Comentários sobre: Por que é tão elevada a carga tributária sobre os serviços de saneamento básico? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=988&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=por-que-e-tao-elevada-a-carga-tributaria-sobre-os-servicos-de-saneamento-basico Mon, 27 Feb 2012 12:57:53 +0000 hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.2 Por: Faz sentido impor tributação tão elevada sobre o consumo de energia elétrica? | Brasil, economia e governo https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=988#comment-1077 Mon, 27 Feb 2012 12:57:53 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=988#comment-1077 […] ao longo dos anos (para uma análise do aumento do PIS/PASEP e COFINS, ver neste site o texto Por que é tão elevada a carga tributária sobre os serviços de saneamento básico?). Em terceiro lugar aparece uma miríade de “encargos setoriais” (para uma análise desses […]

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Por: Ricardo Araujo https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=988#comment-1058 Fri, 10 Feb 2012 19:33:32 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=988#comment-1058 Prezados Senhores:

Li com atenção o artigo publicado pelos senhores – com a contribuição certamente importante do economista Raul Velloso – na edição de 27 de janeiro do jornal Valor Econômico. Não tenho qualquer reparo à argumentação apresentada; antes, ela é correta e oportuna.
Como se trata de discutir a mobilização de recursos necessária a uma vigorosa expansão da oferta de serviços de saneamento, gostaria de acrescentar alguns outros aspectos, não exatamente fiscais, que representam problemas que concorrem para um cenário de dificuldades:
– A busca da universalização dos serviços, tanto de abastecimento de água quanto de esgotamento sanitário, impõe a necessidade de expansão dos sistemas de água em áreas periféricas novas e de ampliação dos sistemas de coleta e de tratamento de esgotos. Esta expansão, dadas as suas características, exige grandes investimentos em construção e operação, mas os retornos tarifários são desproporcionalmente baixos. Por que isso acontece? Em primeiro lugar, porque, ressalvadas diferenças regionais não exatamente desprezíveis, falta expandir redes de abastecimento de água e de coleta de esgotos principalmente em dois tipos de territórios urbanos: nas novas periferias metropolitanas e em cidades de população inferior a 10 mil habitantes. No primeiro caso, a população a ser incorporada à cobertura dos serviços apresenta consumo médio baixo e renda média igualmente reduzida; com frequência, reside em loteamentos de natureza irregular e em favelas, exigindo, nestes casos, intervenções das prefeituras para a regularização física e legal dos assentamentos. No segundo caso, há uma questão de escala e também de renda média baixa. Nas duas situações, as arrecadações tarifárias decorrentes encontram-se, em geral, abaixo dos custos de investimento e mesmo de operação das prestadoras dos serviços. Assim, são expansões fortemente subsidiadas pela companhia operadora. Por outro lado, ainda há muito a fazer, como todos sabemos, quanto ao tratamento de esgotos (incluídas as tubulações e elevatórias necessárias ao transporte dos esgotos coletados às estações de tratamento). Embora avanços relativamente importantes tenham sido obtidos, isto ocorreu em grande medida pela via dos recursos próprios e/ou obtidos na forma de financiamentos – houve aporte baixo de recursos de ordem fiscal, não onerosos. Quanto a isso, dois comentários: em países desenvolvidos, com áreas urbanas muito mais organizadas que as nossas e com rendas familiares médias maiores, as transferências fiscais foram um instrumento importante para o avanço desta infraestrutura; no Brasil, dada a estrutura tarifária habitualmente adotada, estas obras – e seus respectivos custos de operação – implicam grande aumento de despesas e nenhuma receita. Não obstante, é clara uma imensa pressão social para que estes investimentos sejam feitos em prazo curto, numa espécie de “queima” de etapas históricas. Voltando novamente aos países desenvolvidos, a sua cobertura dos serviços de saneamento tem levado várias e várias décadas para se completar – quando se completou -, resultando em um período de tempo bastante longo que não parece, no nosso caso, por maior que seja o paradoxo, algo politicamente realista.
– As empresas operadoras enfrentam uma perda de clientes nas faixas mais altas de consumo (sobretudo industriais), subsidiadores dos investimentos de expansão dos sistemas para as populações de renda mais baixa. Desde o Planasa, a estrutura tarifária (inclusive de prestadores municipais dos serviços) estabelece que consumos mais elevados pagam proporcionalmente muito mais; a escalada da tarifa, pelo consumo, é geométrica, e não aritmética. O conceito, não isento de contradições, mas engenhoso e de fácil operacionalização, leva a que consumidores maiores subsidiem consumidores menores. Usuários de baixa renda tendem a apresentar consumos médios reduzidos, o que os transforma em subsidiados. Na outra ponta, os maiores consumidores seriam os subsidiadores. Além disso, as tarifas industriais e comerciais são mais elevadas que as residenciais. Todavia, deseconomias dos grandes centros urbanos e a necessidade de agudo gerenciamento de custos por parte das empresas, sobretudo industriais, têm levado à transferência de plantas produtivas para áreas menos congestionadas (ainda que a alta gerência permaneça metropolitana), onde frequentemente dispõem de fontes próprias para o abastecimento de água.
