desigualdade de gênero – Brasil, economia e governo https://www.brasil-economia-governo.com.br Wed, 04 Jan 2012 04:20:22 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.2 Como coibir a prática do trabalho escravo no Brasil? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=953&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=como-coibir-a-pratica-do-trabalho-escravo-no-brasil https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=953#comments Mon, 19 Dec 2011 11:12:17 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=953 O art. 243 da Constituição Federal prevê que as glebas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas serão imediatamente expropriadas e destinadas ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.

Há discussões no Congresso Nacional para alterar o dispositivo constitucional citado de forma a estender a pena de expropriação de terras para os casos em que for constada a exploração de trabalho escravo ou em situação análoga à escravidão (doravante denominados indistintamente trabalho escravo), sendo a respectiva área revertida para fins de reforma agrária.

Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o que caracteriza o trabalho escravo é a privação de liberdade a que os trabalhadores ficam submetidos. Embora não existam informações oficiais sobre o número de trabalhadores em condições de escravidão no Brasil, dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) mostraram que, em 2006, existiam 25 mil trabalhadores nessas condições. Os dados mais recentes apresentados pela CPT, relativos a 2010, mostram que as atividades que mais empregam esse tipo de mão de obra, considerando os casos denunciados e efetivamente fiscalizados, são a pecuária (59%), outras lavouras (16%) e carvoarias (11%). Naquele ano foram libertos 1.613 trabalhadores.

O crime por manter trabalho escravo está tipificado no Código Penal Brasileiro, em seu art. 149.  Conforme análise econômica do crime e das penas, sabe-se que seria eficiente do ponto de vista econômico que o Estado estabelecesse uma punição tal que, para o infrator, o prejuízo ex ante associado à punição seja superior aos benefícios que aufere por transgredir a lei.  Dentro dessa lógica, a pena aplicada deveria ser capaz de dissuadir o criminoso de praticar o crime. No entanto, a pena prevista para quem pratica crime de manutenção de trabalho escravo, conforme a legislação penal vigente, parece não estar sendo capaz de coibir tal prática, ou está coibindo em um grau menor do que o desejado pela sociedade.

Segundo o relatório Conflitos no Campo, da CPT, entre 1996 e 2003, menos de 10% dos empregadores envolvidos com o trabalho escravo no sul-sudeste do Pará foram denunciados por esse tipo de crime.  Baseando-se nos dados levantados pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público do Trabalho (MPT) e da CPT, observa-se que, em todos os estados da federação, nem todas as denúncias são efetivamente checadas. Além disso, a possibilidade de transmutação da pena (alteração da privação de liberdade por prestação de serviços ou doação de cestas básicas) acaba por encorajar os empregadores a explorarem o trabalho escravo frustrando a intenção do legislador em dissuadir o criminoso de praticar o delito. Em outras palavras, pode-se dizer que a transmutação da pena diminui sua força, fazendo com que o benefício (para o empregador) de manter trabalho escravo seja superior à punição esperada. Isso faz com que a punição não seja efetiva e não propicie a diminuição do delito.

Sob a perspectiva do crime racional, o criminoso calcula o valor esperado do crime, que é igual ao ganho menos a pena, multiplicado pela probabilidade de ser pego e condenado. O uso de mão-de-obra escrava está muito relacionado com os custos de transação: usualmente é praticado em locais distantes, onde é relativamente fácil para o empregador manter o empregado preso e onde é mais difícil chegar o Estado. Assim, é fácil entender porque atividades agropastoris (cultivo de soja, cana de açúcar e pecuária), extrativistas (mineração) e siderúrgicas (produção de ferro-gusa a partir da madeira queimada em carvoarias) valham-se costumeiramente de mão de obra escrava em seus processos produtivos.

Paralelamente às sanções penais cabíveis, o MTE procura combater o trabalho escravo com sanções administrativas como, por exemplo, a advertência, a multa, a suspensão e a interdição do estabelecimento. Essas medidas visam atingir economicamente quem incorre no crime de trabalho escravo, piorando a situação do autor do delito. O problema é que, além de nem todas as atividades que se valem de mão de obra escrava serem efetivamente fiscalizadas, o MTE só age quando motivado por denúncia.

