{"id":1207,"date":"2012-05-20T22:06:43","date_gmt":"2012-05-21T01:06:43","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=1207"},"modified":"2012-05-20T22:06:43","modified_gmt":"2012-05-21T01:06:43","slug":"por-que-renegociar-a-divida-estadual-e-municipal","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=1207","title":{"rendered":"Por que renegociar a d\u00edvida estadual e municipal?"},"content":{"rendered":"
Este site j\u00e1 descreveu o problema da d\u00edvida dos estados com a Uni\u00e3o no texto Como evoluiu a d\u00edvida estadual nos \u00faltimos dez anos?<\/span><\/em><\/a>. O presente texto volta ao tema buscando responder uma quest\u00e3o espec\u00edfica: por que se deve renegociar a d\u00edvida dos estados e munic\u00edpios com a Uni\u00e3o?<\/p>\n A d\u00edvida dos estados e munic\u00edpios com a Uni\u00e3o estava, ao final de abril de 2012, em R$ 438 bilh\u00f5es, o que equivalia a 10,6% do PIB. Trata-se de um montante elevado, e cujas condi\u00e7\u00f5es de pagamento ou risco de inadimpl\u00eancia t\u00eam forte impacto sobre a economia.<\/p>\n Essa d\u00edvida \u00e9 o resultado de um bem sucedido acordo pol\u00edtico realizado ao final dos anos 90, e vem sendo um dos sustent\u00e1culos da estabilidade econ\u00f4mica do Pa\u00eds. \u00c0quela \u00e9poca, a maioria dos estados e os munic\u00edpios de maior porte estavam em p\u00e9ssima situa\u00e7\u00e3o financeira, com d\u00edvidas elevadas, sobre as quais incidiam altas taxas de juros, e que precisavam ser refinanciadas quase diariamente. O Governo Federal ofereceu-se para assumir essa d\u00edvida. Vale dizer, o Governo Federal passaria a pagar a d\u00edvida aos credores originais (bancos nacionais e estrangeiros, empresas estatais, entre outros). E os estados e munic\u00edpios passariam a dever ao Governo Federal.<\/p>\n Para os governos estaduais e municipais foi um acordo vantajoso. A d\u00edvida, que era de curto prazo, passou a ser paga em trinta anos. Foi concedido um desconto no valor total da d\u00edvida (vari\u00e1vel para cada estado, em geral um pouco acima de 10%). A taxa de juros e a corre\u00e7\u00e3o monet\u00e1ria estabelecidas eram, \u00e0 \u00e9poca, mais baixos que as taxas de mercado, de modo que o custo da d\u00edvida caiu. Al\u00e9m disso, fixou-se que os estados e munic\u00edpios pagariam, no m\u00e1ximo, um percentual fixo de suas receitas a t\u00edtulo de presta\u00e7\u00e3o (em geral fixado em 13% das respectivas receitas). Assim, por exemplo, se o valor da presta\u00e7\u00e3o a pagar fosse de R$ 12, mas o limite m\u00e1ximo de 13% da receita fosse igual a R$ 8, o estado pagaria apenas os R$ 8, e os R$ 4 restantes seriam agregados ao saldo devedor da d\u00edvida. Isso impedia que as receitas estaduais fossem excessivamente consumidas pela d\u00edvida. Em contrapartida, surgia o risco de, ao final do contrato, ainda haver um saldo devedor a pagar. Por isso, criou-se um prazo adicional de 10 anos para a quita\u00e7\u00e3o desse res\u00edduo.<\/p>\n Para o Governo Federal tamb\u00e9m foi um bom acordo. Isso porque os estados que aderissem ficavam obrigados a cumprir um programa de ajuste fiscal, controlando seus d\u00e9ficits e ajudando o governo federal no esfor\u00e7o de gera\u00e7\u00e3o de super\u00e1vit prim\u00e1rio, instrumento central para manter a d\u00edvida p\u00fablica agregada (federal e estadual) sob controle e, tamb\u00e9m, para controlar a infla\u00e7\u00e3o.<\/p>\n Se o acordo foi bom para todos, por que os estados e munic\u00edpios t\u00eam reclamado tanto, demandando uma revis\u00e3o do acordo? Ser\u00e1, de fato, necess\u00e1rio renegociar os termos dessa d\u00edvida?