ANAC – Brasil, economia e governo https://www.brasil-economia-governo.com.br Wed, 08 Nov 2017 13:33:56 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.8.1 Aperte os cintos: a passagem aérea subiu https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=3091&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=aperte-os-cintos-a-passagem-aerea-subiu https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=3091#comments Wed, 08 Nov 2017 13:33:56 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=3091 Desde junho deste ano, as empresas de aviação estão cobrando pela primeira bagagem despachada nos voos nacionais, conforme autorização concedida pela Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC). Além disso, as passagens sem direito a bagagem despachada não dão direito a qualquer reembolso, em caso de não utilização. Assim, quem opta por não pagar a bagagem, abre mão de eventual restituição.

Considerando o modelo de cobrança da tarifa de despacho adotado pelas empresas aéreas e a extinção do reembolso, tudo indica que a medida resulta em aumento da receita média por passageiros e não, como alega a ANAC, a extinção do subsídio cruzado que existiria dos passageiros que não despacham bagagem em benefício dos que despacham.

Segundo a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (ABEAR), a média mensal de passageiros pagantes em 2017 está em 7,4 milhões, até setembro, e dois terços desses passageiros estão adquirindo bilhetes sem direito a bagagem despachada, após a vigência da cobrança. As empresas estão cobrando um valor fixo de R$ 30 por bagagem. A receita anual decorrente desta cobrança será, portanto, de aproximadamente R$ 900 milhões, valor pouco maior que o prejuízo operacional de R$ 700 milhões absorvido pelas companhias nacionais em 2016.

As empresas argumentam que a cobrança não significa um aumento de preços médios, mas apenas a eliminação do subsídio cruzado, em que os passageiros que não despachavam bagagem arcavam com parte dos custos dos que utilizavam o serviço. A ABEAR assim se pronunciou oficialmente: “Defendemos justiça tarifária. (…) A bagagem nunca foi gratuita – sempre esteve diluída no preço dos bilhetes. Não concordamos que esses custos tenham que ser divididos entre todos os passageiros”.

Os preços de passagens são voláteis. Há variações incríveis de preço de acordo com a data do voo, o período do dia, a antecedência da compra, os custos do combustível, a cotação do dólar e a intensidade da atividade econômica. É muito difícil, apenas 4 meses depois da mudança, estimar com grau aceitável de confiança se o valor médio das passagens sem direito a bagagem realmente teve queda suficiente para compensar a cobrança da tarifa nos demais bilhetes. Como alertou Maurício Schwartsman neste blog, o próprio aumento dos preços médios das passagens nacionais apurados nos índices do IBGE e da FGV (de 36% e 17%) entre junho e setembro não pode levar automaticamente à conclusão de que tenha havido elevação sistemática dos ganhos das empresas: o aumento da média pode ter ocorrido por variação sazonal, aumento da atividade econômica ou elevação do preço do combustível – ou uma combinação das três hipóteses.

Há ainda dúvidas sobre se as mudanças no critério de apuração do preço das passagens – que passou a incorporar o custo da remessa de bagagem – não estariam superestimando a elevação de preços médios.

De fato, estudos mais robustos e confiáveis só poderão ser feitos dentro de alguns meses, quando haverá dados suficientes para se avaliar se as variações nos preços das passagens não são decorrentes de outros fatores de oferta e demanda. A expectativa é que, isolados outros efeitos, seja possível estimar com precisão se a nova regra terá efetivamente baixado os preços das passagens sem direito à franquia de bagagem.

Por outro lado, já é possível julgar se o modelo de tarifação da bagagem despachada adotado pelas empresas é consistente com a argumentação de que a medida não tem por finalidade expandir seu lucro, mas apenas eliminar o subsídio cruzado do serviço, imputando os custos incorridos com o serviço apenas aos usuários que o utilizam.

Nessa perspectiva, o que se espera é que o modelo de cobrança de tarifas onere os usuários que despacham bagagens em montante equivalente ao custo do serviço. Isso não está ocorrendo. As maiores empresas estão cobrando uma tarifa fixa de R$ 30, que independe dos custos variáveis, como a distância do voo, o peso da bagagem e o número de conexões previstas. O passageiro que despacha uma mala de 10 quilos de Brasília a Goiânia em um voo direto está pagando o mesmo que um passageiro que despache 23 quilos de Manaus a Porto Alegre, em voo com uma conexão.

