Comportamento Judicial – Brasil, economia e governo https://www.brasil-economia-governo.com.br Mon, 30 Oct 2017 14:25:47 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.2 Jurimetria: como decidem os juízes que vão julgar Lula? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=3068&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=jurimetria-como-decidem-os-juizes-que-vao-julgar-lula https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=3068#comments Mon, 30 Oct 2017 14:24:46 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=3068 1. Introdução

A ciência política americana desenvolveu nas últimas décadas úteis ferramentas para analisar o histórico de votações no Legislativo, permitindo traçar um “mapa” dos votantes, resumindo a informação de dezenas ou centenas de votações em um único gráfico.

Nestes chamados modelos espaciais, estimam-se pontos ideais que são designados para cada parlamentar e permitem reproduzir as divergências ocorridas no passado. Um óbvio resultado nos parlamentos de outros países é a visualização de como parlamentares se dividem no espectro esquerda-direita, por exemplo.

É possível pegar emprestada esta metodologia e analisar colegiados também no Judiciário, tentando mapear a divergência entre juízes. Neste artigo fazemos este exercício para os desembargadores da 8ª Turma do TRF4.

Exemplo: mensalão

Como exemplo, apresentemos antes o resultado desta metodologia para o Supremo Tribunal Federal no julgamento da Ação Penal no 470 (mensalão) – discutida anteriormente aqui no blog.

A Figura acima apresenta a dispersão entre os Ministros de acordo com as dezenas de divergências votações ocorridas naquele julgamento. Nesta metodologia, cada votante recebe um ponto no espaço (um círculo unitário variando de -1 a 1 nos eixos horizontal e vertical). .

Entre as infinitas possibilidades de alocar estes pontos no espaço, apresenta-se aquela que melhor reproduz as divergências na amostra de votação – produto de um estimador de máxima verossimilhança.

Assim, quanto mais os votos do ministro A tiver coincidido com os votos do ministro B, mais próximos eles estarão no espaço. Igualmente, quanto mais divergências um votante possui com outro, mais distante eles estarão.

O interesse é na dispersão entre os pontos, e não nos valores absolutos das coordenadas, que não tem qualquer significado relevante a priori.

Uma vantagem evidente de usar este tipo de metodologia para criar uma síntese das decisões é que os pontos são estimados automaticamente a partir dos dados, sem necessidade de conhecer previamente os processos para buscar a origem das divergências ou analisar conteúdo de votos por exemplo.

Os pontos dos Ministros, que na Figura receberam cores diferentes de acordo com o Presidente que os indicou, podem ser interpretados de maneira intuitiva neste exemplo.

Como também levou-se em conta a opinião do Procurador-Geral da  República, fica claro que os ministros mais distantes do PGR foram os que tiveram votos mais pró-réu. Os pontos estimados refletem posicionamentos que foram muito difundidos pela imprensa, com o Ministro Joaquim Barbosa mais próximo do PGR no eixo horizontal, e os Ministros Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli mais distantes.

Em uma segunda dimensão, capturada pelo eixo vertical, é possível visualizar o tradicional isolamento do Ministro Marco Aurélio, frequentemente voto vencido sozinho.

Note que o resultado do modelo é a distância entre os pontos, não importando se estão na esquerda, na direita, em cima ou embaixo no Gráfico. Também não é necessário fazer qualquer suposição ex-ante sobre o significado das distâncias. A interpretação é feita posteriormente, e aqui foi mais intuitiva porque se sabe o papel do PGR neste tipo de caso (de acusador).

Uma explicação mais detalhada do método, bem como mais resultados para o Supremo, podem ser encontradas em Nery e Mueller (2014)1 e Nery (2013)2, em que mais de 700 ações diretas de inconstitucionalidade em um período de mais de 10 anos foram analisadas. No blog, a metodologia também já foi aplicada ao Copom na era Tombini.

2. A 8ª Turma

Aplicamos esta mesma metodologia à 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). Identificamos 95 votações no ano de 2017, até meados de agosto, em casos da Operação Lava-Jato.

