{"id":1141,"date":"2012-03-26T13:51:32","date_gmt":"2012-03-26T16:51:32","guid":{"rendered":"http:\/\/www.brasil-economia-governo.org.br\/?p=1141"},"modified":"2012-03-26T13:54:30","modified_gmt":"2012-03-26T16:54:30","slug":"o-brasil-deve-desistir-da-energia-nuclear","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.brasil-economia-governo.com.br\/?p=1141","title":{"rendered":"O Brasil deve desistir da energia nuclear?"},"content":{"rendered":"

Em mar\u00e7o de 2011, um forte terremoto gerou um acidente nuclear na usina de Fukushima, no Jap\u00e3o. Reabriu-se, a partir da\u00ed, o debate sobre os riscos da energia nuclear e a conveni\u00eancia ou n\u00e3o de utiliz\u00e1-la. A Alemanha optou pelo banimento das usinas nucleares em seu territ\u00f3rio. J\u00e1 a Fran\u00e7a, sua vizinha, tem 80% de sua matriz de energia el\u00e9trica em base termonuclear e tende a aumentar essa propor\u00e7\u00e3o. E o Brasil, deve abrir m\u00e3o de construir novas usinas nucleares?<\/p>\n

A matriz de energia el\u00e9trica brasileira tem evolu\u00eddo sempre no sentido de se garantir um perfil renov\u00e1vel. As principais fontes renov\u00e1veis s\u00e3o as usinas hidroel\u00e9tricas, que propiciam energia abundante e barata.<\/p>\n

A energia nuclear, apesar de n\u00e3o renov\u00e1vel, tem uma enorme vantagem sobre as fontes f\u00f3sseis de energia, j\u00e1 que n\u00e3o emite gases de efeito estufa. Desse modo, a combina\u00e7\u00e3o de fontes renov\u00e1veis com fonte nuclear tem recebido o apoio de v\u00e1rios ambientalistas de renome, que v\u00eaem na energia nuclear um risco muito menor aos biomas globais do que a energia de origem f\u00f3ssil. Assim, do ponto de vista ambiental<\/span>, a energia nuclear parece ser uma op\u00e7\u00e3o positiva.<\/p>\n

Como se observa no gr\u00e1fico abaixo, o Plano Decenal de Expans\u00e3o do Setor El\u00e9trico (PDE) 2011-2020 prev\u00ea um aumento da participa\u00e7\u00e3o de renov\u00e1veis e de energia termonuclear na pot\u00eancia instalada e a consequente redu\u00e7\u00e3o das fontes f\u00f3sseis (Usinas Termoel\u00e9tricas \u2013 UTE). Trata-se do esfor\u00e7o brasileiro para reduzir a emiss\u00e3o dos gases de efeito estufa (GEE).<\/p>\n

\"\"<\/a><\/p>\n

Do ponto de vista do abastecimento de energia<\/span>, a gera\u00e7\u00e3o nuclear tamb\u00e9m pode dar contribui\u00e7\u00e3o positiva. O consumo de energia el\u00e9trica acompanha, \u00e0s vezes, at\u00e9 mais que proporcionalmente, o crescimento da renda per capita<\/em>. Atualmente, cada brasileiro consome cerca de cinco vezes menos do que o consumidor dos EUA e tr\u00eas vezes menos do que o consumidor europeu. O Brasil necessita ampliar sua oferta, para atender o crescimento da popula\u00e7\u00e3o e do seu poder aquisitivo.<\/p>\n

Atualmente, o Pa\u00eds necessita de aproximadamente 6.000 MW por ano de acr\u00e9scimo de pot\u00eancia instalada para suprir suas necessidades. Ao final da d\u00e9cada de 2010, esse acr\u00e9scimo anual ser\u00e1 de 10.000 MW, quase uma Itaipu por ano. Por isso, abrir m\u00e3o da possibilidade de gera\u00e7\u00e3o de energia nuclear significar\u00e1 maior esfor\u00e7o na constru\u00e7\u00e3o de hidroel\u00e9tricas e termoel\u00e9tricas.<\/p>\n

