financiamento imobiliário – Brasil, economia e governo https://www.brasil-economia-governo.com.br Mon, 14 May 2012 13:37:13 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.2 O governo alterou corretamente a regra de correção da caderneta de poupança? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=1198&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=o-governo-alterou-corretamente-a-regra-de-correcao-da-caderneta-de-poupanca https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=1198#comments Mon, 14 May 2012 03:00:27 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=1198 A rentabilidade  da caderneta de poupança, fixada em TR mais 6,17%, ao ano representava um obstáculo a novas reduções na taxa Selic.

Para resolver o problema do piso de rentabilidade o governo optou por um sistema híbrido, que manteve a regra antiga para os depósitos existentes, e criou, para os depósitos novos, a regra de 70% do valor da Selic + TR em vez dos atuais 6,17% + TR sempre que a Selic atingir 8,5% ao ano ou menos.

Havia grande temor, por parte das autoridades governamentais, de que se usasse politicamente a alteração, que é tecnicamente justificável, como argumento político. Afinal, ainda está fresca na memória da população o episódio do congelamento dos depósitos no Governo Collor.

A decisão tomada foi, portanto, costurada para que fosse dada a maior garantia possível aos poupadores de que nada mudaria em relação aos depósitos já existentes.

Ainda que se tenha em mente esse contexto político, cabe perguntar: haveria solução técnica melhor? A solução adotada está totalmente livre de causar efeitos colaterais negativos?

A rigidez da rentabilidade líquida da poupança tinha duas causas: a existência de um piso nominal, de 6,17% ao ano, e a isenção da tributação do IR para pessoas físicas.  Ambas elevavam a rentabilidade líquida da poupança. O governo optou por manter a isenção tributária e reduzir o piso nominal de remuneração.

Alternativamente, o governo poderia ter optado por reduzir paulatinamente a anacrônica e injustificada isenção de imposto de renda de que gozam esses depósitos. A segunda opção teria duas importantes vantagens em relação à adotada.

Em primeiro lugar, a nova regra irá criar uma indeterminação sobre o custo de funding entre as várias instituições, gerando incerteza sobre qual será o spread na poupança em cada instituição. Isso ocorrerá porque o custo para cada instituição individual dependerá da proporção em que se dividirá o total dos depósitos entre os antigos (TR + 6,17%) e os novos (70% da Selic + TR). Sendo uma aplicação fortemente regulamentada, com contratos de longo prazo e com subsídio fiscal implícito, essa circunstância poderá dar margem a disputas, inclusive judiciais.

Mutuários e suas associações poderão reivindicar condições de reequilíbrio do spread original, pressionando por redução de juros em seus contratos, e instituições com maior proporção  de depósitos antigos podem passar a demandar compensações. Isso acabará  levando a aumento das já excessivas arbitragens regulatórias existentes no Sistema Brasilieiro de Poupança e Empréstimo (SBPE).

Essa crescente regulação nem sempre consegue resolver todos os problemas que pretende solucionar e sempre corre o risco de criar novas brechas jurídicas e novas situações de conflito não imaginadas inicialmente. No mínimo será acrescentado um maior custo operacional para que as instituições financeiras e o Banco Central obedeçam e operem a nova norma, com impacto deletério sobre a produtividade do setor financeiro e da economia.

Segundo as estatísticas do SFH de fevereiro publicadas pelo Banco Central, 53% dos depósitos em poupança estão em instituições públicas e 47% em instituições privadas. Já os financiamentos a mutuários finais concedidos por essas instituições se dividem na proporção de 72% (com grande concentração na Caixa Econômica Federal) e 28%. Ou seja, bancos públicos e privados captam poupança quase que na mesma proporção, mas bancos públicos (em especial a CEF) têm empréstimos imobiliários em valor 172% superior ao dos bancos privados.

Os financiamentos habitacionais de instituições privadas a mutuários pessoas físicas representam apenas R$ 51,3 bilhões, enquanto os financiamentos à produção e os eufemisticamente chamados “desembolsos futuros”[1] correspondem a R$ 43,4 bilhões. Os financiamentos a compradores finais com recursos da poupança correspondem a somente 32,7% dos depósitos das instituições privadas.

