eficiência – Brasil, economia e governo https://www.brasil-economia-governo.com.br Thu, 06 Oct 2016 12:48:57 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.2 Como usar inteligência artificial para combater a corrupção? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2882&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=como-usar-inteligencia-artificial-para-combater-a-corrupcao https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2882#comments Thu, 06 Oct 2016 12:48:57 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=2882 O gasto do governo federal em 2016 será de aproximadamente R$ 3 trilhões. Parte desse dinheiro irá parar nos bolsos de corruptos, como resultado de compras superfaturadas, venda de favores e outros crimes. É impossível fiscalizar centavo por centavo: são centenas de milhares de compras públicas, pagamentos de salários e repasses a ONGs. É possível, porém, automatizar o processo com o uso de inteligência artificial (IA).

O uso de IA faz parte do nosso cotidiano há algum tempo: a humanidade já se habituou a tradutores automáticos (como o Google Translate) e a assistentes virtuais (como Siri e Cortana), por exemplo. Quando seu banco telefona e pergunta se foi você mesmo que comprou aquela passagem para Cancún isso acontece porque um algoritmo de IA disparou o alerta. Médicos rotineiramente submetem imagens de biópsias a aplicativos que dizem se há ali algum tumor maligno. Mais recentemente, a Uber botou em circulação em Pittsburgh, nos Estados Unidos, seus primeiros carros autônomos.

A lógica de funcionamento é a mesma na maioria dos casos: você “alimenta” o algoritmo com casos passados e com isso o algoritmo “aprende” a prever ou classificar casos novos. Considere, por exemplo, a base de dados de um grande banco qualquer. Essa base contém dados sobre cada compra no cartão de crédito de cada cliente: data, horário, local, valor e se a compra foi identificada como fraudulenta (digamos, com base em reclamação do cliente). Quando o banco submete essa base a um algoritmo de IA, o algoritmo identifica os padrões e regularidades mais comumente associados às compras fraudulentas: horário, local, valor e quaisquer outras informações que existam na base. Uma vez alimentado (no jargão da inteligência artificial diz-se “treinado”), o algoritmo pode ser usado para identificar se novas compras são ou não fraudulentas.

Pois essa mesma lógica vem sendo usada no combate à corrupção. O Cadastro de Expulsões da Administração Federal (CEAF), por exemplo, contém dados sobre servidores punidos com perda do cargo. O Observatório da Despesa Pública (ODP) da Controladoria-Geral da União (CGU) usou um algoritmo de inteligência artificial para identificar os padrões mais comumente associados aos servidores expulsos: forma de ingresso no serviço público (concurso ou cargo de confiança), filiação partidária, se é sócio de empresa, etc. Com isso foi possível desenvolver um aplicativo que diz, para cada um dos 1,2 milhão de servidores do Executivo federal, a probabilidade de esse servidor ser corrupto. Naturalmente trata-se apenas de uma probabilidade, não de uma certeza; não chegamos (ainda) ao mundo de Minority Report. Mas a probabilidade é um primeiro passo: no mínimo ajuda a decidir quais investigações priorizar.

Outros órgãos também vêm usando IA no combate à corrupção. A Receita Federal tem usado IA para detectar exportações fictícias e pedidos fraudulentos de compensação tributária – o que, numa análise inicial, pode gerar R$ 16 bilhões de arrecadação em multas e recolhimento de tributos devidos. O Banco do Brasil, por sua vez, tem usado IA para análise de crédito. O Ministério do Planejamento tem usado IA para identificar fraudes na folha de pagamentos do funcionalismo. A lista não se restringe ao Executivo federal: Legislativo e Judiciário, bem como órgãos estaduais e municipais, também têm explorado o potencial de IA.

Ainda há muito por fazer. O concurso público privilegia candidatos capazes de memorizar leis e regimentos internos; apenas acidentalmente selecionam-se candidatos capazes de usar ferramentas de IA. É preciso recrutar melhor e, ao mesmo tempo, capacitar os já recrutados para que possam tirar proveito dessas ferramentas. É preciso, ainda, facilitar a troca de dados entre diferentes órgãos e eliminar retrabalho (hoje diferentes órgãos gastam um tempo enorme limpando e carregando as mesmas bases). Mesmo com esses obstáculos, porém, o potencial de IA é imenso na administração pública.

 

(Para os interessados em saber quem está fazendo o quê onde, um bom começo é assistir as duas edições do Seminário sobre Análise de Dados na Administração Pública, ocorridas em 2015 e 2016 e disponíveis no canal do Tribunal de Contas da União (TCU) no Youtube).

 

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A ineficiência é sempre injusta? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2833&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=a-ineficiencia-e-sempre-injusta https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2833#comments Mon, 15 Aug 2016 11:59:25 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=2833 Em meio à reconhecida polarização política, parece haver consenso quanto a um relevante tema: é preciso evitar que as instituições do Estado sejam apropriadas por interesses corporativos. Com justo motivo, personalidades de todos os espectros partidários, integrantes dos três Poderes republicanos, já externaram preocupações nesse sentido, desde o então Ministro-Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República,  Gilberto Carvalho (2014), passando pelo Senador Cristovam Buarque (2016), até o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes (2016).

O justificado receio possui variados fundamentos. O mais evidente é que, ao tornar o Estado refém das corporações, acaba-se por corromper a representação parlamentar democrática, a tecnocracia executiva e a imparcialidade judicial. Contudo, há outra disfunção causada pelo fenômeno, que tem sido menos alardeada, apesar dos graves impactos econômicos gerados: a “miopia” ocasionada pela condução estatal por interesses segmentados imediatistas pode ser altamente nociva à realização do interesse público primário.

Tal “miopia” turva a perspectiva distante, isto é, de longo prazo; assim, os tomadores de decisões – Chefes do Executivo, parlamentares ou mesmo juízes – acabam se orientando unicamente pelos efeitos de curto prazo. Aliás, mesmo quando inexiste a pressão de grupos setorizados, por vezes as deliberações não maximizam o bem-estar. A esse respeito, a Análise Econômica do Direito tem muito a contribuir, conforme se verá no transcorrer destas linhas.

Quando se utiliza o instrumental da Análise Econômica do Direito para analisar normas jurídicas1, é comum procurar saber se determinada legislação (ou decisão) melhora ou piora a eficiência da sociedade. Afinal, é sabido que as normas criam um conjunto de incentivos aos indivíduos e empresas, com reflexos sobre a eficiência das transações econômicas.

A norma, ao aprimorar a eficiência da sociedade, contribui para o crescimento econômico, seja por via direta ao estimular a atividade econômica, seja por via indireta ao propiciar a redução de desperdícios de recursos públicos, como, por exemplo, quando foca melhor o alvo de um programa social.

No entanto, há que se ter em mente a existência de um possível dilema entre eficiência de curto prazo e de longo prazo quando acontece uma mudança regulatória. É possível que, num primeiro momento, exista uma perda de bem-estar social, mas, quando se considera a eficiência intertemporal e seu reflexo no crescimento econômico, a nova legislação pode ser considerada pertinente.

Cootere Schäfer(2012) discutem essa perspectiva com enfoque na inovação e seu papel no crescimento econômico. Começam com um exemplo em que não existe o dilema citado, como na regulação que combate cartéis. Nesse caso, a lei, que proíbe e penaliza a formação de cartéis, atua positivamente nas duas frentes, promovendo, a um só tempo, crescimento e eficiência, no curto e no longo prazo. Ao propiciar uma concorrência mais acirrada, a lei contribui para uma maior eficiência incentivando a inovação (oligopólios e monopólios tendem a não inovar, pois seus detentores não querem perder a posição privilegiada no mercado). Além disso, o fim dos lucros extraordinários incentivará o consumo, assim propiciando maior crescimento econômico (e menor concentração de renda).

Nesse caso, a mudança implementada por essa lei pode ser representada na Figura 1 por um deslocamento do ponto A para o ponto B, ou seja, acarreta mais eficiência e mais crescimento.

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No entanto, há leis nas quais há um claro trade-off no curto prazo, como as que asseguram a exclusividade na exploração de direitos de propriedade intelectual. Ganha-se de um lado, mas perde-se do outro.

A criação da propriedade intelectual justifica-se por conta de um problema econômico: uma falha de mercado que impede o oferecimento de um nível eficiente de inovação. Para resolver essa falha de mercado, criou-se, dentre outros institutos, a patente, que é um monopólio jurídico temporário para quem criar uma inovação, garantindo ao autor da invenção condição de obter retorno para os recursos investidos no processo de geração da nova tecnologia (Dosi, Marengo e Pasquali, 2007).

Como todo monopólio, a patente traz uma ineficiência embutida. O inventor, por ter poder de mercado, pode colocar o preço para a utilização de seu produto em um valor bem acima do ótimo social. Na prática, isso significa que a inovação será disseminada, mas não tanto quanto poderia ser.

Cooter e Edlin (2010) discutem esse dilema entre eficiência estática e crescimento econômico, provando que a perda de bem-estar no curto prazo pode ser compensada por ganhos nos próximos períodos (Welfare Overtaking Theorem).

No caso das patentes, desenvolvem o seguinte  raciocínio: o custo gerado num primeiro momento (preço mais alto, tanto em razão da ausência de concorrência, como para recuperar o investimento inicial necessário ao desenvolvimento da inovação), com consequente queda no consumo, pode ser compensado no longo prazo com uma maior taxa de crescimento que se sustente (estímulo ao investimento necessário para avanços tecnológicos).Ou seja, no longo prazo a queda de eficiência inicial terá sido compensada. Isso fará com que a nova norma seja eficiente do ponto de vista intertemporal, apesar de, no curto prazo, trazer embutida uma ineficiência.

Outro exemplo elucidativo sobre essa ocorrênciaé encontrado nos debates envolvendo o novo Código de Processo Civil. Esteve presente, no transcorrer de toda a sua elaboração, a preocupação acerca das diversas inovações contempladas no diploma. Decerto, haverá um custo inicial de adaptação (dos operadores do direito em geral), tanto na adequação à nova sistemática, como na interpretação dos comandos mais complexos. Acredita-se, todavia, que o benefício social experimentado no longo prazo superará a perda inicial de bem-estar.

Nesse caso, a perda de eficiência num primeiro momento consegue ser compensada por benefícios de médio e longo prazos a superarem o custo inicial? O fato de o país contar com uma legislação processual mais moderna trará maior crescimento econômico nos períodos seguintes? Em caso positivo, na Figura 1, esse movimento seria representado pela mudança do ponto B para o ponto C.

Outras aplicações do Welfare Overtaking Theorem podem ser encontradas no ordenamento jurídico brasileiro, como em tópicos constantes do direito falimentar. A lógica está presente no afastamento da sucessão nas dívidas tributárias e trabalhistasdo adquirente de filiais no âmbito da falência e da recuperação judicial (art. 60, parágrafo único e art. 141, II, ambos da Lei 11.101/05); do mesmo modo, na previsão da suspensão das execuções em curso contra o devedor quando este tem deferido o processamentodo seu pedido de recuperação judicial (art. 6º da Lei 11.101/05).Nos dois casos, há a imposição de uma ineficiência inicial, pois se dificulta o adimplemento obrigacional, por motivos óbvios. Em contrapartida, no primeiro caso, criam-se condições que facilitam a realização do ativo a preço próximo do real, assim viabilizando o pagamento dos credores e, em alguns casos, a continuidade da empresa; e, no segundo caso, se favorece a coordenação dos interesses dos credores no recebimento integral do crédito e concede-se, à empresa recuperada, um período para a sua reestruturação, com vistas a um retorno futuro. No médio e longo prazo, portanto, as medidas propiciam benefícios aos trabalhadores, credores e Estado, embora contemplem uma ineficiência de curto prazo.

A lição a ser extraída do teorema é que não se deve atentar tanto para ineficiências iniciais decorrentes da legislação, desde que essas ineficiências sejam comprovadamente superadas por aumento na taxa de crescimento econômico que se sustente no decorrer do tempo. Assim, deixar de aprovar determinada norma ou política pública porque há uma perda momentânea, desconsiderando os benefícios futuros, é entravar a realização do interesse público na maior extensão possível.

Há que se frisar, no entanto, que também existem ações governamentais extremamente deletérias fazendo o oposto, pois geram aparente aumento do bem-estar num primeiro momento, mas criam uma ineficiência que se propaga de forma negativa por várias gerações. Normalmente, essas ações nocivas estão relacionadas à incapacidade de o governo recusar o atendimento a pedidosde grupos de interesses ou à necessidade de obter rápido retorno eleitoral. Nesse conjunto, incluem-se atos que promovem o agravamento do déficit fiscal em detrimento de toda a sociedade.

Na literatura econômica, esse assunto é conhecido como Political Budget Cycle (“ciclos políticos orçamentários”, Rogoff, 1990). O autor discute a estratégia do governante que tende a distorcer a política fiscal, cortando tributos, aumentando transferências e promovendo gastos que tenham visibilidade imediata. Tal comportamento do governante, provavelmente, geraria ou agravaria uma situação de déficit fiscal. Segundo esse estudo, o político mais votado é aquele que tende a gerar maior desequilíbrio nas contas públicas, contrariamente ao político preocupado com os recursos do Estado. Isso acontece porque se mostra mais eficiente, sob uma perspectiva de curto prazo, aquele que gera maiores déficits.