Outro aspecto muito importante \u00e9 a seguran\u00e7a energ\u00e9tica,<\/span> que s\u00f3 \u00e9 assegurada por fontes pass\u00edveis de armazenamento. \u00c9\u00a0crucial que a energia seja armazenada para uso em momentos de car\u00eancia peri\u00f3dica de fontes de energia ou em face do car\u00e1ter aleat\u00f3rio da demanda. Atualmente, s\u00f3 as fontes convencionais oferecem essa seguran\u00e7a. Seus \u201ccombust\u00edveis\u201d \u2013 \u00e1gua, carv\u00e3o, derivados de petr\u00f3leo, g\u00e1s natural, pastilhas de ur\u00e2nio \u2013 podem ser armazenados, a custo baixo, em torno das plantas de produ\u00e7\u00e3o de energia.<\/p>\n

Derivados de petr\u00f3leo, carv\u00e3o e g\u00e1s natural podem todos ser estocados ao lado das usinas termoel\u00e9tricas, para produzir energia sempre que os consumidores demandarem. As hidroel\u00e9tricas produzem energia renov\u00e1vel, e sua forma de armazenar energia \u2013 \u00e1gua em seus reservat\u00f3rios \u2013 \u00e9, de longe, a mais barata. Quanto maiores os reservat\u00f3rios, mais energia pode ser armazenada (a esse respeito ver, neste site, o texto O que s\u00e3o usinas hidrel\u00e9tricas a fio d\u2019\u00e1gua e quais os custos inerentes \u00e0 sua constru\u00e7\u00e3o?<\/span><\/a>). O combust\u00edvel nuclear pode ser armazenado sob a forma de pastilhas e usado no momento requerido, nas usinas termonucleares.<\/p>\n

O Brasil \u00e9 um dos tr\u00eas \u00fanicos pa\u00edses do mundo que dominam o ciclo de enriquecimento do ur\u00e2nio e, ao mesmo tempo, t\u00eam reservas de ur\u00e2nio em seu territ\u00f3rio[1]<\/a>. Os outros dois s\u00e3o Estados Unidos e R\u00fassia. Este \u00e9 um ponto muito importante para a seguran\u00e7a energ\u00e9tica: dispor das usinas, deter o conhecimento tecnol\u00f3gico e ter a mat\u00e9ria-prima b\u00e1sica dentro do territ\u00f3rio nacional. A Alemanha, por exemplo, precisa importar o ur\u00e2nio para suas usinas, de modo que, ao abandonar a energia nuclear, ir\u00e1 importar energia de outras fontes. Sua decis\u00e3o n\u00e3o altera o status de sua seguran\u00e7a energ\u00e9tica. J\u00e1 o Brasil, se tomar atitude similar, abrir\u00e1 m\u00e3o de uma fonte de gera\u00e7\u00e3o para a qual tem precondi\u00e7\u00f5es muito favor\u00e1veis.<\/p>\n

Em caso de o Brasil desistir da energia nuclear, \u00e9 preciso considerar quais seriam as fontes energ\u00e9ticas substitutas. Uma op\u00e7\u00e3o sempre lembrada est\u00e1 nas fontes alternativas (e\u00f3lica, solar, etc.). Por\u00e9m n\u00e3o \u00e9 economicamente vi\u00e1vel estocar a energia gerada por essas fontes. Os governos em todo o mundo t\u00eam prudentemente mesclado as fontes convencionais com as fontes alternativas de energia. Estas t\u00eam uma modesta participa\u00e7\u00e3o na matriz de energia, mediante incentivos espec\u00edficos, mas n\u00e3o s\u00e3o utilizadas para prover o crescimento estrutural da oferta<\/strong>. As fontes alternativas ainda s\u00e3o muito mais caras do que as convencionais. As baterias s\u00e3o o \u00fanico meio de armazenagem dispon\u00edvel, e elas s\u00e3o extremamente caras. S\u00f3 para dar um exemplo, um ve\u00edculo el\u00e9trico com pot\u00eancia equivalente ao de um carro popular custa cerca de US$ 30.000 no Jap\u00e3o. S\u00f3 a bateria responde por 70% do custo do ve\u00edculo. Portanto, impor o uso de fontes alternativas para prover o crescimento estrutural da oferta de energia, com seguran\u00e7a energ\u00e9tica, no momento atual, significaria impor aos consumidores um enorme salto nas tarifas de energia.<\/p>\n