Uma versão anterior desta pesquisa foi publicada no site JOTA, mas a amostra não era exclusiva da Operação Lava Jato, contemplando casos de tráfico de drogas, contrabando e descaminho – e, logo, casos que vieram de outras varas que não a 13ª (a do juiz federal Moro)3.

A opção neste artigo de analisar somente casos da Lava Jato e do ano de 2017 fornece informações de maior qualidade para entender o caso do ex-Presidente Lula no tribunal. Ainda, permite que se estimem pontos ideais para o juiz Sérgio Moro, bem como uma posição para o conjunto de recorrentes (embargantes, apelantes, impetrantes, pacientes, etc). Anteriormente, no artigo veiculado no JOTA, apenas os desembargadores e o MPF tinham pontos ideais estimados.

Uma vantagem adicional de ter esses pontos estimados é ampliar a amostra: o NOMINATE trabalha apenas com divergências, e não com consensos. Incluir a posição de Moro e dos recorrentes garante que a quase totalidade da amostra será utilizada, uma vez que o próprio recurso ao TRF4 já implica por si ao menos uma divergência (do recorrente ou do MPF).

O ponto estimado para Ministério Público Federal contribui para balizar a interpretação do resultado. Importante observar que na 2ª instância a divergência com o MP tem interpretação menos óbvia do que em uma ação originária como o mensalão. Se na AP 470 o maior grau de divergência com o parquet insinuava uma visão pró-réu, neste caso ela seria menos intuitiva, pois pode sugerir meramente a concordância do desembargador com os termos de uma condenação ocorrida em primeira instância.

Assim, um desembargador A pode discordar do MPF para absolver um réu, assim como pode discordar do MPF apenas porque não concorda com seu pleito por aumento de pena, mas mantém a condenação de 1ª instância. Como o modelo espacial é bidimensional, e não unidimensional, estas diferenças podem ser captadas.

Em relação ao ponto do juiz Moro, cabe ressaltar que Moro não se pronuncia nesta etapa do processo. O seu ponto decorre das suas decisões em 1ª instância. Apenas em uma parte pequena da amostra não foi possível designar um posicionamento para ele, como em questões de ordem.

A Figura 2 apresenta os resultados.

A estimativa dos pontos apresentados acima, feitas com o pacote W-NOMINATE na linguagem R, reproduz corretamente 98% dos “votos” da amostra da forma com que ocorrem nas “votações”, ou 495 de 507 posicionamentos.

Em uma primeira dimensão, capturada pelo eixo horizontal, há em um extremo o Ministério Público Federal, e em outro extremo, o conjunto de recorrentes.  Note que há relativa coesão dos desembargadores, que se alinham mais com a acusação do que a com a defesa, sendo Laus o mais próximo dos recorrentes.

Em uma segunda dimensão, capturada pelo eixo vertical, o espectro acusação-defesa dá lugar a outro, menos claro. Há uma razoável distância entre MPF e Moro, com a maioria dos desembargadores se aproximando mais daquele do que deste. Há também nesta segunda dimensão uma dispersão maior das coordenadas dos desembargadores.

Em especial, há um distanciamento de Gebran, que aparece como o desembargador mais distante de Moro, mas que também possui uma distância relevante do MPF. Este posicionamento que a princípio não é óbvio será analisado mais adiante.

Outro fato de interesse nesta segunda dimensão em que as coordenadas dos desembargadores possuem maior variância é Paulsen, que aparece como o votante mediano. Na literatura, há grande interesse pelo votante mediano, já que é ele que compõe a maioria com maior frequência e é vencedor na maior parte das vezes. Este seria, portanto, o votante “decisivo”.

As coordenadas são apresentadas na Tabela 1, a seguir.

Por fim, não foram estimados pontos para os juízes convocados que eventualmente substituíram os desembargadores da Turma em caso de ausência (ex: férias). São eles os juízes Nivaldo Brunoni e Danilo Pereira Júnior: eles não participaram de votações em quantidade suficiente na amostra para que o modelo conseguisse estimar pontos.