Os percentuais de aplicação de recursos da poupança em financiamento habitacional devem ser comparados com o percentual de 65% que, em tese, seria o determinado na norma de direcionamento do SFH. As instituições privadas estão ofertando muito menos crédito subsidiado do que deveriam, capturando, portanto, a isenção fiscal. Já as públicas estão com excesso de aplicação, elevando o risco governamental implícito.

O novo modelo da poupança pode tornar esse cenário pior, caso as novas regras levem os bancos privados a demandar mais benefícios regulatórios sob a forma de não aplicação dos recursos da poupança em crédito habitacional. Tal situação é inconsistente com o objetivo governamental de reduzir  o spread bancário.

Por outro lado, a redução do incentivo tributário da poupança reduziria o grau de subsídio mal direcionado no SFH, poderia gerar receita pública imediatamente e caminhar na direção de reduzir a excessiva regulação do SBPE. Tornaria desnecessário o estranho privilégio que se concedeu aos depósitos antigos, que, além de continuar capturando rentabilidade superior àquela que seria determinada pelas novas condições da política monetária, continuarão gozando de incentivo fiscal para tanto!

Se, no momento atual, fosse imposta uma tributação de 5% sobre os rendimentos, a rentabilidade efetiva da poupança cairia, para o poupador pessoa física, de 6,17% ao ano para 5,86%, liberando igualmente a política monetária, sem discriminar novos e antigos poupadores e sem criar heterogeneidade no funding da modalidade. Do ponto de vista da receita pública, haveria uma expansão de aproximadamente 1,3 bilhão por ano, dos quais praticamente R$ 600 milhões seriam repartidos entre Estados e municípios, de acordo com as regras do FPE e do FPM.

Assim, a solução adotada pelo Governo faz pouco sentido, pois cria um modelo híbrido, complexo e que, principalmente, mantém uma isenção fiscal que não chega, na prática, aos que deveriam ser os principais beneficiários, continuando a vazar pelas brechas da arbitragem regulatória. Piora o quadro o fato de que os fortes subsídios tributários e creditícios concedidos à habitação parecem ter contribuído mais para a espiral de preços e valorização de terrenos do que para a redução do custo final aos adquirentes. . Além disso, parte significativa dos empréstimos (estoque de R$ 57 bilhões de créditos em dezembro de 2011) é feita na modalidade de taxas livres, destinada ao financiamento de imóveis de maior valor para as classe média e média alta.

Por fim, quando se considera o valor das operações (em contraposição ao número), observa-se que, em sua grande maioria, os poupadores pertencem à classe média. Para se ter uma ideia da distribuição, em dezembro de 2011, cerca de 85% das contas tinham saldo inferior a R$ 5 mil. Isso representava algo em torno de 10% do valor total dos depósitos. No outro extremo da distribuição, cerca de 0,5% das contas tinham valores acima de R$ 100 mil, que representavam mais de 30% do valor dos depósitos. Do ponto de vista distributivo, portanto, seria mais eficaz tributar os depósitos de poupança, isentando somente os de baixo valor (para maiores detalhes acerca da tributação da poupança ver, neste site, o texto A isenção do Imposto de Renda na poupança é um subsídio justo e eficiente?).

A introdução paulatina de imposto de renda sobre a poupança não só evitaria o problema da indeterminação do custo da poupança entre as várias instituições – o que, insisto, poderá, no médio prazo, suscitar conflitos jurídicos e regulatórios – como reduziria o grau de subsídio em um sistema que, patentemente, não tem dirigido recursos públicos da isenção fiscal para o público que  pretendia beneficiar.

Tal solução, tecnicamente superior, não poderia ser improvisada. Em vista da incidência do princípio da anterioridade sobre o imposto de renda, deveria ter sido, necessariamente, prevista em lei ainda em 2011.

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[1] Desembolsos futuros são as tranches de financiamento à produção já contratadas mas ainda não desembolsadas para as construtoras.

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O FGTS traz benefícios para o trabalhador? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=1127&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=o-fgts-traz-beneficios-para-o-trabalhador https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=1127#comments Mon, 19 Mar 2012 12:52:56 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=1127 O FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, regido pela Lei nº 8.036, de 11/05/90, foi instituído, em 1966, em substituição à estabilidade no emprego, direito restrito aos trabalhadores que permaneciam mais de dez anos na mesma empresa. É por isso que seu objetivo estrito é prover o trabalhador de uma poupança em caso de desemprego; embora, desde sua instituição, também tenha sido muito utilizado na aquisição da casa própria.