Se o Brasil s\u00f3 produzisse energia el\u00e9trica a partir de fontes alternativas, haveria um aumento acentuado das tarifas, o que provocaria uma desarticula\u00e7\u00e3o da ind\u00fastria e uma maci\u00e7a onda de desemprego, em face da enorme perda de competitividade de nossas ind\u00fastrias no mercado internacional. Deve-se lembrar que o Brasil j\u00e1 possui uma das tarifas mais altas do planeta (a esse respeito ver, neste site, o texto Faz sentido impor tributa\u00e7\u00e3o t\u00e3o elevada sobre a energia el\u00e9trica<\/span>?<\/a>). \u00c9\u00a0preciso dar o devido tempo para que a ci\u00eancia d\u00ea respostas para os problemas ambientais de nosso tempo, sem desarticular as economias.<\/p>\n

As estimativas oficiais indicam o esgotamento dos potenciais de energia hidr\u00e1ulica ap\u00f3s 2020. Caso o Brasil renunciasse ao uso da energia nuclear para gera\u00e7\u00e3o de eletricidade, n\u00e3o restaria outra op\u00e7\u00e3o sen\u00e3o as poluentes termel\u00e9tricas a carv\u00e3o ou g\u00e1s natural.<\/p>\n

Duas premissas guiam a escolha da matriz de energia do Brasil:<\/p>\n

    \n
  1. a manuten\u00e7\u00e3o do perfil renov\u00e1vel da matriz e a redu\u00e7\u00e3o das emiss\u00f5es de GEE. Isso imp\u00f5e o aproveitamento dos potenciais hidr\u00e1ulicos, das fontes e\u00f3licas, biomassa, solar, bem como a constru\u00e7\u00e3o de usinas termoel\u00e9tricas complementares para garantir a seguran\u00e7a energ\u00e9tica;<\/li>\n
  2. a diversifica\u00e7\u00e3o da matriz de energia, privilegiando o aproveitamento de todas as fontes de energia dispon\u00edveis. Isso implica o uso de fontes hidr\u00e1ulicas, fontes t\u00e9rmicas a carv\u00e3o mineral, g\u00e1s natural, pastilhas de ur\u00e2nio levemente enriquecido, fontes e\u00f3lica, maremotriz, biomassa, res\u00edduos s\u00f3lidos urbanos.<\/li>\n<\/ol>\n

    A evolu\u00e7\u00e3o da matriz de energia prim\u00e1ria[2]<\/a> (e n\u00e3o apenas a matriz de gera\u00e7\u00e3o de eletricidade)\u00a0 at\u00e9 2030 est\u00e1 mostrada na tabela abaixo. Nota-se a previs\u00e3o de expans\u00e3o das fontes termonucleares. Seriam oito usinas nucleares em v\u00e1rios pontos do Pa\u00eds, para atender a crescente demanda por energia el\u00e9trica. Observa-se a manuten\u00e7\u00e3o do perfil atual, de 46,6% de fontes renov\u00e1veis. Somados aos 3% de energia nuclear, prev\u00ea-se que, em 2030, a matriz de energia brasileira ter\u00e1 49,6% de fontes que n\u00e3o emitem GEE.<\/p>\n

    Estrutura da Oferta Interna de Energia<\/strong><\/p>\n

    Em %<\/em><\/p>\n\n\n\n\n\n\n\n\n\n\n\n\n\n\n
    <\/td>\n2005<\/strong><\/td>\n2010<\/strong><\/td>\n2020<\/strong><\/td>\n2030<\/strong><\/td>\n<\/tr>\n
    Energia n\u00e3o renov\u00e1vel<\/strong><\/td>\n55,5<\/strong><\/td>\n57,0<\/strong><\/td>\n54,2<\/strong><\/td>\n53,4<\/strong><\/td>\n<\/tr>\n
    Petr\u00f3leo<\/td>\n38,7<\/td>\n34,8<\/td>\n29,9<\/td>\n28,0<\/td>\n<\/tr>\n
    G\u00e1s natural<\/td>\n9,4<\/td>\n13,4<\/td>\n14,2<\/td>\n15,5<\/td>\n<\/tr>\n
    Carv\u00e3o mineral e derivados<\/td>\n6,3<\/td>\n7,2<\/td>\n7,6<\/td>\n6,9<\/td>\n<\/tr>\n
    Ur\u00e2nio (U3<\/sub>O8<\/sub>) e derivados<\/td>\n1,2<\/td>\n1,7<\/td>\n2,5<\/td>\n3,0<\/td>\n<\/tr>\n
    Energia renov\u00e1vel<\/strong><\/td>\n44,5<\/strong><\/td>\n43,0<\/strong><\/td>\n45,8<\/strong><\/td>\n46,6<\/strong><\/td>\n<\/tr>\n
    Hidr\u00e1ulica e eletricidade<\/td>\n14,8<\/td>\n13,5<\/td>\n13,7<\/td>\n13,5<\/td>\n<\/tr>\n
    Lenha e carv\u00e3o vegetal<\/td>\n13,0<\/td>\n10,1<\/td>\n7,0<\/td>\n5,5<\/td>\n<\/tr>\n
    Cana-de-a\u00e7\u00facar e derivados<\/td>\n13,8<\/td>\n14,1<\/td>\n17,4<\/td>\n18,5<\/td>\n<\/tr>\n
    Outras fontes prim\u00e1ria renov\u00e1veis<\/td>\n2,9<\/td>\n5,3<\/td>\n7,6<\/td>\n9,1<\/td>\n<\/tr>\n
    Total<\/strong><\/td>\n100,0<\/strong><\/td>\n100,0<\/strong><\/td>\n100,0<\/strong><\/td>\n100,0<\/strong><\/td>\n<\/tr>\n<\/tbody>\n<\/table>\n