A esse respeito, advertiu Fernando Henrique Cardoso (2016):

Essa constatação [da desigualdade] só aumenta a angústia e a responsabilidade dos que dela têm noção. Vivemos no Brasil, à nossa moda, algo disso. Há responsáveis, mas não vem ao caso acusar. Provavelmente alguns deles, se forem intelectualmente honestos, estão se perguntando: por que não vi antes que endividar irresponsavelmente o País, mesmo que a pretexto de aumentar momentaneamente o bem-estar do povo e criar ilusões de crescimento econômico, é algo ruinoso, que as gerações futuras pagarão? Exemplo simples: quando foi derrotada a emenda na Previdência Social de meu governo que definia uma idade mínima para as aposentadorias, não faltou quem gritasse vitória. Alguns dos mesmos que década depois se deram conta de que não se tratava de “neoliberalismo”, mas de projetar no futuro próximo as consequências financeiras de tendências demográficas inelutáveis. Diante do estrago, não adianta chorar: é darmo-nos as mãos e ver se encontramos caminhos.

Sabemos que justiça e eficiência são conceitos distintos, mas, como ensina Timm (2014, p. 28), “a ineficiência é sempre injusta“, especialmente num país com extrema desigualdade social como o Brasil, no qual se deveria evitar com todas as forças o desperdício de recursos públicos.

Com a discussão realizada neste texto, podemos lapidar a advertência de Timm para esclarecer que a ineficiência poderá ser injusta quando o crescimento econômico no médio ou longo prazo não a superar e, para tanto, faz-se necessária a análise do impacto das normas e das políticas públicas numa perspectiva intertemporal, sob o risco de se deixar de tomar medidas positivas caso se considere somente o momento presente ou ainda pior, o risco de se decidir algo que trará malefícios para as gerações futuras. O Welfare Overtaking Theorem expõe um dos mais lesivos efeitos da “captura” do Estado por corporações: condicionar a atuação estatal ao atendimento de interesses imediatista, sem sopesá-los com a eficiência intertemporal e o bem-estar de longo prazo.

 

O presente texto está baseado no paper “O Dilema entre a Eficiência de Curto e de Longo Prazo no Ordenamento Jurídico e o Impacto no Crescimento Econômico”, disponível em http://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/textos-para-discussao/TD200

 

Referências Bibliográficas

BRITO, Adriano (2016). PT se “autoassassinou” e governo está em fase terminal, diz ex-ministro de Lula, BBC Brasil, 22/01/2016. Disponível em: http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/01/160122_entrevista_cristovam_buarque_ab. Acesso em: 02/08/2016

CARDOSO, F. H. (2016). Um pouco de bom senso. Estadão, Opinião, 03/07/2016. Disponível em: http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,um-pouco-de-bom-senso,‌10000060660. Acessoem 10/07/2016.

COOTER, R.; Edlin, A. (2010). Law and Growth Economics: A Framework for Research. Berkeley Program in Law and Economics, Working Paper Series. Disponívelem: http://escholarship.org/uc/item/50t4d0kt

COOTER, R. D.; Schäfer, H. B. (2012). Solomon’s knot: how law can end the poverty of nations. New Jersey: Princeton University Press.

DOSI, G.; Marengo, L.; Pasquali, C. (2007). Knowledge, competition and innovation: is strong IPR protection really needed for more and better innovations? Disponível em http://repository.law.umich.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1093&context=mttlr. Acesso em 28/06/2016.

MARETTI, Eduardo (2014). Interesses corporativos impedem reformas no país, afirma Gilberto Carvalho, Rede Brasil Atual, 24/04/2014. Disponível em: http://www.redebrasilatual.com.br/politica/2014/04/interesses-corporativos-impedem-reformas-no-pais-afirma-gilberto-carvalho-3731.html. Acesso em: 03/08/2016.

SALES, Robson (2016). Gilmar Mendes: Impeachment está “a caminho de se concretizar”, Valor Econômico, 10/06/2016. Disponível em: http://www.valor.com.br/politica/4596367/gilmar-mendes-impeachment-esta-caminho-de-se-concretizar. Acesso em: 03/08/2016.

TIMM, L. B. (2014). Direito e Economia no Brasil. Editora Atlas, São Paulo.

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1 O termo “normas jurídicas” é utilizado, aqui, em sentido bastante amplo, incluindo leis de efeitos abstratos e concretos, atos administrativos e mesmo decisões judiciais (enquanto normas do caso concreto).

 

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Injusto, ineficiente e caro https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2716&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=injusto-ineficiente-e-caro https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2716#comments Mon, 01 Feb 2016 11:56:08 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=2716 A cidade de Dois Irmãos das Missões (RS) tem 2,2 mil habitantes e recebe do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) R$ 2,9 mil per capita. Como é uma cidade pequena, não tem escala para oferecer serviços públicos diversificados: são poucos os adolescentes para que se abra uma escola de ensino médio, não há doentes graves em quantidade que justifique um hospital para casos complexos. Por isso, boa parte do dinheiro do FPM é gasto com a burocracia. Só a Câmara de vereadores consome 10% da receita corrente.

Águas Lindas de Goiás (GO) tem 182 mil habitantes. Fica na periferia de Brasília. Sua população cresceu 22% nos últimos dez anos. Há forte necessidade de urbanização, muitas crianças em idade escolar, violência e pobreza. Mas o FPM, que coloca muito dinheiro em dois mil municípios pequenos,  destina apenas R$ 334 per capita para Águas Lindas.

Isso é injusto: o dinheiro não vai para onde é mais necessário. É ineficiente, pois há desperdícionos municípios pequenos, além de estimular os municípios grandes a se dividirem. É caro: o FPM transferido aos municípios com menos de dez mil habitantes somou R$ 14 bilhões em 2014.

Xavier é eletricista. Trabalha como autônomo e está registrado como Microempreendedor Individual. Para uma renda mensal de R$ 3 mil, desembolsa R$ 44,40 em tributos. Joaquim realiza o mesmo trabalho e tem a mesma renda de Xavier. Em vez de autônomo, trabalha em uma empresa formal de reparos domésticos. A carga de tributos que incide sobre eleé mais de sete vezes superior à paga por Xavier: R$330,00.

A empresa em que Joaquim trabalha tem muitos clientes, o que aumenta a escala de produção, reduz o peso dos custos fixos e permite otimizar o uso do tempo e a distribuição  geográfica dos profissionais. Além disso, promove treinamentos regulares, introduz novos métodos de trabalho, tem equipamentos modernos, realiza tarefas complexas em equipe.

Já o autônomo Xavier passa o dia com um celular no bolso e sua malinha de ferramentas. Não se atualiza, não tem equipe e, volta e meia, fica sem serviço,porque não conta com um pool de clientes como o da empresa onde trabalha Joaquim.

Logo, o trabalho de Joaquim é mais eficiente que o de Xavier. Mas o peso dos tributos faz com que a renda líquida de Xavier seja 10,7% maior que a de Joaquim. Isso é injusto e ineficiente. E também é caro: a renúncia de receita dos regimes especiais de tributação (Simples e MEI) somou R$ 62,4 bilhões em 2014.

Sebastião e Antônio trabalham em empregos que pagam salário mínimo. Sebastião contribui mensalmente para o INSS, o que vai lhe garantir uma aposentadoria, no valor de um salário mínimo, a partir dos 65 anos de idade. Antônio não contribui com um centavo para o INSS ao longo de toda sua vida profissional. Porém, aos 65 anos poderá receber um Benefício de Prestação Continuada (BPC), também no valor de um salário mínimo. Isso é injusto: os benefícios assistenciais são importantes para amparar os mais necessitados, mas não podem ter o mesmo valor do que se paga a quem contribuiu. É ineficiente, pois desestimula a formação de poupança previdenciária. É caro: a despesa com BPC para idosos em 2014 foi de R$  17 bilhões.

Jandira recebe uma aposentadoria mensal de R$ 10 mil. Deveria pagar R$ 1,9 mil de Imposto de Renda. Porém está isenta de tal pagamento, porque tem uma doença cardíaca. A Lei nº 7.713/1988 concede isenção de IR às aposentadorias e pensões dos portadores de cardiopatia grave e outras 15  enfermidades, bem como a moléstias de origem profissional. No Congresso tramitam 51 projetos para agregar novas doenças à lista atual.

Com o dinheiro que não gastou com Imposto de Renda, Jandira decidiu comprar um carro novo. E vai ser beneficiada de novo, porque a isenção se reproduz nas legislações de IPI, ICMS e IPVA sobre veículos, abarcando 37 doenças, que vão de “formigamento”a “autismo”.

Não é simples conseguir a isenção. Afinal, o Estado quer se prevenir contra aproveitadores, e exige vários atestados. Aí entra em cena o despachante Odair, cujo trabalho é “agilizar” a concessão do benefício. Diversos funcionários públicos são alocados para conferir os documentos.

Palmira é pobre e tem doença de chagas. Sua renda está fora da faixa de pagamento de Imposto de Renda, e ela jamais terá dinheiro para comprar um carro zero. Palmira e seu coração inchado vão de ônibus para a fila do SUS.

Isso é injusto, porque o Imposto de Renda incide sobre os 10% mais ricos da sociedade. Qualquer isenção ou dedução beneficia apenas os mais ricos. É caro: as isenções e deduções do IR (todas, não só as relativas a doenças) representam perda de arrecadação de R$ 34,3 bilhões. É ineficiente, porque Odair e os servidores alocados para cuidar da papelada poderiam usar seu tempo em atividade mais útil.

Há muito que reformar nos programas públicos para torná-los mais justos, eficientes e baratos. É um erro deixar de fazê-lo por temer prejudicar os mais pobres. Os beneficiários de cada um dos programas tortos aproveitam-se dessa falácia para bloquear o desmonte de seus privilégios. A função primordial do Estado brasileiro não tem sido prestar serviços públicos ou socorrer os mais pobres, mas sim garantir benefícios obtidos por alguns grupos às expensas do resto da sociedade e das gerações futuras. Ganha quem tem o lobby mais organizado. Isso trava o crescimento da economia e prejudica a todos. Apenas umas gotas desse oceano de benefícios respingam para os mais pobres. E esses ainda pagam parte da conta sob a forma de inflação e impostos altos, baixa criação de empregos e juros elevados. A alternativa às reformas é a estagnação econômica e a consolidação da desigualdade extrema que sempre caracterizou o Brasil.

 

Texto originalmente publicado no jornal O Estado de S. Paulo no dia 22/1/2016.

 

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As leis podem atrapalhar a eficiência? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=1982&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=as-leis-podem-atrapalhar-a-eficiencia https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=1982#comments Mon, 09 Sep 2013 12:53:29 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=1982 Há um clamor da sociedade para um uso mais adequado dos recursos públicos. Espera-se que a prestação de serviços governamentais ocorra com qualidade, que o Estado aja diligentemente no atendimento das demandas coletivas essenciais, utilizando racionalmente os recursos dos contribuintes. Essa exigência posta pelos cidadãos passa, inexoravelmente, pelo aprimoramento do Estado de forma a torná-lo mais eficiente.

No entanto, no meio político, é comum ouvirem-se discursos argumentando a dificuldade de se conseguir eficiência dado o ordenamento jurídico vigente. Fala-se que as leis engessam sobremaneira o administrador público.

Ante esse debate, vale discutir a interação (por vezes conflituosa) entre a legalidade e a eficiência, bem como a possibilidade de harmonizá-las concretamente.

Na essência do conteúdo político de um Estado de Direito, sobressai-se a legalidade como um princípio basilar, norteador das relações estabelecidas pelas pessoas naturais e jurídicas. No âmbito do regime jurídico-administrativo, a legalidade implica a submissão do Estado à lei, sujeitando os agentes públicos (exercentes do poder em concreto) a um encadeamento normativo que embargue desvios de finalidades, favoritismos, improbidades, abusos de poder ou desmandos.

A legalidade é indispensável para o alcance de um parâmetro objetivo e abstrato de atuação dos administradores e dos administrados, orientando-os previamente acerca das condutas admitidas ou vedadas, dos ritos procedimentais a serem observados e das consequências aplicáveis em face de cada modalidade do agir administrativo. Normas extremamente complexas e rígidas em relação ao trato com a coisa pública visam a garantir, simultaneamente, a lisura na gestão pública e a observância dos direitos fundamentais dos administrados.

Nos termos do artigo 37 da Constituição Federal, figuram como princípios constitucionais da Administração Pública, ao lado da legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência. Tradicionalmente, os administrativistas muito se debruçaram sobre os três primeiros, pouco aprofundando os estudos sobre as implicações do princípio da eficiência, acrescentado à Constituição pela Emenda no 19/1998.