Conforme a legislação em vigor, os empregadores depositam, em contas abertas na CAIXA, em nome dos seus empregados e vinculadas ao contrato de trabalho, o valor correspondente a 8% do salário de cada funcionário.

Tais recursos, além de configurarem uma poupança do trabalhador, constituem os pilares básicos da política habitacional, de saneamento básico e de infraestrutura urbana do Estado, em especial no caso da habitação popular.

Conforme o Orçamento Financeiro, Operacional e Econômico do FGTS, para o exercício de 2012, de um total de R$ 44 bilhões, estão previstos para serem utilizados em habitação popular R$ 26 bilhões (59% do total), incluindo o Programa “Minha Casa Minha Vida”.

Assim, na concepção original do Fundo, fica fácil perceber o caráter social duplo do FGTS: patrimônio do trabalhador para fazer face ao desemprego e principal fonte de financiamento da política habitacional, de saneamento básico e de infraestrutura urbana brasileira.

O que se pretende neste texto é analisar se realmente o FGTS traz vantagens ao trabalhador ou se ele cria custos que oneram o trabalho e a renda do empregado.

O primeiro problema que se vislumbra é o baixo rendimento do FGTS. A remuneração das contas vinculadas do Fundo corresponde à Taxa Referencial de Juros (TR) mais juros de 3% ao ano, ou seja, menos do que rende a Caderneta de Poupança, pois esta remunera seus aplicadores com TR mais 6% ao ano. Isso torna o FGTS um dos investimentos com a mais baixa remuneração do mercado financeiro brasileiro.

O risco dessa aplicação é nulo, pois os saldos das contas vinculadas estão garantidos e protegidos por lei, sendo o risco de crédito integralmente assumido pela CAIXA. As aplicações no FGTS diferem, portanto, dos investimentos no mercado financeiro, onde o risco é todo do aplicador de recursos. Ainda assim, não é justo impor ao trabalhador uma aplicação que renda menos do que a inflação, conforme ilustrado pela tabela abaixo.

Rendimento do FGTS X IPCA (2000-2011)
Anos Rendimento FGTS IPCA
(TR + 3% a.a.)
(% anual) (% anual)
2000 5,14 5,97
2001 5,33 7,67
2002 5,85 12,53
2003 7,69 9,30
2004 4,86 7,60
2005 5,88 5,69
2006 5,08 3,14
2007 4,45 4,46
2008 4,65 5,90
2009 3,64 4,31
2010 3,71 5,91
2011 4,13 6,50
Fonte: TR e IPCA – IPEADATA

Pelos números acima, verifica-se que a remuneração total do FGTS ficou bem aquém da inflação do período, ou seja, com o tempo, os depósitos estão perdendo seu poder de compra. Se acumularmos as taxas mostradas na tabela, o FGTS acumulou rentabilidade de 80%, enquanto a inflação foi de 114%.

Do modo como o Fundo está equacionado, vários incentivos adversos foram criados. Como a remuneração do FGTS é baixa para o empregado e é um custo para o empregador, isso incentiva a informalidade. Os empregados e os empregadores preferem contratos informais nos quais estes pagam diretamente àqueles. Também há o caso em que a informalidade pode não ser completa: é comum haver contratos registrados em carteira, mas especificando uma remuneração menor do que a efetivamente paga.

Outra distorção vem do fato de que o empregado formal irá buscar uma forma de sacar seus recursos depositados na conta vinculada o mais rápido possível, para evitar sua corrosão pela inflação. Uma maneira é provocar sua demissão, de forma a se apoderar do dinheiro (principalmente em épocas de crescimento econômico, em que o mercado de trabalho fica aquecido). Outra pode ser adquirir imóveis, mesmo que não seja aquele que o trabalhador adquiriria caso dispusesse dos recursos em outra aplicação.

Com essa característica do Fundo, patrões e empregados não esperam que os contratos durem muito tempo. A consequência é uma alta rotatividade no mercado de trabalho. Se a expectativa é ter uma força de trabalho renovada constantemente, há menos incentivos para investir no treinamento individual dos trabalhadores, diminuindo o investimento em capital humano, o que certamente prejudica a produtividade da economia, reduzindo o potencial de crescimento econômico.