A participação desses juízes convocados é contemplada na Tabela 2, abaixo, que descreve as 95 votações que compõem a amostra e foram sintetizadas no Gráfico anterior. Nela, cada linha representa uma votação, e designamos a cor cinza para posicionamentos ausentes, verde para o posicionamento de Moro e vermelho para posicionamentos diferentes do de Moro.

3. Divergências: entendendo o mapa

Inspecionar a amostra ajuda a entender de maneira mais intuitiva a metodologia aqui usada e a consolidar as informações do mapa. Como os pontos estimados decorrem diretamente das diferenças de posicionamentos, é útil discriminar exemplos específicos em que ocorreram divisões reproduzíveis no mapa.

Este exercício didático é feito nesta seção. Ressalta-se que 98% dos “votos” da amostra tal qual ocorreram nas votações podem ser reproduzidos no Gráfico. Isto é, é possível reproduzir nele quase todas as divergências ocorridas nas 95 decisões da amostra.

Exemplo: apenas os recorrentes isolados

Começemos olhando os pontos que o estimador isolou, como o dos recorrentes, à direita. Trata-se de votações em que os desembargadores foram unânimes em negar pleito dos recorrentes, no mesmo sentido da decisão de Moro e da opinião do MPF, como na Figura 3.

São exemplos das várias decisões com essa configuração, que repercutiram na estimativa, a da APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5039475-50.2015.4.04.7000/PR, de 2 de agosto, em que foram negados os apelos de João Augusto Henriques, supostamente um lobista do PMDB, e Eduardo Musa, ex-gerente da Petrobras.

O mesmo ocorreu com o habeas corpus impetrado por José Roberto Batochio para o ex-ministro Antonio Palocci e outros, denegado em 19 de abril.

Exemplo: apenas o MPF isolado

Em outro extremo, está isolado o Ministério Público Federal. Isso decorre da existência na amostra de um bom número de decisões unânimes do Tribunal, contrariando o pleito do MPF, referendando uma decisão de Moro. A Figura 4 apresenta esta divisão.

Sem razão o parquet” quanto a acusação de organização criminosa feita ao ex-deputado André Vargas, seu irmão Leon Ilário e o publictário Ricardo Hoffmann em uma das decisões na APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5023121-47.2015.4.04.7000/PR, julgada em 4 de junho.

Exemplo: apenas Laus e os recorrentes isolados

Continuando nesta dimensão, passamos agora a olhar divisões dentro do colegiado. Percebemos que Laus é o desembargador mais próximo dos recorrentes. Como a distância dos pontos estimados é tão menor quanto maior tiver sido os posicionamentos em comum na amostra, os pontos estimados sugerem que ele, dentro da Turma, é o com maior inclinação pró-réu.

Estamos falando, portanto, da ocorrência de decisões que Laus foi voto vencido e esteve contrário ao posicionamento do MPF e a decisão de 1ª instância (Moro), se manifestando a favor dos recorrentes – como na Figura 5.

 

É o caso da APELAÇÃO Nº 5012331-04.2015.4.04.7000/PR, decidida em 27 de junho quando Laus votou por conceder habeas corpus de ofício ao ex-diretor da Petrobras Renato Duque. A Turma também negou provimento a outros apelos nesta ação, tendo Laus como voto vencido, relativos a Renato Duque, ao empresário Adir Assad e à sua sócia Sônia Mariza.

Laus também tem um posicionamento divergente em relação a medidas assecuratórias, tendo sido vencido, por exemplo, também na  APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5033700-54.2015.4.04.7000/PR.

Exemplo: Meio a meio (MPF, Moro e Gebran de um lado, Paulsen, Laus e os recorrentes de outro)

Agora chegamos a outra divisão, em que não há “isolados”: os representados no Gráfico são divididos igualmente, ao longo do eixo horizontal.

Esta divisão reproduz a divisão que ocorre quando há divisão no colegiado mas agora em vez de Laus ser vencido, é vencedor. O vencido é Gebran, com voto no sentido da opinião do MPF e da decisão da 1ª instância, e os demais desembargadores se alinham com os recorrentes.