A propósito, o professor Celso Antônio Bandeira de Mello, ao tratar desse princípio, afirma que se trata de conceito “juridicamente tão fluido e de tão difícil controle ao lume do Direito, que mais parece um simples adorno agregado ao art. 37 ou o extravasamento de uma aspiração dos que buliram no texto1.

Por outro lado, para o Professor Paulo Modesto, o princípio da eficiência pode ser percebido “como uma exigência inerente a toda atividade pública. Se entendermos a atividade de gestão pública como atividade necessariamente racional e instrumental, voltada a servir ao público, na justa proporção das necessidades coletivas, temos de admitir como inadmissível juridicamente o comportamento administrativo negligente, contra-produtivo, ineficiente2.

Percebe-se que, nos fatos concretos, a relação entre legalidade e eficiência nem sempre se mostra despida de conflitos. São corriqueiras as situações em que o gestor público, ao perseguir o cumprimento estrito de todas as regras legais, imputa ao Estado uma ineficiência no aproveitamento dos recursos e na prestação dos serviços públicos. Nesse ponto, evidenciam-se hipóteses em que a escolha legislativa, sob a ótica do caso concreto, não apresenta a eficiência necessária para o êxito da atuação administrativa. Em face desses casos, qual escolha deve realizar o administrador? Qual a margem de interferência do Poder Judiciário, no âmbito de seu controle jurisdicional, em casos de conflito entre esses princípios?

Antes de adentrar a análise da interação entre os princípios constitucionais acima referidos, convém apresentar contribuições para a formulação de um conceito mais robusto de eficiência administrativa.

A questão da eficiência é assunto basilar para a Economia e, consequentemente, para a Análise Econômica do Direito. Sabe-se que a sociedade deve fazer escolhas. Para tanto, realiza-se a análise custo-benefício para se comparar a diferença positiva entre os benefícios globais (econômicos e sociais) e os custos globais de cada opção.

Podem-se utilizar conceitos econômicos e, por analogia, enunciar o seguinte: uma lei é dita eficiente se os benefícios oriundos da norma compensam os custos impostos por ela, além de esses custos serem os menores possíveis. Esse é o conceito que será utilizado a seguir, focando no fato de que a norma jurídica e as decisões judiciais, ao buscarem eficiência, devem procurar propiciar uma estrutura de incentivos adequada de forma a não acarretar desperdício de recursos.

Estabelecidas tais premissas conceituais, pretende-se analisar como a Administração e o Poder Judiciário tratam da relação entre a legalidade e a eficiência.

Nesse ponto, cabe ressaltar ser indubitável que, num cenário ideal, legalidade e eficiência devam estar justapostas. Assim, seja no momento de criação da lei, seja no momento de aplicação da norma (quando se tratar de atos discricionários), as escolhas do legislador e do administrador, respectivamente, devem necessariamente recair sobre a opção mais eficiente, tanto num viés objetivo (análise do conteúdo dos benefícios e dos custos, aprioristicamente – quais são os benefícios e os custos?), como num viés subjetivo (análise dos sujeitos sobre os quais recaem os custos e os benefícios, de modo que afetem ou aliviem, equitativamente, tanto os administradores como os administrados – quem suporta os custos e quem se favorece com os benefícios?). Trata-se da hipótese de interação típica entre a legalidade e a eficiência.

No entanto, a praxe administrativa descortina situações de interação atípica entre os dois princípios, em que a opção administrativa não se evidencia a mais eficiente para o alcance da finalidade de interesse público.

Em pesquisa de acórdãos proferidos pelos Tribunais Regionais Federais, verificam-se duas hipóteses: a) a situação supostamente ineficiente é também ilegal; e b) a situação ineficiente é legal.

No primeiro caso, de tranquila solução, não há dúvidas quanto à possibilidade de intervenção do Poder Judiciário, para declarar a nulidade do ato administrativo impugnado e determinar as providências pertinentes para o restabelecimento da situação de legalidade. Nessas hipóteses, a interação atípica não se resolve pela análise do conteúdo da eficiência administrativa, mas decerto pela legalidade.

Um exemplo corriqueiro consiste na inobservância, por parte da Administração Pública, dos prazos legais para proferir decisões em processos administrativos. Multiplicam-se as ações judiciais com notícias de pedidos administrativos não apreciados em tempo hábil, nas mais diversas esferas, como pedidos de desembaraço aduaneiro à Receita Federal do Brasil ou de registro de medicamentos genéricos à Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Nesses casos, percebe-se que o parâmetro de eficiência encontra-se intimamente ligado ao parâmetro de legalidade, de modo que a violação da regra implica uma situação gravosa ao administrado, supostamente ineficiente, uma vez que o atraso em decisões administrativas impõe custos à iniciativa privada.

No entanto, mais controversa é a segunda situação, em que a obediência à regra legal revela-se ineficiente para a gestão pública.

Em algumas dessas hipóteses, o Poder Judiciário tende, em caráter excepcional, a mitigar a obediência à estrita legalidade, em prol de uma solução que garanta resultados com maximização de benefícios e minoração de custos, tanto para os administrados, quanto para os administradores. A seguir são listados alguns exemplos.

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região afastou a aplicação da Instrução Normativa nº 13/99, da Secretaria de Defesa Agropecuária (Ministério de Agricultura e do Abastecimento), que previa prazo de 60 (sessenta) dias para licenciamento de importação de alho. Entendeu-se que o estabelecimento de prazo elástico violara o princípio da eficiência, especialmente considerando o caráter perecível do produto importado, bem como os riscos de perda do produto, caso cumprida a legislação, em seu rigor (autos da apelação nº 157-90.2000.01.3400, julgada em 03.05.2013).

Em outros julgados recorrentes, também balizados no princípio da eficiência, os Tribunais Regionais Federais têm permitido a posse de aprovados em concurso público para cargo de nível médio, de natureza técnica, que disponham de titulação superior em área compatível com a especialidade requerida, uma vez que não caberia, pelo princípio da eficiência, limitar “o acesso ao cargo público por candidata que apresenta qualificação técnica distinta, mas superior à exigida pelo edital”. (TRF 1ª Região, AMS 2007.38.12.000664-8/MG, Rel. Des. Fed. Selene Maria de Almeida, Quinta Turma, e-DJF1 21.11.2008)

Em outro julgado, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região reconheceu a improcedência de pedido de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal, que pleiteava a declaração parcial de nulidade de contrato administrativo celebrado entre o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) e empreiteira, tendo por objeto a recuperação da BR-163. A despeito de diversas irregularidades reconhecidas e comprovadas, especialmente quanto à dispensabilidade da licitação, entendeu-se que a situação calamitosa em que se encontrava a rodovia exigia uma atuação emergencial do gestor público, sob pena de afetar a segurança dos cidadãos (TRF 4ª Região, Processo n. 4704-34.2006.404.7005/PR, Rel. Des. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, DJ 25.05.2010).

Ao fiscalizar a aplicação dos valores públicos, o Tribunal de Contas da União – TCU já abordou também o dilema eficiência versus legalidade em alguns acórdãos. O que se nota é que existe a possibilidade de flexibilização do princípio da legalidade quando o objetivo é obter um maior retorno dos recursos públicos em prol da sociedade.

Um exemplo está associado ao mandamento do inc. IV do art. 27, combinado com o inc. IV do art. 29 da Lei nº 8.666/93 que estipula ser necessário, para a habilitação nas licitações, exigir dos interessados documentação relativa à regularidade fiscal e trabalhista, que consistirá, entre outros, em prova de quitação com a Seguridade Social e o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS. O TCU entendeu que, “quando a competição for inviável, por inexistirem outros prestadores de serviços essenciais ao funcionamento da Administração Pública, que não os inadimplentes, a única alternativa é realizar a contratação da empresa monopolista, estatal ou privada, ainda que ela esteja em débito com o INSS e o FGTS” (Plenário/TCU, Acórdão 1105/2006, Processo n. 002.994/2004-8, Rel. Min Marcos Vinicios Vilaça, DOU 10/07/2006).

O que se pode inferir é que a inclusão da eficiência no rol dos princípios constitucionais da Administração Pública (EC nº 19/98), muito além de assumir um papel meramente retórico, descortinou um novo viés de análise jurídica sobre a gestão pública administrativa. Sempre em busca da satisfação do interesse público, a eficiência tem sido um prisma diferenciado de solução de conflitos.

O Poder Judiciário e o Tribunal de Contas da União acenam para a possibilidade de afastamento pontual de escolhas normativas que se reputem ineficientes, desde que, harmonizado com o interesse público, sejam asseguradas (i) a inocorrência de prejuízo ao erário; (ii) a boa-fé e a probidade dos agentes envolvidos; (iii) a ausência de violação ao núcleo essencial dos demais direitos e garantias fundamentais (a título de exemplo, o contraditório, a ampla defesa, a duração razoável do processo, a isonomia, etc); e (iv) a obtenção de resultado prático com preponderância considerável de benefícios sobre os custos, tanto para a Administração, como para os administrados.

A mitigação da obediência à estrita legalidade deve necessariamente estar atenta a esses parâmetros objetivos, não podendo se aplicar a qualquer opção legal que o gestor repute ineficiente, sob pena de se adotar a indesejável noção de que os fins de interesse público convalidam quaisquer espécies de violação da norma.

As decisões públicas podem e devem considerar critérios de eficiência, visando a uma otimização dos recursos públicos e a um incremento no bem-estar social. Para tanto, não é necessário que a eficiência seja vista como uma excludente da legalidade, bastando que haja uma reinterpretação das normas de forma favorável ao princípio da eficiência. Nas palavras do Professor Paulo Modesto, “ao contrário de contrastar com o princípio da legalidade, ou legitimar sua atenuação, […] o princípio da eficiência pode ser percebido como componente da própria legalidade, percebida sob um ângulo material e não apenas formal” [2].

Salutar também seria que o ordenamento jurídico fosse produzido e constantemente revisado já incorporando análises de eficiência, de forma que o gestor público não precisasse enfrentar essa aparente dicotomia.

O amadurecimento da sociedade democrática torna o Estado cada vez mais questionado acerca do desempenho e da efetividade de suas ações. Nesse ponto, a eficiência será certamente um dos grandes desafios – teóricos e pragmáticos – enfrentados pelo Poder Público, como as inúmeras obras de infraestrutura paradas por irregularidades detectadas, a morosidade do processo de compras públicas decorrente de muitas exigências de conformidade da lei de licitações, as regras desconexas e sobrepostas dos processos de licenciamento ambiental, entre outros.

Para saber mais sobre alguns desafios inerentes à questão da eficiência, veja neste site:

Como o setor privado pode ajudar a melhorar os serviços públicos de infraestrutura?

http://www.brasil-economia-governo.org.br/2012/04/26/como-o-setor-privado-pode-ajudar-a-melhorar-os-servicos-publicos-de-infraestrutura/

Por que o licenciamento ambiental no Brasil é tão complicado?

http://www.brasil-economia-governo.org.br/2013/03/25/por-que-o-licenciamento-ambiental-no-brasil-e-tao-complicado-parte-i/

Como tornar a gestão pública mais eficiente?

http://www.brasil-economia-governo.org.br/2012/11/21/gestao-publica-mais-eficiente/

(Este texto é baseado no trabalho “Há incompatibilidade entre eficiência e legalidade?”.  O estudo integral consta do Texto para Discussão nº 133 do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria Legislativa do Senado, disponível no seguinte link: www.senado.leg.br/estudos.)

___________

1MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 118.

2MODESTO, Paulo. “Notas para um Debate sobre o Princípio Constitucional da Eficiência”. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico, Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, nº 10, mai/jun/jul, 2007. Disponível no site: http://www.direitodoestado.com/revista/REDAE-10-MAIO-2007-PAULO%20MODESTO.pdf. Acessado em 11/06/2013.

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Quem deve pagar a conta dos subsídios nos serviços de utilidade pública? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=1028&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=quem-deve-pagar-a-conta-dos-subsidios-nos-servicos-de-utilidade-publica https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=1028#comments Tue, 07 Feb 2012 13:18:22 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=1028 Muito mais corriqueiramente do que se imagina, alguns consumidores ajudam a pagar a conta de outros. São os chamados subsídios cruzados. Muitas vezes esses subsídios são difíceis de serem percebidos. Por exemplo, quem pede para embalar um presente está sendo subsidiado por quem não solicita esse serviço (afinal, o custo do papel e da mão-de-obra que irá embalar está embutido no preço final do bem); quem come pouco ajuda a pagar a conta de quem come muito em um rodízio; um paciente que demanda menos tempo do médico subsidia o que demora mais; quem parcela o pagamento de passagens aéreas sem pagar juros está sendo financiado por aqueles que pagam à vista.

Em todos os exemplos acima, o subsídio cruzado surge como uma solução de mercado, pois diferenciar o preço traria custos além dos benefícios. Pode também ser uma estratégia de marketing: cobrar por certos serviços pode parecer antipático aos olhos do consumidor. Apesar disso, ao longo dos últimos anos, vimos que a sociedade tem cada vez mais aceitado pagar valores diferentes, de acordo com os serviços adquiridos. Dessa forma, é cada vez mais comum shopping centers cobrarem pelo estacionamento, companhias aéreas cobrarem pelo despacho de malas ou pela comida servida a bordo, e lojas cobrarem para embalar produtos.

