mercado – Brasil, economia e governo https://www.brasil-economia-governo.com.br Thu, 18 Jun 2020 17:39:29 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.2 Leis que dão desconto em escola ou congelam preço de remédio criarão caos https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=3270&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=leis-que-dao-desconto-em-escola-ou-congelam-preco-de-remedio-criarao-caos Thu, 18 Jun 2020 17:38:37 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=3270 Tenho acompanhado com muita preocupação os Projetos de Lei em tramitação nas várias casas legislativas pelo país afora. Infelizmente muitas das leis que têm sido aprovadas sob o pretexto de proteger a sociedade só gerarão um caos em vários setores da economia. Já tinha escrito um pouco sobre isso no início de abril “A epidemia de medidas descoordenadas pode agravar a pandemia do coronavírus”, mas parece que de lá para cá a situação apenas se agravou.

Para mim, ainda não está claro se isto tem ocorrido por uma absoluta incapacidade dos nossos políticos de avaliar os efeitos econômicos do quanto tem sido proposto ou se é apenas um comportamento oportunista e populista, que contam com a possibilidade de veto por parte do executivo. Na realidade, o conjunto de propostas legislativas que têm sido aprovado nada mais é do que um caso clássico de expropriação de receita privada cujo resultado para a sociedade será o pior possível.

O exemplo mais gritante é a obrigação imposta às escolas particulares para reduzir entre 30% a 40% o valor das mensalidades (Maranhão, Espírito Santos e Rio de Janeiro são só alguns dos exemplos). Já não bastasse o Estado não fornecer um ensino público com o mínimo de qualidade, alguns políticos resolveram simplesmente inviabilizar o ensino privado. Me pergunto se eles sabem qual a margem de lucro deste setor.

Há outras propostas envolvendo o setor da saúde que nada mais são do que o “canto eleitoral da sereia”. Por exemplo, proibir a suspensão dos planos de saúde durante a pandemia (caso do Maranhão) é mais um caso clássico de querer obrigar a que o privado cumpra o papel do Estado, sem permitir a que se receba qualquer remuneração por isso. Me pergunto ainda quem cobrirá o rombo operacional dessas empresas, tomando ainda por base todo o dinheiro público aparentemente desviado nesta pandemia.

Ainda no campo da saúde, o Senado aprovou nesta semana o Projeto de Lei n° 881/2020, congelando os preços dos medicamentos. Além de simplesmente atropelarem a Lei de Liberdade Econômica que aprovaram no ano passado, o efeito mais direto desta determinação será o desaparecimento de alguns medicamentos das prateleiras das farmácias, principalmente os de uso contínuos.

Na Câmara dos Deputados, há projetos de todo tipo determinando a suspensão de corte de serviços com luz, telefone, água e gás por inadimplência (um exemplo é a do Deputado Marcão Gomes do Partido Liberal). Neste caso, gostaria que o nobre deputado esclaressece de onde essas empresas retirarão o dinheiro para garantir a continuidade desses serviços, pagar seus funcionários ou para fazer os investimentos tão necessários na manutenção de suas respectivas redes. No setor de telecomunicações, em particular, a pérola da vez veio do plenário da Alerj que, atropelando competência federal, derrubaram o veto do governador Wilson Witzel ao Projeto de Lei no 2.012/2020. Com isso as operadoras de celular ficam obrigadas a disponibilizar gratuitamente acesso ilimitado a sites de comunicação, redes sociais e serviços de streaming (que mais sobrecarregam as redes) sem descontar do pacote de franquia de dados contratado pelo cliente.