Foi assim em um caso que teve grande repercussão na opinião pública: a decisão de 27 de junho na APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5012331-04.2015.4.04.7000/PR. A turma decidiu “POR MAIORIA, VENCIDO O RELATOR, DAR PROVIMENTO AO APELO DE JOÃO VACCARI NETO, PARA ABSOLVÊ-LO DAS IMPUTAÇÕES APRESENTADAS NA INICIAL.”

Exemplo: apenas Moro e os recorrentes isolados

Em uma segunda dimensão, visualizada na vertical, estão mais acima Moro e os recorrentes. A estimativa destes pontos com essas coordenadas decorre do peso na amostra das votações em que o colegiado foi unânime, acompanhando o posicionamento do Ministério Público Federal, contrário à decisão de Moro na 1ª instância e em desfavor dos recorrentes.

Note que aqui está uma das constatações mais interesses sintetizada no mapa: a de que o colegiado tende a estar ainda mais distante dos recorrentes do que o próprio juízo da 13ª Vara.

Estes casos podem ser visualizados na Figura 7. Um deles foi a decisão em de 5 de abril relativa a Waldomiro de Oliveira, “laranja” do doleiro Alberto Youssef, quando a decisão foi de “por unanimidade, dar provimento à apelação do Ministério Público Federal para afastar o reconhecimento da litispendência em relação ao réu WALDOMIRO e condená-lo pela prática do delito de lavagem de dinheiro”.

Adicionalmente, cumpre observar que não é de interesse analisar os casos em que apenas Moro está “isolado”. Uma decisão assim, por construção, não poderia existir porque MPF e os recorrentes estariam juntos com o mesmo posicionamento contra uma decisão de 1ª instância.

Por que então Moro aparece mais isolado acima no Gráfico, se não existe na amostra casos em que seu posicionamento é diverso de todos os demais ao mesmo tempo? A resposta pode ser visualizada na Tabela 1 e se relaciona com algo que já foi abordado: a ausência de posicionamento de Moro em algumas decisões da Turma, quando não tratam diretamente de suas decisões – como exceção de suspeição relativa ao MPF ou embargos de declaração de decisões da 8ª Turma.

Exemplo: Meio a meio (Moro, os recorrentes e Laus de um lado, Paulsen, MPF  e Gebran de outro)

Agora baixamos a barra um pouco pra incluir Laus: isto é, usar como exemplo um caso em que Laus foi voto vencido no colegiado, estando ao lado dos recorrentes, mas dessa vez, ao contrário do exemplo da Figura 5, no sentido de manter a decisão de 1ª instância de Moro.

Este exemplo ilustra casos na amostra que pesaram para que no Gráfico seja Laus o menos distante de Moro e dos recorrentes.

A Figura 7 apresenta esta divisão que tem, de outro lado, Paulsen e Gebran vencedores, acompanhando posicionamento do MPF.

Esta divisão foi observada em uma das divergências da APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5083351-89.2014.4.04.7000/PR, em 21 de junho, quando Laus reconheceu como autônomos apenas dois delitos (o MPF insurgiu-se contra decisão de Moro que reconhecia continuidade delitiva entre crimes de corrupção ativa e crimes de lavagem de capitais, pleito reconhecido por Gebran e Paulsen).

Exemplo: Gebran e os recorrentes isolados

Uma última divisão de interesse é aquela em que Gebran é vencido, ao lado dos recorrentes. Esta divisão pode ser reproduzida no Gráfico e adiciona complexidade à nossa discussão: agora temos uma reta mais inclinada, isto é, uma divisão que no Gráfico não se dá exatamente na horizontal (esquerda-direita) ou na vertical (cima-baixo)

A Figura 9 revela então que não é possível contemplar todas as divergências da amostra como se dando ao longo de apenas duas dimensões (mais ou menos pró-réu na horizontal; mais ou menos pró-Moro na vertical) – ainda que a maioria possa, o que é um grande vantagem desse tipo de ferramenta.

Um exemplo de divisão reproduzível no Gráfico, como na Figura acima, é o da APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5023121-47.2015.4.04.7000/PR, em que Gebran foi veto vencido para absolver Leon Ilário do crime de corrupção passiva.