O que explica o fato de, em alguns casos, as empresas preferirem manter os subsídios cruzados e em outros casos optarem por diferenciar os preços conforme o serviço ou bem consumido é o custo que se incorre para fazer a diferenciação dos preços. Manter alguém vigiando a entrada de um banheiro restrito a pagantes pode ser mais caro do que liberar o acesso; cobrar um preço diferente para cada tipo de alimento em um restaurante a quilo é praticamente inviável; pode ser mais barato contratar um empacotador do que perder tempo com o próprio cliente empacotando as compras em um supermercado.

Preços uniformes também reduzem o custo de informação. A decisão de um consumidor fica mais fácil se ele sabe, de antemão, o preço dos ingressos nos cinemas X e Y, sem se preocupar com a duração ou com o custo de produção do filme. A informação de uma vitrine é mais clara se o preço de um modelo não depender do tamanho da roupa.

Por fim (e lembrando que essas explicações não formam uma lista exaustiva), pode haver assimetrias de informação e conflitos de interesse que tornam a diferenciação de preços ineficiente. Por exemplo, se o preço de um bem depender do tempo de negociação ou da duração do serviço (o tempo gasto em uma consulta médica ou em um corte de cabelo), pode ser gerado um incentivo perverso de as transações se estenderem além do tempo necessário. Um caso clássico é o do jornal Pravda, editado na antiga União Soviética, no qual os jornalistas eram remunerados pelo tamanho das reportagens escritas, o que resultava em textos enormes.

Em princípio, quando o preço pago é diferente do custo de produção, gera-se uma ineficiência na economia, com perda de bem-estar. Nos casos acima, entretanto, o subsídio cruzado pode aumentar a satisfação da sociedade se a cobrança de preços diferenciados gerar custos maiores do que a ineficiência decorrente da uniformização de preços.

Há situações, entretanto, em que o subsídio cruzado decorre de restrições institucionais. Um exemplo é a proibição de cobrança de preços diferenciados para compras à vista e com cartões de crédito (sobre esse tema, ver o artigo Deve-se proibir a diferenciação de preços entre compras à vista e com cartão de crédito?, neste site). Mas é na prestação de serviços de utilidade pública que ocorrem com maior frequência os subsídios cruzados.

Talvez a principal justificativa para o uso desses subsídios seja política. Em primeiro lugar, por não serem transparentes, são mais fáceis de serem cobrados. É mais provável que o usuário culpe a concessionária pelo alto preço da tarifa do que o governo, que está lhe tributando.

Em segundo lugar, porque a sociedade parece aceitar com certa facilidade a ideia de solidariedade entre grupos, ainda que artificialmente construídos e que não façam sentido econômico. Os consumidores passam a ser agregados em grupos como passageiros de ônibus, consumidores de energia, de água, etc, e tornam-se (compulsoriamente) solidários, com os mais abastados subsidiando os mais pobres.

Um exemplo está no transporte urbano, no qual os idosos têm direito a passagens gratuitas. Quem paga por isso? Normalmente são os demais usuários do transporte. Se não houvesse problemas de assimetria de informação, esse subsídio cruzado seria claramente indesejável do ponto de vista social.

Em primeiro lugar, porque a discrepância entre preço e custo (os passageiros pagantes pagam acima do custo, e os passageiros não pagantes ou com direito a desconto pagam abaixo do custo de produção), per si, gera ineficiências na alocação de recursos: os passageiros não subsidiados vão fazer menos viagens do que fariam se não precisassem subsidiar os mais velhos. Em segundo lugar, porque é injusto. Por que é o passageiro de ônibus (frequentemente, pertencente às classes menos favorecidas) quem deve pagar pelo transporte do idoso e não, digamos, quem anda de carro, quem vai ao cinema, quem faz compras no supermercado?

Não se trata aqui de discutir o mérito de os idosos poderem ou não viajar de graça. A questão é quem deve pagar por isso. Se a sociedade entende que a gratuidade (ou qualquer desconto) é justa, então deve ser o contribuinte, via pagamento de impostos – e não o usuário do ônibus – quem deve pagar pelo serviço.

Pode haver, entretanto, problemas de assimetria de informação que justifiquem o subsídio cruzado. A empresa de ônibus pode ter incentivos para inflar o número de idosos transportados e, com isso, arrecadar mais subsídios (pagos pelo orçamento público) do que teria direito. Se o custo de fiscalização for alto e/ou se o número de idosos usuários do sistema público de transporte for baixo (o que implica baixo impacto sobre os custos totais) pode ser socialmente preferível manter o sistema de subsídios cruzados.

Subsídios cruzados estão também presentes nas tarifas de energia e saneamento. Nos dois casos, as tarifas são definidas de forma a garantir a viabilidade financeira das respectivas concessionárias. Via de regra, as tarifas aumentam de acordo com a faixa de consumo e são calculadas de forma a viabilizar o provimento do serviço para as populações mais pobres e a expansão da rede. No caso da energia elétrica, a tarifa final embute ainda encargos destinados a financiar o fornecimento de energia para usuários que residem em algumas áreas da Região Norte[1].

É difícil encontrar justificativas econômicas para o subsídio aos consumidores dos estados nortistas por meio da tarifa de energia dos demais usuários. Assim como no exemplo da passagem de ônibus. Se a sociedade entende que deve haver o subsídio, é o contribuinte, via imposto, quem deve financiar o usuário de energia da Região Norte. Como se trata de uma transferência de recursos entre concessionárias, não se pode argumentar aqui que o subsídio cruzado pode ser justificado com base em redução de custos de informação, de transação ou para resolver problemas de assimetria de informações.

É igualmente difícil de justificar os usuários pagarem pela expansão da rede. Do ponto de vista distributivo, não faz sentido quem consome hoje subsidiar o consumidor de amanhã[2]. Para haver eficiência alocativa, é necessário que a tarifa reflita o custo de produção do serviço, que deve incluir o custo do financiamento para a infraestrutura já realizada. Se a tarifa passa a incluir também o financiamento para as concessionárias, seu valor passará a superar o custo de produção, fazendo com que o consumo de energia/saneamento fique abaixo do socialmente ótimo. Isso se torna ainda mais grave quando se considera que esses serviços trazem importantes benefícios à sociedade (externalidades positivas) (sobre as externalidades de água e saneamento, ver, neste site, o texto Por que é tão elevada a carga tributária sobre os serviços de saneamento básico?; e sobre o conceito de externalidades ver, também neste site, o texto Por que o governo deve intervir na economia?).

Por fim, é também discutível se a tarifa por Kwh consumido de quem consome mais deve ser maior do que a de quem consome menos. Se o objetivo é fazer justiça distributiva, não é esse o caminho mais adequado. Em primeiro lugar, porque a distribuição de renda quando feita pelo orçamento (ou seja, via impostos) não distorce o preço da energia/água em relação aos outros bens (uma vez que seriam igualmente tributados), reduzindo os impactos deletérios sobre a eficiência alocativa de recursos.

Em segundo lugar, porque não necessariamente está se fazendo justiça distributiva, pois a relação entre consumo de água/energia e riqueza não é direta. Famílias grandes tendem a consumir mais, mesmo não sendo mais ricas. Quem tem mais capital pode investir em um sistema de aquecimento solar, bem como trocar os aparelhos eletrodomésticos, reduzindo o seu consumo de energia. Pessoas que têm o hábito de comer fora e lavar a roupa em lavanderias também tendem a apresentar consumo mais baixo de água e energia. Casas de praia e de campo têm baixo consumo, pois são usadas apenas no final de semana. Enfim, o melhor indicador de riqueza de um indivíduo é sua renda e seu patrimônio, e não seu consumo de água e energia. A tributação da renda e do patrimônio é, dessa forma, um instrumento mais eficiente para se fazer justiça social do que a tributação sobre água e energia.

O subsídio cruzado nas contas de energia e água poderia ser justificado com base na redução de custos de transação. Esses custos, entretanto, devem ser relativamente baixos, pois não deve ser difícil para os órgãos reguladores (ou quem quer que venha a ser responsável pelo pagamento de subsídios) ter acesso ao consumo de cada domicílio, a partir do qual seria calculado o subsídio a que a concessionária teria direito.

Em síntese, mesmo reconhecendo que há justificativas para que serviços de utilidade pública sejam subsidiados, o financiamento desses subsídios deveria se feito através do orçamento público. A prática de se cobrar tarifas mais altas dos usuários que consomem mais, além de não garantir justiça social, pode reduzir o bem-estar da população devido à ineficiência gerada na alocação de recursos.

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[1] Sobre uma abrangente revisão dos encargos embutidos nas tarifas de energia elétirca, vide: Montalvão, Edmundo: “Impacto de tributos, encargos e subsídios setoriais sobre as contas de luz dos consumidores”, disponível em: http://www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_discussao/TD62-EdmundoMontalvao.pdf.

[2] Assim como nos casos anteriores, faz sentido, se a sociedade assim o entender, que o contribuinte hoje financie o contribuinte de amanhã.

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Como o código de defesa do consumidor colabora para a eficiência da economia? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=767&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=como-o-codigo-de-defesa-do-consumidor-colabora-para-a-eficiencia-da-economia https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=767#comments Wed, 28 Sep 2011 14:50:40 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=767 As relações de consumo são a base de um sistema capitalista. Garantir que as partes nessa relação estejam em condições de igualdade é fundamental para a prosperidade do mercado e para a geração de riquezas.

Já publicamos artigo neste site Como as Leis e o Poder Judiciário afetam a Economia? , no qual defendemos que as leis e as decisões judiciais, juntamente com os instrumentos que obrigam todos os cidadãos a cumpri-las (polícia, judiciário, fiscalização pública, etc.), fornecem um conjunto de incentivos aos cidadãos e empresas, que têm reflexos sobre a eficiência das transações econômicas.

Dessa breve introdução é que podemos extrair a importância do Código de Defesa do Consumidor (CDC) – Lei nº 8.078, de 1990. O princípio básico que norteia todo o Código é o Princípio da Vulnerabilidade do Consumidor: trata-se da aceitação de que o consumidor é a parte mais fraca da relação de consumo e, portanto, faz-se necessária uma tutela especial. Essa premissa é reconhecida pela Constituição Federal ao declarar que o Estado promoverá a defesa do consumidor (art. 5º, XXXII).

Relativamente à responsabilidade civil, isto é, à obrigação de reparar o dano ou o prejuízo causado a alguém, o CDC traz regras específicas para tentar obter efetividade na proteção do consumidor.

Dos estudos da análise econômica do direito, sabemos que o sistema de responsabilidade civil tem uma função importante na redução da frequência com que produtos e serviços viciados – que causam danos ao patrimônio, à propriedade, à saúde e até à vida dos consumidores – são oferecidos no mercado.

A regra basilar da responsabilidade civil no direito privado é a responsabilidade subjetiva que se resume na obrigação de indenizar somente quando ocorre a comprovação de dolo ou culpa por parte do causador do dano, cabendo ao prejudicado o ônus de demonstrar a existência desses elementos subjetivos.

No entanto, essa regra é inadequada para as relações de consumo, sendo necessária outra forma de se imputar o ônus face a produtos danificados. O mais adequado é a chamada responsabilidade civil objetiva.

Para gerar a responsabilidade civil objetiva, três requisitos devem estar presentes: uma determinada conduta a ser praticada pelo agente; a existência de dano a outrem; e o nexo causal entre a conduta e o dano (a conduta errada deve ter gerado o dano). Na responsabilidade civil subjetiva temos a necessidade da inclusão de um quarto pressuposto caracterizador: o dolo ou culpa do agente causador.

É fácil perceber que é muito mais simples provar o nexo causal do que provar a culpa. Por exemplo, pense no estouro de uma garrafa de refrigerante, devido ao excesso de gás, em que a tampa é arremessada no olho do carregador que estava manuseando o engradado. Sem necessidade de muita argumentação, prova-se que a explosão da garrafa de refrigerante feriu o funcionário, mas é bem mais complexo provar que o fabricante adota processos de engarrafamento negligentes.

Assim, não é despropositadamente que o CDC estabelece como regra a responsabilidade objetiva, isto é, o fornecedor responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados por defeitos ou inadequações de informações relativos aos produtos que colocou no mercado.

Mas como o sistema de responsabilidade civil, previsto no Código de Defesa do Consumidor, pode tornar mais eficientes as transações econômicas? Há danos em que os custos de barganha são exageradamente altos, de forma que impedem totalmente a cooperação. No caso da venda de produtos com problemas, o fabricante vai pensar que a maioria dos consumidores permanecerá ignorante a respeito da existência do problema. Consequentemente, o fabricante tem incentivo a não mencionar a falha. Nesse exemplo, o obstáculo para a cooperação é a ignorância dos consumidores e a decisão estratégica do produtor de manter a informação privada.

