Salário mínimo – Brasil, economia e governo https://www.brasil-economia-governo.com.br Fri, 18 Mar 2016 13:53:12 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.2 Um guia para o ajuste fiscal na economia brasileira: as 23 medidas https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2742&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=um-guia-para-o-ajuste-fiscal-na-economia-brasileira-as-23-medidas https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2742#comments Wed, 16 Mar 2016 12:37:45 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=2742 1. Introdução

Apesar da constante negativa dos técnicos do governo, resta evidente que a situação fiscal da economia brasileira tem se deteriorado nos últimos anos. Tanto isso é verdade que, desde 2011, a equipe econômica do governo vem anunciando seguidos ajustes fiscais. Por exemplo, no início de 2011 o governo anunciou um ajuste da ordem de R$ 50 bilhões. Já em fevereiro de 2012 outro pacote fiscal foi anunciado, desse feita da ordem de R$ 55 bilhões.Em 2015 novo pacote de ajustes foi anunciado. A rigor nenhum desses ajustes foi levado a termo, contudo seu simples anúncio denota a preocupação das autoridades nacionais.

Em favor da estabilidade das contas públicas pode-se fazer referência aos seguidos superavits primários obtidos. Contudo, três observações se fazem necessárias nesse assunto: 1) boa parte do superávit tem sido obtida por meio de aumento na arrecadação de tributos, e não com a redução do gasto; 2) ocorreu uma verdadeira operação de maquiagem das contas públicas; e 3) mesmo se levando em consideração os itens 1 e 2, ainda assim o superavit primário tem se reduzido, tendo se convertido em déficit a partir de 2014. Isto é, a sustentabilidade fiscal da economia brasileira suscita dúvidas pertinentes

Do ponto de vista macroeconômico não restam dúvidas de que o lado fiscal desempenha papel importante no desenvolvimento econômico de longo prazo do país. Certamente existem agendas políticas e econômicas distintas. Contudo, é consenso geral de que o equilíbrio fiscal é uma meta de política econômica a ser perseguida. No momento em que escrevemos esse texto, nossa compreensão do cenário atual sugere a necessidade de um forte ajuste fiscal na economia Brasileira.

Este ensaio é apartidário, não se refere a nenhum candidato ou preferência ideológica específica. Aqui constatamos apenas que um forte ajuste fiscal terá que ser levado a cabo nos próximos anos. Este texto é então um guia prático para a realizaçào de tal ajuste. Além dessa introdução, na Seção 2 apresentamos um panorama geral do ajuste fiscal necessário para colocar a economia brasileira numa trajetória sustentável. A Seção 3 traz mais detalhes sobre cada proposta elaborada na seção anterior.A Seção 4 conclui este ensaio.

 

2. Panorama Geral do Ajuste Fiscal

O orçamento federal para o ano de 2012 era de R$ 866 bilhões, com o “corte” anunciado de R$ 55 bilhões ele se reduziu para R$ 811 bilhões. Contudo, dependendo de considerações técnicas, o governo federal teve uma despesa primária no ano de 2011 entre R$ 724 e R$ 757 bilhões. Isto é, o Brasil passou a ser o primeiro país no mundo que anunciou um ajuste fiscal que aumentavaem mais de 50 bilhões de reais (ao invés de diminuir) o gasto público.Mesmo em termos reais, o anunciado ajuste fiscal implicava aumento de despesas! No ano de 2015 não tem sido diferente, o governo anuncia cortes em relação ao orçamento, mas tem pouca capacidade de cortar os gastos em relação ao executado no ano anterior. No Brasil, ajuste fiscal deve ser feito por cortes de gastos em relação ao ano anterior, e não por anúncio de cortes orçamentários (que tal como no exemplo acima, podem implicar aumento de gastos).

Quando se conhece a estrutura do gasto público no Brasil, o primeiro detalhe que chama a atenção é a impossibilidade de se fazer grandes cortes de gastos num único ano. Assim, qualquer pacote fiscal deve ter em mente um horizonte mínimo de 3 a 4 anos. Grandes ajustes dependem de consistentes alterações ao longo dos anos. Essa é a única maneira de se produzir um ajuste fiscal sério no país. Junto com a redução do gasto público deve ser realizada uma reforma que reduza a carga tributária no Brasil.

Quem conhece contas públicas sabe que só existem 5 maneiras de se realizar grandes cortes orçamentários num único ano: 1) cortar investimentos; 2) cortar gastos sociais e transferências; 3) congelar o salário mínimo; 4) aumentar impostos; e 5) inflação. Estou desconsiderando a possibilidade de aumentar os restos a pagar, pois isso apenas transfere a dívida de um ano para outro – ainda assim, o Governo Dilma utilizou reiteradamente este instrumento.

Abaixo estão especificadas as medidas necessárias para a promoção de um ajuste fiscal duradouro na economia Brasileira. Frisamos novamente que a estrutura do gasto público impede sua redução se não forem feitas reformas importantes. De pouco adiantam medidas pontuais aqui. É fundamental que tanto a sociedade quanto a classe política compreendam que sem esse ajuste a situação de longo prazo de nossa economia tende a patamares inviáveis. Muitas vezes ouvimos a grande mídia repercutir sobre os ajustes fiscais ocorridos em alguns paises europeu, tais como na Grécia, como se os mesmos fossem uma questão de escolha política. Não, tais ajustes não foram questão de escolha, foram a consequência inevitável do colapso fiscal de determinados países.

No ritmo em que caminha a situação fiscal brasileira, em breve seremos obrigados a fazer ajustes dolorosos, independente de vontade ou negociação política. Sendo assim, sugerimos que devemos realizar tais ajustes antes do colapso fiscal, isto é, devemos realizar esses ajustes enquanto ainda existem margens de manobra e espaço para negociação política.

 

3. O Ajuste Fiscal Proposto

Dividimos essa seção em duas partes: a) redução do tamanho do Estado na economia pelo lado da despesa; e b) redução do tamanho do Estado na economia pelo lado da receita.

 

A. REDUÇÃO DO TAMANHO DO ESTADO NA ECONOMIA: LADO DA DESPESA

Medida 1: Tesouro – BNDES.

A mais fácil medida a ser tomada para o ajuste fiscal é o fim imediato das operações entre Tesouro Nacional e BNDES. Tais operações geram pesados ônus ao erário, e ao mesmo tempo fragilizam a situação fiscal do país.

De acordo com relatório do TCU,em 2011, o valor dos subsídios decorrentes das operações Tesouro-BNDES foram de R$ 19,2 bilhões (mais R$ 3,6 bilhões de custo orçamentário). Dados da Secretaria do Tesouro Nacional indicam que tais subsídios foram de R$ 7,6 bilhões em 2010, e R$ 1,4 bilhão em 2009. Observem a velocidade da evolução desses custos. Em 2014, após a aprovação da MP 633, o BNDES (e a FINEP) tiveram autorização para emprestar mais R$ 50 bilhões de reais a juros subsidiados. O custo para o contribuinte, apenas em relação a equalização de juros da expansão de R$ 50 bilhões, será de R$ 12,3 bilhões. No ano de 2015 outros R$ 30 bilhões foram transferidos do Tesouro para o BNDES. Tais transferências precisam parar imediatamente.

 

Medida 2: Substituir Investimento Público por Parcerias ou Concessões

Reduzir os gastos com investimento público. Essa é a maneira mais efetiva de se diminuir gastos no curto prazo. Em compensação o estímulo a parcerias público-privadas, ou a concessão a entes privados, pode ser uma política muito mais efetiva para melhorar a infra-estrutura do país.

Sem incluir empresas estatais, o investimento do governo central, estados e municípios é de aproximadamente de 2,3% do PIB.

 

Medida 3: Acabar com a regra atual de reajuste do salário mínimo.

Tal regra implica umpesado ônus para as contas públicas. Além disso, os efeitos deletérios dessa política sobre o mercado de trabalho podem parecer pequenos quando a economia está aquecida e a taxa de desemprego está baixa. Contudo, numa situação de retração econômica e de desemprego alto, esta regra de reajuste tem potencial para aumentar a taxa de desemprego entre os trabalhadores menos qualificados.

Congelar o salário mínimo ajuda muito nas contas da previdência e nas contas de alguns estados e municípios. Cada 1 real de aumento no salário mínimo pode impactar nas contas públicas em algo em torno de 350 milhões de reais/ano.

 

Medida 4: Minimizar os custos decorrentes da Copa do Mundo de 2014.

A escolha de sediar a Copa do Mundo foi um equívoco. Os recursos destinados à construção de estádios poderiam ter sido melhor utilizados numa série outra de programas. Dado que essa alternativa não é mais viável, faz-se necessário uma política pública que minimize os custos de manutenção com estádios. Nesse sentido, propomos duas frentes: a) recuperar o investimento público que foi feito por meio de empréstimos para a construção de estádios; e b) repassar a administração dos estádios a iniciativa privada.

 

Medida 5: Minimizar os custos decorrentes de sediar as Olimpíadas de 2016.

As mesmas ressalvas do item anterior se aplicam aqui. Afinal, num país sem esgoto e sem água encanada, isso não pode ser prioridade de políticas públicas.

 

Medida 6: Projeto de Lei que aumente a idade mínima para aposentadoria para 67 anos.

Não apenas a idade mínima de aposentadoria por idade deve ser aumentada, com uma regra de transição, como a aposentadoria por tempo de serviço deve ser extinta (novamente com regra de transição). Além disso, tanto homens como mulheres devem se aposentar com a mesma idade. Não se deve tentar corrigir problemas do mercado de trabalho (como a discriminação e a jornada dupla da mulher) no sistema de previdência. ESSA MEDIDA É FUNDAMENTAL PARA O EQUILÍBRIO DE LONGO PRAZO DAS CONTAS PÚBLICAS.

 

Medida 7: FIM da aposentadoria por tempo de serviço.

É simplesmente insustentável permitir que um trabalhador saudável se aposente aos 50 anos de idade.

 

Medida 8: Não elevação dos gastos com o bolsa família e implementação de uma regra compulsória de saída.

O problema do bolsa família não está na falta de recursos e nem em sua abrangência (com quase 14 milhões de famílias atendidas e orçamento para o ano de 2015 de R$ 27,7 bilhões). O problema do bolsa família está na ausência de uma regra de saída. Além disso, existem limites para o tamanho da população que pode ser mantida dentro desse sistema. Hoje aproximadamente 1 em cada 4 brasileiros depende do bolsa família. Não parece ser necessário aumentar ainda mais essa proporção.

 

Medida 9: Pente fino na necessidade de se realizar novos concursos públicos

Em anos de ajuste fiscal, a contratação de novos servidores deve ser vista com cautela. O que for possível postergar deve ser postergado.

 

Medida 10:Congelar o Salário dos Servidores Públicos.

Cada caso deve ser analisado separadamente. A regra de ouro aqui é, gradativamente, diminuir parte da excessiva atratividade do setor público. Salários altos, e risco, são características do setor privado. Quem quer ir para o setor público terá menos risco, mas ao custo de um salário menor. Sugestão pontual: congelar o salário dos servidores em 2016 (economia estimada de R$ 15 bilhões).

 

Medida 11: Forte redução com gastos de publicidade.

Deve-se incluir nessa redução não somente o gasto em publicidade do governo federal, mas também o gasto das empresas estatais e dos bancos públicos em propaganda.

 

Medida 12: Proibição do Banco do Brasil e da CEF de comprarem participação em bancos privados.

Tais operações costumam ser onerosas e cheias de risco. Se isso não for legalmente possível, então é melhor vendê-los.

 

Medida 13: Forte redução na quantidade de Ministérios.