A pergunta óbvia que surge é: por que não se aumenta a remuneração do FGTS, de forma a torná-lo pelo menos tão atraente quanto a Caderneta de Poupança?

O óbice em se aumentar a remuneração do FGTS consiste no fato de que isso rebaterá, necessariamente, no encarecimento dos empréstimos para compra da casa própria, por parte das classes menos favorecidas de nossa sociedade.

Mas então, outra pergunta vem à tona: cabe ao trabalhador, com seus recursos, fornecer subsídios para o sistema financeiro de habitação e para as obras de infraestrutura urbana?

A carga tributária brasileira figura entre as mais altas do mundo (34% do PIB). Se o governo quer financiar a habitação popular, que o faça com recursos previstos no orçamento, que passaram pela aprovação indireta da sociedade, via discussão no Congresso Nacional. Hoje, a legislação em vigor obriga o empregado a deixar seu recurso aplicado no FGTS, recebendo uma remuneração baixa por isso, de forma que o governo possa emprestar recursos para a aquisição da casa própria com juros aquém dos praticados pelo mercado.

Outra questão correlata é que uma baixa taxa de juros cobrada de um trabalhador de baixa renda em um financiamento habitacional não necessariamente será um benefício para este trabalhador. Se esse sistema de crédito subsidiado gerar um grande aumento na demanda por habitações populares (como de fato ocorreu após o lançamento do programa “Minha Casa Minha Vida”), o preço dessas habitações vai subir. Isso significa que o subsídio acaba sendo apropriado pelas empresas que constroem e vendem tais habitações, sob a forma de maior margem de lucro (a esse respeito, ver neste site o texto: A isenção do imposto de renda na poupança é um subsídio justo e eficiente?)

Sabe-se da teoria econômica tradicional que a tributação sobre a folha de pagamentos gera ineficiências e desemprego, pois eleva o custo do trabalho. O FGTS funciona como um tributo que encarece o salário pago pelo empregador, mas que vai diminuir o salário líquido recebido pelo empregado.

Se não houvesse o FGTS, o salário efetivamente percebido pelo trabalhador poderia ser maior e, em vez de ele ser obrigado a manter seu dinheiro no Fundo, poderia utilizar o dinheiro da forma que melhor lhe aprouvesse, inclusive escolhendo uma aplicação financeira mais rentável. Se fosse dada a opção para os trabalhadores, muitos prefeririam receber menos que os 8% pagos pelos empregadores, se pudessem aplicar livremente os recursos.

Destaque-se que a própria ideia de poupança compulsória não se justifica. A melhor pessoa para decidir quanto, como e se vai poupar é o próprio trabalhador. Talvez na época em que o FGTS foi criado, quando havia poucos instrumentos financeiros disponíveis, a ideia de poupança compulsória poderia fazer algum sentido. Atualmente, contudo, o acesso ao sistema financeiro é muito maior, de forma que o indivíduo pode formar a própria poupança, escolhendo a composição de rentabilidade/risco que mais lhe convier. Alternativamente, em caso de queda na renda, pode-se buscar crédito, seja no sistema financeiro formal (embora as taxas de juros sejam muito elevadas, especialmente para quem está desempregado) ou em redes informais, entre amigos.

Há quem argumente que, dado os baixos salários no Brasil, a única poupança possível é a poupança forçada. Há vários problemas com esse argumento. O primeiro é a violação ao direito soberano que o indivíduo deve ter de poupar ou não. O segundo é que, mesmo com baixos salários, é possível poupar. Milhões de brasileiros trabalham por conta própria e em atividades sazonais (como agricultura, turismo, construção civil ou mesmo diaristas), não recebem FGTS, e ainda assim conseguem sobreviver nos períodos de baixa (ou de total ausência de) demanda por trabalho. Um indicativo de que os pobres poupam é que 75% das contas de caderneta de poupança (em torno de 45 milhões de contas) possuem saldo inferior a R$ 1 mil. Certamente, se os trabalhadores dispusessem dos recursos do FGTS, esse saldo seria maior.

Atualmente o Congresso Nacional discute uma revisão da legislação do FGTS. Talvez a melhor forma de se obter ganhos de bem estar para a sociedade e para o trabalhador, em vez de reformar o Fundo, seja simplesmente extingui-lo.

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