Ao alocar o custo de produtos defeituosos ao produtor, o sistema de responsabilidade o incentiva a ser precavido. Todo produto posto em circulação deve ter segurança suficiente para não acarretar danos a outrem, pois, se o contrário acontecer, surgirá o correspondente dever de reparar.

O modelo econômico que fundamenta a afirmação anterior é bem simples. Conforme ensinam os professores Cooter e Ulen, a probabilidade (p) de um acidente diminui com o aumento da precaução (x), logo a função p(x) é decrescente.

O valor do prejuízo causado por uma mercadoria viciada é representado por A. Assim, o prejuízo esperado é dado por p(x).A (que também é decrescente).

Se w for o custo unitário da precaução, consequentemente, w.x equivale à quantia total gasta com precaução. O custo esperado social de um prejuízo causado em decorrência de um produto defeituoso é a soma dos gastos relativos à precaução com o valor da indenização que deve ser igual ao prejuízo esperado: wx + p(x)A

Na situação em que existe a responsabilidade civil objetiva do produtor, este sabe que será responsabilizado no caso de um produto com problema e que terá que pagar uma indenização no valor do prejuízo da vítima. Isso faz com que ele escolha um nível socialmente eficiente de precaução (nível de precaução que minimiza os custos sociais esperados do acidente), desde, obviamente, que o valor das indenizações seja estabelecido no nível adequado. Indenizações baixas deverão levar a um nível de precaução abaixo do socialmente ótimo. Já indenizações excessivamente elevadas devem provocar um nível igualmente excessivo de precaução.

Praticamente toda atividade econômica traz embutido o risco em sua existência. A redução da margem de risco a baixos níveis pode ser muito dispendiosa ao negócio. O empresário tem que procurar o equilíbrio entre quanto de risco está disposto a correr e o custo que isso gera, de forma a maximizar seu lucro. A responsabilização civil objetiva prevista no CDC, ao garantir ao consumidor o ressarcimento pelos prejuízos sofridos em face de produto danificado, cria incentivos para que as empresas invistam em qualidade num nível eficiente.

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Para ler mais sobre o tema:

COOTER, Robert; ULEN, Thomas.  Direito & Economia. Porto Alegre: Bookman, quinta edição, 2010.

MENEGUIN, Fernando B. “Como as Leis e o Poder Judiciário afetam a Economia?”. Disponível no site Brasil, Economia e Governo (http://www.brasil-economia-governo.org.br/2011/02/13/como-as-leis-e-o-poder-judiciario-afetam-a-economia/).

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https://www.brasil-economia-governo.com.br/?feed=rss2&p=767 2
Por que o governo gasta tanto com terceirização? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=746&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=por-que-o-governo-gasta-tanto-com-terceirizacao https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=746#comments Mon, 26 Sep 2011 10:00:44 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=746 A chamada “terceirização” de mão-de-obra e serviços é uma ideia voltada tanto para a redução de custos quanto para o aumento da eficiência operacional das organizações, sejam elas públicas ou privadas.

Trata-se de contratar, junto a terceiros, serviços necessários ao dia-a-dia da organização, mas que não dizem respeito às suas áreas-fins. Em geral terceirizam-se os serviços de: conservação, limpeza, jardinagem, segurança, vigilância, transportes, informática, copeiragem, recepção, reprografia, telecomunicações, manutenção de equipamentos.

Para os órgãos públicos a vantagem evidente, em termos de custos, é de não precisar dar estabilidade no emprego e outras vantagens do funcionalismo (gratificações, promoções por tempo de serviço, etc.) a profissionais que não exercem atividades típicas de governo. Em termos de eficiência, a vantagem está na possibilidade de rescindir o contrato de prestação de serviços com firmas que prestem serviços ruins, ou determinar à firma a substituição de profissionais que apresentem baixo rendimento, e de ganhar flexibilidade organizacional, à medida que atividades de apoio se tornem obsoletas com o passar do tempo.

Além disso, o órgão público, em tese, estaria livre de administrar toda essa mão-de-obra (folha de pagamentos, férias, obrigações patronais, controle de frequência, etc.), o que permitiria o enxugamento dos departamentos administrativos.

Não obstante essas vantagens, um dado curioso chama atenção: a despesa com terceirização tem crescido de forma acelerada. A tabela abaixo compara tal despesa com outros “elementos de despesa” do orçamento do governo federal. Nota-se que a despesa com terceirização cresceu 82% entre 2005 e 2010, uma taxa muito superior aos gastos fixos e variáveis com pessoal civil, aos gastos com material de consumo, com aposentadorias e com pensões.

Ainda que as despesas com terceirização apresentem valores absolutos muito mais modestos que as demais rubricas apresentadas na tabela, a forte taxa de crescimento merece análise. Afinal, se estiver ocorrendo alguma disfunção no processo de terceirização, então tanto a economicidade quanto a eficiência que ela promete entregar podem estar comprometidas.

Elementos de Despesa do Orçamento do Governo Federal: despesa empenhada em 2005 e 2010 (R$ milhões de 2010)

Fonte: Siafi. Sistema Siga Brasil
(*) Locação de mão-de-obra e outras despesas de pessoal decorrentes de contratos de terceirização.
Deflator: IPCA

Uma primeira causa para a expansão dos gastos com terceirização pode estar na tendência dos órgãos públicos em expandir excessivamente suas áreas-meio. Um comportamento típico do setor público é o de que, não havendo forte controle da direção do órgão público, induzindo a entidade a concentrar seus esforços em suas áreas-fim, tende a ocorrer a expansão de atividades de apoio, tais como centros de treinamento, atividades culturais e recreativas, relações públicas, comunicação social,  manutenção de departamentos cujos serviços se tornaram obsoletos tecnologicamente, etc[1].

Outra possível fonte de crescimento da despesa de terceirização é a ocupação de postos em áreas-fim da administração por trabalhadores terceirizados. Conhecido no jargão do Governo Federal como “terceirização ilegal”, esse fenômeno vem sendo reprimido pelo TCU, mas o próprio Tribunal tem limitações para checar se a prática tem sido abandonada ou não pelos órgãos públicos. Nesse caso estaria havendo uma substituição de despesa de pessoal efetivo por despesa com terceirizados.

Porém, o ponto central deste artigo é o fato de que os custos unitários dos contratos tradicionais de terceirização estão crescendo fortemente para o setor público, acima dos serviços similares prestados a empresas privadas.

A razão disso parece ser o fato de que, no setor público, há menos incentivos para conter custos e evitar desperdícios. Como já argumentado no texto “Por que a intervenção do governo pode gerar prejuízos à sociedade?“, publicado neste site, o administrador público usa um dinheiro que não é dele, para comprar bens e serviços que não serão usados por ele próprio. Nessa situação, não tem incentivos nem para buscar um menor preço de aquisição nem para exigir maior qualidade no serviço prestado.

Esse incentivo parece aplicar-se nos casos de contratos de terceirização. Para apresentar evidências nesse sentido, é preciso chamar atenção, primeiro, para o fato de que a quase totalidade dos custos envolvidos em contratos de terceirização diz respeito à remuneração da mão-de-obra contratada (os insumos utilizados na prestação dos serviços têm pequena participação no custo total dos contratos).

Em segundo lugar, deve-se atentar para o fato de que os pisos salariais fixados em convenções coletivas ou dissídios trabalhistas têm, praticamente, força de lei, em conformidade com o estabelecido no art. 7º, inciso XXVI da Constituição[2].

A ideia do legislador constitucional, ao estabelecer tal regra, foi a de garantir que as conquistas obtidas nas negociações trabalhistas sejam efetivamente reconhecidas, obrigando as empresas a pagar, no mínimo, o piso salarial de cada categoria.

Pressupõe-se que, em toda negociação salarial, há interesses opostos entre empresas e seus empregados: os empregados buscam aumentar ao máximo seus rendimentos e empregos e os patrões, para preservar sua margem de lucro, tentam conter o aumento da folha de pagamento.

Porém não é exatamente assim que as coisas acontecem nos contratos de terceirização. As firmas de prestação de serviços e locação de mão-de-obra têm suas remunerações baseadas em um percentual do custo total do serviço prestado. Isso significa que quanto maior o aumento da sua folha de pessoal, maior o percentual que as firmas receberão. Portanto, a negociação entre patrões e empregados, nesse setor, não se dá como em outras áreas da economia. Tanto os patrões quanto os empregados desejarão que a folha salarial seja a maior possível, pois todos ganham com isso.

O que pode limitar essa lógica de aumentar o máximo possível os salários é o fato de que os serviços terceirizados passem a ficar caros e as empresas e órgãos públicos passem a contratar quantidades menores de serviços terceirizados. Por exemplo: um aumento real muito expressivo nos salários de profissionais de limpeza levaria um shopping center a reduzir seu contrato, passando a usar 30 faxineiros em vez dos 50 que utilizava anteriormente.

A ameaça de redução do valor total do contrato faria com que as firmas de serviços terceirizados tivessem incentivos para conter as demandas salariais de seus empregados. De maneira simplificada, aumentos exagerados nos preços unitários poderiam redundar em reduções mais que proporcionais na receitas totais, pelo corte mais que proporcional nas quantidades contratadas.

No entanto, o setor público é menos ágil e tem menos incentivos para diminuir as quantidades contratadas frente a aumentos de custos. Além disso, os valores de contratos com o setor público são muito superiores aos dos contratos com empresas privadas. Isso incentiva as firmas de terceirização a relaxarem nas negociações salariais, pois essa postura aumenta seus ganhos e gera repasse de custos à administração pública.

É interessante comparar a evolução dos pisos salariais estabelecidos por convenções coletivas entre empresas e sindicatos de trabalhadores de serviços terceirizados[3] com as convenções coletivas relativas a trabalhadores que atuam tipicamente no setor privado. É interessante fazer essa comparação no âmbito do Distrito Federal, onde a administração pública tem peso significativo na economia. Para representar o grupo de trabalhadores do setor privado escolhemos a categoria dos comerciários, que atua tipicamente em estabelecimentos comerciais privados[4].

Esse tipo de comparação usa os empregados do setor privado como uma espécie de “grupo de controle”. As condições gerais do mercado de trabalho (ritmo de crescimento da economia, inflação, taxa de desemprego, etc.) são similares para os dois setores. O que houver de diferença na evolução dos salários dos dois setores é, muito provavelmente, decorrente de dinâmicas diferentes em cada um dos setores.

O gráfico abaixo mostra que, tomando o ano de 2003 como base, os salários das duas categorias evoluem de modo similar. No entanto, a partir de 2009 o piso salarial dos trabalhadores em serviços terceirizados dispara, ficando 16% acima do piso salarial dos comerciários.

Ou seja, desde 2009 o setor de serviços terceirizado, que no Distrito Federal atende principalmente o setor público, tem encontrado condições mais fáceis de reajuste salarial do que em uma atividade tipicamente privada, na qual as negociações salariais são “para valer”.

Gráfico 1 – Evolução nominal do piso salarial dos trabalhadores de serviços terceirizados no DF e dos trabalhadores do comércio do DF


Fontes: SEAC e Fecomércio

O gráfico acima analisou a taxa de variação dos salários no tempo. Há que se verificar, também, o nível dos salários. E nesse caso há evidências ainda mais claras de que o setor público paga caro nos serviços terceirizados. As empresas de terceirização, quando encontram espaço, conseguem discriminar o preço cobrado de clientes do setor privado e de clientes do setor público.

Detectamos dois casos em que essa discriminação de preços ocorre há muitos anos: serviços de vigilância e de bombeiros de brigadas de incêndio. No caso das convenções coletivas dos trabalhadores em vigilância no Distrito Federal, historicamente fixam-se pisos salariais maiores para os vigilantes que trabalham no Banco do Brasil (uma empresa controlada pelo governo) e no Banco Central (um órgão público). A tabela abaixo mostra que o Banco do Brasil paga 34% a mais que os bancos privados, enquanto o Banco Central paga 95% a mais.

Tabela 1 – Piso salarial de vigilantes no DF estabelecido em convenção coletiva para o período 2010/2011


Fontes: Sindicato dos Vigilantes do DF. www.sindesvdf.com.br

Consultamos gestores do Banco Central e do Banco do Brasil acerca dos motivos da diferença. A resposta das duas instituições foi basicamente a mesma: quando se decidiu desfazer o quadro próprio de vigilantes e passar  a adotar serviços terceirizados, o BB e o BACEN pagavam acima do mercado privado. Decidiram, então, manter os salários mais altos para não prejudicar os então empregados, também preservando todos os postos de trabalho[5].

Ou seja, as instituições públicas não atuaram no sentido de reduzir seus custos, priorizando outros objetivos: a manutenção do emprego e do salário em níveis superiores ao de minimização de custos (conta que, obviamente, é paga pelo contribuinte e, no caso do BB, também pelos acionistas privados).

Deve-se notar que um vigilante não exerce tarefas adicionais ou corre maior risco por trabalhar no BB do que, digamos, no Itaú ou no Santander; o mesmo raciocínio se aplicando para o Banco Central.