Não faz o menor sentido uma estrutura federal composta de 39 ministérios. Tal número deve ser reduzido com a imediata redução do número de funcionários comissionados não concursados presentes nos mesmos. Reduzir o número de ministérios para 20, cortando em torno de 3000 cargos comissionados, e redução de estruturas físicas, tem o potencial de gerar uma economia entre R$ 500 milhões e R$ 1 bilhão (dependendo de quais estruturase de quais cargos seriam cortados).

 

Medida 14: Imediata auditoria nos repasses para todas as ONG´s

Escândalos recentes mostram como é importante, do ponto de vista de moralidade do gasto público, verificar com rigor o repasse de entes governamentais a Organizações Não-Governamentais, abrindo inclusive processo judicial quando se fizer o caso. Inclui-se aqui também o fim do repasse para qualquer ONG ligada a movimentos ilegais (tais como as ligadas ao MST).

 

Medida 15: Revisão das Concessões de Indenização aos grupos denominados “Perseguidos Políticos”

Já se aproxima da casa de R$ 1 bilhão de reais por ano o valor de benefícios concedidos aos anistiados políticos. É fundamental rever o valor das indenizações que esse grupo recebeu nos últimos anos, inclusive com ações judiciais para recuperar somas indevidamente pagas. Adicionalmente, devem ser suspensos novas concessões de indenização a pessoas que dizem ter sido perseguidas pelo regime militar até que sejam esclarecidas as dúvidas aqui levantadas (sobre a utilização desse fundo para beneficiar grupos que nada ou pouco perderam em decorrência da perseguição sofrida durante o regime militar). Caberia, ainda, cassar as indenizações de quem for condenado em crimes contra o erário.

 

Medida 16: Regra para o “Restos a pagar”

Em grande parte das ocasiões, “restos a pagar” é uma maneira de o governo enganar a opinião pública (dizendo que economizou um dinheiro que na verdade gastou). É fundamental para a transparência das contas públicas a aprovação de uma lei que regule “restos a pagar”, impondo limites ao montante de despesa que pode ser postergado para outros exercícios..

 

Medida 17: Redução nas despesas com saúde

De acordo com dados preliminares é possível reduzir os gastos federais com saúde numa magnitude ao redor de 3 bilhões.

 

Medida 18: Redução dos gastos federais em educação

De acordo com dados preliminares é possível reduzir os gastos federais com educação numa magnitude ao redor de 3 bilhões.

 

Medida 19: Abandonar, pelos próximos 4 anos, os grandes projetos tais como o programa Minha Casa Minha Vida ou o PAC

Tais programas são dispendiosos, e antes de se aventurar neles é fundamental sanar as contas públicas do país. O governo deve finalizar imediatamente tais programas, passando imediatamente àiniciativa privada a responsabilidade por tais obras. Na ausência de interesse do setor privado recomenda-se a extinção de TODOS esses grandes projetos quando tal alternativa se faça possível.

 

B. REDUÇÃO DO TAMANHO DO ESTADO NA ECONOMIA: LADO DA RECEITA

Medida 20: Suspensão de vários dos incentivos tributários concedidos nos últimos anos

Não há espaço orçamentário para muitas concessões. Entre os incentivos tributários concedidos ao longo dos últimos anos, a mais famosa foi a desoneração sobre a folha de pagamentos, mas um amplo conjunto adicional de medidas foi implementado para levar benefícios fiscais a setores específicos da economia. Tais incentivos devem ser revogados. Apenas em 2014 essa conta chegou a R$ 88 bilhões. Pelo menos 1/3 desses benefícios deve ser revisto, gerando uma economia aproximada de R$ 30 bilhões.

 

Medida 21: Fim da Isenção de IR para LCI e LCA

Igualar as regras de Imposto de Renda que já incide sobre os CDB’s nas Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e nas Letras de Crédito do Agronegócio (LCA). Receita estimada R$ 5 bilhões.

 

Medida 22: Grande processo de privatização de empresas públicas

Captar ao menos R$ 50 bilhões com a venda de ativos públicos (empresas públicas e participações acionárias em empresas privadas).

 

Medida 23: Ampla revisão da legislação ambiental

Essa legislação é um embaraço constante a realização de investimentos privados. Além disso, tal legislação trava também as parecerias público-privadas, e os próprios investimentos públicos.

 

4. Considerações Finais

Ajuste fiscal é isso. Ajuste fiscal corta gastos e corta projetos que talvez sejam importantes, mas que não são urgentes. As medidas anunciadas aqui são certamente impopulares, mas são necessárias para colocar o Brasil novamente numa trajetória fiscal sustentável.

Adicionalmente, faço um alerta: existe uma maneira política mais fácil de se fazer o ajuste fiscal. O nome da saída fácil é inflação. Na presença de taxas de inflação elevadas, os gastos do governo sofrem considerável redução (principalmente a folha de salários, que corresponde a aproximadamente 4,5% do PIB). Além disso, não devemos esquecer que o imposto inflacionário também é uma fonte extra de receita para o governo. Sendo assim, e como o governo é capaz de indexar seus tributos, altas taxas de inflação melhoram as contas públicas. Espero que tenhamos a sabedoria de não incorrer nesse caminho fácil. Querer melhorar as contas públicas por meio de inflação é o mesmo que decepar a mão para se livrar da unha encravada. De maneira alguma devemos recorrer ao expediente inflacionário para sanar nossos problemas fiscais.Infelizmente o governo já está indo nessa direção.

Por fim, deve-se ressaltar que as contas fiscais dos estados e municípios também estão em situação precária, com vários dos entes federativos a beira do colapso fiscal. Em vez de realizar um trabalho sério, e doloroso, de ajuste fiscal, o governo prefere ajustes fiscais fictícios que se baseiam em aumento da arrecadação, truques contábeis, e ganhos com o processo inflacionário. Esse não é o caminho para estabilizar as contas públicas brasileiras no longo prazo.

 

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Política de valorização do salário mínimo: que valorização? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2530&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=politica-de-valorizacao-do-salario-minimo-que-valorizacao https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2530#comments Mon, 01 Jun 2015 13:46:32 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=2530 1. Introdução: valor do salário mínimo de 2016 a 2019 pelas regras da MP 672/2015

A política de valorização do salário mínimo constante da MP 672/2015 replica as regras da Lei 12.382, de 25 de fevereiro de 2011. Os reajustes para o período 2016-2019 terão a mesma fórmula que tiveram os reajustes do período 2012-2015: para cada ano, o salário mínimo será reajustado pela inflação do ano anterior e pelo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes1.

O índice de inflação usado para a preservação do poder aquisitivo do mínimo continua sendo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), cabendo ao componente do crescimento do PIB a parcela de ganho real da fórmula.

Embora a política de valorização do salário mínimo tenha concedido grande aumento real no período 2011-20152, a mesma política não deve conceder aumentos reais importantes nos próximos anos, por conta do arrefecimento da economia, já que existe a defasagem em relação ao crescimento do PIB3. Assim, o valor do salário mínimo dos anos de 2016 e 2017 não contaria com aumento real devido à estagnação do PIB em 2014 e à provável retração de 2015.

No entanto, a variação negativa do PIB não é incorporada no valor do salário mínimo. A MP 672/2015 prevê o uso do PIB “a título de aumento real”. Assim, em caso de recessão, o menor valor aplicado seria zero, e o salário mínimo seria reajustado somente pela inflação observada no ano anterior.

Estimamos o valor do salário mínimo para o período 2016-2019, de acordo com a política de valorização do salário mínimo da MP 672/2015. Usamos as expectativas do Sistema de Expectativas de Mercado do Banco Central do Brasil para os valores estimados do crescimento do PIB (2015-2017) e da inflação (2015-2018)4. O resultado é apresentado no Gráfico 1 e na Tabela 1, abaixo.

Gráfico 1 – Salário mínimo: valor de 2015 e estimativa para 2016-2019 pela regra da MP 672/2015

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Tabela 1 – Valor estimado do salário mínimo para 2016-2018 pela regra da MP 672/2015

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Estimamos que, pela manutenção da regra, o salário mínimo passaria a marca de R$ 1.000 em 2019, mas teria um aumento real de apenas 1,16% no período 2016-2018, por conta da estagnação do PIB em 2014, da retração em 2015, e do crescimento modesto esperado para 2016. Este valor corresponderia a um aumento real médio de apenas de 0,4% ao ano.  A decomposição entre aumento nominal e real é apresentada no Gráfico 2.

Gráfico 2 – Decomposição do aumento nominal e real estimado do salário mínimo para 2016-2018 pela regra da MP 672/2015

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Cabe ressaltar que as estimativas para os últimos anos da série tendem a ser bem menos precisas do que as do início da série. Enquanto o valor estimado para 2016, por exemplo, é baseado no crescimento do PIB em 2014 (um valor já conhecido) e na estimativa do INPC de 2015 (que pode ser estimada com razoável confiança), o valor estimado para 2019 é baseado na expectativa de crescimento do PIB em 2017 e na expectativa do INPC para 2018.

Dessa forma, a virtual ausência de ganho real no salário mínimo dos anos de 2016 e 2017 é, por ora, algo mais concreto do que a valorização real de 1,06% e 2,05% para 2018 e 2019.

2. Por que os gastos do governo federal aumentam com o aumento do salário mínimo?

Teoricamente, o salário mínimo não deveria afetar significativamente as contas de um governo central. Por ser uma variável do mercado de trabalho, ele impactaria apenas o salário de empregados do governo federal que recebem esse valor (um baixo contingente) e aqueles serviços e obras contratados que são intensivos em mão de obra de baixa produtividade. Entretanto, o governo federal incorre em aumentos substanciais nos seus gastos quando se eleva o salário mínimo devido i) à vinculação constitucional do salário mínimo e; ii) à ampliação da faixa de elegibilidade de benefícios sociais (prevista também, em parte, na Constituição).

Vinculação

A Constituição Federal prevê a vinculação do salário mínimo na Previdência Social e na Assistência Social. Assim, no Brasil, o salário mínimo não apenas é o menor salário do mercado de trabalho, mas também serve como piso para os benefícios da Previdência (aposentadorias, pensões e auxílios, conforme o art. 201, § 2º5), abono salarial e para o Benefício de Prestação Continuada (BPC, conforme o art. 203, V6) ― muito embora o próprio dispositivo da Constituição que institui o salário mínimo vede expressamente a sua vinculação para qualquer fim (art. 7º, IV).

Quase dois terços dos benefícios da Previdência Social possuem o valor de um salário mínimo, totalizando mais de 17 milhões de benefícios7, ao custo de cerca de R$ 180 bilhões em 2015. Destaca-se ainda o contingente de 9 milhões de beneficiários da clientela rural, cuja aposentadoria também tem vinculação com o mínimo (art. 201, § 7º, II8). Por sua vez,  o Benefício de Prestação Continuada (BPC), um benefício assistencial, tem mais de 4 milhões de beneficiários, custando cerca de R$ 42 bilhões em 20159.

Ainda pela Constituição, o salário mínimo é também o valor do abono salarial (art. 240, § 3º10): são 24 milhões de beneficiários, ao custo de R$ 19 bilhões em 201511. Legislação infraconstitucional vincula ainda o seguro-desemprego ao valor do salário mínimo12, em um total de 9 milhões de beneficiários e custo de R$ 38 bilhões neste ano13.