No setor financeiro retorna a velha história de congelamento de taxa de juros, com o Projeto de Lei no 1166/2020, de autoria do Senador Álvaro Dias do PODEMOS. A ideia é estabelecer um teto de 20% ao ano para todas as modalidades de crédito ofertadas por meio de cartões de crédito e cheque especial para as dívidas contraídas entre os meses de março de 2020 e julho de 2021. Já escrevi nesta coluna deixando claro minha posição de que os juros no Brasil são realmente muito elevados, mas não se cura uma febre colocando gelo no termômetro; e os juros são apenas o ponteiro do termômetro. Ao invés de se dar o remédio correto que amplie a concorrência e que reduza os preços neste mercado (tarifas bancárias e juros), a proposta do Senador só criará mais distorções no setor. Ao não levar em consideração l o custo de captação de recursos no país, podemos restringir ainda mais o pouco crédito hoje disponível no mercado. Aliás, é natural que em momentos de maiores riscos e incertezas, o custo do dinheiro fique mais caro e menos disponível. Não por outra razão, o governo está finalmente estudando como dar garantias para elevar a liquidez no mercado financeiro em um momento como este.

Mas o pior efeito desta decisão pode ser a redução futura da concorrência. Como os grandes conglomerados financeiros verticalizados atuam em vários segmentos de mercado, eles certamente terão como compensar a queda forçada dos juros nos preços de outros serviços (como tarifas bancárias, seguros, etc). Já aquelas instituições menores, que atuam em nichos específicos de mercado, terão mais dificuldade de se ajustar, reduzindo sua capacidade de crescer e concorrer no mercado. Note-se que a potencial cobrança ou elevação do valor das tarifas bancárias poderá ainda reduzir o nível de “inclusão financeira digital” no país, que vinha crescendo ao longo do tempo.

Finalmente vale citar os Projetos de Lei que impõem a proibição de descontos salarias de servidores para pagamento de consignado (casos de Maranhão e Rondônia). A impossibilidade de desconto para quem não perdeu emprego e renda já é por si só um tanto quanto inusitado, mas o que os políticos fizeram foi, no mínimo, criar duas categorias de consumidores demandantes de crédito. O problema é que certamente os bancos procurarão compensar essa perda momentânea de fluxo de caixa com os novos demandantes de crédito, que são principalmente do setor privado. Ademais, contrariando toda a lógica do objetivo do consignado, a instituições financeiras entenderão no futuro que o risco para empresar para funcionário público se elevou, o que possivelmente impactará as taxas de juros cobradas com este tipo de empréstimo.

Acredito que muitos dos projetos aqui destacados sofrerão veto por parte do Executivo ou serão derrubados no judiciário, dada a nítida inconstitucionalidade da maioria deles. De toda forma, o estrago já está sendo feito. Seja pelo custo financeiro momentâneo e o de transação no processo de contestação nas várias esferas judiciárias, seja por darem um péssimo sinal para os investidores sobre a perspectiva de rentabilidade no país de cada um desses setores. No fundo, o recado dos políticos está sendo que contratos por aqui pouco valem e que os riscos de investimento no país são muito maiores do que na maioria dos demais países do mundo.

 

*Texto de autoria de Cleveland Prates e originalmente publicado no Portal UOL. Aqui reproduzido com consentimento do autor.

 

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Análise alternativa de fusões: indicadores de preços x definição de mercado relevante https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=3114&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=analise-alternativa-de-fusoes-indicadores-de-precos-x-definicao-de-mercado-relevante Wed, 29 Nov 2017 18:27:22 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=3114 1. Introdução

A análise de fusões e aquisições representa uma grande parte do trabalho do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), autarquia responsável pela preservação da concorrência no país. Em 2016, 389 atos de concentração foram notificados, isto é, processos de fusão entre duas ou mais empresas ou de aquisição de controle de uma pela outra1. Entre todos os casos julgados pelo Conselho, 55% corresponderam aos atos de concentração.

Os números acima ressaltam a importância da utilização de métodos eficazes para a análise de tais casos. A Lei 12.529/11 inovou no sistema de concorrência brasileiro ao exigir que os atos de concentração sejam previamente notificados antes de consumados, ao contrário do que ocorria no passado2. Dessa forma, o Cade possui 240 dias para aprovar ou não as propostas de aquisição de empresas. Essa análise pode ser resolvida em até 30 dias se elas forem enquadradas como procedimento sumário, ou seja, com menor potencial ofensivo à concorrência. Entre as possíveis condições para esse enquadramento, a mais comum é a baixa participação de mercado (menor que 20%, nos casos das fusões horizontais3).