Assim, embora seja útil e prático analisar os pontos estimados pela ótica de espectros (dimensões), as divergências em um colegiado como este podem ser mais ricas do que um espaço bidimensional pode captar.

Entretanto, os pontos estimados continuam fornecendo insights por meio das distâncias. A apelação referida exemplifica por exemplo por que Gebran é o mais distante de Moro.

Note , como já colocado, que Paulsen é o juiz mediano, entre Gebran e Laus nas duas dimensões. Isso sugere que ele compõe a maioria com maior frequência. Na literatura, o votante mediano é de grande interesse, até seu potencial de ser o votante decisivo, o que desempata.

4. Pesquisa futura

O modelo espacial utilizado foi concebido para analisar legislaturas e, portanto, grupos de votantes significativamente maiores. A aplicação com poucos votantes sofre do chamado incidental parameters problem4. Pesquisa futura pode estimar os pontos com o IDEAL, um método bayesiano e não-paramétrico que usa um algoritmo Monte Carlo via cadeias de Markov5, mais adequado às capacidades computacionais existentes hoje. Carroll et al. (2009) compararam o NOMINATE e o IDEAL para votos da Suprema Corte americana, concluindo que6:

as estimativas de pontos ideais são altamente voláteis para ambos os métodos quando o número de votantes é pequeno. Nossas simulações revelam não haver clara vantagem de um método sobre o outro de produzir estimativas para legislaturas de qualquer tamanho ou número de votações feitas. Ainda mais, nenhum dos estimadores é mais robusto do que o outro em obter estimativas do processo gerador de dados adotado pelos outros métodos.

5. Conclusão: “A República de Porto Alegre”

A aplicação de modelos espaciais parece promissora no Judiciário brasileiro. Usando uma amostra de 95 votações da 8ª turma do TRF4 no ano de 2017 – até meados de agosto – no âmbito da Operação Lava Jato, estimamos pontos ideais que reproduzem corretamente 98% dos posicionamentos ocorridos nas votações. Eles sintetizam que:

  • O colegiado é relativamente coeso, sem grande dispersão entre os seus membros;
  • O colegiado como um todo é mais próximo do MPF do que dos recorrentes;
  • O colegiado como um todo é ainda mais próximo do MPF do que de Moro – o que, combinado com o item anterior – sugere uma 2ª instância com decisões ainda mais duras do que a 1ª;
  • O desembargador mais próximo dos recorrentes é Laus7;
  • O desembargador mais distante de Moro é Gebran, às vezes a favor da apelação do MPF, às vezes dos recorrentes; e
  • O desembargador mediano é Paulsen, que tende a ser o voto decisivo do Tribunal.

Portanto, sem conhecimento acerca de detalhes dos processos, a absolvição de recorrentes condenados em 1ª instância, como o ex-Presidente Lula, parece improvável.

O veloz avanço recente de métodos estatísticos para captura e análise de informações, bem como a maior disponibilidade de informações dos tribunais, podem permitir o avanço de análises como a deste artigo no país e melhor compreensão da academia, da sociedade e dos operadores do Direito sobre os tribunais brasileiros.

________________

1 http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1517758014000253.

2 http://repositorio.unb.br/bitstream/10482/13565/1/2013_PedroFernandoAlmeidaNeryFerreira.pdf.

3 https://jota.info/artigos/o-mapa-da-8a-Turma-do-trf-4-29072017.

4 Ver Poole (2005) e Peress (2009).

5 Ver Martin e Quinn (2002, 2009)

6 https://scholar-qa.princeton.edu/sites/default/files/jameslo/files/lsq_nomvsideal.pdf

7 O que é consistente com evidências anedóticas. “Breda brilhou os olhos quando o desembargador Victor dos Santos Laus, 54 anos, abriu o microfone para seu voto final.” http://piaui.folha.uol.com.br/eles-vao-julgar-lula/

 

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Como decide um Ministro do STF? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2515&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=como-decide-um-ministro-do-stf https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2515#comments Mon, 18 May 2015 12:33:19 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=2515 1. Introdução

O que influencia a decisão de um juiz em julgamento? Várias teorias buscam responder a questão e definir os determinantes do comportamento judicial. Nos Estados Unidos, uma farta literatura empírica – de autoria de juristas, cientistas políticos e economistas – analisa a tomada decisão dos juízes da Suprema Corte do país. As decisões são determinadas pelo texto da lei? Ou os juízes são orientados pela ideologia ao julgar? Que objetivos eles perseguem, e como perseguem esses objetivos? Essas são todas questões fundamentais da literatura de comportamento judicial.