Os sindicatos de trabalhadores e os de empresas desse setor aproveitam essa brecha e praticam a chamada discriminação de preços. Para maximizar os empregos no setor privado – e a receita das empresas de terceirização –, fixam um piso menor para os vigilantes empregados por esse setor, pois há a ameaça de o setor privado retaliar reduzindo mais que proporcionalmente o contingente total contratado; e para maximizar salários – e as receitas das empresas de terceirização –, fixam um piso maior para as empresas públicas, onde praticamente não há ameaça de retaliação, já que não se prevê ameaça de redução do número de contratados, a despeito de aumentos de salário sensivelmente acima dos praticados no setor privado.

Fenômeno similar ocorre com a categoria de bombeiros profissionais do Distrito Federal, profissionais destacados para o trabalho de prevenção de incêndios em prédios. Sua convenção coletiva, firmada com o Sindicato de empresas de terceirização (SEAC), discrimina claramente dois tipos de contratantes dos serviços.

De um lado ficam os clientes do setor público: “órgãos da administração pública federal direta e indireta, empresas públicas, sociedades de economia mista, administração pública direta e indireta do distrito federal, empresas públicas, sociedades de economia mista”. De outro lado, os clientes do setor privado: “empresas privadas, condomínios, shoppings e congêneres”[6]

A tabela abaixo mostra a diferença de pisos salariais praticados para cada grupo: o setor público paga 53% mais caro por um bombeiro de nível básico e 66% mais caro por um bombeiro líder.

Tabela 2 – Piso salarial de bombeiros profissionais no DF estabelecido em convenção coletiva para o período 2010/2011


Fontes: SEAC

Em geral os administradores públicos responsáveis pelos contratos de terceirização argumentam que nada podem fazer pois, por determinação da Constituição, precisam obedecer às convenções coletivas e pagar os reajustes estabelecidos.

Há, inclusive, uma norma do Ministério do Planejamento determinando o efetivo e integral repasse dos reajustes salariais aos contratos de terceirização (Instrução Normativa nº 2, de 2008 – alterada pela IN nº 3, de 2009):

§ 4º A repactuação para reajuste do contrato em razão de novo acordo, dissídio ou convenção coletiva deve repassar integralmente o aumento de custos da mão-de-obra decorrente desses instrumentos.

Estará o setor público, por força da regra constitucional, impotente diante desse aparente conluio entre patrões e empregados de serviços terceirizados? Não necessariamente.

Em primeiro lugar, é preciso lembrar que a  Lei de Licitações (Lei nº 8.666, de 1993) estipula, em seu art. 57, inciso II,  que a renovação de contratos de terceirização, mediante aditamento, sem a realização de nova licitação, deve ter por objetivo gerar preços e condições mais vantajosas para a administração. Há, espaço, portanto, para uma renegociação do contrato.

Isso pode ser feito mediante uma sinalização ou efetiva redução do valor total do contrato (com correspondente redução do serviço prestado). A Lei de Licitações fixa, no seu art. 65, § 1º [7], que a administração pública pode, a qualquer momento, e unilateralmente, reduzir em até 25% o valor de seus contratos. Portanto, uma forma de reagir a aumentos excessivos no custo de mão-de-obra embutido nos contratos terceirizados seria sinalizar aos prestadores que a reação a aumentos abusivos seria o corte no tamanho do contrato. Isso induziria as empresas a conter o valor dos reajustes salariais para não perder no valor total do contrato.

Mas para que essa atitude pró-ativa se torne realidade, é preciso que os gestores do setor público tenham incentivos a agir; não sendo trivial criar tais incentivos.

Alternativamente se poderia propor norma (legal ou infralegal) que proibisse a fixação de pisos salariais ou reajustes salariais diferenciados em função de o trabalhador prestar serviços ao setor público ou ao setor privado.

Outra opção no campo da legislação seria fixar que, no caso de serviços terceirizados, os reajustes dos contratos decorrentes de variação de custo de mão-de-obra não poderiam ser superiores a uma variação de uma cesta de salários praticados no setor privado, que passaria a ser tomada como referência. Tal medida não afetaria a soberania das convenções coletivas, uma vez que os salários ali fixados seriam pagos, mas a administração ficaria obrigada a reduzir o tamanho do contrato, com a consequente redução do número de trabalhadores prestando o serviço.

O problema de diferenciação salarial tratado neste texto é apenas um dos muitos problemas que envolvem os contratos de terceirização e que minam a capacidade desse instrumento para reduzir custos e aumentar eficiência administrativa.

Entre outros problemas pode-se apontar o fato de que há um conjunto de grandes empresas de terceirização com significativo poder de mercado, que tende a gerar práticas de cartel (o que poderia ser objeto de análise pelas autoridades responsáveis pela preservação da concorrência).

Outro problema decorre da intensa interação das empresas de terceirização com administradores públicos. Isso acaba por gerar práticas de reciprocidade que, embora vetadas pela legislação e pelos normativos do Ministério do Planejamento, tornam-se comuns, como a indicação, pelos dirigentes públicos, das pessoas que serão contratadas pelas firmas de terceirização.

A convivência dos terceirizados com os corredores do poder lhes dá espaço para reivindicar a manutenção de seus empregos junto a dirigentes políticos. Isso significa que os gestores dos contratos de terceirização perdem mais uma ferramenta de barganha: a ameaça de reduzir o tamanho dos contratos em caso de reajustes muito elevados nos valores dos salários.

Para piorar a situação, a justiça do trabalho, em sua  jurisprudência,  coloca o contratante de serviços terceirizados como responsável solidário pelo pagamento de direitos trabalhistas. Isso, por um lado, protege o trabalhador  mas, por outro, cria incentivos para que as empresas se tornem inadimplentes com relação a essas obrigações, como forma de forçar a administração pública a pagá-las. Não é incomum a prática de deixar uma empresa de terceirização quebrar, depois de ter recebido a quase totalidade dos pagamentos  feitos pelo setor público, deixando-se o “mico” trabalhista nas mãos do erário.

Por fim, vale registrar que boa parte da simplificação administrativa esperada com a terceirização acaba não ocorrendo. As regras impostas pelo Ministério do Planejamento e o temor dos administradores públicos quanto à possibilidade de as firmas lhes empurrarem custos trabalhistas acabam induzindo a criação de um controle administrativo paralelo. Assim, a administração pública acaba tendo que alocar pessoal para controlar os pagamentos de salários e auxílios (transporte, alimentação, etc.) aos terceirizados que lhes prestam serviços.

O resultado é um custo de terceirização elevado e crescente, pela fixação de remunerações acima daquelas que as leis do mercado estabeleceriam, pela manutenção de pessoal terceirizado acima do nível ótimo e pela manutenção de uma aparato administrativo interno de monitoramento de contratos de terceirização do qual, em um modelo racional, a administração pública deveria prescindir.

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[1] Sobre a dificuldade do setor público para conter seus custos e manter atividades com relação custo-benefício negativo ver, neste site, o texto Por que a intervenção do governo pode gerar prejuízos à sociedade?

[2] Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

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XXVI – reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho;

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[3] Convenções coletivas entre o Sindicato dos empregados de empresas de asseio, conservação, trabalho temporário, prestação de serviço e serviços terceirizáveis do Distrito Federal (Sindiserviços) e o Sindicato de empresas de asseio, conservação, trabalhos temporários e serviços terceirizáveis do DF (SEAC). Disponível em www.seac-df.com.br

[4] Convenções coletivas entre a Federação do Comércio de Bens, Turismo e Serviço do Distrito Federal (FECOMERCIO) o o Sindicato dos Empregados no Comércio do DF (Sindicom). Disponível em www.fecomerciodf.com.br

[5] O técnico do Banco Central consultado a respeito adicionou, ainda, o argumento de que, eventualmente, um vigilante de prédio do Banco Central pode vir a ser requisitado a fazer escolta armada de valores e que, por isso, o Bacen paga ao vigilante de prédio remuneração igual à do vigilante de escolta armada, apesar da baixa probabilidade de que ele seja, efetivamente, requerido a fazer tal serviço.

[6] Convenção coletiva 2010/2011, SEAC-Sindbombeiros do DF, cláusula 3ª.

[7] Art. 65…………………………………………….

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1o O contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas condições contratuais, os acréscimos ou supressões que se fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso particular de reforma de edifício ou de equipamento, até o limite de 50% (cinqüenta por cento) para os seus acréscimos.

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Por que é importante controlar o gasto público? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=634&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=por-que-e-importante-controlar-o-gasto-publico https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=634#comments Tue, 28 Jun 2011 14:17:10 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=634 Sempre que se fala em controlar o gasto público surge na cabeça de muitas pessoas uma reação automática: “trata-se de proposta neoliberal com o objetivo de cortar programas de governo, o que vai prejudicar a população, em especial os mais pobres”.

O senso comum é de que o gasto do governo gera benefícios sem custos. Na verdade, o que ocorre é que cada programa público gera benefícios bastante visíveis para um grupo específico de pessoas (aposentados são beneficiários do pagamento das aposentadorias, usuários do SUS são beneficiários dos gastos em saúde, credores do governo são beneficiários dos gastos com juros, etc.); ao passo que os custos são pagos por todos os contribuintes, de forma difusa.

O resultado é que os beneficiários diretos têm incentivos para lutar pela criação, expansão ou manutenção de gastos em seu favor. Quem não quer receber um serviço que será oferecido a uma parcela da sociedade, mas cujo pagamento será dividido entre toda a população? A mobilização lhes proporcionará ganhos elevados, o que estimula a criação de grupos de pressão em defesa de seus interesses.

Por outro lado, os contribuintes, que pagam a conta, terão menos incentivos a protestar contra o aumento dos gastos e consequente aumento da carga tributária. Primeiro porque o custo de um novo programa público a ser suportado individualmente por cada contribuinte é pequeno. Segundo, porque é difícil coordenar a formação de um grupo de pressão formado por todos os contribuintes do país.

Esse maior incentivo à mobilização dos beneficiários em relação aos que pagam a conta desequilibra a balança em favor da expansão dos gastos do governo. Não se está, aqui, fazendo juízo de valor sobre a importância ou não de cada programa de governo. Apenas se faz o registro de que há, em sociedades democráticas, um viés em favor da expansão dos gastos.

Outro argumento contrário ao controle do gasto público é o de que tal gasto estimula o crescimento da economia. Cortá-lo, portanto, provocaria menor crescimento do PIB, prejudicando toda a sociedade e não apenas os beneficiários diretos das despesas.

O presente texto tem por objetivo chamar atenção para o outro lado da questão: os custos diretos e indiretos da expansão do gasto público prejudicam o crescimento de longo-prazo do país. Ainda que no curto-prazo uma expansão dos gastos do governo estimule o crescimento; no longo prazo um governo que imponha alta carga tributária, e que tenha déficit e dívida elevados, acaba prejudicando importantes propulsores do crescimento econômico, quais sejam: o aumento da produtividade, a inovação, a concorrência, a flexibilidade do mercado de trabalho e a competitividade dos exportadores no mercado externo.

A redução e maior eficiência do gasto público como proporção do PIB são condições necessárias para que o Brasil possa obter mais crescimento econômico, mais renda, menor desigualdade, mais oportunidades de trabalho e uma vida mais longa e recompensadora para sua população.

O estado brasileiro cresceu fortemente nos últimos anos e parece estar excessivamente grande. A despesa do governo federal passou de 19% para 30% do PIB entre 1995 e 2009[1]. E a carga tributária imposta pela União, estados e municípios saltou de 27% do PIB, em 1995, para mais de 33,6% em 2009[2].

Isso significa que quase 34% daquilo que os trabalhadores e empresas produzem ao longo do ano é retirado das rendas privadas e, posteriormente, re-injetado na economia por meio dos gastos do governo. Isso significa que os dirigentes do setor público detêm grandepoder, pois podem decidir quem vai ficar com 34% da renda do país.

A princípio, a ação do governo tende a estimular o crescimento econômico e a igualdade social. Como mostra outro artigo deste site (Por que o governo deve interferir na economia?), o mercado privado está sujeito a várias falhas, que podem ser corrigidas pelo governo. Por exemplo, a construção de uma estrada ligando indústrias a um porto de exportações pode ser importante para o desenvolvimento do país, mas o retorno financeiro da empreitada, em si, pode não ser compensador para que um investidor privado decida construí-la. Nesse caso, a ação do governo, retirando dinheiro compulsoriamente da sociedade e investindo-o na estrada, permitirá que a sociedade atinja um nível mais elevado de renda.

Todavia, quando o governo cresce excessivamente, os custos de suas ações tendem a superar os benefícios, e surgem diversos motivos pelos quais ele passa a prejudicar o desenvolvimento econômico e social.

Para sustentar uma máquina pública grande e em expansão, é preciso impor crescente tributação à sociedade. Como as fontes tradicionais de tributação (renda, patrimônio e consumo) são limitadas, o governo, em busca de mais receitas do que essas bases tributárias podem oferecer, opta por criar também impostos de baixa qualidade, que incidem sobre o faturamento das empresas, a folha de pagamentos, os depósitos bancários; e que acabam por impor custos excessivos à sociedade.

