{"id":16,"date":"2011-02-21T02:44:26","date_gmt":"2011-02-21T05:44:26","guid":{"rendered":"http:\/\/economia-e-governo.braudel.org.br\/?p=16"},"modified":"2011-03-14T19:21:52","modified_gmt":"2011-03-14T22:21:52","slug":"deve-o-brasil-persistir-no-fomento-aos-biocombustiveis","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=16","title":{"rendered":"Deve o Brasil persistir no fomento aos biocombust\u00edveis mesmo com a descoberta da volumosa reserva de petr\u00f3leo do pr\u00e9-sal?"},"content":{"rendered":"
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O frisson<\/em> causado pela descoberta das reservas do Pr\u00e9-sal \u2013 estimadas entre quarenta e cinquenta bilh\u00f5es de barris equivalentes de petr\u00f3leo e que colocaria o Brasil, no m\u00ednimo, entre as dez maiores reservas do mundo \u2013 trouxe \u00e0 tona a discuss\u00e3o apaixonada do nacionalismo e da aplica\u00e7\u00e3o das riquezas minerais do Brasil. Nesse contexto, encontra-se o debate do papel dos biocombust\u00edveis na pol\u00edtica energ\u00e9tica nacional.<\/p>\n A precifica\u00e7\u00e3o correta da reserva do Pr\u00e9-sal pelo mercado, a escolha de um modelo explorat\u00f3rio apropriado e a utiliza\u00e7\u00e3o dos recursos para promo\u00e7\u00e3o do desenvolvimento do Pa\u00eds s\u00e3o quest\u00f5es cruciais, mas que n\u00e3o elidem a necessidade de o Brasil continuar com a mais bem-sucedida pol\u00edtica de energia renov\u00e1vel do mundo \u2013 o fomento aos biocombust\u00edveis.<\/p>\n Inicialmente, cabe destacar que h\u00e1 riscos e incertezas no processo de extra\u00e7\u00e3o de petr\u00f3leo das reservas do Pr\u00e9-sal que n\u00e3o devem ser desprezados, ainda que o Brasil tenha sido capaz de desenvolver tecnologia para explora\u00e7\u00e3o de petr\u00f3leo em \u00e1guas profundas, colocando-o como l\u00edder em prospec\u00e7\u00e3o nessas condi\u00e7\u00f5es.<\/p>\n Mesmo que os desafios tecnol\u00f3gicos sejam vencidos, a explora\u00e7\u00e3o plena do Pr\u00e9-sal levar\u00e1 alguns anos. Al\u00e9m disso, o volume de extra\u00e7\u00e3o di\u00e1rio ir\u00e1 crescer de modo progressivo, o que leva \u00e0 necessidade da exist\u00eancia de outras fontes energ\u00e9ticas complementares.<\/p>\n Em segundo lugar, \u00e9 importante n\u00e3o se olvidar que parte importante das reservas de petr\u00f3leo do mundo se localiza em \u00e1reas de instabilidade pol\u00edtica, o que tem gerado flutua\u00e7\u00f5es de pre\u00e7o[1]. Al\u00e9m disso, uma taxa de extra\u00e7\u00e3o de 85 milh\u00f5es de barris por dia indicaria que o petr\u00f3leo mundial pode ser exaurido em 40 anos[2]. Adicionalmente, a quest\u00e3o ambiental tratada reiteradamente em f\u00f3runs internacionais mostra que os pa\u00edses ter\u00e3o de mudar suas posturas para combater o aquecimento global, com ou sem um bom tratado internacional. Essas raz\u00f5es seriam por si s\u00f3 determinantes para que o Brasil sopesasse cuidadosamente a import\u00e2ncia da inser\u00e7\u00e3o dos biocombust\u00edveis em sua matriz energ\u00e9tica nacional.<\/p>\n Al\u00e9m das quest\u00f5es de geopol\u00edtica e tecnol\u00f3gica retromencionadas, faz-se premente, tamb\u00e9m, uma an\u00e1lise focada na import\u00e2ncia do setor sucroalcooleiro para o desenvolvimento sustent\u00e1vel do Pa\u00eds. Sob esse fulcro, sete raz\u00f5es internas principais emergem para que o Brasil persista com uma pol\u00edtica proativa para os biocombust\u00edveis, qualquer que seja o contexto macroecon\u00f4mico.<\/p>\n Primeira, as experi\u00eancias com biocombust\u00edveis no Brasil j\u00e1 t\u00eam mais de um s\u00e9culo e constituem-se em um verdadeiro feito tecnol\u00f3gico, ambiental, econ\u00f4mico, social e pol\u00edtico do Brasil<\/strong>. Ademais, a produ\u00e7\u00e3o, processamento e distribui\u00e7\u00e3o de biocombust\u00edveis no Pa\u00eds contaram com a parceria da sociedade e do Estado que desenvolveram cultivares de cana-de-a\u00e7\u00facar adaptados ao clima e solo brasileiros e tecnologia nas usinas e em toda cadeia para produ\u00e7\u00e3o eficiente de a\u00e7\u00facar, \u00e1lcool e bioenergia, mais recentemente.