– As prestadoras de serviços devem se defrontar, cada vez mais, com necessidades importantes de substituição de equipamentos e manutenção de grandes, médias e pequenas estruturas: há um inexorável envelhecimento dos sistemas, tanto de água quanto de esgotos. Uma vez que boa parte destas estruturas foi implantada nas últimas três décadas, mas com apreciável concentração delas entre 1970 e 1990, impõem-se gastos de reposição que antes não pressionavam os custos ao nível que mais e mais vai se tornando necessário.
– As expansões dos sistemas de água dependem, nas grandes metrópoles (mas não apenas nelas), da busca por mananciais novos, os quais se situam, invariavelmente, em locais mais distantes. Com isso, ampliam-se os ônus de investimentos e de operação, elevando-se o custo médio por metro cúbico de água produzido. Além disso, a expansão das malhas urbanas leva a pressões sobre os mananciais situados em bacias hidrográficas mais próximas, acarretando problemas por vezes agudos de qualidade na água armazenada em represas ou captada diretamente nos rios e ribeirões. Na melhor das hipóteses, este fato provoca um aumento dos custos de tratamento da água, antes de sua adução e distribuição à população; no pior cenário, corre-se o risco de perda do manancial, e a sua conseqüente substituição por outro recurso hídrico situado em bacia mais distante. Ainda outro ponto a destacar: existe uma tendência a exigências cada vez mais rigorosas das áreas da saúde e do meio ambiente quanto ao padrão de qualidade das águas nas represas (antes do tratamento) e das águas, já tratadas, distribuídas à população. Em quaisquer dos casos, ampliam-se os custos operacionais.
– Há uma crescente e poderosa influência do que se poderia chamar de um “ambiente de regulação” do setor – apesar das suas características institucionais fragmentárias, fragmentação esta que decorre do fato das concessões serem basicamente municipais, e não centralizadas na União ou nos Estados. Hoje, os novos contratos de concessão (contratos de programa, nos termos da Lei Federal de 2007), das empresas prestadoras estaduais com os municípios, já são efetivamente bilaterais, com regras claras de tarifas, de investimentos, de qualidade e de quantidade de serviços. No Estado de São Paulo, nas áreas de concessão da Sabesp, cresce a importância da Arsesp, agência reguladora dos serviços de energia e saneamento e com atuação pró-ativa. Mas o ambiente de regulação vai mais além, constituído por diferentes esferas e organizações de controle da atividade pública e privada. Podem ser destacadas, no âmbito do Executivo ou do Judiciário: as legislações e os órgãos de licenciamento e fiscalização ambiental; a defesa dos direitos do consumidor; a ação dos sistemas de gerenciamento dos recursos hídricos, da União e dos estados; a atuação do Ministério Público. Na esfera da sociedade civil, é crescente a importância de organizações ambientalistas e de defesa dos direitos do consumidor, dentre outras. Este ambiente regulatório novo é radicalmente diferente daquele de duas décadas atrás; observo, a propósito, que ele não exerce uma pressão apenas sobre os investimentos – a pressão vai além, sobre a qualidade dos serviços prestados (eficiência, regularidade, modicidade tarifária, cortesia no atendimento, etc.). Ressalvados os enormes méritos do controle social e da qualidade ampliada da prestação dos serviços, o fato é que as pressões de custos e de responsabilidades de médio e longo prazo das prestadoras de serviços, particularmente das maiores dentre elas, também se ampliam.
Todos estes fatores indicam, para o setor de saneamento, uma tendência ao que chamo de “receitas estacionárias e custos crescentes”. Assim, o aperto fiscal, tema do artigo dos senhores, complica grandemente o que já seria um cenário difícil.
Naturalmente, sempre alguém poderá replicar que todas estas empresas e organizações prestadoras de serviços, usualmente públicas, bem merecem uma situação nova e exigente, que requeira melhor gerenciamento de suas atividades, forte controle de custos, etc. Mas há um limite mesmo para a melhor gestão microeconômica. O risco é que as demandas se avolumem desproporcionalmente quanto aos meios disponíveis para o seu atendimento. Neste caso, as formas de superar os problemas escapam da esfera dos prestadores de serviços e tornam-se, ou devem se tornar, tema da agenda pública estratégica.

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