Ainda que as denúncias sejam feitas, é inviável, quiçá impossível, para um órgão fiscalizador atender a todas as ocorrências que lhes são direcionadas. A título de exemplificação consideremos que, no caso de uma autuação do MTE por uso de mão de obra escrava, o empregador pague por todos os benefícios trabalhistas, como se os empregados fossem registrados. O valor é calculado sobre o salário prometido pelo aliciador, no momento do aliciamento. Assim, todos os direitos trabalhistas, tais como, salários atrasados, férias vencidas e proporcionais, décimo terceiro, aviso prévio e Fundo de Garantia por Tempo de Serviço devem ser integralmente pagos. Além disso, como para o MTE a relação de emprego é presumida, ainda que não tenha sido formalizada, o trabalhador faz jus a três parcelas de seguro-desemprego.

Quando o empregador contrata trabalhadores escravos, atribui uma probabilidade estritamente positiva de nunca ser pego (se a probabilidade fosse nula, o empregador já contrataria obedecendo a legislação, pois saberia que, mais cedo ou mais tarde, teria de arcar com todos os custos trabalhistas). Por isso a contratação de trabalho escravo reduz os custos esperados do empregador. Custos mais baixos, por sua vez, estimulam a contratação de mão-de-obra. Quando a fiscalização do trabalho autua um empregador e lhe impõe o pagamento de todas as obrigações legais, o custo incorrido é maior do que o que incorreria se ele obedecesse à lei desde o início, pois, nesse caso, teria contratado menor volume de mão-de-obra. Essa punição administrativa, entretanto, não gera custos (ex ante) suficientemente elevados para todos os empregadores a ponto de desestimular a contratação da mão-de-obra escrava.

Por fim, na esfera cível, o Ministério Público do Trabalho (MPT) procura atuar de forma a compensar os danos morais sofridos pelos trabalhadores. Via de regra, as indenizações peticionadas aos juízes são elevadas com o claro objetivo de coibir o trabalho escravo. Não obstante, como se trata de uma ação civil, a ilegalidade cometida pelo empregador precisa ser comprovada por preponderância de evidências, posto que, pelo Princípio de Presunção de Inocência, ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória. Como, costumeiramente, quem se vale da mão de obra escrava são pessoas com bons recursos financeiros, elas podem contar com uma excelente assessoria contábil e jurídica para suas fazendas e empresas, protelando as sentenças condenatórias ou até mesmo revertendo-as.

Além de todos esses problemas já relatados, o trabalho escravo gera ainda uma concorrência desleal, na medida em que as empresas que o usam podem praticar preços mais vantajosos no mercado, justamente por gastarem menos no emprego da mão de obra, auferindo lucros maiores que seus concorrentes que agem dentro da legalidade. O mercado de trabalho também é afetado uma vez que mais trabalhadores aliciados para o trabalho escravo significam menor oferta de trabalho nos demais setores da economia, encarecendo artificialmente a mão-de-obra legalmente empregada, o que vai de encontro à eficiência na economia.

Para que se crie um mecanismo eficaz de desestímulo ao trabalho escravo, é preciso definir qual seria o ponto ótimo de esforços de dissuasão. Seria aquele em que se minimizasse o custo social marginal e maximizasse o benefício social marginal. Sabemos que manter uma fiscalização intensa exige o empenho de muitos recursos, sobretudo financeiros, o que acaba onerando o orçamento público. A estrutura (organizacional, financeira e administrativa) exigida para combater o trabalho escravo no Brasil requer criar e equipar grupos de fiscalização móvel, arcar com todos os custos de operação do MTE, do MPT, ações conjuntas com a Polícia Federal, entre outros. Tudo isso implica empenhar recursos que já são escassos e, na verdade, poderiam ser mais bem empregados em outras áreas mais carentes.

Dessa forma, a aplicação de uma punição exemplar, com multas extremamente elevadas, pode compensar a baixa probabilidade de punição que observamos atualmente. A expropriação das terras onde ocorre o uso de trabalho escravo é perfeitamente cabível como forma de fazer o agente criminoso pagar pelos danos infligidos aos trabalhadores. Mas isso não pode ser aludido apenas para atender a requisitos de eficiência, pois dentro dessa lógica, o Estado deveria exaurir sua capacidade de cobrar multas (mais barato) antes de aplicar penas de aprisionamento (mais caras para o Estado). No caso de crimes contra a liberdade, como é o caso de reduzir alguém à condição análoga à de escravo, a multa deve ser aplicada sem prejuízo das medidas penais cabíveis, em vista do tratamento degradante aos quais os trabalhadores estão submetidos.