    Fonte: Minist\u00e9rio das Minas e Energia.<\/p>\n

    Resta, por fim, enfrentar a grande quest\u00e3o: n\u00e3o ser\u00e1 essa fonte de energia uma fonte potencial de acidente nuclear de alta propor\u00e7\u00e3o, capaz de afetar a sa\u00fade de seguidas gera\u00e7\u00f5es? Vale a pena correr esse risco? Esse debate n\u00e3o deve desconsiderar os fatos objetivos, a evolu\u00e7\u00e3o da tecnologia nuclear e a posi\u00e7\u00e3o cient\u00edfica sobre os riscos efetivos representados por essas usinas.<\/p>\n

    Em primeiro lugar, vale a pena deixar claro dois pontos importantes:<\/p>\n

      \n
    1. A radia\u00e7\u00e3o produzida pela fiss\u00e3o nuclear no cora\u00e7\u00e3o dos reatores \u00e9 potencialmente letal para a vida. Mas ainda n\u00e3o h\u00e1 consenso cient\u00edfico que dimensione as reais consequ\u00eancias da radia\u00e7\u00e3o ionizante[3]<\/a> a longo prazo<\/span>. Pesquisas mais profundas sugerem que elas podem ser bem menos graves do que se costuma propalar.<\/li>\n
    2. As usinas nucleares jamais<\/em> se transformar\u00e3o numa bomba at\u00f4mica. Enquanto as bombas at\u00f4micas t\u00eam uma concentra\u00e7\u00e3o de ur\u00e2nio 235 (f\u00edssil) de 90%, a concentra\u00e7\u00e3o do mesmo \u00e1tomo nas usinas nucleares \u00e9 de apenas 3% (misturado em 97% de ur\u00e2nio 238, n\u00e3o f\u00edssil). Uma usina nuclear nunca produzir\u00e1 uma rea\u00e7\u00e3o nuclear em cadeia inst\u00e1vel, como nas bombas at\u00f4micas. Podem at\u00e9 ocorrer explos\u00f5es nas usinas nucleares, mas elas s\u00e3o devidas \u00e0 produ\u00e7\u00e3o de hidrog\u00eanio no interior do n\u00facleo, que \u00e9 um g\u00e1s altamente combust\u00edvel. O impacto dessa explos\u00e3o \u00e9 local; o perigo (ainda n\u00e3o corretamente dimensionado pela ci\u00eancia) reside no espalhamento da radia\u00e7\u00e3o liberada, que pode ser levada pelas \u00e1guas ou pelos ventos.<\/li>\n<\/ol>\n

      Os tr\u00eas mais graves acidentes da hist\u00f3ria das usinas nucleares (Three Mile Island – EUA, Fukushima \u2013Jap\u00e3o e Chernobyl \u2013 Ucr\u00e2nia) resultaram de uma combina\u00e7\u00e3o de premissas de projeto equivocadas, falha humana, irresponsabilidade pol\u00edtica, e ocorreram devido a problemas aos quais as usinas de nova gera\u00e7\u00e3o n\u00e3o est\u00e3o mais sujeitas.<\/p>\n