A hipótese de que a combinação entre empresas com baixa participação de mercado é menos lesiva à concorrência parte do paradigma estrutura-conduta-performance da economia industrial cujo pressuposto é que indústrias muito concentradas têm menor incentivo à inovação e maior probabilidade de aumento de preços4. Todavia, em uma indústria na qual há produtos diferenciados, isto é, com características específicas que tornem um produto preferível a um similar, essa hipótese não é necessariamente verdadeira. Mesmo que uma empresa detenha grande poder de mercado, é possível que sua participação em um nicho específico seja menor, não significando que a fusão irá resultar em aumentos de preços (e vice-versa).

Diante desse desafio, acadêmicos como Farrel e Shapiro (2010)5 e Salop e Moresi (2009)6 desenvolveram indicadores informativos que vêm sendo adotado por autoridades da concorrência da União Europeia e dos Estados Unidos. Estes visam estimar os possíveis efeitos unilaterais de aumentos de preços de uma fusão sem a necessidade de utilização de modelos econométricos sofisticados. Os autores, ambos antigos servidores do sistema de concorrência americano, ressaltam que a análise de um ato de concentração precisa considerar dois efeitos opostos: a perda de competição direta entre duas empresas, que cria uma pressão positiva sobre os preços; e as reduções de custo marginal que, por sua vez, geram eficiências e possível diminuição dos mesmos. Em alguns casos, a hipótese de que a fusão irá criar uma concentração requer uma definição de qual é o mercado em questão. A tarefa de encontrar esse mercado específico, não sendo trivial7, acaba por tomar muito tempo dos técnicos de concorrência, o que pode ser minimizado com o uso dos indicadores de pressão de preços (do inglês index of pricing pressure ou IPP).

Na revisão do Guia para análise de atos de concentração horizontal (o “Guia H”)8, o Cade incluiu conceitos como elasticidade de preços cruzadas e taxas de desvio, que fazem parte da ideia por trás desses índices. Grande parte dos operadores do direito e da economia da concorrência, no entanto, ainda desconhece esses indicadores. O objetivo deste artigo, portanto, é apresenta-los de forma resumida, de modo a facilitar a vida dos interessados em política da concorrência e promover um debate mais qualificado.

2. Primeiros conceitos: elasticidade-cruzada e taxa de desvio

A dificuldade em se analisar o efeito de uma fusão com base apenas nas suas participações de mercado (market share) pode ser vista com o seguinte problema: suponha que haja quatro redes de supermercados em um município, cada um com participação de 25%. A compra de uma rede pela outra automaticamente gera uma concentração de 50%, índice moderadamente preocupante sob a ótica da análise clássica da concorrência9.

Todavia, supomos que esses mercados estão espacialmente distribuídos na cidade, sendo que os supermercados A e B estão a menos de 1 quilômetro de distância; já entre os mercados B e C ou B e D (ou A e C e A e D) há uma distância maior a ser considerada pelo consumidor, cerca de 5 quilômetros.

Fica claro que, mesmo possuindo um market share de 25% cada, a fusão entre os supermercados A e B tem maior probabilidade de gerar prejuízos à concorrência que uma fusão entre os mercados B e C, por exemplo. Isso porque é necessário considerar a preferência do consumidor pelas quatro lojas. No caso acima, a chance de o cliente migrar para o mercado B no caso de um aumento de preços no supermercado A é maior que para o mercado C. Mas não se pode descartar a hipótese de que o mercado C esteja no caminho de um consumidor cativo de A, que pode aproveitar para comparar os preços entre as duas lojas. A essa preferência de um produto sobre o outro chamamos de elasticidade-preço cruzada. No caso, o efeito sobre a demanda na loja B quando a loja A aumenta seu preço é positivo quando elas são substitutas.