Faixa de elegibilidade de benefícios

Com o aumento do salário mínimo, amplia-se a faixa de elegibilidade de benefícios pagos pelo governo federal, elevando o número de beneficiários. O abono salarial e também o BPC usam valores vinculados ao salário mínimo como critério de elegibilidade para recebimento dos benefícios. Para o abono salarial, a referência é dois salários mínimos mensais, enquanto para o BPC é de ¼ do salário mínimo como renda familiar per capita14.  Assim, quando o salário mínimo aumenta, mais pessoas passam a ter direito ao abono salarial e ao BPC, além das que já recebiam o benefício anteriormente, com impacto nos cofres do governo.

O crescimento dos gastos do governo federal por conta da elevação do salário mínimo (pela vinculação e pela ampliação da faixa de elegibilidade dos benefícios) será significativamente atenuado, em termos reais, se a manutenção da política de valorização do salário mínimo de fato não for capaz de conceder a ele aumento real importante entre 2016-2019.

3. Política de valorização do salário mínimo no período 2011-2015: possíveis consequências indesejáveis

A política de valorização do salário mínimo, agora renovada pela MP 672/2015, apesar de ganhos evidentes (como no consumo daqueles que recebiam o salário mínimo), despertou preocupação sobre consequências indesejáveis da forte valorização. Além do já citado efeito nas contas do governo federal e do efeito evidente na elevação dos custos unitários de trabalho (e, logo, na competitividade do país e também na inflação), destacam-se considerações de seus efeitos: i) na distribuição de renda e no combate à pobreza e ii) no mercado de trabalho.

Distribuição de renda e combate à pobreza

A recuperação do valor do salário mínimo nas últimas duas décadas e a sua valorização de maneira mais acentuada nos últimos anos (vide Gráfico 3) fez com que a trajetória do salário mínimo se descolasse da dos menores rendimentos. Assim, aumentos do salário mínimo teriam perdido gradativamente a efetividade em combater a pobreza e elevar os menores rendimentos da economia (reduzindo a desigualdade de renda) (tema discutido anteriormente no blog)

Segundo Foguel, Ulyssea e Courseil (2014), do Ipea, enquanto em 1995 o salário mínimo equivalia a 25% do rendimento médio do trabalho, em 2012 ele já correspondia a 45% deste valor15. Segundo eles, “há uma migração dos trabalhadores de salário mínimo para as partes mais altas da distribuição de renda”. Barbosa (2014), antes de assumir o Ministério do Planejamento da atual administração, avaliou que a política de valorização do salário mínimo o elevou para o patamar de 40% do salário médio, que seria “nível de país desenvolvido da Europa” 16.

Gráfico 3 – Valor real do salário mínimo (média anual) entre 1974 e 2014

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A título de ilustração, o valor do salário mínimo em 2015 (R$ 788) já se encontra dez vezes acima da linha da extrema pobreza brasileira (R$77) e cinco vezes acima da linha da pobreza (R$ 154), que são referência para os valores do Programa Bolsa Família (PBF)17, cujo valor dos benefícios variam de R$ 35 à R$77 (vide Gráfico 4, abaixo). Como já apontado, o salário mínimo é vinculado como o valor de pagamento inclusive de um benefício assistencial, o BPC. Assim, aumentos do salário mínimo não apenas não estariam mais tendo capacidade de atingir os mais necessitados, como, pela sua vinculação, drenam recursos de políticas públicas que poderiam ser voltadas a essas camadas da população18. Nesse mesmo sentido, Giambiagi (2014) observa que, na região Nordeste, o indivíduo que recebesse o salário mínimo estaria virtualmente na metade mais rica da população19.

Gráfico 4 – Comparação entre as linhas da pobreza e da extrema pobreza brasileiras, o salário mínimo e o valor dos benefícios do Bolsa Família (benefício básico e benefícios variáveis)

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De acordo com Barbosa (2014), a atual política de valorização do salário mínimo “cumpriu um papel importante”. Para Giambiagi (2014), a política é “vítima do seu próprio sucesso”.  O autor considera que a elevação de seu valor real modificou o papel do salário mínimo na sociedade, dando ensejo à revisão da noção de que o salário mínimo é “indicador do rendimento daqueles que estão na base da pirâmide distributiva”.

Mercado de trabalho

Por conta da elevação dos custos para o empregador, aumentos do salário mínimo sempre despertam preocupação em relação ao aumento do desemprego e da informalidade. Nos últimos anos, esses possíveis efeitos adversos da valorização do mínimo estariam “escondidos” na tendência de queda tanto do desemprego quanto da informalidade. Entretanto, segundo o já citado estudo do Ipea20, “há evidências de crescimento de informalidade e diminuição na taxa de participação em decorrência dos aumentos recentes do salário mínimo”.

Os autores destacam o “efeito expulsão” no mercado de trabalho (Gráfico 5), que chegaria a até 8% dos trabalhadores atingidos pelo salário mínimo: esses trabalhadores migrariam para fora da População Economicamente Ativa (PEA), estando fora mesmo das estatísticas de desemprego. Os autores destacam ainda a transição do mercado formal para a informalidade, que chegaria a até 4% dos trabalhadores afetados pelo mínimo, concluindo haver evidências de que “o valor do salário mínimo avançou mais rápido que a produtividade de parte da força de trabalho brasileira, que parece se ver obrigada a migrar para o setor informal ou se retirar do mercado de trabalho”.

Gráfico 5 – Expulsão do mercado de trabalho – Transição de empregado para fora da PEA (força de trabalho) entre 2003 e 2013

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O eixo vertical do gráfico acima mostra a probabilidade de um trabalhador do setor formal que ganhava um salário mínimo estar fora do setor formal um ano após o aumento do salário mínimo. Essa probabilidade chegou a um mínimo de 3% em 2010. Em 2013 estava acima de 8%, maior valor da série. Não havendo significativa valorização real do salário mínimo no ciclo 2016-2019 (apenas nominal) conforme a MP 672/2015, as possíveis consequências indesejáveis sobre a desigualdade de renda, o combate à pobreza e o mercado de trabalho ficariam contidas.

4. É hora de desvincular o salário mínimo?

O peso que aumentos do salário mínimo geram nas contas públicas, conforme apresentado na seção 2, e a dificuldade que esses aumentos têm em afetar os mais necessitados, conforme apresentado na seção anterior, dão ensejo à desvinculação do salário mínimo. A desvinculação, que foi considerada e discutida pelo Executivo na década passada, consistiria em emendar à Constituição para que os pisos da Assistência Social e da Previdência Social não fossem mais vinculados ao salário mínimo.

“Perdedores”

É oportuno identificar quem “perde” e quem “ganha” com a desvinculação. A desvinculação tenderia a reduzir os aumentos dados ao BPC. Por conta da vinculação entre o salário mínimo e o BPC, há um grande contraste em relação ao Programa Bolsa Família, também voltado ao combate à pobreza, que custará neste ano menos de dois terços que o BPC pagando benefícios até 22 vezes menores do que o salário mínimo, mesmo para beneficiários adultos (questão discutida aqui)21.

Também seriam reduzidos os aumentos dados aos beneficiários da Previdência que teriam direito a um benefício menor que um salário mínimo, mas que recebem o valor do salário mínimo por conta da vinculação. Atualmente, a vinculação acaba sendo um mecanismo de solidariedade, transferindo os ganhos da valorização do salário mínimo mesmo para aqueles que contribuíram sobre valores menores.

Dependendo de como feita, a desvinculação poderia também conter os aumentos do benefício rural da Previdência, de um salário mínimo. Este benefício, formalmente previdenciário, tem característica de benefício assistencial pela ausência de contrapartida de contribuições diretas ao sistema por parte do beneficiário.

Dessa forma, os grandes perdedores de uma eventual desvinculação seriam os beneficiários que ganham o salário mínimo ou pouco acima. Isso significa todos os beneficiários do BPC e parte significativa dos aposentados. Aposentados com rendimentos acima do salário mínimo não seriam afetados pela desvinculação.

“Ganhadores”

E quem “ganha” com a desvinculação? Potencialmente, toda a parcela da população nas partes inferiores da distribuição de renda, conforme apresentado na seção anterior. Isso inclui, por exemplo, beneficiários do Bolsa Família, abaixo das linhas de pobreza e extrema pobreza, e um elevado contingente de trabalhadores informais, que não são alcançados pelo salário mínimo. Com o passar dos anos, a desvinculação liberaria grande quantidade de recursos públicos para políticas públicas que atinjam esses segmentos da população, que compete por recursos públicos com os benefícios vinculados ao mínimo. Trata-se não apenas de políticas de transferência de renda, mas também de políticas de educação, saúde ou saneamento básico que beneficiem a parcela mais carente da população22. Alternativamente, os recursos liberados poderiam permitir redução da carga tributária, com óbvios efeitos positivos sobre a geração de emprego e renda, tanto no setor formal quanto informal.

Ganhariam também os trabalhadores da ativa que recebem o salário mínimo. Isso porque a vinculação tende a conter aumentos maiores para o salário mínimo, mesmo para quem recebe o salário mínimo de empregadores, e não do governo.  Como o mínimo é um só, pela vinculação, sendo simultaneamente piso do mercado de trabalho, da Previdência Social e da Assistência Social, o governo tem dificuldade de aceitar aumentos maiores pela pressão que a vinculação gera em suas contas. Com a desvinculação, o governo teria mais graus de liberdade para permitir aumentos maiores para os trabalhadores que recebem o salário mínimo.

Por fim, cabe ressaltar que a vinculação gera ainda grande insatisfação dos segurados da Previdência que ganham mais de um salário mínimo, já que eles recebem reajustes levando em conta apenas a inflação anual, e, portanto, menores do que os reajustes dos segurados que recebem benefícios de um salário mínimo. Como consequência, há uma contínua pressão para conferir sistematicamente aumentos reais àqueles que recebem mais de um salário mínimo na Previdência, sob o argumento de que seus benefícios perdem valor porque crescem em ritmo menor do que os benefícios vinculados ao mínimo (assunto debatido anteriormente no blog).

Politicamente difícil, por ter “ganhos” difusos e menos visíveis do que as “perdas”, a desvinculação poderia voltar à pauta agora, depois que o salário mínimo recebeu grandes aumentos reais, estando prestes a ultrapassar a barreira dos R$ 1.000, neste ciclo da política de valorização.  No entanto, com a expectativa de uma valorização real bem menor no período 2016-2019 em comparação com anos anteriores, o debate sobre a desvinculação pode ser considerado menos urgente e ficar adiado.

5. Outras propostas existentes para a política de valorização do salário mínimo

Durante o ciclo anterior da política de valorização, por conta das referidas consequências adversas do crescimento do mínimo muito acima da produtividade, outras fórmulas para a valorização do salário mínimo foram sugeridas, substituindo o crescimento do PIB como o componente de reajuste real.

Barbosa e Pires (2014) fazem a comparação do caso brasileiro com as fórmulas de reajuste do salário mínimo em outros países, observando que são com frequência adotados reajustes por índices de preços, nível geral de salários e critérios relacionados a fatores econômicos como produtividade, nível de emprego, renda per capita e expectativa de crescimento23.

Foguel, Ulyssea e Courseil (2014) sugerem adotar o crescimento da produtividade média do trabalho como o componente real da fórmula do salário mínimo brasileiro, no lugar do crescimento do PIB.  Barbosa e Pires (2014) sugerem três alternativas: o crescimento de uma medida de produtividade (PIB por trabalhador), o crescimento do PIB per capita ou o crescimento do salário médio.

