{"id":1723,"date":"2013-02-18T09:37:29","date_gmt":"2013-02-18T12:37:29","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=1723"},"modified":"2013-03-26T09:18:32","modified_gmt":"2013-03-26T12:18:32","slug":"a-interferencia-no-preco-da-gasolina-e-um-bom-instrumento-para-se-controlar-a-inflacao","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=1723","title":{"rendered":"A interfer\u00eancia no pre\u00e7o da gasolina \u00e9 um bom instrumento para se controlar a infla\u00e7\u00e3o?"},"content":{"rendered":"
Ap\u00f3s meses de discuss\u00f5es, de not\u00edcias desencontradas e especula\u00e7\u00f5es, finalmente, no final de janeiro deste ano, foi anunciado o reajuste de 6,4% para o pre\u00e7o da gasolina e de 5,5% para o diesel. Trata-se de um reajuste que vinha sendo pleiteado pela Petrobras j\u00e1 h\u00e1 bastante tempo. No m\u00ednimo, desde 2011, os jornais publicam declara\u00e7\u00f5es do Ministro de Minas e Energia dizendo que n\u00e3o haver\u00e1 reajuste no pre\u00e7o da gasolina. Em junho de 2012, o pre\u00e7o cobrado pela refinaria aumentou em 7,8% para a gasolina e em 3,9% no diesel, mas esse reajuste n\u00e3o chegou ao consumidor final porque, simultaneamente, o governo zerou a al\u00edquota da CIDE que incidia sobre os combust\u00edveis.<\/p>\n
De acordo com especialistas, o reajuste foi insuficiente diante do aumento do pre\u00e7o internacional do petr\u00f3leo e da deprecia\u00e7\u00e3o do real que ocorreu no segundo semestre de 2012. Tanto \u00e9 que, ap\u00f3s seu an\u00fancio, o valor das a\u00e7\u00f5es da Petrobras caiu quase 5%. Claramente, o objetivo do governo em postergar o aumento do pre\u00e7o da gasolina e em faz\u00ea-lo em n\u00edvel insuficiente para equiparar os pre\u00e7os dom\u00e9sticos ao pre\u00e7o internacional \u00e9 tentar segurar a infla\u00e7\u00e3o. H\u00e1 aqui certamente uma mistura de pragmatismo \u2013 politicamente, \u00e9 melhor represar a infla\u00e7\u00e3o controlando os pre\u00e7os do que via instrumentos convencionais de conten\u00e7\u00e3o de demanda agregada, como aumento da taxa de juros \u2013 com uma ideologia que defende maior interven\u00e7\u00e3o sobre os pre\u00e7os. Tamb\u00e9m pode pesar o temor de vivenciarmos novamente os duros anos dos choques do petr\u00f3leo.<\/p>\n
Ap\u00f3s o primeiro choque (embora n\u00e3o necessariamente ele tenha sido respons\u00e1vel por tudo que ocorreu a partir da\u00ed), em 1973, a infla\u00e7\u00e3o mudou de patamar e a taxa de crescimento caiu pela metade (felizmente, na \u00e9poca, o crescimento vinha entre 8% e 10% ao ano, de forma que cair pela metade n\u00e3o era assim t\u00e3o tr\u00e1gico). Ap\u00f3s o segundo choque do petr\u00f3leo, em 1979, (novamente, sem responsabiliz\u00e1-lo integralmente pelo que se sucedeu), a infla\u00e7\u00e3o disparou, ultrapassando pela primeira vez os 100% anuais, e o Brasil mergulhou em forte recess\u00e3o.<\/p>\n
Tal preocupa\u00e7\u00e3o, contudo, n\u00e3o se justifica mais. Em primeiro lugar, porque a magnitude do reajuste do pre\u00e7o internacional do petr\u00f3leo (ou mesmo do pre\u00e7o dom\u00e9stico, em reais) \u00e9 muito inferior \u00e0 observada na \u00e9poca dos choques do petr\u00f3leo. Em 1973, o pre\u00e7o do barril quase triplicou em um espa\u00e7o de tr\u00eas meses. No segundo choque, o aumento foi da ordem de 2,5 vezes. Os reajustes agora t\u00eam sido bem menos intensos. Em 2010, por exemplo, o barril do \u00f3leo cru flutuou entre US$ 70 e US$ 80. Em 2012, o pre\u00e7o flutuou, na maior parte do tempo, entre US$ 90 e US$ 105.<\/p>\n
Mais importante do que a menor intensidade de reajuste, \u00e9 o fato de haver instrumentos de pol\u00edtica monet\u00e1ria capazes de lidar com fortes mudan\u00e7as de pre\u00e7os relativos. Desde 1999, com a introdu\u00e7\u00e3o do regime de metas para infla\u00e7\u00e3o no Brasil, foi poss\u00edvel derrubar mitos de que alguns pre\u00e7os, simplesmente, n\u00e3o poderiam subir muito. Por exemplo, uma forte deprecia\u00e7\u00e3o cambial (da ordem, digamos, de 30%) era vista como um catalisador de um surto inflacion\u00e1rio.<\/p>\n