Diante do exposto, pode-se dizer que a previsão constitucional de expropriação da terra em casos de trabalho escravo poderia gerar incentivos para melhorar a situação atual. As sanções aplicadas (penais, cíveis e administrativas) não representam ameaças suficientes frente às vantagens pecuniárias advindas da exploração dos trabalhadores, não sendo assim capazes de dissuadir o crime. Nesse sentido, a previsão constitucional de expropriação da terra para quem emprega mão de obra escrava reduziria o beneficio esperado da prática delituosa.

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A desigualdade de gênero no Brasil é maior do que a do Burundi? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=860&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=a-desigualdade-de-genero-no-brasil-e-maior-do-que-a-do-burundi Fri, 25 Nov 2011 14:29:50 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=860 O Brasil ficou em 82º lugar no Índice Global de Desigualdade de Gênero (Global Gender Gap Index – GGGI), de 2011, do Fórum Econômico Mundial. O índice varia de 0 (total desigualdade) a um (total igualdade). Liderando o ranking, com a menor desigualdade de gênero, está a Islândia com índice de 0,8530. O Brasil ficou com índice de 0,6679.

Na frente do Brasil ficaram, por exemplo, Lesoto em 9º lugar, com índice de 0,7666; África do Sul em 14º lugar (0,7478); Burundi em 24º lugar (0,7270); Moçambique em 26º lugar (0,7251) e Uganda em 29º lugar (0,7220). Estes países citados também ficaram na frente da França, que apareceu em 48º lugar, com índice de 0,7018 no GGGI 2011.

Mas será que esta posição brasileira no ranking global do GGGI reflete a real situação de gênero no país? Por exemplo, a desigualdade de gênero no Brasil (82º lugar) é realmente muito pior do que a situação existente no Burundi (24º lugar)?

Para qualquer pessoa minimamente informada, parece evidente que a situação da mulher não é pior no Brasil e na França em relação a países como Lesoto, Burandi e Uganda. O problema, na minha maneira de ver, reside no objetivo e na metodologia utilizada no Global Gender Gap Index (GGGI), bem como na forma de utilização dos dados dos diferentes países.

No relatório do Global Gender Gap Index está explicitado o seguinte: “O Índice é projetado para medir hiatos de gênero no acesso a recursos e oportunidades em cada país ao invés de níveis reais dos recursos disponíveis e oportunidades. Fazemos isso para tornar o Global Gender Gap Index independente dos níveis de desenvolvimento dos países” (p.3). Isto quer dizer que o índice está buscando medir a desigualdade (hiato) e não o nível de desenvolvimento ou a situação dos direitos econômicos, sociais e políticos da mulher.

Em outras palavras, não é objetivo do índice responder à pergunta “onde as mulheres têm melhor padrão de vida?” mas, sim, “onde o padrão de vida das mulheres é mais semelhante ao padrão de vida dos homens?”.

O problema do objetivo do índice é que um país com enorme exclusão social para os dois sexos e totalmente carente em termos econômicos, politicos e de qualidade de vida pode aparecer com bom indicador de gênero, enquanto  um país com maior inclusão social  e com direitos humanos básicos atendidos para toda a população pode aparecer em posição ruim no ranking se houver diferenças relativas entre os sexos.

Adicionalmente, mesmo nos limitando ao objetivo do índice, de captar a diferença entre gêneros, independentemente do grau de desenvolvimento do país, encontramos falhas metodológicas que distorcem a real discrepância entre homens e mulhers.

Vejamos o caso do Brasil e de Burundi.

De acordo com dados da Divisão de População da ONU, a esperança de vida ao nascer no Brasil, no quinquênio 2005-10, foi de 72,2 anos (75,9 anos para as mulheres e 68,7 para os homens). Os dados de Burundi, para o mesmo período, são 48,8 anos de esperança de vida ao nascer (50,1 anos para as mulheres e de 47,5 para os homens). Portanto, as condições de saúde da mulher, em relação aos homens, são muito melhores no Brasil do que em Burundi. Aqui, as mulheres têm expectativa de vida 7,2 anos maior que os homens, enquanto em Burundi a diferença é de apenas 2,6 anos a favor das mulheres.