<\/p>\n A resposta a essa \u00faltima pergunta parece ser positiva, por dois motivos: (1) as taxas de juros de mercado ca\u00edram e isso n\u00e3o se refletiu nos contratos da d\u00edvida estadual e municipal; (2) h\u00e1 alguns estados e um munic\u00edpio cuja d\u00edvida est\u00e1 em trajet\u00f3ria explosiva, com baix\u00edssima possibilidade de ser efetivamente paga nos termos atuais. Vejamos cada um desses pontos.<\/p>\n Os juros da d\u00edvida<\/span><\/strong><\/p>\n As taxas de juros da economia ca\u00edram bastante desde o momento em que foram assinados os contratos entre a Uni\u00e3o e os estados e munic\u00edpios (entre 1996 e 2001). \u00c0 \u00e9poca, a taxa Selic, que constitui o custo de financiamento do Governo Federal, era muito superior \u00e0 corre\u00e7\u00e3o monet\u00e1ria mais os juros fixados no contrato dos estados e munic\u00edpios. Tais contratos t\u00eam como corre\u00e7\u00e3o monet\u00e1ria o \u00cdndice Geral de Pre\u00e7os \u2013 Disponibilidade Interna (IGP-DI) mais uma taxa fixa de juros, que varia entre 6% e 9% ao ano.\u00a0 Ou seja, o Governo Federal tomava recursos no mercado pagando uma taxa Selic, que era maior do que IGP-DI + 6% a.a., usava os recursos para quitar os d\u00e9bitos dos estados e munic\u00edpios com os credores originais, e s\u00f3 cobrava dos estados e munic\u00edpios IGP-DI+6% a.a.. Logo, o Governo Federal estava subsidiando os estados e munic\u00edpios.<\/p>\n Por\u00e9m, ao longo dos anos a melhoria da situa\u00e7\u00e3o macroecon\u00f4mica permitiu significativa queda da taxa Selic, que caiu de um m\u00e1ximo de 46% a.a., em outubro de 1997, para 9% a.a., em maio de 2012. E os contratos das d\u00edvidas estaduais e municipais permaneceram com a mesma taxa de juros. Ou seja, o subs\u00eddio de juros foi diminuindo ao longo dos anos e, mais recentemente, o Governo Federal est\u00e1 cobrando dos estados e munic\u00edpios uma taxa de juros que supera a taxa Selic.<\/p>\n <\/strong><\/p>\n O Gr\u00e1fico 1 mostra a diferen\u00e7a das taxas acumuladas, tomando 1995 como ano base. Temos que se o contrato de refinanciamento das d\u00edvidas estaduais e municipais tivesse previsto a Selic como taxa de juros, e n\u00e3o o IGP-DI + 6% ao ano (maioria dos contratos), ou IGP-DI + 7,5% ao ano (contrato de MG, AL e PA), a d\u00edvida teria crescido com maior intensidade. Somente o\u00a0 pior dos contratos (IGP-DI + 9% ao ano \u2013 aplic\u00e1vel somente para a Prefeitura de S\u00e3o Paulo) teve varia\u00e7\u00e3o acumulada superior \u00e0 Selic. Ou seja, ao longo dos 15 anos de contrato j\u00e1 cumpridos, os estados e munic\u00edpios (exceto a Prefeitura de S\u00e3o Paulo) receberam relevante subs\u00eddio, se comparada a taxa paga com o custo de financiamento da Uni\u00e3o.<\/p>\n Gr\u00e1fico 1 \u2013 Varia\u00e7\u00e3o acumulada da Selic vs. IGP-DI mais juros: 1996-2011<\/strong><\/p>\n Fonte: Banco Central do Brasil, dados elaborados pelo autor<\/p>\n Todavia, com a expressiva queda da Selic nos \u00faltimos anos, em per\u00edodos recentes a Selic representou custo mais elevado que o IGP-DI mais taxa fixa de juros.<\/p>\n O Gr\u00e1fico 2 apresenta a diferen\u00e7a entre o IGP-DI mais juros fixos (nas tr\u00eas op\u00e7\u00f5es: 6%, 7,5% e 9% ao ano) e a Taxa Selic para diferentes per\u00edodos de tempo, desde o per\u00edodo 2004-2011 at\u00e9 o per\u00edodo 2010-2011. Valores positivos indicam que os custos do refinanciamento da d\u00edvida superaram a Selic. O que se percebe \u00e9 que, com raras exce\u00e7\u00f5es, no per\u00edodo mais recente, o custo da d\u00edvida por IGP-DI mais taxa de juros fixa superou o custo representado pela Taxa Selic.<\/p>\n <\/strong><\/p>\n Gr\u00e1fico 2 \u2013 Diferen\u00e7a acumulada entre o IGP-DI mais taxa de juros fixa e a\u00a0 Selic para diversos per\u00edodos de tempo(% ao ano)<\/strong><\/p>\n Fonte: Banco Central do Brasil, dados elaborados pelo autor.