Vale citar o caso da tributação sobre os investimentos em saneamento básico. Como é demonstrado pela literatura[3], a instalação de redes de água e esgoto, bem como o adequado tratamento dos resíduos, gera muitas externalidades positivas: redução de doenças infectocontagiosas, menor custo de assistência hospitalar, maior produtividade dos trabalhadores, valorização imobiliária, ampliação do setor turismo, etc. Por isso, é recomendável que o governo evite tributar tal setor e, além disso, o estimule mediante subsídios. No Brasil, as empresas de saneamento pagam mais de R$ 3 bilhões em impostos por ano, a maior parte incidente sobre seu faturamento. Uma recente tentativa de desonerar a tributação do setor, embutida na Lei nº 11.445, de 2007[4], foi vetada pelo Presidente da República, sob o argumento de que “permitir desoneração adicional de tributos significaria dificuldades para a manutenção das despesas sociais em níveis satisfatórios”. Ou seja, o alto nível de despesas impede que se conceda uma isenção tributária que, por si só, teria grande impacto socioeconômico e ambiental. E a justificativa para negar a desoneração é a necessidade de se fazer gastos em políticas sociais. Cabe perguntar o que seria melhor: garantir condições de melhoria de vida mediante expansão do saneamento ou ampliar o atendimento em hospitais públicos dos aproximadamente 500 mil[5] casos anuais de infecções gastrintestinais, gerados pelo saneamento deficiente?

Além da tributação excessiva, o governo tende a criar e ampliar mecanismos de poupança forçada (PIS/PASEP, FGTS), que obrigam empresas e empregados a depositar em fundos públicos, em troca de baixa remuneração, um dinheiro que poderia ser usado de forma mais produtiva no consumo ou poupança privados, sem que critérios políticos afetassem a alocação desses recursos.

Esse sistema tributário pesado e distorcido onera a criação de novos negócios, dificulta a ampliação das empresas, e prejudica as exportações, que são algumas das molas mestras do crescimento econômico. Um novo equipamento, que poderia duplicar a produção de uma empresa, fica muito mais caro devido ao aumento dos impostos, podendo deixar de ser uma opção lucrativa para a empresa (o impacto da tributação sobre as transações econômicas é tratado neste site no texto Como os impostos afetam o crescimento econômico).

Quando se tributa excessivamente a folha de salários, desestimula-se a contratação de novos empregados. Isso afeta não só o potencial de geração de empregos, mas também as possibilidades de crescimento das empresas.

Não se consegue exportar parte da produção porque as empresas dos países concorrentes têm custos tributários menores e, por isso, oferecem preços menores.

Outra importante fonte de crescimento – o aumento da produtividade – também é afetada pela tributação excessiva. Em um contexto de tributação elevada, pagar ou não todas as obrigações tributárias passa a ser, muitas vezes, uma decisão determinante para a sobrevivência das empresas. Muitas optam por não pagar impostos e, para não aparecer aos olhos do fisco, não podem crescer, mantendo-se pequenas e pouco produtivas, não podendo aproveitar os ganhos decorrentes do aumento da escala de produção e do acesso a técnicas mais eficientes.

Um mestre de obras e seus operários, por exemplo, terão dificuldade para crescer a ponto de se tornarem uma pequena empreiteira, formalmente registrada, com acesso a crédito na rede bancária e junto a fornecedores, com uma sede em endereço publicamente divulgado, onde poderão organizar a administração, receber clientes, etc.

Ao se tornar visível para o fisco, o empreendimento corre o risco de ser inviabilizado pelo peso da carga tributária. Com isso, multiplicam-se no país as feiras e camelôs, onde deveria haver lojas bem organizadas; os quebra-galhos e biscateiros, em lugar das pequenas empresas de serviços; as fabriquetas de fundo de quintal, os quiosques de comida sem higiene. Todos empreendimentos de baixa qualidade e impedidos, pela asfixiante carga fiscal, de crescerem e de se tornarem mais produtivos.

A concorrência, que estimula a eficiência e a produtividade, também é afetada. Devido à alta carga de tributos, são poucas as empresas de porte médio com capital disponível suficiente para crescer e tentar obter uma fatia de mercado atendida por grandes empresas. Estas, por falta de concorrência, não precisam se esforçar (aumentar qualidade e produtividade) para manterem suas fatias de mercado; basta confiar no fato de que somente as grandes empresas têm condições de atender as exigências burocráticas e o esforço financeiro requerido pelo fisco. A alta carga tributária acaba se transformando em barreira à entrada, protegendo as grandes empresas de terem seus mercados ameaçados por novas empresas de porte médio. O resultado é uma economia pouco dinâmica e pouco inovadora.

Uma característica dos governos grandes é que, mesmo com uma tributação elevada, eles dificilmente conseguem equilibrar suas contas. Para cada nova receita arrecadada, a burocracia, os políticos e sua clientela ou as demandas da população (muitas delas legítimas) já criaram uma despesa nova. A tendência, então, é que governos grandes acumulem dívidas igualmente grandes.

Um governo que deve muito representa risco para os emprestadores, que dele cobrarão altas taxas de juros. Pagando juros elevados e absorvendo parcela significativa dos recursos disponíveis na sociedade, o governo reduz o crédito disponível para o setor privado e eleva o custo dos financiamentos. Muitos empreendimentos se tornam inviáveis em função desse custo financeiro. A taxa de investimento do país cai, prejudicando o crescimento.

No governo, os incentivos para agir com eficiência são menores, afinal o burocrata ou governante gastam um dinheiro que não é seu (veja a esse respeito, neste site, o artigo Por que a intervenção do governo pode gerar prejuízos à sociedade?). Quando um percentual elevado da renda do país passa pelas mãos do governo, isso significa que um setor com baixo incentivo para ser produtivo tem prioridade na decisão de alocação dos recursos escassos da sociedade. O resultado é a baixa eficiência e produtividade e, mais uma vez, menos crescimento.

Já que é o governo quem decide a alocação de 34% da renda nacional, torna-se interessante, para cada indivíduo, ter acesso a essa parcela da renda. Isso significa que muitas pessoas vão investir tempo e dinheiro para se especializar em obter recursos públicos. Vão, por exemplo, buscar relacionamentos pessoais que facilitem o acesso a instâncias de decisão no governo. Ou, ainda, buscarão uma militância partidária ou em grupos de interesse que abram as portas para um cargo público comissionado ou para um patrocínio de uma empresa estatal.

Essa é a chamada atividade de “caçador de renda”, que não cria riqueza nova para a sociedade, mas apenas busca capturar recursos já existentes, produzidos por outros. É fácil perceber que será baixo o crescimento e a produtividade de longo prazo em um país onde valha mais fazer bons relacionamentos do que gastar horas estudando para se tornar um profissional produtivo; onde é mais lucrativo explorar brechas da lei para processar o estado do que desenvolver um novo produto.

Já que o governo está entre os maiores compradores de bens e serviços do país, o nível de lucro de muitas empresas depende de decisões tomadas pelo governo. Por outro lado, as decisões de governo tendem a ser fortemente influenciadas pelos objetivos dos governantes que, em geral, buscam, em primeiro lugar, a sobrevivência política e a vitória nas próximas eleições. Nesse contexto, muitas vezes será mais interessante para uma empresa investir no financiamento de campanhas eleitorais, que garantam a eleição de um governante amigo e mantenha o acesso a contratos públicos, a investir na busca de produtos mais eficientes e de menor custo.

Não podemos nos iludir, contudo, com a idéia do estado mínimo. Em uma sociedade tão desigual como a brasileira, é fundamental que sejam tomadas ações que busquem melhorar a distribuição da renda e das oportunidades. Isso, contudo, não é justificativa suficiente para a expansão ilimitada do gasto público. Tome-se o exemplo do setor de saneamento, citado acima, em que a necessidade de se financiar gastos sociais vem impedindo a redução da tributação em um setor fundamental à melhoria das condições de vida da população pobre. É preciso fazer escolhas racionais, ainda que difíceis e sujeitas a perda de popularidade.

Por mais meritório que seja um programa público, seus objetivos podem se perder devido a baixos incentivos para implementá-lo de forma eficiente, ou pela captura de seus benefícios por grupos outros que não o seu público alvo. Daí porque toda criação de um novo programa, projeto, subsídio ou contratação pública deve ser analisada com muito critério.

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Para ler mais sobre o tema:

Hausmann, R. (2009) Diagnóstico do Crescimento Econômico Brasileiro. CLP Papers nº 1. São Paulo. Centro de Liderança Pública.

Mendes, M. (2010) Controle do gasto público: reformas incrementais, crescimento e estabilidade macroeconômica. CLP Papers nº 4. São Paulo. Centro de Liderança Pública.

Schuknecht, L e Tanzi, V (2005) Reforming public expenditure in industrilised countries: are there trade-offs? European Central Bank. Working Paper Series nº 435

Zettelmeyer, J. (2006) Growth and reforms in Latin America: a survey of facts and arguments. IMF working paper nº 06/210. www.imf.org/external/pubs/ft/wp/2006/wp06210.pdf.


[1] Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional.

[2] Fonte: Receita Federal do Brasil.

[3] Ver, por exemplo, FGV (2010) Benefícios econômicos da expansão do saneamento brasileiro. Mimeo,  Instituto Trata Brasil. Disponível em: www.tratabrasil.org.br.

[4] Vide art. 54 da Lei nº 11.445/2007.

[5] FGV(2010), op. cit.

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https://www.brasil-economia-governo.com.br/?feed=rss2&p=634 11
O que fazer para melhorar a eficiência dos servidores públicos e reduzir as despesas de pessoal do governo? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=36&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=o-que-fazer-para-melhorar-a-eficiencia-dos-servidores-publicos-e-reduzir-as-despesas-de-pessoal-do-governo https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=36#comments Fri, 18 Feb 2011 00:07:05 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=36 Esse texto propõe diretrizes para a política de admissão e gerência de pessoal no Governo Federal, tendo por objetivo: elevar o estímulo à produtividade, evitar a admissão excessiva de pessoal, melhorar a qualidade do pessoal selecionado para o serviço público, facilitar a alocação mais eficiente da mão-de-obra disponível e reduzir o custo da folha de pagamento.

1. Cada órgão deve focar esforços em sua área-fim. É comum que as instituições públicas percam foco em suas areas-fim, permitindo o crescimento excessivo das atividades-meio ou secundárias; com consequente necessidade de contratar pessoal para essas áreas.

É preciso permanentemente reavaliar as estruturas organizacionais, “aparando” a expansão das atividades de apoio, de divulgação, ou acessórias; bem como evitando a duplicação de estruturas e promovendo a automação de tarefas rotineiras, que leva a ganhos de eficiência e redução da necessidade de pessoal.

2. Planejamento da força de trabalho e cronograma anual de concursos. Um órgão central, como o Ministério do Planejamento, deve montar um planejamento das necessidades de força de trabalho do governo com horizonte de cinco anos ou mais para as admissões.

A partir daí, deve ser fixado um cronograma de concursos, a serem realizados anualmente, em data preestabelecida, para praticamente todas as carreiras. Seria uma regularidade similar à dos concursos vestibulares das universidades.

Atualmente os concursos públicos são realizados sem regularidade temporal, por decisão negociada entre o órgão contratante e o Ministério do Planejamento. Sabedores da dificuldade de se aprovarem novas admissões futuras, e cientes do custo de transação envolvido na negociação para abertura de concurso, os gestores públicos têm incentivos para superestimar o número de servidores necessários. Abrem vagas em excesso e, além disso, realizam concursos com prazo de validade máximo permitido pela Constituição (4 anos), deixando uma lista de espera a ser convocada ao longo desse período.

Isso gera diversos problemas. Primeiro, os indivíduos da lista de espera tendem a montar lobby para garantir e acelerar sua convocação, o que gera mais custo de transação e induz a contratação de mais servidores que o necessário. Segundo, os concursos se tornam grandes eventos, com número elevado de candidatos, o que eleva o custo de realização dos certames. Terceiro, deixa de haver uma substituição gradativa dos servidores que ano após ano saem de atividade, pois há grande intervalo entre um concurso e outro, com prejuízo à memória institucional.

3. Melhorar a qualidade dos concursos públicos. Nos concursos públicos as questões de múltipla escolha têm maior peso. Dado que os concursos são grandes eventos, opta-se por um método de teste que facilite a correção por meio eletrônico.

As provas raramente são focadas nos assuntos e habilidades estritos que serão requeridos do candidato ao longo da vida profissional. É costume cobrar dos candidatos um tipo de conhecimento enciclopédico, superficial, com amplo espectro de matérias (direito penal, direito civil, direito constitucional, orçamento e contabilidade pública, economia, ciência política, administração, regulamento interno dos órgãos, etc.). Isso leva os candidatos a uma extenuante preparação, baseada no aprendizado pouco profundo de matérias (a famosa “decoreba”) que, passado o concurso, raramente lhes serão de interesse ou de alguma utilidade.