Portanto, um supermercado, ao planejar um aumento de preços, considera a clientela que irá perder para a loja concorrente, de modo que o incentivo que ele tem para aumentar os preços é denominado taxa de desvio. Ela representa a proporção de clientes da loja A que migrariam para a loja B caso a primeira promovesse um aumento os preços.

Em fórmula matemática, a taxa de desvio (do inglês, diversion ratio ou DR) é a razão entre a elasticidade cruzada do produto B em relação aos preços de A e a elasticidade-preço do produto A (ou a sensibilidade da demanda de A face um aumento de preços):

No exemplo acima, vamos assumir que, diante de um aumento de 10% nos preços de A, a taxa de desvio do supermercado A para o B é de 40%, de A para C de 10% e de A para D de 4%.

3. O índice positivo de pressão de preços (UPP)

No exemplo acima, caso os supermercados A e B sejam objetos de fusão, A vende apenas o produto 1 e B vende apenas o produto 2, sendo 1 e 2 muito semelhantes, mas diferenciados pelo custo que o consumidor tem de ir de uma loja para a outra. Cada loja, individualmente antes da fusão, uma possui uma função lucro (π) que depende das quantidades (q) e dos preços (p), deduzidas dos custos (c) de se obter cada produto:

A corporação que coordenará as duas empresas após a fusão pode controlar a quantidade vendida de A ou B para maximizar o lucro final colocando uma “taxa” interna em cada supermercado. Essa taxa, na verdade, é o custo de oportunidade de vender mais de um produto em detrimento do outro. Supondo a empresa A é a primeira a ter o lucro maximizado:

Logo, para maximizar o lucro da firma B, sendo que agora elas fazem parte da mesma corporação, ela será “taxada” ao equivalente à maximização de lucro da firma A:

O termo  (dq2/dq1) é a taxa de desvio da loja A para B, isto é, o quanto do produto 2 deixa de ser produzido quando existe a opção de aumentar a produção de 1. O termo (p2-c2 ) é a margem de lucro da firma 2. Da mesma forma:

Como explicam Farrel e Shapiro (2010), essas “taxas” são o efeito de canibalização de uma empresa pela outra, com vistas a reduzir o custo de produção da firma fusionada e manter os lucros elevados. Dessa forma, uma fusão pode gerar pressão sobre os preços se o termo de canibalização T1 for maior que as reduções de custo (ou ganhos de eficiência):

As fusões podem reduzir o custo da corporação final reduzindo essa “taxa interna”, isto é, com a criação de eficiências (equivalente ao termo E1C1 ). Essa expressão é a força contrária que pressiona os preços para baixo. Dessa forma, o índice de pressão de preços é equivalente à:

Considerando a taxa de desvio do supermercado A para o B de 40% e uma margem  (P2 – C2) de 20%, há uma pressão de preços positiva de 8%. Essa pressão pode ser compensada por uma redução de custos equivalente, ou seja, seria necessário um ganho de eficiência de, pelo menos, 8% para que essa fusão não gerasse aumento de preços. No caso de uma fusão entre A e C, cuja taxa de desvio é de 10%, a pressão de preços é seria bem menor (2%, considerando a mesma margem de 20%).

4. GUPPI

Diante das dificuldades em se definir ou calcular as eficiências oriundas de uma fusão, Salop e Moresi (2009) sugerem, seguindo o mesmo raciocínio teórico acima, um índice bruto de pressão positiva sobre os preços (GUPPI). O GUPPI tem como objetivo avaliar a pressão sobre os preços considerando apenas a proximidade de substituição entre os produtos das empresas fusionadas. Formalmente:

No exemplo dos supermercados, supondo que os preços antes da fusão são idênticos, vemos que o GUPPI equivale à primeira parte do UPP, gerando uma pressão bruta de preços de 8% na fusão de A e B; e de 2% na fusão de A e C, apesar de as participações de mercado serem idênticas (25%).