O regime de metas (no Brasil e em v\u00e1rios outros pa\u00edses) mostrou que uma deprecia\u00e7\u00e3o cambial nada mais \u00e9 do que uma mudan\u00e7a de pre\u00e7os relativos, em que opre\u00e7os dos bens comercializ\u00e1veis (aquilo que pode ser exportado ou importado) aumenta em rela\u00e7\u00e3o ao pre\u00e7o dos bens n\u00e3o comercializ\u00e1veis (aqueles que s\u00e3o muito dif\u00edceis de serem exportados ou importados, como servi\u00e7os).\u00a0 Uma pol\u00edtica monet\u00e1ria bem conduzida \u00e9 capaz de fazer com que haja forte realinhamento desses pre\u00e7os relativos com impacto relativamente moderado na infla\u00e7\u00e3o. Basta, para tanto, controlar a demanda agregada de forma a evitar, ou pelo menos, moderar substancialmente, o reajuste dos pre\u00e7os dos n\u00e3o comercializ\u00e1veis.Com a gasolina n\u00e3o \u00e9 diferente. Um reajuste do pre\u00e7o da gasolina pode ser contrabalan\u00e7ado por um reajuste menor dos demais pre\u00e7os, com impacto relativamente pequeno sobre a infla\u00e7\u00e3o.<\/p>\n
O problema, portanto, n\u00e3o \u00e9 o risco inflacion\u00e1rio que eventual reajuste da gasolina provocaria. O que existe \u00e9 uma decis\u00e3o de n\u00e3o deixar para a pol\u00edtica monet\u00e1ria a tarefa de garantir a mudan\u00e7a de pre\u00e7os relativos com infla\u00e7\u00e3o baixa e est\u00e1vel (leia-se, eventual aumento de taxa de juros1<\/sup>). Ocorre que, como tudo em economia, a op\u00e7\u00e3o de manter o pre\u00e7o da gasolina constante (ou reajust\u00e1-lo abaixo do que deveria) tem seus custos, e esses custos s\u00e3o mais altos do que um eventual aumento da taxa de juros.<\/p>\n Ao impedir a mudan\u00e7a de pre\u00e7os relativos, o governo est\u00e1 fazendo com que o mercado emita sinais incorretos para os consumidores. As pessoas e firmas tomam suas decis\u00f5es baseando-se nos pre\u00e7os, que, em \u00faltima an\u00e1lise, refletem os custos de produ\u00e7\u00e3o do bem. Se o pre\u00e7o do bem aumenta, significa que \u00e9 necess\u00e1rio mais recursos da sociedade (capital, trabalho, terra, etc.) para produzi-lo. \u00c9 salutar, portanto, que as pessoas e firmas passem a substituir esse bem por outros mais baratos. Quando o pre\u00e7o n\u00e3o reage ao aumento de custos, cessa o movimento de substitui\u00e7\u00e3o, gerando inefici\u00eancia e perda de bem estar.<\/p>\n No caso do petr\u00f3leo, especificamente, foi o aumento do pre\u00e7o internacional do barril que estimulou a explora\u00e7\u00e3o de novas \u00e1reas (como o Mar do Norte), novas descobertas (como o pr\u00e9-sal brasileiro) e o uso de energias alternativas (como o nosso programa de \u00e1lcool). O que teria ocorrido, em n\u00edvel mundial, se houvesse um \u00f3rg\u00e3o regulador que tivesse impedido o aumento do pre\u00e7o do petr\u00f3leo nos \u00faltimos 40 anos2<\/sup>? O uso do petr\u00f3leo teria sido bem mais intenso e, provavelmente, as reservas j\u00e1 teriam se exaurido ou estariam pr\u00f3ximas a isso. O pior, n\u00e3o ter\u00edamos desenvolvido nenhuma tecnologia capaz de utilizar alguma energia alternativa (se, com todo o est\u00edmulo decorrente do aumento do pre\u00e7o do petr\u00f3leo, ainda n\u00e3o dispomos de energia alternativa, sem esse est\u00edmulo, certamente, a situa\u00e7\u00e3o estaria ainda pior). Adicionalmente, o meio ambiente estaria mais deteriorado, tendo em vista que o pre\u00e7o mais baixo intensificaria o uso do hidrocarboneto.