Considerações finais

Diante do exposto, a manutenção da fórmula do salário mínimo se mostrou politicamente conveniente para o governo. Com a redução no crescimento do PIB, a fórmula deixará de dar ganhos substanciais ao salário mínimo, possivelmente adiando debate importantes como a desvinculação do salário mínimo e mitigando parcialmente as consequências desses aumentos sobre o desemprego, a informalidade, a expulsão do mercado de trabalho, a competitividade e a inflação. O mais grave, a própria fórmula atual de reajuste contribui para que nos mantenhamos no atual quadro de estagnação econômica, paradoxalmente contribuindo para que o baixo crescimento do valor real do salário mínimo.  No início deste mandato, o ministro do Planejamento chegou a anunciar o interesse de trocar a fórmula, mas foi desautorizado pela Presidência24. Com a MP 672/2015 e a manutenção da fórmula atual, o governo conseguiu fugir da polarização que vem marcando temas na área de Trabalho e Previdência, como as mudanças no seguro-desemprego e no abono salarial, nas pensões por morte e a terceirização, evitando a acusação de fazer “a vaca tossir”25.

 

Este texto é baseado no trabalho “A MP 672/2015 e a Política de Valorização do Salário Mínimo: Haverá Valorização?”. O estudo integral consta do Boletim do Legislativo nº 30 do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria Legislativa do Senado, disponível no seguinte link: http://www.senado.gov.br/estudos)

______________

1 Para maiores detalhes, ver o Sumário Executivo da Medida Provisória nº 672, de 25 de março de 2015. Disponível em: http://www.senado.gov.br/estudos.

2 Especialmente pelo ano de 2012, que refletiu o crescimento de 7,5% do PIB em 2010.

3 Tipicamente o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulga o PIB de um ano no primeiro trimestre do ano seguinte. Como o novo valor do salário mínimo começa a valer já em 1º de janeiro, só é possível incorporar o crescimento do PIB do penúltimo ano na fórmula do reajuste.

4 Disponível em https://www.bcb.gov.br/?FOCUSERIES. Informações de 30 de abril de 2015.

5Nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo.”

6A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: (…) a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.”

7 Boletim Estatístico da Previdência Social, volume 20, nº 1. Janeiro de 2015. Disponível em: http://www.previdencia.gov.br/estatisticas/.

8É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições (…) sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, reduzido em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.”

9 Incluindo seu antecessor, a Renda Mensal Vitalícia (RMV).

10Aos empregados que percebam de empregadores que contribuem para o Programa de Integração Social ou para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público, até dois salários mínimos de remuneração mensal, é assegurado o pagamento de um salário mínimo anual (…)

11 O número de beneficiários e o custo do abono não seriam afetados em 2015 com a aprovação da Medida Provisória nº 665, de 30 de dezembro de 2014.

12 Art. 5º, § 2º, da Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990.

13 Segundo o Ipea, o texto original da Medida Provisória nº 665, de 30 de dezembro de 2014, teria causado redução de cerca de R$ 9 bilhões no valor gasto em 2014 e de 2 milhões no número de benefícios. Ver: CAETANO, M. A.; CAMPOS, A. G; CHAVES, J. V.; COURSEIL, C. H; TOMELIN, L. F. Os Reflexos das Medidas Provisórias 664 e 665 sobre as pensões, o abono salarial e o seguro-desemprego em suas modalidades defeso e formal. Texto para discussão nº 2067. Brasília: Ipea, março de 2015. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=24980

14 Art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993.

15 FOGUEL, M.; ULYSSEA, G.; COURSEIL, C. H. Salário mínimo e mercado de trabalho no Brasil. In: MONASTERIO, L. M.; NERI, M. C.; SOARES, S. S. D. (Org.). Brasil em desenvolvimento 2014: estado, planejamento e políticas públicas – vol. 1. Brasília: Ipea, 2014.

16 BARBOSA, N. ‘É preciso ir além com o gasto social, diz ex-secretário executivo da Fazenda’ [15 de fevereiro de 2014]. São Paulo: O Estado de S. Paulo. Entrevista concedida a Alexa Salomão e Ricardo Grinbaum. Disponível em: http://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,e-preciso-ir-alem-com-o-gasto-social-diz-ex-secretario-executivo-da-fazenda,1130766 . Acesso em: 23/04/2015.

17 O benefício variável de R$ 35 por criança até 15 anos e por gestante ou nutriz, R$ 42 mensais por adolescente de 16 ou 17 (limite de cinco filhos), além do benefício básico de R$ 77 se a família for extremamente pobre. As apenas pobres não recebem o benefício básico de R$ 77, apenas o variável.

18 Ver BARROS, R. A efetividade do salário mínimo em comparação à do programa Bolsa Família como  instrumento de redução da pobreza e da desigualdade. In: BARROS, R.; FOGUEL, M.; ULYSSEA, G. (Org.). Desigualdade de renda no Brasil: uma análise da queda recente, v. 2. Brasília: Ipea, 2007.

19 Com base em dados de 2011. Ver: GIAMBIAGI, F. Salário-mínimo – razões e bases para uma nova política. In: Giambiagi, F.; Porto, C. (Org.). Propostas para o Governo 2015/2018. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014. 393p.

20 Foguel, Ulyssea e Courseil (2014). Ver nota 16.

21 Especificamente em relação ao BPC, a desvinculação ainda permitiria a diminuição da informalidade (e, logo, a desproteção no mercado de trabalho e o déficit da Previdência) e a valorização do segurado da Previdência, já que o BPC paga benefícios na mesma idade e de mesmo valor do que a aposentadoria por idade (para homem).

22 Cabe ressaltar que a desvinculação permitiria uma mudança no perfil do gasto do governo federal, deslocando recursos de despesas hoje obrigatórias para despesas discricionárias. O aumento deste tipo de despesa é relevante, já que o orçamento público é considerado engessado, não apenas pelas despesas obrigatórias, mas também pelas receitas vinculadas e os gastos mínimos em áreas específicas.

23 BARBOSA, N.; PIRES, M. Nova Regra para o Reajuste do Salário Mínimo. Seminário Política de Salário Mínimo para 2015-18 – Avaliações de Impacto Econômico e Social. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), 7-8 de maio de 2014. Disponível em: http://portalibre.fgv.br/

24 http://www.correio24horas.com.br/detalhe/noticia/desautorizado-pela-presidente-dilma-barbosa-recua-de-mudanca-no-minimo/?cHash=f4c76c66f31c4dde55a4069b9a514fc4

25 https://twitter.com/dilmabr/status/521315535498530818

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É verdade que as aposentadorias e pensões acima de um salário mínimo estão perdendo valor? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2346&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=e-verdade-que-as-aposentadorias-e-pensoes-acima-de-um-salario-minimo-estao-perdendo-valor https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2346#comments Mon, 01 Dec 2014 15:23:03 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=2346 As aposentadorias e pensões do INSS receberam nos últimos anos aumentos em ritmos muito diferentes. Enquanto o piso dos benefícios da Previdência acompanhou os ganhos reais dados ao salário mínimo, os benefícios superiores a um salário mínimo tiveram aumentos reais muito menores, na maioria dos anos acompanhando apenas a inflação. Assim, os segurados que têm benefícios maiores do que um salário mínimo se queixam da perda de valor de suas aposentadorias ou pensões. A questão que discutimos aqui é a seguinte: houve, realmente, perda para esses beneficiários?

A compreensão de que existe uma perda incita pleitos para que as aposentadorias e pensões sejam majoradas, o que incentivou a apresentação de dezenas de projetos de lei no Congresso Nacional nesse sentido1. Há dois tipos principais de reivindicações: i) que o benefício tenha valor proporcional à razão entre o seu valor inicial e o salário mínimo (piso do INSS) à época de concessão do benefício, ou, pelo menos, que cada benefício receba anualmente aumentos proporcionalmente iguais aos do salário mínimo; ou ii) que o  benefício tenha valor proporcional à razão entre o seu valor inicial e o teto do INSS na época de concessão do benefício2.

Analisemos mais detidamente as fórmulas de reajuste segundo o salário mínimo e segundo o teto:

Reajuste pelo salário mínimo

De acordo com algumas das fórmulas propostas, os benefícios de todos os segurados passariam a ser proporcionais ao salário mínimo, de acordo com a proporção existente entre o benefício e o salário mínimo na ocasião da concessão do benefício. Por exemplo, um benefício que, quando foi concedido, tinha valor equivalente ao de três salários mínimos deveria ser reajustado para que mantivesse essa equivalência.

Outras fórmulas preveem que, daqui em diante, aumentos dados ao salário mínimo sejam reproduzidos nos benefícios (aposentadorias e pensões) de valor maior. Ou seja, se em 2016 o aumento do mínimo for de 10%, também deveria ser aplicado um aumento de 10% a todos que recebem mais do que um salário mínimo.

O objetivo dessas fórmulas seria manter o poder aquisitivo dos segurados nos mesmos patamares da época de concessão dos benefícios.  Argumenta-se que essa perda de poder aquisitivo aconteceu porque os reajustes concedidos aos benefícios com valores superiores aos de um salário mínimo foram inferiores aos reajustes concedidos aos benefícios que correspondiam ao valor de um salário mínimo, o que trouxe perdas aos aposentados e pensionistas que recebiam os benefícios previdenciários com valores acima do mínimo.

Entretanto, a atual fórmula de reajuste dos benefícios contida no art. 41-A do Plano de Benefícios da Previdência Social (Lei nº 8.213, de 1991), já garante a manutenção do poder aquisitivo dos aposentados e pensionistas que recebem benefícios com valores maiores que um salário mínimo. Exatamente com o intuito de preservar o poder de compra desses beneficiários, o referido dispositivo define que os benefícios da Previdência Social sejam reajustados com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

Cumpre esclarecer que o INPC é considerado o índice que melhor reflete o poder compra dos domicílios com rendimento na faixa de um a oito salários mínimos, faixa que contempla a quase totalidade dos segurados do Regime Geral de Previdência Social. Destaca-se ainda que o seu uso foi fruto de acordo entre entidades que representam aposentados e pensionistas e o Governo Federal.

Assim, as referidas fórmulas não trariam como consequência a recuperação do poder aquisitivo dos beneficiários em relação à época de concessão do benefício, mas sim aumentos reais para boa parte dos beneficiários. Isso porque, desde o Plano Real, o governo executou uma política de forte valorização do salário mínimo, principalmente na última década. Pelas fórmulas propostas, o ganho real do salário mínimo seria repassado para os outros benefícios.

Como ilustração, analisemos um benefício fictício de R$ 1.000 concedido em 2004. Aplicando o INPC a esse valor, conforme a lei, chegamos dez anos depois, em 2014, ao valor de R$ 1.673. Assim, teria havido um aumento nominal de 67,3% e nenhuma perda real.

A impressão de que houve perda ocorre quando se compara o aumento desse benefício com os aumentos dados ao salário mínimo. No Brasil, o piso previdenciário (e também o piso assistencial) é vinculado ao salário mínimo. Nos últimos dez anos, por conta da deliberada intenção de valorizá-lo, seu crescimento nominal foi de 178,5%, com grande ganho real, já que a inflação foi de 67,3%. Inicialmente, o benefício de R$ 1.000 equivalia a cerca de quatro salários mínimos (precisamente 3,85) e em 2014 ele equivalia a cerca de dois salários mínimos (2,31).

É essa a comparação feita por quem argumenta que houve perda. Entretanto, a queda na razão benefício/salário mínimo é uma consequência óbvia da valorização do mínimo, e não implica perda real para os segurados que ganham mais do que ele – como vimos, o poder aquisitivo se manteve igual por conta dos reajustes que levaram em conta a inflação.

O gráfico abaixo mostra as duas séries:

Gráfico 1 – Benefício e salário mínimo entre 2004 e 2014

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Fonte: Elaboração própria.