5. Exemplo recente: aquisição do HSBC pelo Bradesco

Em 2016, o Cade avaliou a compra do HSBC, então o sexto maior banco do Brasil em ativos totais, pelo Bradesco, o quarto colocado. A Superintendência-Geral do Cade, considerando os índices de concentração baseados em participação de mercado, concluiu que o percentual de market share representado pelo HSBC era relativamente baixo. Para se ter uma ideia, em depósitos totais10, o Bradesco possuía apenas 11,44% do mercado, e o HSBC, 3,11% (podendo mesmo ser enquadrado como rito sumário). Considerando apenas os precedentes do Conselho em análise de concentrações no setor bancário, o acréscimo de participação decorrente da operação estaria aquém daquele capaz de gerar uma piora do quadro geral do setor. Dito de outra forma, não foi encontrado nexo de causalidade entre a operação e os problemas concorrenciais identificados no setor bancário11.

O Departamento de Estudos Econômicos (DEE) do Cade, todavia, apontou que, a despeito da participação inferior a 20%, haveria uma pressão potencial por aumento de preços dos produtos ofertados pelo Bradesco e pelo HSBC. Essa conclusão foi obtida por meio da análise do UPP e do GUPPI para uma simulação de 7 cestas de serviços a serem oferecidas pelos bancos, na qual foram simulados cenários com margens (a fórmula  (P2 – C2) acima) de 25% e 50%. No primeiro cenário, apenas duas cestas indicaram a possibilidade de aumento de preços após a operação, visto que a operação ainda traria uma eficiência hipotética de 5%. No cenário com margem de 50%, todas as simulações apontaram para a possibilidade de aumento de preços, em até 6%, na cesta de produtos. Sem as eficiências de 5%, essa pressão seria ainda maior.

Diante da discussão metodológica entre o Departamento e as partes, o Conselheiro João Paulo Resende, relator do caso, repetiu o cálculo dos indicadores considerando os produtos bancários de forma individualizada12. Além disso, utilizou uma margem de 30%, obtida pela decomposição do spread bancário informado pelo Banco Central, para subsidiar parte das hipóteses do modelo e que foram objeto de questionamento pelos advogados. De maneira preocupante, o Conselheiro observou possíveis pressões de preço em 67% do total de produtos bancários.

Por fim, a operação foi aprovada com várias condicionantes, como o incentivo à portabilidade bancária e a obrigação de não adquirir o controle, por meio de fusões ou aquisições, de qualquer outra instituição financeira e/ou administradora de consórcio no Brasil.

6. Conclusão

Fica claro que o objetivo dos indicadores de pressão de preço não é o de dificultar a análise, mas sim o de promover, como instrumento adicional, a averiguação de casos com potenciais riscos lesivos à concorrência não captados por indicadores de concentração de mercado. Servem como indicadores preliminares para identificar, de forma rápida e com poucos dados, qual o risco de aumento de preços em uma fusão. As informações a serem obtidas para a análise também são poucas, como margem e taxa de desvio. Ressalta-se que esta última, para além da complexidade das elasticidades cruzadas, pode ser obtida por meio de pesquisas de mercado e do market share das empresas, como explicam Farrel e Shapiro (2010).

Por fim, no caso Bradesco/HSBC, argumentou-se que por trás dos indicadores haveria a hipótese de competição de Bertrand13 com produtos diferenciados, não sendo possível sua aplicação generalizada. Como apresentado nesse artigo, esse argumento é falacioso. O modelo teórico parte da maximização de lucros entre firmas que, de forma dinâmica, interagem no longo prazo, resultando na probabilidade de gerar pressão sobre os preços a depender do custo de oportunidade de se produzir mais em uma firma que em outra, o chamado efeito canibalização. Os próprios autores afirmam a mesma fórmula dos indicadores pode ser aplicada em situações onde há competição do tipo Cournot14, com uma adaptação da taxa de desvio, que é assumida como unitária. Ou seja, o fator a ser considerado como pressão de preços se torna apenas as diferenças entre as margens das duas firmas15.