<\/p>\n Segunda, o setor sucroalcooleiro tem grande import\u00e2ncia econ\u00f4mica para o Brasil<\/strong>. Sozinho representou cerca de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2008, ou seja, uma produ\u00e7\u00e3o da ordem de US$ 28,2 bilh\u00f5es, equivalente a um quarto do PIB do Kwait para aquele ano[3]. Ademais, a arrecada\u00e7\u00e3o de impostos agregados foi estimada em US$ 6,86 bilh\u00f5es (equivalente a cerca de 6% da arrecada\u00e7\u00e3o do Imposto de Renda em 2008)[4].<\/p>\n Terceira, o setor sucroalcooleiro \u00e9 um grande gerador de empregos e paga sal\u00e1rios compat\u00edveis com o mercado de trabalho agr\u00edcola brasileiro.<\/strong> Nas atividades de produ\u00e7\u00e3o de \u00e1lcool, incluindo o plantio, 465.236 trabalhadores (cerca de 8,5 vezes o n\u00famero de funcion\u00e1rios da Petrobras em 2008[5]) s\u00e3o empregados em 25 estados.Os \u00fanicos Estados que n\u00e3o est\u00e3o envolvidos na produ\u00e7\u00e3o do setor s\u00e3o Roraima e Amap\u00e1[6]. Al\u00e9m disso, em 2007, o trabalhador de cana-de-a\u00e7\u00facar recebeu o segundo maior sal\u00e1rio m\u00e9dio entre os trabalhadores rurais, ficando atr\u00e1s apenas do trabalhador da soja, que, em geral, tem maior grau de educa\u00e7\u00e3o.<\/p>\n Quarta, os biocombust\u00edveis brasileiros s\u00e3o respons\u00e1veis pela redu\u00e7\u00e3o de emiss\u00e3o de CO2<\/sub> na atmosfera<\/strong>. Estimativas indicam que o \u00e1lcool emite 89% menos CO2<\/sub> que a gasolina. Ademais, que a emiss\u00e3o de gases do efeito estufa, entre 1990 e 2006, teria sido 10% maior se n\u00e3o tivesse sido utilizado o etanol no Brasil (essas contas excluem a emiss\u00e3o devido \u00e0s queimadas). Outro dado surpreendente indica que, do in\u00edcio do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) da Organiza\u00e7\u00e3o das Na\u00e7\u00f5es Unidas (ONU), em julho de 2005, at\u00e9 julho de 2009, o etanol brasileiro evitou a emiss\u00e3o de gases de efeito estufa equivalente a 60% dos cr\u00e9ditos de carbono gerados por esse mecanismo no mundo![7]<\/p>\n Quinta, os biocombust\u00edveis brasileiros contribuem para melhoria da vida da popula\u00e7\u00e3o nas grandes cidades e para redu\u00e7\u00e3o do custo com a sa\u00fade<\/strong>. Inicialmente cabe destacar que, gra\u00e7as ao uso do \u00e1lcool anidro, que \u00e9 adicionado \u00e0 gasolina, p\u00f4de ser poss\u00edvel a substitui\u00e7\u00e3o completa do chumbo tetraetila \u2013 produto cancer\u00edgeno, que era usado para aumentar a octanagem da gasolina e como anticorrosivo nos motores. Al\u00e9m disso, estudos indicam que se o etanol fosse substitu\u00eddo por gasolina, somente na cidade de S\u00e3o Paulo, haveria 416 mortes a mais por ano e 25.680 interna\u00e7\u00f5es, o que ampliaria o custo com a sa\u00fade em US$ 138,1 milh\u00f5es.[8]<\/p>\n Sexta, os biocombust\u00edveis podem contribuir para ampliar a produ\u00e7\u00e3o energ\u00e9tica brasileira de forma limpa<\/strong>. O Brasil apresentou uma matriz energ\u00e9tica com 45,3% de energia renov\u00e1vel em 2008, a mais limpa do mundo. O fomento aos biocombust\u00edveis pode ajudar a manter a matriz energ\u00e9tica brasileira limpa. Entre os benef\u00edcios da bioeletricidade podem ser destacados: tempo de constru\u00e7\u00e3o reduzido; baixo impacto ambiental; o per\u00edodo de safra \u00e9 complementar \u00e0 gera\u00e7\u00e3o das hidroel\u00e9tricas, portanto a bioeletricidade pode ser produzida em per\u00edodo seco, quando as hidrel\u00e9tricas produzem menos; e maior proximidade com o sistema el\u00e9trico interligado[9]. N\u00e3o se pode desprezar que o potencial de cogera\u00e7\u00e3o de energia el\u00e9trica a partir do baga\u00e7o seja da ordem uma e meia vez a capacidade de gera\u00e7\u00e3o da Usina Hidrel\u00e9trica de Itaipu.