 

É possível ver no gráfico que tanto o benefício quanto o salário mínimo aumentaram entre 2004 e 2014: apesar de o ritmo do aumento do mínimo ter sido maior, diminuindo o hiato entre as duas séries, não houve perda de poder aquisitivo. Cabe salientar que, apenas para simplificar a análise e focá-la no valor real do benefício, consideramos um benefício reajustado somente pelo INPC. Na verdade, aumentos reais são esporadicamente dados aos benefícios maiores do que um salário mínimo, como, por exemplo, em 2010.

A redução da distância entre esses valores, e assim da razão entre os benefícios maiores e o salário mínimo, pode ser considerada um efeito intencional e desejável da política de valorização do salário mínimo, que, entre outros motivos, visava à redução da desigualdade de renda no país. Não apenas os benefícios da Previdência, mas também outros valores da economia cresceram em ritmo menor do que o salário mínimo, o que é natural se a intenção do governo e da sociedade era valorizá-lo.

Como uma simples ilustração, consideremos que uma economia em que existem apenas cinco salários: 1.000 (o mínimo), 2.000, 3.000, 4.000 e 5.000. Cada um desses salários é recebido por 20% da população. O índice de Gini, que mede a desigualdade, seria de 0,27 (quanto maior o índice, pior a distribuição de renda).

Se nessa sociedade todos os salários crescerem em substanciais 50%, mas com uma valorização maior do mínimo para 100%, teríamos os valores de 2.000, 3.000, 4.500, 6.000 e 7.500. Assim, o índice de Gini cairia para 0,20, indicando uma melhora na distribuição de renda. Todos tiveram aumento e não houve perda para as camadas superiores, apesar do ganho maior dos mais pobres. Se, no entanto, todos os salários aumentassem na mesma proporção que o mínimo, teríamos os valores de 2.000, 4.000, 6.000, 8.000 e 10.000. Todos ganhariam, mas a desigualdade ficaria nos mesmos 0,27 iniciais.

É comum também o argumento de que a grande valorização do mínimo aumenta o custo de vida nas cidades (por exemplo, serviços mais intensos em mão de obra ficam mais caros e o mercado consumidor como um todo se amplia e pressiona os preços). Assim, haveria perda do poder aquisitivo, dando ensejo a aumentos para as aposentadorias e pensões maiores que o salário mínimo. Entretanto, se existe aumento do custo de vida por conta do aumento do salário mínimo, esse aumento seria captado por um índice de inflação, como o INPC, que é exatamente o parâmetro para os reajustes dos benefícios maiores e para a manutenção de seu poder aquisitivo.

 Reajuste pelo teto do INSS

 O raciocínio usado em relação ao salário mínimo (piso previdenciário) também se aplica ao teto. Como mostramos nas simulações anteriores, é compreensível que os beneficiários argumentem que suas aposentadorias ou pensões perderam valor porque a magnitude dos aumentos desses benefícios foi menor que a dos reajustes no teto. Para contornar a situação, costuma ser proposta uma fórmula de reajuste que mantém a proporção entre cada benefício e o valor do teto.

A suposta perda ocorreria porque tanto a primeira reforma da Previdência (Emenda Constitucional nº 20, de 1998) quanto à segunda reforma da Previdência (Emenda Constitucional nº 41, de 2003) elevaram o “limite máximo de contribuição” (teto) para o valor nominal de dez salários mínimos da época. Dessa forma, ao vincular o valor dos benefícios à proporção existente, no momento da concessão, entre o benefício e o teto, essa fórmula de reajuste repassaria esses aumentos a todos os benefícios concedidos antes dessas reformas constitucionais. Apenas na reforma de 2003 a elevação do valor do teto foi de 28%.

Ademais, observa-se que, à exceção das alterações feitas pelas referidas emendas constitucionais em dezembro de 1998 e dezembro de 2003, o reajuste do valor do limite máximo de contribuição seguiu, desde a promulgação do Plano de Benefícios da Previdência Social, de 1991, os mesmos índices e datas usados no reajuste dos benefícios. Foram apenas nessas duas ocasiões em que houve redução da razão entre o valor do benefício e o teto.

Ainda assim, mesmo essa redução não implicou perda de poder aquisitivo, que só teria ocorrido, como vimos, caso os reajustes dos benefícios tivessem sido inferiores à inflação. As elevações do valor do teto em magnitude maior que os reajustes dos benefícios podem ter causado aos segurados a impressão de terem sido prejudicados, mas não houve perda no poder de compra de seus benefícios. Cabe ressaltar que essa afirmação não é o mesmo que dizer que os benefícios são altos, mas meramente que não perderam valor.

Assim como os reajustes mais altos para o piso reduzem a desigualdade de renda, como mostrado acima; reajustes mais intensos para o teto tendem a aumentar a desigualdade, visto que o grupo de aposentados e pensionistas melhor remunerados são os beneficiários da elevação do teto.

Outras fórmulas de reajuste

 Além da equivalência com os aumentos do salário mínimo ou do teto, outras proposições no Congresso buscam, com diversas fórmulas, dar aumentos reais para os benefícios superiores a um salário mínimo, seja para grupos específicos3, ou para todos os beneficiários (com fórmulas vinculando ao PIB4, aos rendimentos dos trabalhadores5 ou considerando índices de inflação mais complexos6).

Entre essas, destaca-se a bem intencionada ideia de reajustar os benefícios com um índice de inflação que dê maior peso aos produtos consumidos por idosos, como remédios7. Entretanto, essa noção, apresentada inclusive pela oposição na última eleição presidencial, não considera que, na verdade, boa parte dos beneficiários da Previdência não são idosos. Entre os motivos para isso, que também revelam as distorções da nossa seguridade social8, estão as regras de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição (discutida no texto Por que o julgamento do STF sobre desaposentadoria é importante?), de aposentadoria precoce para mulheres (discutida no texto Por que precisamos reformar a previdência?), de aposentadoria especial e de pensões por morte (também já discutida no blog: Por que a previdência social brasileira gasta tanto com o pagamento de pensões por morte?). De maneira ilustrativa, segundo o Anuário Estatístico da Previdência, apenas 20% dos benefícios concedidos pela Previdência Social em 2012 eram para pessoas com mais de 60 anos de idade, conforme o gráfico abaixo9.

Gráfico 2 – Distribuição por faixa etária dos benefícios concedidos em 2012

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Fonte: Ministério da Previdência Social. Elaboração própria.

 

Cabe observar que não se defende aqui a extinção de benefícios, como as pensões por morte, mas apenas a racionalização dos recursos da Previdência e a aplicação das regras de concessão usadas no resto do mundo – inclusive em países emergentes.

O que o gráfico 2 mostra é que os benefícios da Previdência são concedidos no país em idades em que, normalmente, as pessoas ainda têm uma boa capacidade laboral. Assim, para contemplar as carências dos beneficiários idosos, é preciso uma proposta mais equilibrada e sofisticada do que simplesmente aumentar todos os benefícios.

Considerações finais: como conciliar a insatisfação dos beneficiários com a sustentabilidade do regime?

 Entendemos que as alterações da fórmula de reajuste propostas nos diversos projetos listados no texto  comprometem a sustentabilidade do Regime Geral de Previdência Social. O número de segurados que poderiam ter seus benefícios aumentados com o projeto superaria nove milhões, o equivalente a cerca de 30% do total de beneficiários da Previdência Social. De fato, a Previdência deve manter o poder de compra de seus benefícios, conforme o § 4º do art. 201 da Constituição Federal, mas não está obrigada a prover aumentos reais. A concessão de aumentos reais traria grande impacto financeiro nas contas públicas. Frisa-se também que aumentos na Previdência devem respeitar o § 5º do art. 195 da Constituição (criando não apenas o aumento, mas anunciando de onde virão os recursos) e os arts. 16 e 17 da  Lei de Responsabilidade Fiscal10 (pela sua caracterização como “despesa obrigatória de caráter continuado”).

Vale ressaltar novamente que, apesar de a Constituição Federal e do Plano de Benefícios preverem apenas a manutenção do valor real dos benefícios, desde a implantação do Plano Real foram concedidos aumentos reais aos benefícios maiores que um salário mínimo em 1995 e nos anos eleitorais de 2006 e 2010. Nesse período, pós-Plano Real, a variação do valor dos benefícios acima de um salário mínimo superou a variação do INPC em 25,3%. Assim, não apenas as elevações do salário mínimo ou do teto não acarretaram perdas aos beneficiários, como nos últimos anos também houve aumentos reais dos benefícios, de maior ou menor magnitude dependendo do ano em que foram inicialmente concedidos.

Compreendidas a ausência de perda real dos benefícios e levando em conta a insatisfação dos beneficiários, faz-se necessário analisar as possibilidades de conceder aumentos reais significativos a esses benefícios – que, infelizmente, são poucas. Não existe, em tese, impossibilidade de aumento real das aposentadorias e pensões, mas para que ganhos sejam transferidos do mercado de trabalho para os inativos, é preciso que haja ganhos. Por isso, para que possamos aumentar esses benefícios é essencial que a economia cresça. Isso implica colocar no centro do debate a realidade de estagnação do PIB per capita e da produtividade da economia (ver o texto O que é produtividade e como conseguir seu incremento?)

O crescimento econômico é importante não só para a Previdência agora, mas será também essencial para o seu futuro. Contrariando o mandamento constitucional de equilíbrio financeiro e equilíbrio atuarial, temos um déficit financeiro do INSS estimado para 2014 em R$ 55 bilhões. Mas o cenário pode ser ainda pior. O Tribunal de Contas da União (TCU) lançou neste mês de novembro um documento que estima um déficit atuarial de R$ 3 trilhões em relação ao ano de 2050 – se as regras de concessão de benefícios não mudarem11.

É quase impossível que o mercado de trabalho brasileiro consiga sustentar essa situação. Seria preciso que o país crescesse em um ritmo que nunca crescemos – e mais ainda se quisermos dar aumentos reais para os inativos. Entretanto, o que observamos nos últimos anos é, de fato, uma grande dificuldade de o país sair da estagnação econômica (que, de maneira circular, se deve em parte às distorções da Previdência).

Junto com a recente divulgação de que também a queda da miséria cessou, a estagnação da economia deve estimular o debate sobre a sustentabilidade da Previdência Social. Acreditamos que este seja, nos próximos anos, um dos principais assuntos da discussão política do país. Vivemos atualmente a situação paradoxal de termos, simultaneamente, segurados insatisfeitos e um grave desequilíbrio do sistema.

 

(Este texto é baseado no trabalho “Sobre a Perda de Valor das Aposentadorias: existe perda?”. O estudo integral consta do Boletim do Legislativo nº 17 do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria Legislativa do Senado, disponível no seguinte link: http://www.senado.gov.br/estudos)

__________________

1  Propostas de emenda à Constituição 154/2012 e 43/2007; projetos de lei 6345/2009, 5719/2009, 4509/2008, 4434/2008, 4147/2008, 3273/2008, 3197/2008, 2816/2008, 2229/2007 e 3197/2008; projeto de lei do Senado 558/2013.

2 Em 2015, R$ 4.662,43.

3 Projetos de lei do Senado 285/2014 e 174/2013, e projeto de lei 777/2011.

4 Projetos de lei 5768/2013 e 6048/2009.

5 Projetos de lei do Senado 20/2013 e 361/2012.

6 Projetos de lei do Senado 287/2014, 244/2003 e projeto de lei 2380/2007.

7 Projetos de lei 1732/2007 e 2539/1996.

8 Entretanto, é natural que parte dos beneficiários sejam jovens, como adolescentes que recebem pensão por morte.

9 995.648 pessoas entre 4.957.618 benefícios.

