandir mais rapidamente a produ\u00e7\u00e3o. Poderia tamb\u00e9m ser distribu\u00edda na forma de lucros, o que renderia ao governo e ao BNDES algo em torno de US$ 2,8 bilh\u00f5es anuais (correspondente \u00e0 participa\u00e7\u00e3o de 46% que det\u00eam no capital social da empresa). Esses recursos, por sua vez, poderiam ser empregados em programas que tivessem maior retorno social ou financeiro, inclusive em subs\u00eddios para as empresas aplicarem em ci\u00eancia e tecnologia.<\/p>\n Conclus\u00e3o<\/strong><\/p>\n Em s\u00edntese, as diversas intromiss\u00f5es que v\u00eam sendo impostas pelo governo t\u00eam criado s\u00e9rias dificuldades para a Petrobras manter lucratividade adequada e, com isso, dispor de recursos para investir no pr\u00e9-sal na velocidade que seria desej\u00e1vel. Destaque-se, entretanto, que, independentemente dos problemas que enfrenta, dificilmente a Petrobras \u2013 como, de resto, qualquer empresa \u2013 teria musculatura suficiente para se responsabilizar por, pelo menos, 30% do pr\u00e9-sal, conforme previsto em Lei. As constantes interven\u00e7\u00f5es nos neg\u00f3cios da Petrobras constituem-se, dessa forma, em um problema adicional para outro que j\u00e1 estava criado: a Petrobras ter se tornado operadora \u00fanica de todas as \u00e1reas do pr\u00e9-sal a serem partilhadas.<\/p>\n ________________<\/p>\n 1<\/sup> Sigla para \u201cEarnings Before Interest, Taxes, Depreciation, and Amortization\u201d. Download:<\/em><\/strong><\/p>\n<\/a><\/strong><\/p>\n
<\/a><\/strong><\/p>\n
\n2<\/sup> A exig\u00eancia de uma licen\u00e7a, per si<\/em>, n\u00e3o implica barreiras \u00e0 entrada. Por exemplo, para se abrir um restaurante, \u00e9 necess\u00e1rio obter uma licen\u00e7a das autoridades sanit\u00e1rias. Nesse caso, qualquer empresa que satisfa\u00e7a os requisitos impostos pela autoridade sanit\u00e1ria obter\u00e1 o direito de abrir o restaurante. No caso do petr\u00f3leo, a licen\u00e7a n\u00e3o est\u00e1 condicionada somente ao preenchimento de determinados pr\u00e9-requisitos, mas a uma limita\u00e7\u00e3o no n\u00famero de empresas que podem operar em determinada \u00e1rea. Por exemplo, em cada bloco licitado, somente poder\u00e1 atuar um operador.
\n3<\/sup> A margem bruta corresponde \u00e0 diferen\u00e7a entre o pre\u00e7o de venda da refinaria e o custo do \u00f3leo bruto. Assim, a margem bruta incorpora os custos de processamento do petr\u00f3leo.
\n4<\/sup> Os valores podem ser acessados no seguinte site: http:\/\/energyalmanac.ca.gov\/gasoline\/margins\/<\/a>.
\n5<\/sup> Ver apresenta\u00e7\u00e3o \u201cPetrobras at a Glance\u201d, dispon\u00edvel em: http:\/\/www.investidorpetrobras.com.br\/en\/presentations\/petrobras-at-a-glance.htm<\/a>.
\n6<\/sup> A reportagem est\u00e1 dispon\u00edvel em: http:\/\/fatosedados.blogspetrobras.com.br\/2012\/05\/25\/primeiro-navio-petroleiro-construido-no-nordeste-inicia-operacoes\/<\/a>.<\/p>\n