<\/p>\n S\u00e9tima, os biocombust\u00edveis podem contribuir para fortalecer a ind\u00fastria nacional, gerar empregos e renda de forma sustent\u00e1vel para o Brasil.<\/strong> A produ\u00e7\u00e3o de biocombust\u00edveis no Pa\u00eds conseguiu responder a todas as demandas, induziu desenvolvimento tecnol\u00f3gico \u2013 a ponto de, inicialmente, provocar o desenvolvimento do carro a \u00e1lcool nacional e, em 2003, o primeiro carro bicombust\u00edvel \u2013 e cumpriu importante papel na redu\u00e7\u00e3o dos impactos ambientais. Al\u00e9m disso, promoveu importante papel no desenvolvimento de usinas e equipamentos nacionais, fazendo do pa\u00eds l\u00edder mundial no setor. A persist\u00eancia nessa estrat\u00e9gia pode consolidar ainda mais a posi\u00e7\u00e3o brasileira.<\/p>\n Por fim, mas n\u00e3o menos importante, espera-se que o Brasil se torne um dos maiores pa\u00edses do mundo neste s\u00e9culo. Proje\u00e7\u00f5es do Banco Goldman Sachs<\/em>, posi\u00e7\u00e3o novembro de 2007, indicam que o Pa\u00eds poderia ser maior do que qualquer economia europeia depois de 2030 e superaria o Jap\u00e3o em 2040. A tend\u00eancia \u00e9 que o Pa\u00eds se firme como a quarta economia do mundo at\u00e9 meados deste s\u00e9culo, atr\u00e1s apenas da China, \u00cdndia e Estados Unidos[10].<\/p>\n Portanto, o crescimento econ\u00f4mico e desenvolvimento do Brasil ir\u00e3o demandar quantidades de energia crescentes, que poder\u00e3o ser supridas pela explora\u00e7\u00e3o das reservas do Pr\u00e9-sal, mas tamb\u00e9m, com seguran\u00e7a, pelos biocombust\u00edveis. O Estado brasileiro n\u00e3o pode desconsiderar o investimento, a pesquisa e o know-how<\/em> na \u00e1rea de biocombust\u00edveis desenvolvidos em mais de um s\u00e9culo no Brasil. Esse grande patrim\u00f4nio foi conquistado \u00e0 base da sinergia entre a iniciativa privada e o Estado. Assim, \u00e0 luz dos argumentos expendidos, entende-se que a participa\u00e7\u00e3o dos biocombust\u00edveis na matriz energ\u00e9tica brasileira deve ser fomentada, ainda que estejamos sentados sobre um mar de petr\u00f3leo do Pr\u00e9-sal.<\/p>\n Downloads:<\/em><\/strong><\/p>\n \n \n [2] Sauer, I. L. (2008) O petr\u00f3leo \u00e9 nosso, o pr\u00e9-sal \u00e9 nosso, a Petrobras \u00e9 nossa. Cadernos Aslegis n\u00ba 35 \u2013 A explora\u00e7\u00e3o do Pr\u00e9-sal<\/em>, Bras\u00edlia.<\/p>\n [3] The World Bank: World Development Indicators database, 1 July 2009. Gross domestic product (2008)<\/em>.<\/p>\n [4] Neves, M. F., Trombin, V. G., Cons\u00f4li, M. A. (2008) Mapeamento e Quantifica\u00e7\u00e3o do Setor Sucroenerg\u00e9tico em 2008<\/em>. MARKESTRAT\/FUNDACE, S\u00e3o Paulo.<\/p>\n [5] Hip\u00f3tese de a Petrobras ter 55 mil funcion\u00e1rios.<\/p>\n [6] Moraes, M. A. F. D., Costa, C. C., Guilhoto, J. J. M., Souza, L. G. A., Oliveira, F. C. R. (2009) Externalidades Sociais dos Diferentes Combust\u00edveis no Brasil. http:\/\/www.unica.com.br\/downloads\/estudosmatrizenergetica\/pdf\/Matriz_Social_Moraes2.pdf<\/a>.<\/p>\n [7] Macedo, I. C., Meira Filho, L. G. (2009) Uso do etanol contribui para reduzir aquecimento global. http:\/\/www.unica.com.br\/downloads\/estudosmatrizenergetica\/<\/a>.<\/p>\n [8] Saldiva, P. H. N., Andrade M. F., Miraglia S. G. E. K., Andr\u00e9 P. A. (2009) Etanol e sa\u00fade humana: uma abordagem a partir das emiss\u00f5es atmosf\u00e9ricas. http:\/\/www.unica.com.br\/downloads\/estudosmatrizenergetica\/pdf\/Matriz_Social_Saldiva4.pdf<\/a>.<\/p>\n\n
[1] Mello, F. O. T., Paulillo, L. F., Vian, C. E. F. (2007) O biodiesel no Brasil: panorama, perspectivas e desafios. Informa\u00e7\u00f5es Econ\u00f4micas<\/em>, 37 (1).<\/p>\n