<\/p>\n Portanto, a primeira quest\u00e3o relevante que se estabelece \u00e9 que as condi\u00e7\u00f5es macroecon\u00f4micas vigentes \u00e0 \u00e9poca da assinatura dos contratos mudaram para melhor, o que permitiu a queda da taxa de juros de equil\u00edbrio da economia brasileira. Essa melhoria n\u00e3o se refletiu nos contratos de d\u00edvida dos Estados. Para que isso aconte\u00e7a, \u00e9 necess\u00e1rio que se reveja tanto o indexador da d\u00edvida (IGP-DI) quanto a taxa de juro fixa dos contratos.<\/p>\n Outro problema, n\u00e3o diretamente tratado neste artigo, refere-se ao indexador utilizado para corrigir as d\u00edvidas. O IGP-DI \u00e9 um \u00edndice geral, fortemente influenciado pelos pre\u00e7os no atacado, que, por sua vez, s\u00e3o fortemente sens\u00edveis \u00e0 varia\u00e7\u00e3o do d\u00f3lar. O ideal seria escolher um \u00edndice de infla\u00e7\u00e3o que melhor acompanhasse a evolu\u00e7\u00e3o nominal das receitas estaduais. Um \u00edndice de pre\u00e7os ao consumidor, como o IPCA, pode servir melhor a esse prop\u00f3sito.<\/p>\n A sustentabilidade da d\u00edvida<\/span><\/strong><\/p>\n Outra quest\u00e3o relevante \u00e9 saber se todos os estados e munic\u00edpios ser\u00e3o capazes de pagar a d\u00edvida at\u00e9 o final do contrato. Caso isso n\u00e3o seja verdadeiro, ent\u00e3o h\u00e1 a sinaliza\u00e7\u00e3o de uma poss\u00edvel crise da d\u00edvida, que deve ser evitada com a devida anteced\u00eancia, para que n\u00e3o sejam amplificados seus efeitos adversos sobre a economia.<\/p>\n Aqui entra um ponto importante. Como afirmando no in\u00edcio do texto, os contratos t\u00eam uma cl\u00e1usula que imp\u00f5e um limite m\u00e1ximo ao valor da presta\u00e7\u00e3o mensal, em geral em torno de 13% da receita do estado ou munic\u00edpio, com o restante n\u00e3o pago sendo agregado ao saldo devedor. Em alguns casos, os valores integrais das presta\u00e7\u00f5es eram muito superiores ao limite m\u00e1ximo, o que resultou em forte ac\u00famulo de saldo devedor, indicando a impossibilidade de pagamento da d\u00edvida dentro do prazo contratual.<\/p>\n A situa\u00e7\u00e3o dos entes federados \u00e9 hoje bastante heterog\u00eanea. Para mostrar uma fotografia dessa heterogeneidade, foi elaborado um exerc\u00edcio matem\u00e1tico simplificado.<\/p>\n Embora n\u00e3o sejam divulgados dados detalhados da d\u00edvida de cada estado, \u00e9 poss\u00edvel fazer um exerc\u00edcio, considerando-se que o valor total da d\u00edvida de cada estado \u00e9 todo ele devido ao Governo Federal. Frente \u00e0 limita\u00e7\u00e3o dos dados, tomou-se como proxy<\/em> para tal d\u00edvida os n\u00fameros relativos \u00e0 D\u00edvida Consolidada L\u00edquida (DCL). Em termos agregados, a d\u00edvida renegociada equivale a 85% da DCL dos Estados. Assim, as estimativas apresentadas na coluna (A) da Tabela 1 usam um saldo devedor que, em m\u00e9dia, \u00e9 um pouco superior ao valor efetivamente devido \u00e0 Uni\u00e3o. Os resultados devem ser tomados apenas como ilustrativos, tendo em vista a precariedade dos dados acima referida.<\/p>\n As colunas (B), (C) e (D) apresentam as condi\u00e7\u00f5es contratuais negociadas por cada ente federado. A coluna (E) exp\u00f5e a Receita L\u00edquida Real (RLR) de cada ente no m\u00eas de abril de 2012. Esse \u00e9 o valor usado como base para limitar a presta\u00e7\u00e3o mensal paga por cada ente.