Três teorias de comportamento judicial se destacam: o jurídico, o atitudinal e o estratégico. A primeira se relaciona com uma abordagem normativa e argumenta que o comportamento judicial está restringido pela lei e pelo direito. Essa restrição não existe para os “atitudinalistas”, que sustentam que os juízes votam de acordo com as suas preferências pessoais em um caso, inclusive ideológicas. Por seu turno, na teoria estratégica, um juiz vai adotar estratégias para chegar aos seus objetivos, dado que podem existir várias restrições ao seu comportamento. Por essa visão, que é um desdobramento da teoria de escolha racional (rational choice theory), um juiz consideraria a reação de todos os agentes, dentro ou fora da Corte (ex: Poder Executivo), e adotaria uma conduta estratégica para atingir seus objetivos.

A  proxy de ideologia mais usada nos estudos atitudinais é o partido político do Presidente que indicou o juiz. Os autores que usam essa proxy partem do pressuposto de que um Presidente indica um juiz por afinidade ideológica e, por isso, o partido do Presidente se relaciona com a própria ideologia do indicado.  Exemplo eminente da força da teoria atitudinal é o julgamento recente mais notório da Suprema Corte americana: Bush v Gore. No controverso desdobramento do impasse na recontagem dos votos do estado da Flórida nas eleições presidenciais de 2000, a decisão da corte foi tomada por cinco votos a quatro: os cinco votos vencedores eram de indicados por Presidentes republicanos, e os dois únicos indicados por democratas no tribunal ficaram do lado vencido.

2. Literatura para o STF

Jaloretto e Mueller (2011) testam empiricamente a hipótese de as indicações presidenciais influenciarem as decisões do Supremo Tribunal Federal do Brasil, concluindo que não há evidência empírica de que as decisões do STF sejam influenciadas pelo método de escolha de seus ministros.  Leoni e Ramos (2006) aplicam uma técnica de estimação bayesiana (ideal point estimation) e também concluem que o Supremo é independente, apesar de uma tendência de apoiar cada vez mais o Executivo nos últimos anos estudados. Para eles, os ministros não são representantes dos presidentes que os indicaram. Oliveira (2008) usa uma regressão logística para chegar a um resultado consoante com o de Jaloretto e Mueller. O trabalho não encontra muita evidência para o papel de fatores políticos, e, ao observar um alto de grau de consenso nas votações, atribui um papel fundamental nas decisões para o “profissionalismo”. A autora avalia que este resultado dá “credibilidade e legitimidade” ao Supremo Tribunal Federal.

 3. Um modelo espacial para os votos do STF

De maneira a testar empiricamente a hipótese de que o voto de um ministro se correlaciona com o Presidente que o indicou, é oportuna a utilização de um modelo espacial de votação (NOMINATE). Este é um método de escala multidimensional (multidimensional scaling) para projetar preferências em um espaço. Cada objeto recebe uma localização (coordenada) nesse espaço, de acordo com a similaridade que os objetos possuírem, ficando os menos semelhantes entre si mais distantes nesse espaço. Na aplicação aqui proposta, os objetos são os ministros, as similaridades são observadas através de seus votos e as localizações indicariam possíveis  posicionamentos ideológicos.

Através do padrão que emerge de uma quantidade de votações, o modelo concede coordenadas em um espaço para os votantes. Essas coordenadas dependem da maneira que os votos se correlacionam. Votantes que agem de forma parecida recebem coordenadas de maneira a ficarem espacialmente próximos. Da mesma forma, votantes que agem de forma diversa recebem coordenadas de maneira a ficarem espacialmente distantes.