<\/p>\n A forma como a ind\u00fastria petrol\u00edfera no Brasil vem se organizando torna ainda mais grave a limita\u00e7\u00e3o ao reajuste do pre\u00e7o da gasolina. A Petrobras adquire petr\u00f3leo ao pre\u00e7o internacional (ou pode vender o petr\u00f3leo que produz ao pre\u00e7o internacional) e \u00e9 obrigada a vender a gasolina no mercado dom\u00e9stico a um custo mais baixo. De acordo com especialistas, o n\u00e3o reajuste do pre\u00e7o da gasolina levou a um preju\u00edzo de R$ 34 bilh\u00f5es na \u00e1rea do abastecimento 3<\/sup>. Se a Petrobras fosse uma empresa privada, isso j\u00e1 seria ruim, por reduzir a arrecada\u00e7\u00e3o de impostos. Em sendo empresa estatal, al\u00e9m de menores impostos, o lucro distribu\u00eddo para a Uni\u00e3o (seu acionista majorit\u00e1rio) tende a reduzir.<\/p>\n O problema, entretanto, \u00e9 ainda mais grave. A Lei n\u00ba 12.351, de 2010, praticamente reestatizou a explora\u00e7\u00e3o de petr\u00f3leo no Brasil para as \u00e1reas do pr\u00e9-sal e para aquelas que vierem a ser consideradas estrat\u00e9gicas (que, provavelmente, ser\u00e3o todos os campos com alto potencial de produ\u00e7\u00e3o que vierem a ser descobertos). No regime de partilha, institu\u00eddo por aquela Lei, o Minist\u00e9rio de Minas e Energia poder\u00e1 contratar a explora\u00e7\u00e3o diretamente com a Petrobras, sem licita\u00e7\u00e3o. E, onde houver licita\u00e7\u00e3o, a Petrobras participar\u00e1 com, no m\u00ednimo, 30% do cons\u00f3rcio. Adicionalmente, a Lei n\u00ba 12.276, de 2010, autorizou \u00e0 Uni\u00e3o a ceder onerosamente (e sem licita\u00e7\u00e3o) o direito de explora\u00e7\u00e3o de 5 bilh\u00f5es de barris para a Petrobras.<\/p>\n Ora, o petr\u00f3leo n\u00e3o jorra de gra\u00e7a do subsolo. Estimativas feitas no final de 2012 mostravam necessidades de investimento da ordem de US$ 90 bilh\u00f5es somente em quatro anos. At\u00e9 2020, estimativas da Petrobras apontam para uma necessidade total de US$ 1,2 trilh\u00e3o. Ao segurar o pre\u00e7o do petr\u00f3leo, o governo est\u00e1 limitando a capacidade de a Petrobras se capitalizar e, com isso, explorar em sua plenitude a riqueza do pr\u00e9-sal. \u00c9 claro que uma maior abertura do mercado, permitindo participa\u00e7\u00e3o maior de outras empresas poderia amenizar substancialmente o problema. Mas limitar as receitas da Petrobras no marco regulat\u00f3rio atual \u00e9 reduzir dramaticamente a probabilidade de pleno aproveitamento do pr\u00e9-sal.<\/p>\n Certamente, n\u00e3o explorar plenamente o pr\u00e9-sal e, com isso, deixar de arrecadar impostos e participa\u00e7\u00f5es governamentais (somente em royalties<\/em> e participa\u00e7\u00e3o especial, estima-se que o pr\u00e9-sal poder\u00e1 gerar cerca de R$ 50 bilh\u00f5es por ano, at\u00e9 o final da d\u00e9cada) ser\u00e1 muito mais prejudicial para nossa economia e bem-estar do que um eventual \u2013 e, enfatize-se aqui o eventual \u2013 aumento da taxa de juros para impedir que o impacto inflacion\u00e1rio do reajuste da gasolina e \u00f3leo diesel se propague para outros setores da economia.<\/p>\n Em resumo, utilizar o pre\u00e7o da gasolina como instrumento de controle de pre\u00e7os j\u00e1 \u00e9 desaconselh\u00e1vel em situa\u00e7\u00f5es normais. No Brasil, com as prerrogativas dadas \u00e0 Petrobras na explora\u00e7\u00e3o do petr\u00f3leo, torna-se temer\u00e1rio.<\/p>\n _____________<\/p>\n 1<\/sup> O reajuste da gasolina, per si<\/em>, provavelmente seria insuficiente para obrigar o Banco Central a aumentar a taxa de juros. O problema \u00e9 a situa\u00e7\u00e3o atual, em que se vive um ambiente de maior infla\u00e7\u00e3o e deteriora\u00e7\u00e3o das expectativas. Nesse cen\u00e1rio, um reajuste da gasolina pode desestabilizar as expectativas de forma mais intensa do que ocorreria, digamos, h\u00e1 cinco anos.<\/p>\n 2<\/sup> Ainda que parte do aumento tenha se devido \u00e0 carteliza\u00e7\u00e3o do setor, com a cria\u00e7\u00e3o da OPEC, a maior parte da evolu\u00e7\u00e3o dos pre\u00e7os do petr\u00f3leo no longo prazo pode ser explicada pelos movimentos usuais de oferta e demanda em um mercado concorrencial.<\/p>\n 3<\/sup> Vide mat\u00e9ria dispon\u00edvel no link abaixo: http:\/\/www.brasil247.com\/pt\/247\/portfolio\/93391\/Especialista-lamenta-aumento-pequeno-da-gasolina.htm<\/a><\/p>\n Download:<\/strong><\/em><\/p>\n