      Em 28 de mar\u00e7o de 1979, um erro operacional e uma falha num equipamento de refrigera\u00e7\u00e3o provocaram a fus\u00e3o parcial do n\u00facleo da usina nuclear de Three Mile Island<\/strong>. A manuten\u00e7\u00e3o preventiva havia sido prejudicada por cortes de custos<\/span> e materiais de qualidade inferior haviam sido usados. Mas a causa principal do acidente foram as decis\u00f5es erradas tomadas por operadores despreparados<\/span>. A temperatura do n\u00facleo subiu demais e a press\u00e3o aumentou. Uma v\u00e1lvula de redu\u00e7\u00e3o de press\u00e3o abriu-se, mas n\u00e3o se fechou, ao contr\u00e1rio do que estava indicado. Isso provocou a libera\u00e7\u00e3o de enorme quantidade de \u00e1gua radioativa no rio Susquehanna. Gases radioativos tamb\u00e9m escaparam para a atmosfera. O Governador do estado da Pensilv\u00e2nia, onde se encontra a usina, demorou dois dias para iniciar a evacua\u00e7\u00e3o<\/span> em um raio de 8 km ao redor da instala\u00e7\u00e3o nuclear.<\/p>\n

      Fukushima<\/strong> \u00e9 uma usina de \u00e1gua fervente (BWR), atualmente em desuso. Foi dimensionada para suportar um terremoto de 8,1 na escala Richter, <\/span>numa \u00e1rea notoriamente suscet\u00edvel a terremotos de grandes propor\u00e7\u00f5es. Foi dimensionada para suportar maremotos de at\u00e9 5,7 metros de altura<\/span>.<\/p>\n

      O maior terremoto da hist\u00f3ria do Jap\u00e3o, ocorrido em 11 de mar\u00e7o de 2011, teve intensidade de 9,2 na escala Richter e gerou um maremoto de mais de 14 metros de altura. A usina de Fukushima, equivocadamente, n\u00e3o havia sido dimensionada para suportar desastres naturais dessa intensidade<\/span>. O maremoto encobriu e inundou as instala\u00e7\u00f5es nucleares e provocou o desligamento do sistema de resfriamento do n\u00facleo. Os reatores 1, 2 e 3 sofreram fus\u00e3o parcial, com libera\u00e7\u00e3o de hidrog\u00eanio \u2013 g\u00e1s altamente combust\u00edvel \u2013 pela oxida\u00e7\u00e3o das varetas, seguida de implos\u00e3o dos edif\u00edcios onde est\u00e3o os reatores nucleares pela queima do hidrog\u00eanio. Houve vazamento de \u00e1gua radioativa para o mar e libera\u00e7\u00e3o de g\u00e1s radioativo na atmosfera.<\/p>\n

      Em Chernobyl, no in\u00edcio da madrugada do dia 26 de abril de 1986, aproveitando um desligamento de rotina da usina, foram realizados alguns testes para observar o funcionamento do reator a baixa energia. Os t\u00e9cnicos encarregados desses testes n\u00e3o seguiram as normas de seguran\u00e7a<\/span> e, pelo fato de o moderador de neutrons ser \u00e0 base de grafite (em desuso no mundo)<\/span>, o reator poderia apresentar instabilidade num curto per\u00edodo de tempo. E foi o que ocorreu.<\/p>\n

      As pessoas foram alertadas 30 horas depois do acidente<\/span>. At\u00e9 ent\u00e3o, tudo foi mantido em segredo. Apenas cinco trabalhadores da usina sobreviveram ao acidente.<\/p>\n

      Ainda que falha humana, erros de planejamento, politiza\u00e7\u00e3o e irresponsabilidade governamental sejam fatores que sempre existir\u00e3o em maior ou menor grau, os progressos t\u00e9cnicos levaram \u00e0 constru\u00e7\u00e3o de usinas bem mais seguras, o que permite afirmar que em uma planta moderna os acidentes acima descritos dificilmente ocorreriam.<\/p>\n

      Os tr\u00eas maiores acidentes da hist\u00f3ria da ind\u00fastria nuclear n\u00e3o teriam ocorrido se estivessem dispon\u00edveis as tecnologias dos novos reatores. Estes t\u00eam dispositivos passivos para resfriamento do n\u00facleo, que independem de eletricidade ou da interven\u00e7\u00e3o humana. S\u00e3o reatores com vida \u00fatil mais longa, com maior efici\u00eancia t\u00e9rmica e com maior robustez.<\/p>\n