Porém, o Global Gender Gap Index não leva em consideração as desigualdades reversas. Ou seja, quando as mulheres apresentam melhores indicadores do que os homens, o GGGI só considera a existência de uma igualdade, atribuindo índice 1, como se houvesse paridade de gênero e não vantagem pelo lado feminino (assim, tanto o Brasil quanto o Burundi ficariam com índice 1 no quesito diferença de expectativas de vida, ainda que a vantagem das mulheres no Brasil seja muito maior). Evidentemente esta maneira de abordar as desigualdades de gênero não é capaz de retratar a realidade das relações entre homens e mulheres e reduz o indicador dos países em que as mulheres avançaram com maior rapidez na obtenção de direitos e condições de vida.

O Brasil cai bastante nesta metodologia do GGGI, pois apesar de as mulheres brasileiras viverem sete anos a mais que os homens, mais do dobro da diferença observada em Burundi, o índice relativo à saúde brasileiro é de 0,9796 contra 0,9685 do Burundi (apenas 1% a mais). Adicione-se o fato de as brasileiras terem uma esperança de vida de 25,8 anos superior às mulheres do Burundi (50% a mais).

Há um problema semelhante no indicador de educação, que dá peso muito grande ao analfabetismo. Isso prejudica o Brasil porque, apesar de as mulheres estarem à frente dos homens em todos os níveis de educação, inclusive no nível de doutorado, quando se consideram as mulheres mais idosas, de coortes mais velhas, o percentual de mulheres analfabetas é maior do que o percentual de homens. Isso reflete as desigualdades educacionias de gênero do passado. Contudo, houve reversão do hiato de gênero na educação brasileira nas últimas décadas no Brasil. E este hiato está aumentando em favor das mulheres. Portanto, o GGGI deveria apresentar um indicador de gênero para a educação no Brasil acima de 1 (um), ou no mínimo 1 (um) e não de 0,9904, como faz.

Novamente, se nossa preocupação é com a qualidade de vida, é importante lembrar que, segundo dados da UNDP, a população adulta do Brasil tinha, em 2010, 7,2 anos médios de estudo, contra apenas 2,7 anos de estudo em Burundi (o Brasil com 167% a mais do que o Burundi). Porém, o GGGI, que não capta essas diferenças de nível, apresenta um índice relativo à educação para o Brasil apenas 16% mais alto que os 0,8565 atribuídos ao Burundi.

No quesito participação econômica e renda os problemas não são menores. Segundo dados da UNDP, a renda per capita de Burundi em 2010 foi de meros 430 dólares (medidos em poder de paridade de compra – ppp) e de 10.847 dólares no Brasil (também em ppp). Portanto, a renda per capita brasileira é 27 vezes maior do que a da população do Burundi. Contudo, o GGGI apresenta um índice de 0,7270 para Burundi e de 0,6679 para o Brasil porque, apesar das péssimas condições de renda no Burundi,  com ambos os sexos sofrendo baixo nível de renda e pequeno acesso aos bens e serviços necessários para uma boa qualidade de vida, a desigualdade de gênero é pequena. Já no Brasil, embora o padrão de renda e consumo das mulheres brasileiras seja muito superior ao das mulheres de Burundi, a maior desigualdade em relação aos homens brasileiros faz o Brasil ficar atrás do Burundi neste ítem. A maior igualdade de gênero no Burundi, neste caso, não tem qualquer correlação com obtenção de direitos das mulheres e de fortalecimento da autonomia feminina.