Dentre as infinitas possibilidades de coordenadas para os votantes em N dimensões, o modelo escolherá, por um estimador de máxima verossimilhança, os posicionamentos mais prováveis, de acordo com os dados.

Foram estimados pontos ideais para os ministros usando os dados dos votos que eles deram nos julgamentos das 756 ações diretas de Inconstitucionalidade entre 2002 e 2012, abrangendo o final do governo FHC, os dois mandatos de Lula e o início do governo Dilma. Como a formação do tribunal não foi uniforme entre junho de 2002 e março de 2012, os pontos foram estimados para diferentes períodos, respeitando as nove composições diferentes que o Supremo teve.

Também foram estimados pontos ideais para o Advogado-Geral da União (AGU) e para o Procurador-Geral da República (PGR). Ambos devem se posicionar em todas as ações diretas de inconstitucionalidade, e a comparação dos seus pontos estimados com os dos ministros enriquece a análise das teorias de comportamento judicial.

Apesar de o artigo 131 da Constituição atribuir ao AGU a função de representar e assessorar a União, a mesma Constituição lhe reserva, no artigo 103, outro papel nas ADI: o de advogado de defesa. Assim, ele é, em tese, obrigado a se manifestar em todos os processos defendendo a norma que é alvo da ação. No entanto,  desde a ADI 1616, julgada em 2001, o AGU ficou desobrigado a defender normas em processos em que a jurisprudência do STF aponte para a inconstitucionalidade. Essa possibilidade tornou a atuação do Advogado-Geral da União mais interessante, porque ele passou a ter maior discricionariedade.

Já o PGR deve apresentar um parecer, que pode ser tanto favorável quanto contrário à ação, atuando como custos legis, o fiscal da lei.  Tal qual acontece com a manifestação do AGU, o parecer do PGR não vincula o voto dos ministros: eles podem seguir ou não seguir esse parecer.

Assim, é possível discutir a validade das principais teorias de comportamento judicial (atitudinal, estratégica e jurídica) com os gráficos estimados, apresentados a seguir. Na apresentação dos pontos ideais, os ministros estão classificados em subgrupos, de acordo com o Presidente que os indicou, conforme legenda no canto direito superior.

Os eixos dos gráficos não representam necessariamente uma divisão esquerda-direita ou liberal-conservador. Como os pontos são estimados de acordo com o padrão de votos dos ministros, a interpretação dos eixos depende de uma análise “subjetiva” das divisões ocorridas nas votações.

Figura 1 – 1º período: 20/06/2002 a 24/06/2003.

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Figura 2 – 2º período: 25/06/2003 a 29/06/2004.

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Figura 3 – 3º período 30/06/2004 a 15/03/2006.

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Figura 4 – 4º e 5º períodos: 16/03/2006 a 20/06/2006, 21/06/2006 a 04/09/2007.

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Figura 5 – 6º período: 05/09/2007 a 22/10/2009.

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Figura 6 – 7º, 8º e 9º períodos: 23/10/2009 a 02/03/2011, 03/03/2011 a 18/12/2011, 19/12/2011 a 08/03/2012.

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Pelo modelo atitudinal, na forma que a proxy de ideologia leva em conta o Presidente responsável pela indicação, era de se esperar que os pontos nos gráficos estivessem dispersos de acordo com as cores (já que a cor de cada ministro foi colocada de acordo com o Presidente que o indicou). Não é isso que acontece: pontos vermelhos (indicações de Lula) estão dispersos pelos gráficos, e pontos de outras cores (indicações de outros Presidentes) também não se dividem dessa forma.

Também em relação ao modelo estratégico é possível fazer algumas considerações a partir dos gráficos. A ideia então de que o Supremo não seria completamente independente por temer contrariar o Executivo perde força quando se compara a posição dos ministros com a do AGU, que representaria o governo federal.

Por fim, como salienta a literatura de comportamento judicial, é muito difícil provar objetivamente que um voto é estratégico ou que é sincero (como no modelo jurídico). É a presença do PGR nos gráficos estimados que permite discutir a validade do modelo jurídico. Se, por hipótese, ele de fato segue o seu papel constitucional de custos legis (“fiscal da lei”) e produz pareceres independentes com objetivos estritamente jurídicos, não perseguindo estratégias, a análise da sua localização em relação aos ministros indicaria a validade do modelo para o STF.