      No que concerne aos efeitos dos acidentes nucleares, h\u00e1 uma tend\u00eancia a se superestimar o n\u00famero de mortos e os efeitos da radia\u00e7\u00e3o ao longo do tempo. No 20\u00ba anivers\u00e1rio do acidente nuclear de Chernobyl, em 2006, novas fontes de informa\u00e7\u00e3o liberaram dados desencontrados sobre as consequ\u00eancias do acidente nuclear. S\u00f3 na contagem de mortos, havia quatro diferentes dados publicados: 1) 95.500; 2)\u00a070.000; 3) 4.000, e 4) 31.<\/p>\n

      Ronald K. Chesser e Robert J. Baker s\u00e3o renomados cientistas que produziram diversos estudos sobre os efeitos do acidente de Chernobyl[4]<\/a>. Os autores passaram 12 anos na \u00e1rea de Chernobyl, tentando identificar os efeitos do ambiente radioativo sobre a vida selvagem. Realizaram uma s\u00e9rie de estudos e experimentos na zona de exclus\u00e3o.<\/p>\n

      Suas primeiras conclus\u00f5es foram a favor da tese de que animais estariam sujeitos a muta\u00e7\u00f5es gen\u00e9ticas decorrentes da exposi\u00e7\u00e3o \u00e0 radia\u00e7\u00e3o. Contudo, o uso de instrumentos mais precisos e o aperfei\u00e7oamento de suas pesquisas acabou apontando na dire\u00e7\u00e3o contr\u00e1ria: n\u00e3o havia evid\u00eancias de efeitos continuados da radia\u00e7\u00e3o sobre a vida animal. Pelo contr\u00e1rio, a vida selvagem prosperava na regi\u00e3o de Chernobyl.<\/p>\n

      O forte impacto dos acidentes, a cobertura emocional da imprensa, a rea\u00e7\u00e3o igualmente emotiva dos legisladores acaba dando o tom dos debates, restando pouco espa\u00e7o para a avalia\u00e7\u00e3o cient\u00edfica isenta.<\/p>\n

      Tal avalia\u00e7\u00e3o \u00e9 fundamental para estabelecer normas de seguran\u00e7a que equilibrem o controle do risco com os benef\u00edcios sociais da gera\u00e7\u00e3o energ\u00e9tica, e que evitem procedimentos preventivos com impacto restrito sobre a seguran\u00e7a a custos excessivamente elevados.<\/p>\n

      Tem havido propostas no Congresso Nacional para uma morat\u00f3ria na constru\u00e7\u00e3o de usinas nucleares no Brasil e para o fechamento imediato das usinas termonucleares de Angra dos Reis. Mas, em face de tudo o que foi dito, \u00e9 fundamental que n\u00e3o se limite voluntariamente as op\u00e7\u00f5es energ\u00e9ticas do Brasil, por meio de uma morat\u00f3ria unilateral.<\/p>\n

      As usinas nucleares existentes de Angra est\u00e3o na base do sistema el\u00e9trico e s\u00e3o imprescind\u00edveis para a seguran\u00e7a energ\u00e9tica do Pa\u00eds. N\u00e3o deveriam, portanto, ser desativadas. Elas passam por cont\u00ednuos melhoramentos em sua seguran\u00e7a. Ali\u00e1s, os pa\u00edses detentores de usinas nucleares est\u00e3o em constante contato para trocarem informa\u00e7\u00f5es e procedimentos que melhorem continuamente a seguran\u00e7a de todas as instala\u00e7\u00f5es nucleares do mundo.<\/p>\n

      O Brasil precisar\u00e1, na pr\u00f3xima d\u00e9cada, da op\u00e7\u00e3o nuclear para garantir a seguran\u00e7a energ\u00e9tica em rela\u00e7\u00e3o ao seu sistema el\u00e9trico e ao fornecimento de combust\u00edveis. Precisar\u00e1 tamb\u00e9m dessa fonte de energia para garantir a modicidade tarif\u00e1ria. A ren\u00fancia a esse enorme potencial energ\u00e9tico deixaria o Pa\u00eds dependente de fontes f\u00f3sseis, mais caras, mais poluentes e finitas.<\/p>\n

      Downloads:<\/em><\/strong><\/p>\n