 

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1 A Lei 12.529/11, nos artigos 88 e 90, explica com maiores detalhes os tipos de acordo entre empresas que são objeto do escrutínio do Cade. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm

2 Um exemplo clássico de análise posterior de fusão reprovada foi a compra da Garoto pela Nestlé. A empresa chegou a investir US$250 milhões na Garoto em 2002; todavia, com a reprovação pelo Cade, o caso se arrastou até 2016, quando as empresas resolveram firmar um acordo com o Cade (vide https://exame.abril.com.br/negocios/os-15-anos-de-vaivem-entre-cade-garoto-e-nestle/).

3 De maneira geral, fusão que envolvem empresas concorrentes.

4 Vide LYRA, M. e PIRES-ALVES, C. Inovação e Efeitos de Fusões e Aquisições: contribuições da teoria econômica e da prática internacional. Anais do II Encontro Nacional de Economia Industrial e Inovação. Setembro de 2014. Disponível em < https://www.proceedings.blucher.com.br/article-details/inovao-e-efeitos-de-fuses-e-aquisies-contribuies-da-teoria-econmica-e-da-prtica-internacional-26635>.

5 Farrell, J. e Shapiro, C., Antitrust Evaluation of Horizontal Mergers: An Economic Alternative to Market Definition. Fevereiro de 2010. Disponível em:<https://ssrn.com/abstract=1313782>.

6 Salop, S.  e Moresi, S., Updating the Merger Guidelines: Comments. Georgetown Law Faculty Publications and Other Works. 1662. 2009. Disponível em: <http://scholarship.law.georgetown.edu/facpub/1662>.

 

7 No jargão da economia e direito da concorrência, requer-se a definição do mercado relevante

8 <http://www.cade.gov.br/acesso-a-informacao/publicacoes-institucionais/guias_do_Cade/guia-para-analise-de-atos-de-concentracao-horizontal.pdf>.

9 Para maiores detalhes sobre como as agências estrangeiras definem os limites para esses índices vide SCHMIDT, C. e LIMA, M. Índices de Concentração. SEAE/MF Documento de Trabalho nº 13. 2002. Disponível em <http://seae.fazenda.gov.br/central-de-documentos/documentos-de-trabalho/documentos-de-trabalho-2002/DocTrab13.pdf>.

10 Depósitos totais incluem os depósitos à vista, poupança, interfinanceiros, à prazos e outros, segundo metodologia do BACEN. O depósito à vista é um produto destinado a pessoas físicas e jurídicas que consiste na captação de recursos não remunerados, que podem permanecer no banco por tempo indeterminado e são de livre utilização pelo consumidor (conta corrente). Para mais referências vide

11 Anexo ao Parecer Técnico n.º 12/2016/CGAA02/SGA1/SG/CADE. Disponível em: <http://sei.cade.gov.br/sei/institucional/pesquisa/documento_consulta_externa.php?8b7ordf_KdjqNE7xXQyIT8ywVE20IstN0KvraVhk2Pdu0JmyScJG7yscsiknowgJxvnI3g2qMrUOm3H4HELqKw,,>.

12 RESENDE, J.P. Voto no Ato de Concentração nº 08700.010790/2015-41. Disponível em:

<http://sei.cade.gov.br/sei/institucional/pesquisa/documento_consulta_externa.php?sY3Y6Kk8PGKsGxQqCopAgPCCfsR0K5CR0wQwvPBHl-vSQ28xf6Zs_mcUQJu9WucVGtvF0d0wqbRqT8ZlqIQhQQ,,

13 Empresas que competem à la Bertrand adaptam seus preços em função dos preços das empresas rivais.

14 Nesse cenário, as empresas adaptam as quantidades a serem ofertadas a depender das quantidades a serem oferecidas pelas outras empresas.

15 Maiores informações vide a nota de rodapé na pág. 16 em Farrel e Shapiro (2010).

 

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