A tendência é que sejam aprovados nos concursos os jovens candidatos a primeiro emprego, que têm tempo suficiente para dedicar ao estudo intensivo das matérias exigidas nas provas. Profissionais mais experientes, com bagagem e habilidade profissional que seriam muito importantes ao setor público, simplesmente não têm condições de parar de trabalhar durante vários meses para se dedicarem ao estudo do programa do concurso.

Além de reduzir a importância das questões objetivas, seria importante aumentar a importância das questões dissertativas (nas quais é possível avaliar a capacidade de argumentação e a habilidade para escrever); reduzir a amplitude de matérias cobradas, focando naquelas de importância direta para o exercício profissional; dar preferência ao teste de habilidade cognitiva (testes de raciocínio e lógica) em detrimento do conhecimento decorado; e aumentar o peso atribuído ao histórico profissional e aos títulos acadêmicos.

A implantação de um cronograma de concursos anuais, com menor número de vagas e candidatos, conforme sugerido no item 2, viabilizaria esse tipo de modificação nos concursos, pois seria menor o número de candidatos e de avaliações a corrigir.

4. Mudar o foco dos cursos de formação. Uma vez que os concursos públicos tendem a selecionar jovens pouco experientes, há a necessidade de “treinar” aprovados antes do início do efetivo exercício das suas funções. Surgem, então, os longos (e caros) cursos de formação. Contudo, os cursos de formação acabam repetindo a fórmula usada nos concursos: ministrar aulas sobre conteúdo acadêmico, muitas vezes na modalidade express, apresentando-se uma visão introdutória e superficial de grande quantidade de disciplinas acadêmicas.

Se fossem selecionados para o setor público profissionais mais experientes, com conhecimento nas áreas específicas que serão demandadas na atividade laboral cotidiana, a política de formação poderia enfocar o desenvolvimento ao longo da carreira. Os servidores se candidatariam para periódicas e regulares licenças para estudo, no âmbito de um programa de treinamento da instituição, focado na missão e nos objetivos principais daquela organização.

Esse seria um incentivo à qualidade e produtividade dos servidores, que procurariam ser mais aplicados em suas atividades, como forma de se credenciar a um desses programas de treinamento ao longo da carreira. Principalmente se o sucesso na conclusão do curso fosse premiado com um adicional à remuneração.

5. Evitar o excesso de qualificação. Um equívoco comumente observado é a exigência de formação escolar em nível mais elevado que o necessário para o exercício da função, na suposição de que isso levará a uma seleção de pessoal melhor qualificado.

Isso não necessariamente é correto. Moriconi[1] mostra que, tendo em vista que as remunerações oferecidas a professores do ensino básico não são atrativas, e que pessoas com nível superior têm alternativas de emprego com melhor remuneração, ao se exigir nível superior completo para o ingresso na carreira, as vagas para professor acabam atraindo os indivíduos de nível superior com menor qualidade profissional.

Se não fosse exigido o nível superior completo, é possível que jovens talentosos, ainda cursando a universidade, se sentissem atraídos pela remuneração oferecida. A exigência de nível superior, nesse e em outros casos similares, em vez de selecionar os melhores, acaba selecionando os piores.

6. Ascensão funcional por mérito. Ao longo da vida profissional as pessoas estudam, melhoram suas qualificações e podem se tornar sobrequalificadas para o exercício da função para a qual foram inicialmente contratadas. Um jovem, admitido aos vinte anos de idade para exercer funções de nível médio, pode se formar, realizar cursos de especialização, etc. Manter-se com as mesmas tarefas que exercia aos vinte anos, ao longo de toda a vida funcional, é algo bastante frustrante. A tendência é que essas pessoas se tornem desmotivadas para a realização de suas tarefas.

No atual quadro constitucional não é permitido fazer concursos para ascensão interna no setor público. A opção para esse profissional passa a ser a de fazer concurso público para uma nova carreira. Porém, como visto nos itens 2 e 3, os concursos públicos, em seus modelos atuais, exigem um esforço elevado de preparação, e dão pouca importância à experiência profissional acumulada. Há, portanto, um alto custo de transação na opção de “começar de novo” em uma nova carreira, por meio de novo concurso público.

Por isso, seria importante a regulamentação da possibilidade de ascensão funcional, de atividades de nível médio para outras de nível superior, por meio de concursos internos. Esses concursos, praticados anteriormente à vigência da Constituição de 1988, têm um histórico de manipulação em favor de apadrinhados e de uso como mecanismo indevido de elevação geral de remunerações. Seria preciso adotar mecanismos de transparência para evitar tal problema.

7. Carreiras não vinculadas a órgãos específicos. É preciso aumentar a possibilidade de um mesmo servidor ser alocado em diferentes órgãos da administração. Desde o final dos anos noventa houve uma tendência de criação de carreiras vinculadas a um determinado órgão. Temos, por exemplo, o “Plano Especial de Cargos da Cultura”, cujos servidores ficam vinculados ao Ministério da Cultura, o “Plano Especial de Cargos do Ministério da Fazenda”, etc.

Essa foi uma forma encontrada pelas lideranças sindicais e corporativas dos servidores para melhorar a sua remuneração e estimular a coesão em torno dos interesses de classe, reduzindo seus custos de decisão coletiva.

O resultado disso foi uma redução da possibilidade de remanejamento de pessoal entre órgãos. Um “Analista Ambiental” que realize atividades burocráticas e gerenciais no Ministério do Meio Ambiente não encontará espaço para realizar atividades similares no Ministério dos Transportes: ao se transferir, perderá a gratificação que recebe no órgão de origem e não poderá receber gratificação similar paga no órgão de destino, pois não pertence à carreira daquele órgão.

Caso haja excesso de pessoal no primeiro Ministério e escassez no segundo, é reduzida a possibilidade de se solucionar esse desequilíbrio por meio de realocação de pessoal.

8. Competição e mérito na distribuição de funções comissionadas e de Direção e Assessoramento Superior (DAS). A maior mobilidade horizontal, tratada no item anterior, facilitaria a criação de um ambiente de competição, meritocracia e aumento de produtividade: as funções gratificadas ou DAS oferecidas por um órgão poderiam, a critério de seus dirigentes, ser alocadas por meio de abertura de concorrência eletrônica, a ser disputada por servidores de diversos órgãos.

9. Reformulação e enxugamento das funções de confiança e DAS. Nos anos recentes houve um grande incremento no número de funções e cargos que podem ser livremente nomeados pelo gestor público, sem a exigência de que o escolhido seja servidor público de carreira. O número de DAS pulou de 17,6 mil para 21,2 mil entre 2003 e 2009: um crescimento de 20,5%.

Isso é prejudicial não apenas pela tendência ao acúmulo de excesso de pessoal, como também por gerar descontinuidade no processo de trabalho. A cada troca de governo, milhares de gestores e assessores de nível superior e intermediário são substituídos, com a quebra de ritmo do trabalho e perda da memória das organizações. Isso sem contar o elevado risco de que as nomeações políticas levem à escolha de pessoas de baixo nível técnico ou não identificadas com as metas de longo prazo das instituições para as quais foram nomeadas.

Essas contratações revelam uma contradição. Por um lado, é banido o instrumento da ascensão funcional, como visto no item 6, sob o argumento de que a seleção de mérito deve ser por concurso. Por outro lado, usa-se e abusa-se da contratação sem qualquer concurso, para cargos em comissão.

É preciso extinguir os cargos e funções de livre provimento nos níveis intermediários e básicos da administração. A entrada de não-servidores na administração ficaria restrita aos de alta hierarquia, de cunho político.

10. Uso parcimonioso da gratificação por desempenho. Sempre que se fala em premiar o mérito, surge a idéia da avaliação de desempenho pessoal, pagando-se gratificações aos servidores bem avaliados.

Esse procedimento, contudo, tem-se mostrado pouco eficaz. Uma má avaliação deteriora as relações pessoais entre superior (avaliador) e subordinado (avaliado), gerando hostilidade. A tendência é a de se conceder avaliação máxima a todos.

Por isso, esse tipo de mecanismo deve ser usado exclusivamente nos casos em que seja possível medir, de forma exógena e independente, o desempenho coletivo. Por exemplo, gratificar servidores das escolas cujos alunos apresentem bons rendimentos em testes de proficiência, ou gratificar auditores fiscais por atingirem a meta de arrecadação.

Do contrário, o mérito deve ser premiado por outros mecanismos, como a rapidez na ascensão funcional ao longo da carreira (vide item 11) ou o acesso a funções comissionadas por meio de processos competitivos (vide item 8).

11. Progressão seletiva ao longo da carreira. Historicamente as progressões dos servidores a níveis mais elevados de suas carreiras têm sido feitas por tempo de serviço, o que não estimula o bom desempenho.

Para tornar esse quadro ainda mais desestimulante, houve uma tendência ao estreitamento na diferença de remuneração entre o nível inicial e o nível final de remuneração das carreiras, tornando pouco relevante o avanço para os próximos níveis.

Marconi[2] mostra, por exemplo, que para os auditores fiscais essa diferença caiu de 75% para 26%, para os analistas do Banco Central do Brasil reduziu-se de 117% para 40%, para os Técnicos de Seguro Social de 117% para 75%.

Deve-se ampliar a diferença de remuneração entre o nível inicial e final. A segunda providência seria reduzir a prática de concessão de gratificações com valores uniformes a todos os servidores da carreira. Em terceiro lugar, é preciso encontrar mecanismos de promoção ao longo da carreira que privilegiem o mérito.

Um mecanismo possível seria fixar um número de vagas para promoção sempre menor que o de candidatos à promoção. O critério para promoção seria o mérito, definindo-se os escolhidos por um colegiado de superiores (evitando-se a decisão individual do chefe direto).

O estabelecimento de um “funil” de vagas, muito similar ao que existe no sistema de promoção de oficiais militares, serviria para acelerar a ascensão dos servidores de melhor desempenho.

12. Fixação dos vencimentos a partir de comparações com o setor privado. A fixação dos vencimentos para cada carreira tem sido feita de forma ad hoc, ao sabor das pressões sindicais e corporativas. Os percentuais de reajustes no setor público devem acompanhar aqueles praticado no setor privado, para atividades que exijam escolaridade e experiência similares.

13. Regulamentação do direito de greve. Devido à não regulamentação do dispositivo constitucional que estabelece o direito de greve dos servidores, as organizações sindicais de servidores encontram espaço para realizar greves sem sofrer punições, o que permite que se mantenham greves longas, sem a preocupação de se manter um nível mínimo de funcionamento dos serviços essenciais.

Uma decisão do Supremo Tribunal Federal estipulou que, na ausência da lei regulamentadora da greve no setor público, deveriam ser aplicadas as regras (mais disciplinadoras) vigentes no setor privado. A aplicação dessa decisão, contudo, depende da disposição política do governo, que quase sempre tem sido de condescendência com os grevistas.

14. Regulamentação da previdência complementar dos servidores públicos. As Emendas Constitucionais nº 20, de 1998 e nº 41, de 2003 criaram a possibilidade de se estabelecer um regime de previdência complementar para os servidores públicos. A idéia é aproximar as regras do atual sistema de aposentadorias do Regime de Próprio de Previdência Social (RPPS), dos servidores públicos, àquelas vigentes no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que abarca os trabalhadores do setor privado.

Atualmente as aposentadorias e pensões no setor público podem atingir valores muito superiores ao teto legal imposto aos trabalhadores do setor privado. A Constituição, a partir da aprovação das emendas acima citadas, prevê a possibilidade da criação, por lei ordinária do poder executivo (federal, estadual, distrital ou municipal) de um regime de previdência complementar. A partir do início do funcionamento dessa previdência complementar, o RPPS pagaria, a seus participantes, aposentadorias e pensões em valor até o limite máximo do RGPS.

A previdência complementar dos servidores públicos funcionaria sob o regime de contribuição definida, ou seja, a aposentadoria futura seria calculada com base no valor da poupança individual acumulada pelo servidor, a partir de contribuições suas e do governo empregador. Isso garantiria a solvência de longo prazo da previdência dos servidores e desoneraria o Tesouro da obrigação de custear o déficit gerado no sistema atual.

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Para ler mais sobre o tema:

Marconi, N. (2010) A gestão recente de recursos humanos no Governo Federal e sugestões de políticas. Fundação Getúlio Vargas, mimeo, São Paulo.

Mendes, M. (2010). POLÍTICA DE PESSOAL DO GOVERNO FEDERAL: diretrizes para maior produtividade, qualidade, economicidade e igualdade. In: Senado Federal. Agenda Legislativa para o Desenvolvimento Nacional. Senado Federal, Brasília, DF.

OECD (2010) OECD reviews of human resource management in government: Brazil 2010 – Federal Government, mimeo.


[1] Moriconi, G. (2008) Os professores públicos são mal remunerados nas escolas brasileiras? Uma análise da atratividade da carreira do magistério sob o aspecto da remuneração. Fundação Getúlio Vargas, São Paulo. Mestrado em Administração Pública e Governo.

[2] Marconi, N. (2010) A gestão recente de recursos humanos no Governo Federal e sugestões de políticas. Fundação Getúlio Vargas, mimeo, São Paulo.

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