10 Lei Complementar nº 101, de 2000.

11 Pacto pela Boa Governança – Um Retrato do Brasil. Disponível em: http://portal.tcu.gov.br/retratodobrasil/

 

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A desigualdade de renda parou de cair? (Parte III) https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2041&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=a-desigualdade-de-renda-parou-de-cair-parte-iii https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2041#comments Tue, 29 Oct 2013 13:44:19 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=2041 O texto da semana passada mostrou como o mercado de trabalho atuou no sentido de reduzir a desigualdade de renda desde pelo menos o início da primeira década do século XXI. Argumentou-se, naquele texto, que as condições que levaram à redução da desigualdade podem não se reproduzir nos próximos anos, o que faria com que a trajetória de queda se interrompesse.

O presente texto analisa o impacto das políticas sociais mostrando que, também nesse caso, os ganhos mais fáceis em termos de redistribuição já foram obtidos, podendo-se prever redução do seu efeito redistributivo nos próximos anos.

De acordo com IPEA (2013)1, aproximadamente 40% da queda da desigualdade entre 2002 e 2012 decorreu de políticas governamentais, sendo os seguintes os impactos individuais de cada política: aumento do valor real das aposentadorias de menor valor, indexadas ao salário-mínimo (21%); expansão do Bolsa Família (12%) e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) (6%). Souza e Medeiros (2013)2, analisando a variação da desigualdade entre 2002 e 2009, chegam a números similares.

Trata-se de impacto significativo: as políticas sociais estão, de fato, ajudando a reduzir a desigualdade. Todavia, o governo poderia ter feito muito mais em termos de redução da desigualdade e da pobreza sem, ao mesmo tempo, ter prejudicado tanto as perspectivas de crescimento econômico, no curto e no médio prazo.

Em primeiro lugar, deve-se considerar que o Bolsa Família, entre os instrumentos de políticas públicas de redução de pobreza e desigualdade, é o mais eficiente, pois reduz a desigualdade a baixo custo. Já os benefícios previdenciários indexados ao salário-mínimo e o BPC (que também é reajustado de acordo com o mínimo) têm elevado custo fiscal. Outros programas públicos, como o Seguro-Desemprego e o Abono Salarial, além de impacto pífio sobre a desigualdade, também têm custo mais alto que o Bolsa Família.

Não obstante isso, o governo insiste em manter programas sociais menos eficientes e de alto custo, em vez de ampliar as intervenções de menor custo, na linha do Bolsa Família. Em especial, insiste nos aumentos reais do salário-mínimo, que provocam grandes aumentos de despesa pública, gerando desequilíbrio fiscal (além do problema citado na parte II, publicada na semana passada: elevação de custos e perda de competitividade das empresas).

Os aumentos reais do salário-mínimo são uma importante ferramenta eleitoral, o que torna difícil alteração de rota em tal política, a despeito de seus impactos adversos. O resultado é a expansão do gasto público, que pressiona a taxa de juros e a carga tributária. Ambos desestimulam o investimento e o crescimento econômico.

Em segundo lugar, é preciso considerar que a Previdência Social como um todo (considerando-se não só os benefícios de um salário-mínimo mas todas as aposentadorias, pensões e demais benefícios pagos) é fortemente concentradora de renda. De acordo com IPEA (2012)3, em 2011 a Previdência era responsável por 18% de toda desigualdade de renda. Ou seja, se não existissem os pagamentos feitos pela Previdência Social, o Índice de Gini seria aproximadamente 18% menor.

Isso ocorre porque são pagos benefícios de valor mais elevado para segmentos de renda mais alta. Uma reforma da previdência que reduzisse os privilégios hoje existentes (como, por exemplo, a concessão de pensões por morte sem qualquer limitação do prazo de concessão ou restrições de valores), diminuiria esse efeito concentrador de renda. No entanto a reforma da previdência saiu da agenda política, tendo sido aprovada apenas uma versão mitigada da previdência complementar dos servidores públicos.

Em terceiro lugar, houve no período 2007-2010 (segundo mandato do Presidente Lula) significativos aumentos salariais para os servidores públicos, o que também tem impacto concentrador de renda, pois o funcionalismo está no topo da distribuição de renda. Houve aumento real da folha de pessoal da União da ordem de 8% ao ano naquele período4, com posterior estabilização ao longo do Governo Dilma.

De acordo com o texto de Souza e Medeiros (2013), acima citado, entre 2003 e 2009 quase toda a redução de desigualdade promovida pelo Bolsa Família (12%) foi desfeita pelo aumento da remuneração dos servidores públicos, que aumentou a desigualdade em  10%. Note-se que também nesse caso houve deterioração das contas fiscais e necessidade de aumento de impostos e juros, com prejuízo para o crescimento da economia.

Em quarto lugar, duas políticas públicas fundamentais para melhorar as condições de vida da população e ao mesmo tempo elevar a produtividade dos trabalhadores, têm apresentado pouco progresso ou estagnação. Trata-se do saneamento e da saúde.

No caso do saneamento, IPEA (2013, p. 7) apresenta a  informação de que “o percentual de pessoas que tiveram acesso simultaneamente a energia elétrica, coleta de lixo, esgotamento sanitário adequado e acesso adequado à rede geral de água aumentou 1 ponto percentual em 2012, atingindo o universo de 59,2%”. Este é um dado muito ruim: 40,8% da população brasileira não têm acesso a serviços públicos básicos.

É relevante ressaltar que enquanto houve farta distribuição de desonerações tributárias nos últimos anos, as empresas de saneamento básico continuaram a ser taxadas integralmente pelo PIS/COFINS e CSLL, a despeito de haver no Congresso diversos projetos propondo tal isenção.

Na saúde, conforme registra Médici (2011)5, houve descontinuidade de importantes políticas de ampliação de atenção à saúde dos mais pobres. Entre 1992 e 2002 a cobertura do Programa Saúde da Família expandiu-se a uma taxa anual de 25,5%, depois, entre 2002 e 2009, essa taxa reduziu-se para 8% a.a.. A mesma desaceleração foi verificada no Programa de Agentes Comunitários de Saúde, que crescia a 72,6% ao ano entre 1994 e 2002 e desacelerou para 2,5% ao ano no período 2002-2009.

Também foi interrompido o processo de organização da rede de atendimento ambulatorial de forma regionalizada. Por esse meio, postos de atendimento básico filtravam os pacientes mais graves para unidades capacitadas para atendimento mais complexo, geridas pelos estados e cobrindo vários municípios. O sistema regrediu para o modelo anterior de hospitais municipais pequenos, sem economia de escala, baixa capacidade operacional e alta ociosidade.

Pouca ênfase foi dada às experiências de gestão hospitalar por Organizações Sociais, em contratos de gestão mais flexíveis que, comprovadamente, reduzem o custo e aumentam a resolutividade e qualidade dos atendimentos.

Ainda na saúde interrompeu-se a implantação do Cartão SUS, que agregaria qualidade ao atendimento, ao armazenar o histórico clinico dos pacientes. Ao mesmo tempo, o Cartão permitiria a criação de uma câmara de compensação financeira, para que os estados e municípios que prestassem o atendimento fossem por ele remunerados, além de permitir a cobrança, junto a planos de saúde, pelo atendimento de seus clientes que viessem a ser atendidos pelo SUS.

Tais medidas, se levadas adiante, reduziriam a iniquidade no atendimento à saúde, melhorariam a gestão, a produtividade e a qualidade dos serviços prestados. Em última instância, elevariam a capacidade laboral do trabalhador, sua produtividade e as perspectivas de crescimento da economia.

Ou seja, com políticas mais focadas na população pobre teria sido possível diminuir a pobreza e a desigualdade de forma mais intensa do que realmente aconteceu. Esse tipo de aperfeiçoamento da política social se torna cada vez mais importante, pois há motivos para se crer que o atual conjunto de política tende a ter menor efeito sobre a desigualdade nos próximos anos, uma vez que os resultados mais fáceis já foram obtidos. Isso porque:

a) o Bolsa Família e os demais programas sociais estão próximos de esgotar o seu processo de expansão (praticamente toda clientela elegível já é atendida pelos programas) e só continuarão a ter efeito redistributivo se houver aumento real no valor dos benefícios, o que se defronta com a delicada situação fiscal do país;

b) o processo de elevação do valor real do salário-mínimo parece já ter chegado a um ponto de esgotamento, tanto por produzir aumentos artificiais de salários, reduzindo a competitividade das empresas, quanto pela pressão que exerce nas contas públicas via previdência social.

c) Segundo Ferreira et al (2013)6, 32% da população brasileira, em 2009, podia ser classificada como “vulnerável”. Essas pessoas deixaram de ser pobres, mas têm razoável chance de voltar a sê-lo. Uma desaceleração da economia pode levar parte desse grande contingente de volta à pobreza, com possível ampliação dos  índices de desigualdade.

Para evitar que a desigualdade e a pobreza parem de cair é preciso ir além dos ajustes nas políticas sociais referidos ao longo desse texto (inclusive nos setores de saúde e saneamento). Deve-se fazer uma reforma da previdência social que, ao mesmo tempo, reduza a iniquidade daquele sistema e promova ajuste estrutural das contas públicas, o que elevará a poupança agregada e, consequentemente, o potencial de crescimento da economia. Portanto, a reforma da previdência combinaria queda de desigualdade com aumento do crescimento.

Da mesma forma, é fundamental dar prioridade à melhoria da qualidade da educação que é o meio mais garantido de gerar, simultaneamente, redução de desigualdade e crescimento econômico no longo prazo. A oferta de educação de qualidade faz com que o futuro das crianças deixe de depender do nível sócio-econômico dos pais. Um sistema educacional equitativo cria igualdade de oportunidades e promove mobilidade social de uma geração para outra. Sem investimentos em educação as famílias podem até melhorar de vida, mas seus horizontes estarão limitados pelo histórico familiar, pois as suas oportunidades de educação tendem a ser similares ou pouco melhores do que as que seus pais tiveram.

Políticas públicas e reformas que combinem redução da desigualdade com remoção de barreiras ao crescimento devem ser as prioridades governamentais.

__________

1 IPEA (2013) “Duas décadas de desigualdade e pobreza no Brasil medidas pela Pnad/IBGE” – Comunicados do IPEA nº 159, de 2013

2 Souza, P.H.G.F, Medeiros, M. (2013) The Decline in Inequality in Brazil in 2003-2009: the role of the State. Universidade de Brasilia. Economics and Politics Working Paper 14/2013.

3 IPEA (2012) A Década Inclusiva (2001-2011): desigualdade, pobreza e políticas de renda. Comunicado IPEA nº 155, de 2012.

4 Fonte: Boletim Estatístico de Pessoal, mar. 2013. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.

5 Médici, A. (2011) Propostas para Melhorar a Cobertura, a Eficiência e a Qualidade no Setor Saúde. In: Bacha, E.L. e Schwartzman, S. (Orgs.) Brasil: a nova agenda social. LTC editora.

6 Ferreira, F.H.G. et al (2013) Economic Mobility and the Rise of Latin American Middle Class. Banco Mundial.

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Como anda a desigualdade de gênero no Brasil? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=846&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=como-anda-a-desigualdade-de-genero-no-brasil https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=846#comments Mon, 14 Nov 2011 04:01:57 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=846 Desde 2006, o Fórum Econômico Mundial divulga anualmente o Global Gender Gap Index (GGI), que quantifica a magnitude da desigualdade de gênero em mais de 100 países. Em 1º de novembro, foi publicado o GGI de 2011, que classificou o Brasil como 82º dentre 135 países no ranking.