<\/p>\n A coluna (F) calcula qual seria a presta\u00e7\u00e3o mensal a ser paga por cada ente, caso se decidisse que, a partir de janeiro de 2012 a d\u00edvida seria paga em 15 anos (prazo que resta para o final do contrato, sem considerar a prorroga\u00e7\u00e3o de dez anos para pagamento do res\u00edduo), sem qualquer limita\u00e7\u00e3o ao valor da presta\u00e7\u00e3o mensal. Ou seja: os entes pagariam integralmente a presta\u00e7\u00e3o calculada pelo sistema PRICE. A coluna (G) mostra qual a propor\u00e7\u00e3o de tal presta\u00e7\u00e3o em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 RLR. Fica claro que o Munic\u00edpio de S\u00e3o Paulo e que os estados de\u00a0 RS, MG, SP e AL dificilmente conseguiriam pagar integralmente a d\u00edvida.<\/p>\n A coluna (H) leva em conta a possibilidade de a d\u00edvida ter um per\u00edodo adicional de 10 anos, al\u00e9m dos 30 anos do contrato regular. Ou seja, trata-se de um exerc\u00edcio para verificar se o uso do prazo adicional de 10 anos, previsto para o pagamento do res\u00edduo da d\u00edvida, resolveria a situa\u00e7\u00e3o dos estados mais assoberbados pela d\u00edvida. Nesse caso, SP e AL passam a ter presta\u00e7\u00f5es mais palat\u00e1veis em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 RLR, mas a situa\u00e7\u00e3o da Prefeitura de S\u00e3o Paulo, RS e MG continua dif\u00edcil.<\/p>\n Tabela 1 \u2013 D\u00edvida Consolidada L\u00edquida e proje\u00e7\u00f5es acerca da amortiza\u00e7\u00e3o das d\u00edvidas estaduais e municipais renegociadas com a Uni\u00e3o<\/strong><\/p>\n <\/strong><\/p>\n Fontes: Portaria n\u00ba 238\/2012 da STN (para a RLR), http:\/\/www.tesouro.fazenda.gov.br\/lrf\/index.asp<\/a> (para a DCL dos estados), http:\/\/www.tesouro.fazenda.gov.br\/estados_municipios\/sistn.asp<\/a> (para a DCL do Munic\u00edpio de S\u00e3o Paulo). Rech, Celmar (2006) A sustentabilidade dos d\u00e9bitos estaduais junto \u00e0 Uni\u00e3o<\/em>. Tese de Mestado. Universidade de Bras\u00edlia (para as condi\u00e7\u00f5es contratuais).<\/p>\n Ressalte-se que dos entes que est\u00e3o em pior situa\u00e7\u00e3o, tr\u00eas t\u00eam taxas de juros acima de 6% ao ano, com destaque para a Prefeitura de S\u00e3o Paulo, que paga a mais alta taxa de juros: 9% ao ano (lembrando que as diferen\u00e7as de taxas de juros decorrem do maior ou menor pagamento de parcela da d\u00edvida a vista: aqueles Estados e Munic\u00edpios que fizeram privatiza\u00e7\u00f5es e usaram a receita dessas vendas para quitar d\u00edvida com a Uni\u00e3o obtiveram contratos com juros mais baixos).<\/p>\n Ou seja, pelo menos quatro Estados e um Munic\u00edpio apresentam indica\u00e7\u00f5es de que n\u00e3o conseguir\u00e3o honrar sua d\u00edvida. E as d\u00edvidas desses entes representam nada menos que 70% do total devido \u00e0 Uni\u00e3o.<\/p>\n Portanto existe uma inadimpl\u00eancia que se desenha para o futuro. Resolver esse problema agora, renegociando os contratos, ser\u00e1 menos traum\u00e1tico que esperar o problema estourar, como exemplifica o caso da d\u00edvida grega.<\/p>\n Este texto procurou mostrar porque \u00e9 importante renegociar a d\u00edvida de estados e munic\u00edpios com a Uni\u00e3o. Posteriormente analisaremos como<\/span> devem ser renegociados os contratos e as armadilhas que devem ser evitadas em tal renegocia\u00e7\u00e3o.<\/p>\n Downloads:<\/em><\/strong><\/p>\n Para ler mais sobre o tema:<\/p>\n DIAS, Fernando \u00c1lvares Correia. O refinanciamento dos governos subnacionais e o ajuste fiscal 1999-2003<\/em>. Texto para Discuss\u00e3o n\u00ba 17 do N\u00facleo de Estudos e Pesquisas do Senado Federal, Dezembro de 2004. Dispon\u00edvel em (http:\/\/www.senado.gov.br\/senado\/conleg\/textos_discussao\/TD17-FernandoAlvaresDias.pdf<\/a>)<\/p>\n MORA, M\u00f4nica. Federalismo e D\u00edvida Estadual no Brasil<\/em>. Texto para Discuss\u00e3o do IPEA n\u00ba 866, mar\u00e7o de 2002. Dispon\u00edvel em\u00a0 (http:\/\/www.ipea.gov.br\/pub\/td\/2002\/td_0866.pdf<\/a>)<\/p>\n<\/a>
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