Talvez a explicação esteja então nos custos fixos? Também não. Os custos fixos são aqueles necessários à construção e à manutenção da estrutura física de despacho de bagagens (guichês de recepção, balanças, esteiras, espaço na aeronave, estrutura de desembarque e entrega no aeroporto de destino) e à manutenção de uma equipe mínima de funcionários.

Os custos fixos são decorrentes da escala prevista de operação. Se a escala adotada é suficiente para atender, digamos, 60% dos passageiros, o custo dessa infraestrutura irá se manter durante toda a sua vida útil, ainda que nem metade desse percentual demande o serviço após a cobrança. É como o caso do Estádio Mané Garrincha, em Brasília: ainda que não haja um só espectador, as despesas anuais de manutenção e de pagamento do custo financeiro da obra continuarão a ser pagos. Nem se o estádio fosse implodido, os custos do endividamento desapareceriam. Na verdade, é possível demonstrar que, para uma empresa, é racional, no curto prazo, não cobrar ou cobrar apenas parcialmente os custos fixos, se essa for a condição necessária para obter alguma receita líquida de custos variáveis.

Assim, ainda que haja redução imediata do número de bagagens, isso não reduzirá os custos fixos de operação e, portanto, não haverá benefícios para os que não despacham ou deixarem de despachar bagagens.

Se, segundo o modelo adotado, os custos variáveis não estão afetando a tarifa e se os custos fixos não podem afetá-la no curto e no médio prazo, pode-se afirmar com certeza que o modelo de cobrança adotado não se presta a eliminar o subsídio cruzado – o motivo alegado pela ANAC e pela ABEAR para introdução da cobrança.

Aperte os cintos: a passagem aérea subiu.

 

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Qual a consequência do ativismo judicial na fixação dos preços das passagens aéreas? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2048&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=qual-a-consequencia-do-ativismo-judicial-na-fixacao-dos-precos-das-passagens-aereas https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=2048#comments Mon, 04 Nov 2013 11:04:43 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=2048 O transporte aéreo é uma atividade econômica regulada pelo Governo Federal, que mediante concessão autoriza sua prestação a empresas privadas de aviação. Essa exploração pela iniciativa privada cria a necessidade de um sistema regulador estatal para dimensionar, formular e fiscalizar a prestação do serviço. No caso do transporte aéreo, esta competência é da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC). Uma de suas atribuições é realizar a regulação econômica do setor, fazendo o respectivo monitoramento e promovendo possíveis intervenções no mercado de modo a buscar a máxima eficiência.

Apesar de existir em funcionamento um mercado de transporte aéreo com preços oscilando conforme as regras de oferta e demanda e de haver uma agência reguladora controlando o setor, aconteceu recentemente uma intervenção do Poder Judiciário, decorrente de uma ação civil pública, que pode acarretar perda de bem-estar social. A nosso ver, tal intervenção gera distorção maior que aquela que o juiz se propõe a resolver.

Conforme o Ministro Luís Roberto Barroso, o ativismo judicial é uma atitude, a escolha de um modo específico e proativo de interpretar a Constituição, expandindo o seu sentido e alcance1. É nesse sentido que se pretende discutir uma decisão recente da Justiça Federal2, em que foi adotada uma interpretação do ordenamento jurídico, cujo reflexo trará prejuízo ao consumidor, apesar de a base da decisão, segundo a magistrada, serem os princípios norteadores da atividade econômica previstos no art. 170 da Constituição Federal, entre eles a livre concorrência, a função social da propriedade e a defesa do consumidor.

Na referida decisão, a magistrada condenou a empresa TAM Linhas Aéreas a: a) ofertar aos usuários, nos voos com destino para e/ou origem em Imperatriz-MA, no

mínimo, 50% dos assentos com a tarifa denominada “básica”; b) nos meses de alta demanda, em especial dezembro/2013 e janeiro/2014, cobrar do usuário-consumidor o valor máximo de até 50% da tarifa máxima do plano “básico”.