Apesar de índices internacionais tenderem a formas quantitativas de mensuração, o GGI é inovador por combinar dados quantitativos aos qualitativos, estes obtidos pela Executive Opinion Survey do Fórum Econômico Mundial. Além disso, o GGI é o mais robusto dos indicadores de desigualdade de gênero, medindo as disparidades entre homens e mulheres em quatro dimensões, no total de 14 subíndices, de acordo com a tabela I a seguir.

Após serem calculadas as razões, ocorre a normalização dos subíndices por meio da equalização de seus desvios padrões. Os subíndices são então somados, gerando um número para cada dimensão. Posteriormente, é calculada a média das quatro dimensões e esta será igual à pontuação final do país, que pode variar entre 1(igualdade) e 0 (máxima desigualdade).

Em 2006, foram analisados 20 países a menos do que em 2011, e o Brasil, com uma pontuação igual a 0,6543, foi classificado como o 67º país dentre os 115 mensurados. Caso o número de países se mantivesse o mesmo em 2011, a pontuação brasileira, igual a 0,6679, classificaria o País na 76ª posição. Outrossim, nos dois períodos, o Brasil ficou abaixo do índice médio dos 115 países, igual a 0,6617 em 2006 e 0,6824 em 2011.

De 2006 a 2011, o crescimento médio dos índices foi de 4,03%, enquanto o Brasil apresentou uma pequena melhora de 2,1%. É um avanço realmente modesto quando comparado ao Lesotho e a Nicarágua, que aumentaram seus índices em 12,6% e 10,3% respectivamente. Mas é um progresso na busca da igualdade de gênero que não deixa de ser positivo, ao contrário de El Salvador, por exemplo, que viu seu índice diminuir em 3,9%.

O avanço concentrou-se no índice de participação econômica e oportunidades. Mas, apesar da maior inserção da mão de obra feminina no mercado de trabalho em comparação aos anos anteriores, a participação das mulheres ainda é aproximadamente 25% menor em relação à dos homens e a remuneração de homens e mulheres continua consideravelmente desigual.

O subíndice de igualdade salarial classifica o Brasil no último decil do ranking como o 124º país. Já o subíndice de profissionais técnicos, que mensura a mão de obra qualificada, surpreendentemente apresenta razão maior do que 1, o que significa maior quantidade de profissionais femininos do que masculinos, mesmo que, no geral, a taxa de desemprego de mulheres adultas seja 11%  e a dos homens adultos, 5%. No total, considerando a média dos subíndices, o desempenho brasileiro na dimensão econômica obteve a pontuação 0,6490, ocupando a 68ª posição.

Entretanto, é necessário ressaltar que o GGI não quantifica o trabalho informal e/ou doméstico, o que denota falta de representatividade do índice para países que, como o Brasil, tem parte expressiva de sua renda vinculada à economia informal. Infelizmente, nenhum outro índice em voga preenche essa lacuna. O índice de desenvolvimento humano (IDH) elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) não desagrega seus subíndices por sexo.  O Gender-Related Development Index (GDI) também criado pelo PNUD é considerado indicador de desenvolvimento e não de desigualdade, por não ter razões entre mulheres e homens como sua base de cálculo. O Social Institutions and Gender Index (SIGI) da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD) aborda o aspecto institucional da desigualdade de gênero e o Gender Equity Index (GEI) da organização Social Watch estuda o poder político, a educação e a participação econômica, mas não analisa a esfera da saúde, como faz o Global Gender Gap Index.

A dimensão concernente à saúde é a de melhor performance nacional no GGI, repetindo o que já havia sido observado em 2010, pois o Brasil obteve novamente a pontuação máxima, garantindo a 1ª posição junto a mais 37 países. Mas, isso não significa que o sistema de saúde brasileiro tenha qualidade satisfatória – o GGI não é um índice de desenvolvimento, mas de desigualdade de gênero. Logo, a pontuação representa apenas que há condições de igualdade entre homens e mulheres nessa esfera.

Também a educação brasileira é bem avaliada quanto à igualdade de gênero, mantendo-se a pontuação de 2010, igual à 0,990, sendo classificado como o 66º país nesse índice. A taxa de alfabetização é a mesma para homens e mulheres, havendo uma pequena prevalência masculina no ensino fundamental. Contudo, no ensino médio e no superior, as mulheres são mais numerosas do que os homens.

A dimensão política é a de pior desempenho do Brasil nos seis anos analisados, sendo classificado em 2011 como o 114º, com uma pontuação igual a 0,053, atrás de países como Chade, Mali e Azerbaijão. Esse cenário, contudo, apresenta-se melhor do que o do ano anterior, quando o índice político brasileiro obteve pontuação igual a 0,049. Vale ressaltar que o poder político tende a ser a dimensão mais desigual em todos os países analisados, mas a representatividade das brasileiras na política é ínfima e realmente alarmante, apesar da eleição da presidente Dilma Rousseff e das tentativas de se implementar uma política eleitoral efetiva de cotas para mulheres desde 1995.

As regras sobre a participação política feminina estabelecem apenas uma reserva partidária de vagas que, muitas vezes, acabam por não ser preenchidas, devido a uma gama de fatores culturais, sociais, econômicos, psicológicos e institucionais. E mesmo que as vagas sejam preenchidas, isso não significa necessariamente que haverá um maior número de mulheres eleitas.

Vários países latino americanos foram classificados de forma significativamente superior ao Brasil no quesito político. A Argentina, por exemplo, possui a 20ª colocação nesse índice, próxima do Chile na 22ª. Também no ranking geral, ambos estão melhor que o Brasil – o Chile está na 46ª posição e a Argentina na 28ª, a melhor classificação da América do Sul, enquanto na região, o Brasil é o último colocado, devido principalmente ao seu péssimo desempenho na política, atrás de vizinhos como Paraguai, Bolívia e Peru.

O desafio brasileiro, portanto, consiste em estender os bons resultados da educação para a economia e para a política. A qualificação profissional feminina deve servir de base para maior participação das mulheres no mercado de trabalho formal e para remuneração salarial igualitária, além de uma representação política, no mínimo, mais expressiva.

As mensurações fornecem subsídio para mover o debate analítico sobre a igualdade de gênero de uma postura passional para um posicionamento concreto baseado em argumentos objetivos, pois o que é medido e documentado é mais facilmente combatido. Assim, dar visibilidade ao posicionamento desigual de homens e mulheres na sociedade é fundamental para desconstruir o caráter estrutural da desigualdade de gênero, um dos mais persistentes eixos de desigualdade.

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Para ler mais sobre o tema:

http://reports.weforum.org/global-gender-gap-2011/

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Por que não regionalizar o salário mínimo? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=440&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=por-que-nao-regionalizar-o-salario-minimo https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=440#comments Mon, 11 Apr 2011 09:00:54 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=440 Apesar dos esforços econômicos e dos avanços significativos obtidos com as políticas que conduziram à estabilidade de preços e à distribuição de renda, via programas sociais, nos últimos 16 anos, a desigualdade ainda persiste no Brasil. Nosso país ainda precisa avançar muito na composição de políticas econômicas e sociais que atendam ao objetivo de melhorar a vida dos brasileiros de forma perene.

Um tipo de desigualdade que continua presente em nossa sociedade está relacionada à determinação do salário mínimo. No Brasil, o valor do salário mínimo é determinado pelo Poder Executivo Federal. Na verdade, o valor é previsto no orçamento e vem sendo fixado por Medida Provisória, que tramita no Congresso Nacional, sendo que os parlamentares podem alterar o valor do piso nacional durante as discussões. Havendo alteração, a matéria vai à sanção do Presidente da República, que pode vetá-la.

O salário mínimo serve de base para qualquer contrato no mercado de trabalho. Nenhum trabalhador, independentemente da região, área rural ou urbana, poderá receber menos do que o mínimo estabelecido pelo governo. Ademais, este salário também serve de indexador para outros contratos de trabalho e para o nível básico das aposentadorias do INSS. Mais, o mínimo afeta a folha de pagamento de todos os estados e municípios brasileiros, de modo que os reajustes promovidos conduzem a custos fiscais elevados, a depender da decisão do governo federal e do Legislativo, evidentemente, uma vez que se pode dizer que é uma decisão conjunta. Discordâncias entre os Poderes Executivo e Legislativo conduzem a matéria a uma negociação política cujo resultado dependerá da resultante das forças em jogo.

Um problema claro na determinação de um salário mínimo nacional é não levar em conta as diferentes realidades regionais, tanto de renda quanto de nível de preços. Por exemplo, uma prefeitura que tem poucos recursos pode ter dificuldades em pagar um salário mínimo muito alto, enquanto prefeituras com mais recursos são pouco afetadas pelo mínimo nacional. Este tipo de política, portanto, ajuda a manter os níveis de renda equiparados entre as prefeituras do país, mas cria problemas fiscais para aquelas de menor receita per capita. Quando o salário mínimo federal aumenta, ele eleva os gastos dos estados e municípios ricos e pobres de forma desproporcional. Muitos estados e municípios ficam engessados, com uma folha inchada.

Um segundo problema está relacionado ao fato de que o salário mínimo nacional não leva em conta as desigualdades no nível de preços. Usando os dados da cesta básica do Dieese, podemos fazer comparações simples. A cesta básica, em São Paulo, custava R$ 265,15 em dezembro de 2010. Este valor era de R$ 175,88 em Aracaju. Uma diferença de 50,75%. Isto somente para alimentação. Ou seja, o poder de compra de um indivíduo que recebe o mesmo salário mínimo e que, por hipótese, consuma a grande maioria dos bens componentes da cesta básica, é muito maior em Aracaju do que em São Paulo.

Finalmente, devemos levar em conta os efeitos microeconômicos sobre a oferta e demanda por trabalho em cada região. Certamente, alguns trabalhadores de Aracaju estariam dispostos a trabalhar formalmente por um valor inferior ao mínimo. Mas, talvez, o salário mínimo não afete muito o equilíbrio entre oferta e demanda em São Paulo. Como resultado, o mercado de trabalho estaria equilibrado em São Paulo, mas haveria um excesso de oferta de trabalho em Aracaju. Evidentemente, seria razoável supor que também um piso faria todo sentido em Aracaju, mas muito provavelmente ele não seria, em um ambiente com regras regionais, e não nacionais, idêntico ao de São Paulo.

Uma política mais eficiente seria levar estas desigualdades regionais em consideração. A nossa proposta, então, seria a de criação de um salário mínimo regional, determinado pelos estados. Cada estado elaboraria sua própria política salarial, levando-se em conta as desigualdades de renda. Isto já acontece, parcialmente. Estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, por exemplo, possuem mínimos regionais acima do piso nacional. Em São Paulo, existem, inclusive, diferentes faixas salariais de acordo com a profissão. O que não acontece é uma mudança no sentido contrário, ou seja, um salário regional abaixo do nacional.

Este tipo de política permitiria uma separação dos problemas gerados pelo salário mínimo nacional: elevados custos para os estados/municípios pobres, desigualdade do poder de compra e efeitos de oferta e demanda no mercado de trabalho. É verdade que, mesmo dentro dos estados, há heterogeneidade quanto à capacidade de remuneração dos municípios. Mas, como a heterogeneidade tende a ser menor no nível estadual, as finanças dos municípios mais pobres serão provavelmente menos afetadas em um contexto de determinação regional do salário mínimo.