No quesito participação econômica os problemas do GGGI também são enormes, pois não consegue mensurar adequadamente sequer a discrepância de gênero que pretendia captar. O Burundi apresenta um índice de 0,8355 (a quarta melhor igualdade de gênero no mundo), e o Brasil apresenta um índice de 0,6490. Porém, as mulheres brasileiras entram mais tarde no mercado de trabalho porque ficam mais tempo na escola e possuem escolaridade superior à dos homens brasileiros e saem mais cedo porque aposentam, em média, cinco anos antes dos trabalhadores do sexo masculino.  Evidentemente, existe no Brasil, como também no Burundi, uma divisão de trabalho que atribui às mulheres as tarefas da reprodução social. No Brasil isto significa que uma parte das mulheres não consegue conciliar o trabalho no mercado com o trabalho doméstico e outra parte acumula uma dupla jornada de trabalho. Porém no Burundi, a dupla jornada de trabalho é um fenômeno mais corrente e agravado pela sobrecarga das altas taxas de fecundidade e da alta mortalidade infantil.

Além disto, a situação da previdência social é completamente diferente nos dois países. No Brasil as mulheres são maioria dos beneficiários da previdência social, embora não sejam maioria da população economicamente ativa. Portanto, o sistema de proteção social das mulheres, no Brasil, mesmo com todos os defeitos, é muito melhor do que em Burundi. O fato do Global Gender Gap Index não levar em consideração a cobertura previdenciária é um problema metodológico sério e que distorce a análise da desigualdade de gênero entre os países.

No quesito participação política o GGGI apresenta um índice de 0,2442 para o Burundi e de apenas 0,0526 para o Brasil. De fato, a participação das mulheres na Câmera dos Deputados é de 9% no Brasil e de 32% no Burundi. Isto explica o baixo índice brasileiro e mostra o atraso que o Brasil possui no quesito de participação parlamentar. Porém, nas últimas eleições o Brasil elegeu uma mulher para a Presidência da República, enquanto o Burundi tem um homem no posto máximo do Executivo. Portanto, se o Brasil está em pior situação de gênero na participação no Poder Legislativo, o mesmo não acontece no Poder Executivo (que também contam com várias ministras). O GGGI dá um peso importante para o número de Chefes de Estado nos últimos 50 anos, porém isso não é suficiente para captar movimentos recentes de igualdade de gênero na política. Assim, apesar da presença de uma Presidenta mulher no Executivo brasileiro, o índicador de participação política do Brasil fica em situação muito inferior ao indicador do Burundi.

Os exemplos acima mostram que, em geral, as mulheres brasileiras possuem muito mais direitos de cidadania do que as mulheres (e também os homens) do Burundi. Ou seja, as brasileiras vivem melhor que as mulheres do Burundi. Contudo, tendo em vista o objetivo do índice, a falta de direitos de uma renda decente e de um nível mínimo de matricula educacional no Burundi, não foi obstáculo para que o país apresentasse indicadores de gênero de melhor nível. Portanto, quando o GGGI diz que o Burundi está bem posicionado, em 24º lugar no ranking de desigualdade de gênero, pode parecer que a situação de suas mulheres é de maior autonomia. Mas os dados mostram que tanto homens quanto mulheres no Burundi carecem dos direitos humanos elementares.

Já no Brasil, pode parecer que a posição 82º do ranking do GGGI signifique que as mulheres brasileiras possuem menor autonomia. Contudo, o sexo feminino no Brasil tem superado os homens na saúde, na educação e no acesso à previdência. Tem avançado no mercado de trabalho e já são maioria da população economicamente ativa com mais de 11 anos de estudo.

Mesmo que ainda falte muito para se avançar na construção de uma sociedade com maior equidade de gênero, a situação das mulheres brasileiras é muito melhor do que a situação das mulheres do Burundi, mas isto não está refletido nos indicadores do Global Gender Gap Index. Países como a Islândia (primeira colocada no GGGI, 2011), que possuem baixa desigualdade de gênero em uma situação social de respeito aos direitos humanos e ao processo de inclusão social para ambos os sexos, podem ter indicador próximo do de Burundi, onde a menor desigualdade de gênero ocorre em uma situação de total exclusão social e de ausência dos direitos humanos básicos e universais. São dois contextos completamente diferentes. Mas o Índice Global de Desigualdade de Gênero, do Fórum Econômico Mundial, apresenta com se fosse possível separar a desigualdade de gênero das condições gerais da cidadania social.

Desta forma, deve-se ter cuidado ao utilizar este índice de desigualdade de gênero do Fórum Econômico Social como indicador da situação das mulheres, pois o que a metodologia do GGGI apresenta em seu indicador sintético é uma comparação entre alhos e bugalhos.

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