A argumentação da magistrada para tabelar as passagens aéreas para Imperatriz-MA baseia-se no fato de que existe um bem jurídico imediato afetado na relação sub judice que é o direito do consumidor. Entende que o valor das passagens foi elevado abusivamente, uma vez que o trecho entre Imperatriz/MA e Brasília/DF custava R$ 289,00 e passou para R$ 1.529,00 em janeiro de 2014, caindo para R$ 429,00 em fevereiro de 2014. A magistrada argumenta que a TAM ao invés de ampliar a oferta para os meses de referência, devido à procura mais acentuada pelos usuários, limita-se a elevar de forma desarrazoada os preços das passagens aéreas, colocando o consumidor em desvantagem exagerada.

Argumenta ainda a magistrada que, diante da omissão da ANAC em efetivar os comandos insculpidos nos arts. 2° c/c 8° da Lei nº 11.182/05, acaba por deixar tal tarifação à álea e à deriva dos exclusivos interesses das concessionárias aéreas, em prol da política do regime de liberdade tarifária, como se o fornecimento de serviço de transporte aéreo de passageiros fosse, na sua gênese, atividade privada. Esquecendo-se que se trata de “prestação de serviço público”, e da peculiar circunstância de que a ré está a exercer a atividade empresária como longa manus da União, eis que se encontra na condição de concessionária de serviço público, nos termos do art. 21, XII, c, da Constituição Federal de 1988.

No texto disponível neste site, “Empresa aérea é concessionária de serviço público?”, foi explicado que a Lei nº 11.182, de 2005, instituiu o regime de liberdade tarifária, de forma que a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) não pode tabelar os preços das passagens aéreas, como fez o antigo Departamento de Aviação Civil (DAC) ao longo de quase toda sua existência.

A mesma lei também assegura às empresas a exploração de quaisquer linhas aéreas, observada exclusivamente a capacidade operacional de cada aeroporto e as normas regulamentares de prestação de serviço adequado. Antes dessa legislação, as empresas estabelecidas eram protegidas contra novas entrantes, dificultando a concorrência.

Outro ponto a ser destacado é que concessão de serviços aéreos não confere à empresa o direito ou a obrigação de voar entre quaisquer localidades. O direito de voar somente existe após a outorga de uma autorização específica para cada linha a ser explorada. Essa autorização, denominada Horário de Transporte (HOTRAN), estabelece horários, frequências, tipos de aeronaves e oferta de assentos para cada linha.  As empresas aéreas não têm, nem nunca tiveram, portanto, qualquer obrigação de operar em condições deficitárias. Podem, a qualquer tempo, comunicar ao poder público que não mais operarão determinada linha e solicitar o cancelamento do respectivo HOTRAN.

Se o trecho Brasília-Imperatriz fosse extremamente lucrativo, outras empresas teriam interesse em oferecer voos entre essas cidades. Se não o fazem, é porque não há exageros na rentabilidade.

Por outro lado, se os preços praticados estivessem razoáveis, a partir do momento que houve o tabelamento, a empresa talvez não tenha mais interesse em manter essa linha, uma vez que ela não é obrigada a trabalhar de forma deficitária. Isso é o mais provável que aconteça caso o entendimento persevere no Judiciário: uma descontinuidade da linha, com efeitos negativos para os próprios consumidores de passagens entre Brasília e Imperatriz.

Outra possível consequência perversa da decisão é o aumento das tarifas dessa linha em períodos não tabelados. Para custear os passageiros de dezembro e janeiro, quem viajar nos restante do ano terá de pagar mais caro.

Além disso, como o tabelamento funciona para a primeira metade dos assentos vendidos, há um nítido favorecimento dos consumidores que comprarem primeiro, que conseguirem se planejar, em detrimento daqueles que precisarem voar esse trecho por conta de uma emergência, por exemplo, ou que não tiverem a oportunidade de comprar a passagem com muita antecedência.