Ao primeiro olhar, pode-se pensar que esta política exacerbaria as desigualdades regionais, já que provavelmente o mínimo de São Paulo seria (e de fato é) maior do que o de Aracaju, escolhendo duas cidades como exemplos práticos para que diferenças bastante evidentes possam ser colocadas em destaque nesta breve análise. Mas as pessoas se esquecem das desigualdades de poder de compra. Este é o ponto fundamental. Um aluguel é muito maior em São Paulo do que em Aracaju, e o mesmo vale para a cesta básica, como vimos anteriormente. Sem mencionar que, efetivamente, municípios mais pobres, sob a nova regra regional, passariam a ter maior disponibilidade de receitas para gastar em outros programas. Tais programas poderiam gerar maiores benefícios à população pobre, quando comparado ao pagamento de salários, que muitas vezes beneficiam um seleto grupo de habitantes locais, que recebem rendimentos superiores à realidade da média da população local, sem a devida contraprestação de serviços públicos. Em outras palavras, a população mais pobre poderia ser beneficiada com programas de investimento em educação, transferência direta de renda e outros tantos que poderíamos gastar mais outros milhões de caracteres para descrever!

Essa política regional possibilitaria uma maior organização das finanças públicas de estados e municípios, que poderiam investir mais em serviços públicos e, ao mesmo tempo, permitiria um equilíbrio mais próximo do equilíbrio de mercado em cada um dos mercados de trabalho locais.

No entanto, para elaborar tal política, seria necessário alterar a Constituição Federal, pois o inc. IV do art. 7º da Carta Magna dispõe que o trabalhador tem direito a “salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado”. Essa alteração envolve um custo político extremamente elevado, mas que merece ser enfrentado.

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O aumento do salário mínimo e dos benefícios a ele vinculados favorece ou dificulta a eliminação da miséria no Brasil? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=173&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=o-aumento-do-salario-minimo-e-dos-beneficios-a-ele-vinculados-favorece-ou-dificulta-a-eliminacao-da-miseria-no-brasil https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=173#comments Fri, 11 Feb 2011 00:18:21 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=173 Mais de 20 milhões de pessoas foram retiradas da pobreza em função das transferências previdenciárias, particularmente no âmbito do setor rural[1]. De fato, a previdência no Brasil cumpriu papel relevante não apenas na redução da pobreza entre idosos quanto na redistribuição de renda em favor destes últimos e na redução das desigualdades regionais.

O caráter distributivo fica evidente quando se constata que, embora apenas metade da força de trabalho brasileira contribua para a previdência, a quase totalidade dos idosos é hoje coberta por benefícios previdenciários ou pelo benefício assistencial de prestação continuada (BPC) pago ao portador de deficiência e idoso (65 anos ou mais) de família com renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo.

Com relação ao setor rural , a quase totalidade dos benefícios previdenciários concedidos possui caráter eminentemente assistencial. Além de seus trabalhadores se aposentarem cinco antes que os urbanos, as contribuições previdenciárias oriundas desse setor nem de longe cobrem as despesas. A base contributiva é pequena, assim como reduzidas são as condições efetivas de contribuição dos trabalhadores rurais brasileiros, cuja grande maioria é carente.

Com isso, a arrecadação rural só consegue cobrir cerca de 10% da sua despesa com benefícios, sendo a diferença coberta pelo Tesouro Nacional, conforme se verifica abaixo.

Arrecadação Líquida, Despesa com Benefícios Previdenciários e Resultado Previdenciário, segundo as clientelas urbana e rural (2009)

R$ milhões de Dez/2009 – INPC

Clientela Arrecadação Líquida (a) Benefícios

Previdenciários (b)

Resultado (a-b)
Urbana 168.611 170.108 (1.497)
Rural 5.298 42.518 (37.220)
Total 173.908 212.626 (38.717)

Fonte: MPS (2010)

Esses benefícios rurais – que, em 2008, superaram as transferências do Fundo de Participação dos Municípios (principal transferência feita pelo Governo Federal aos governos municipais) em cerca de 2/3 dos municípios –, somados ao benefício assistencial, constituíram verdadeiros motores das economias locais. Melhoraram a vida no campo, desestimularam a migração para os centros urbanos e transferiram recursos dos municípios mais ricos para os mais pobres. Efeitos inquestionavelmente positivos.

Agregando o Programa Bolsa Família, constatamos que as transferências de renda hoje representam quase 20% da renda das famílias, contribuindo inequivocamente no combate à pobreza no Brasil[2].

Não obstante, embora se perceba a relevância das transferências para todas as idades, é de fato na população mais idosa que se verificam os maiores benefícios: com a expansão das transferências previdenciárias (87% do total) e da assistencial, o percentual de pobres entre indivíduos com 65 anos ou mais de idade  despencou de 14% em 1978 para menos de 2% em 2008.

É fundamental destacar ainda que não apenas a quase totalidade dos idosos brasileiros recebe renda, como esta renda tem crescido sistematicamente para a maioria deles nos últimos anos. Dois em cada três segurados da previdência social e a totalidade dos beneficiários do BPC recebem benefícios iguais ao salário mínimo, cujo valor aumentou 122% acima da inflação entre 1995 e 2010.

Com isso, estima-se que hoje a cada R$ 1 real de elevação do salário mínimo, as despesas com benefícios previdenciários sobem R$ 198 milhões e as relativas ao BPC, R$ 46,3 milhões. As receitas, por seu turno, por não estarem concentradas em torno dos benefícios de um salário mínimo, crescem apenas R$ 14 milhões. Resultado: o déficit total do INSS é elevado em R$ 230 milhões a cada R$ 1 de aumento do mínimo.

Fruto, em grande parte, da política de valorização do salário mínimo e de sua vinculação ao piso dos benefícios da previdência social, o crescimento dos gastos previdenciários, nos últimos anos, foi estratosférico – passaram de 2,5% para 7,2% do PIB, entre 1998 e 2009 –, abocanhando hoje 32% do total da despesa primária federal.

No caso do benefício assistencial, a situação é menos grave, embora requeira atenção, já que os respectivos gastos mais que dobraram, passando de 0,27% do PIB em 2003 para 0,60% em 2010, o que representa quase 3% da despesa não financeira da União (maior, portanto, do que os dispêndios do Programa Bolsa Família, responsáveis por menos de 2% dessa despesa).

Embora as despesas do BPC sejam maiores do que as do Bolsa Família, o primeiro programa assistencial beneficia 3,2 milhões de idosos e deficientes enquanto o segundo, 12,4 milhões de famílias.

Resultado desse substancial avanço das despesas previdenciária e assistencial vis-à-vis a política de obtenção sistemática de superávits fiscais primários, gastos essenciais ao crescimento autossustentado do País acabaram sendo comprimidos, ao longo do tempo, tais como os vinculados a investimentos em infraestrutura e educação, além dos direcionados à saúde, segurança pública e outros essenciais ao bem-estar da população brasileira.

Além disso, quando se focaliza a situação dos mais jovens e responsáveis pelo Brasil de amanhã, constata-se que, enquanto a pobreza praticamente acabou entre os idosos, 44% das crianças de até 14 anos de idade são pobres, das quais perto de 20%, extremamente pobres. Não seria chegada a hora de passar a focalizar as transferências de renda primordialmente nos mais jovens (sem deixar de amparar os idosos, obviamente)?

Nesse contexto, cabe averiguar se continuar pagando benefícios previdenciários e assistenciais cada vez mais elevados para idosos, já que seguem a política de valorização do salário mínimo, é a melhor forma de reduzir a pobreza e a triste indigência que ainda assolam nosso País.

Ao comparar o combate à pobreza no Brasil com o ocorrido em outros países da América Latina, conclui-se que nossa política não tem sido tão efetiva quanto poderia ter sido, em face do substancial nível dos nossos gastos sociais. Isso porque, de acordo com dados da Cepal de 2008, registramos a quarta pior performance do Continente.

Ademais, informações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilios (PNAD) para o mesmo ano permitem inferir que, entre aqueles que recebem benefícios previdenciários equivalentes a um salário mínimo, somente 7,6% continuam pobres e apenas 0,6%, extremamente pobres. No caso dos idosos que recebem o benefício assistencial de prestação continuada, apenas 9,4% permanecem pobres e 0,8%, extremamente pobres.

Essas estatísticas traduzem a seguinte realidade: resultado da expressiva escalada de aumentos reais verificada pelo piso salarial de nossa economia, quem hoje o recebe não mais pode ser considerado pobre. Isso, por sua vez, implica que, no futuro, novos incrementos reais no valor do salário mínimo tenderão a melhorar a vida dos que, felizmente, já conseguiram deixar para trás a miséria e se distanciar da pobreza. É como se houvesse dois indivíduos pobres, sendo um mais pobre que o outro, e o menos pobre fosse aquele que estivesse recebendo as maiores transferências de renda. Tal estratégia reduz a pobreza, mas não da forma fundamental.

Em outras palavras: embora a vinculação do salário mínimo ao valor do piso previdenciário e do benefício assistencial de prestação continuada tenha contribuído para a redução da pobreza no Brasil, especialmente entre os idosos; a política de valorização desse salário já atingiu um patamar a partir do qual seu efeito sobre a pobreza está praticamente esgotado.

Conclusão: aumentar os gastos com a previdência social e com o pagamento do benefício assistencial não é hoje o melhor instrumento para reduzir a pobreza e pouco resultado tem na diminuição da miséria.

Desse modo, defender as elevadas despesas advindas da política de valorização do salário mínimo sob o argumento de que constituem importante instrumento de redução da pobreza esconde hoje uma grande verdade: se parcela dos gastos redundantes do sistemático aumento do piso previdenciário e do BPC for alocada na expansão de programas sociais efetivamente focalizados nos extratos inferiores de renda, como por exemplo, o Programa Bolsa Família, a pobreza e a miséria diminuirão muito mais.

Assim, caso se queira contribuir para a concretização do pacto contra a miséria proposto pelo novo Governo lançado ao poder a partir de 2011, o mais indicado é mudar a estratégia. Ao invés de continuar elevando a renda daqueles que recebem benefícios previdenciários e assistenciais equivalentes ao salário mínimo, o mais indicado é preservar o valor real desses benefícios (mediante reajustamentos anuais por índice de preços), direcionando parte dos recursos poupados pela não concessão de aumentos reais aos programas de transferência de renda efetivamente focados nos mais pobres.

Se a opção for por dar continuidade à política de valorização do salário mínimo, isso exigirá que se elimine a vinculação entre este salário e os valores do piso previdenciário e do benefício assistencial de prestação continuada.

Tal estratégia possibilitará manter a proteção aos idosos e, ao mesmo tempo, melhorar a qualidade de vida dos brasileiros de baixa renda mais jovens, potencializando, assim, a redução da pobreza e a eliminação da miséria que ainda impedem que tais cidadãos sejam partícipes do crescimento econômico do Brasil. E o melhor: sem pressionar o aumento das despesas públicas, que devem passar a conferir maior foco aos investimentos em infraestrutura e aos gastos em educação, essenciais ao desenvolvimento sustentado da economia brasileira, com evidentes benefícios à camada mais pobre da população.

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Para ler mais sobre o tema:

AMARO, Meiriane N. Terceira Reforma da Previdência: até quando esperar? Brasília: Centro de Estudos da Consultoria do Senado, fev/2010 (Texto para Discussão nº 84). Disponível no site: http://www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_discussao.htm

Palavras-chave: salário-mínimo, miséria, benefícios, previdenciários, aposentadorias, idosos, pobreza, redistribuição de renda, bolsa família.


[1] MPS. “Evolução Recente da Proteção Previdenciária e seus Impactos sobre o Nível de Pobreza”. Informe da Previdência Social, vol. 22, nº 10, outubro 2010. Brasília: MPS, 2010.

[2] IPEA. Previdência e Assistência Social: Efeitos no Rendimento Familiar e sua Dimensão nos Estados. Comunicados do IPEA nº 59, 22/07/2010. Rio de Janeiro: IPEA, 2010.

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