Não é possível concluir, portanto, que algum dos três modelos analisados é mais pertinente do que outro para explicar o comportamento judicial no STF. A aplicação do modelo de votação espacial vai ao encontro de outros trabalhos empíricos para o STF: de que o voto de um ministro pouco se correlacionaria com a ideologia do Presidente que o indicou, contrariamente ao que parte da opinião pública pensa sobre a questão. Uma explicação plausível para isso é que, a partir de sua nomeação, o ministro não depende mais do que Presidente que o indicou: não há qualquer mecanismo de recondução, devido à vitaliciedade do cargo.

4. Considerações finais: breve análise do mensalão

A possibilidade deste “comportamento determinístico” do Ministro de acordo com o Presidente que o indicou, conforme o caso Bush v Gore, encontrou respaldo na atuação de parte dos ministros na Ação Penal 470 (mensalão), conforme a Figura seguinte.

Figura 7 – Pontos ideais estimados – Mensalão

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Sem a pretensão de analisar exaustivamente esse julgamento, as coordenadas na dimensão horizontal (esquerda-direita) se relacionam com uma maior ou menor incidência de votos pró-réu, conforme comparação com o ponto estimado do PGR (que em uma ação penal tem o papel de acusador – neste tipo de processo não há participação do AGU).

Embora ministros indicados por Lula estejam dispersos pelo gráfico, na verdade, a divisão esquerda-direita do gráfico parece opor ministros mais novos na corte (indicados depois da divulgação do escândalo) de ministros mais antigos, à exceção de Fux. Essa divisão, por exemplo, seria consoante com o modelo atitudinal, conforme a percepção da opinião pública, dando ensejo à alteração no processo de escolha dos ministros.

 

Este texto é baseado no paper  “How Judges Think in the Brazilian Supreme Court: Estimating ideal points and identifying dimensionse na dissertaçãoComo Decidem os Ministros do STF: Pontos Ideais e Dimensões de Preferências”.

 

Leituras recomendadas:

Teorias de comportamento judicial:

EPSTEIN, L.; KNIGHT, J., The Choices Justices Make. Washington: CQ Press, 1998. 186 p.

EPSTEIN, L.; KNIGHT, J.; MARTIN, A. The Supreme Court as a Strategic National Policymaker. Emory Law Journal, v. 50, p. 583-612, 2001.

POSNER, R How judges think. Cambrige: Harvard University Press, 2008. 400 p.
SEGAL, J.; SPAETH, H. The Supreme Court and the Attitudinal Model. New York: Cambridge University Press, 1992.

 

Modelo espacial de votação (NOMINATE):

EVERSON, P.; VALLELY, R.; WISEMAN, J. NOMINATE and American Political History: A Primer. VoteView Working Paper, 2009.

POOLE, K.; ROSENTHAL, H. A Spatial Model for Legislative Roll Call Analysis. GSIA Working Paper #5-83-84, 1983.

 

Literatura empírica para o STF:

JALORETTO, M.; MUELLER, B. O Procedimento de Escolha dos Ministros do Supremo Tribunal Federal – Uma Análise Empírica. Economic Analysis of Law Review, v. 2, p. 170-187, 2011.

LANNES, O.; DESPOSATO, S.; INGRAM, M. Judicial Behavior in Civil Law Systems: Changing Patterns on the Brazilian Supremo Tribunal Federal. In: CICLO 2012 DO PROGRAMA DE SEMINÁRIOS CIEF-CERME-LAPCIPP-MESP, 2, Brasília, 14. nov 2012.

LEONI, E.; RAMOS, A. Judicial Preferences and Judicial Independence in New Democracies: the Case of the Brazilian Supreme Court. Disponível em: http://eduardoleoni.com/workingpapers/>. Acesso em: 14 out. 2012.

RIBEIRO, R. Política e Economia na Jurisdição Constitucional Abstrata (1999-2004). Revista Direito GV, v. 8, p. 87-108, 2012.

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