Por fim, pode acontecer também que, para manter o voo a preços que não lhe garanta lucro, a TAM tenha de aumentar a tarifa de outros voos, de forma que os passageiros do país inteiro teriam que subsidiar aqueles que viajam entre Brasília e Imperatriz (o que na teoria econômica se chama de subsídio cruzado). Em regra geral, quando o preço pago é diferente do custo de produção, gera-se uma ineficiência na economia, com perda de bem-estar. Essa alternativa, no entanto, não é tão provável pela dificuldade de exportar custo extra para outros trechos.

Note-se como uma decisão judicial tem o poder de alterar completamente o equilíbrio do mercado e prejudicar um número muito maior de consumidores do que os supostamente beneficiados.

Conforme o Relatório elaborado pela ANAC, “Tarifas Aéreas Domésticas”3, relativo ao quarto trimestre de 2012, para atender a um maior número de passageiros, otimizar a ocupação das aeronaves e alcançar rentabilidade, as preferências dos usuários devem ser consideradas na prestação e na precificação dos serviços. Em qualquer atividade econômica, a rentabilidade é fator principal para que se tenha investimento e oferta de serviços. Nesse sentido, as tarifas aéreas são ajustadas a todo instante de acordo com a procura e conforme se aproxima a data do voo.

Isto propicia o atendimento a uma maior diversidade de usuários e uma taxa de ocupação da aeronave que sustente a prestação do serviço. Além das preferências dos usuários, os preços do transporte aéreo são afetados, direta ou indiretamente, por outros inúmeros fatores, tais como: evolução dos custos (estes fortemente influenciados pelo preço do barril de petróleo e pela taxa de câmbio do real em relação ao dólar); eficiência da empresa; distância da linha aérea; grau de concorrência do mercado; densidade de demanda; baixa e a alta temporada; ações promocionais de concorrentes; restrições de infraestrutura aeroportuária e de navegação aérea; organização da malha aérea da empresa; porte e eficiência das aeronaves; e taxa de ocupação das aeronaves.

Importante destacar que a distância é apenas um dos fatores que afetam os preços do transporte aéreo, mas não é o preponderante, pois o consumo de combustível é proporcionalmente maior na etapa de decolagem. Quando a aeronave atinge sua velocidade de cruzeiro, o consumo de combustível é menor.

A demanda de voos entre as localidades de origem e destino, por outro lado, é decisiva. Voos entre destinos com baixa densidade de tráfego podem não ser viáveis financeiramente e, quando viáveis, têm passagens mais caras.

Como se percebe, existem diversos fatores que influenciam o preço das passagens, por isso é comum haver passageiros de um mesmo voo pagando tarifas diferentes. É essa dinâmica que propicia a oferta de alguns assentos a baixo preço no transporte aéreo.

Sobre a evolução dos preços das tarifas, apesar de haver liberdade tarifária, alvo da decisão judicial em pauta, o gráfico abaixo ilustra como a tarifa aérea média doméstica real, em valores deflacionados pelo IPCA até dezembro/2011, e o valor médio pago por quilômetro voado (Yield Tarifa Aérea Médio Doméstico Real) sofreram redução entre 2002 e 2011. Isto é, os passageiros estão pagando bem menos para voar hoje, do que no início da década.

O cenário de livre concorrência atrai investimentos para o setor, estimula o crescimento do mercado e promove a ampliação da oferta. A decisão judicial comentada pode reverter esse quadro. Ao tabelar a rentabilidade da iniciativa privada, mesmo sendo esta uma concessionária de serviço público, não se leva em conta o risco específico da atividade nem os custos e características de sua prestação. As consequências negativas serão sentidas pelos consumidores, além de ser mais um agravante para a insegurança jurídica no país. Espera-se que as instâncias superiores do Judiciário tenham uma interpretação diferente acerca do tema.

_________

1 BARROSO, Luís R. “Ano do STF: Judicialização, ativismo e legitimidade democrática”. 2008. Disponível no site Conjur: http://www.conjur.com.br/2008-dez-22/judicializacao_ativismo_legitimidade_democratica. Acessado em 28/10/2013.

2 Processo 0009029-10.2013.4.01.3701 – TRF da 1ª Região

3 http://www2.anac.gov.br/estatistica/tarifasaereas

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