Luísa Cardoso – Brasil, economia e governo https://www.brasil-economia-governo.com.br Fri, 01 Feb 2013 12:30:02 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.2 Como está a desigualdade de gênero entre os estados brasileiros? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=1696&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=como-esta-a-desigualdade-de-genero-entre-os-estados-brasileiros Fri, 01 Feb 2013 12:28:13 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=1696 Medir de forma multidimensional o quão desigual é a situação das mulheres em relação aos homens é uma iniciativa empreendida por organizações internacionais há menos de vinte anos, mas já de grande importância para o debate sobre a igualdade de gênero em todo o mundo. Contudo, órgãos brasileiros ainda não proveem esses indicadores a nível nacional e a produção acadêmica brasileira na área está focada na elaboração de índices de desenvolvimento humano e não exatamente de índices de desigualdade de gênero.

Para preencher essa lacuna, foi construído o Índice Nacional de Desigualdade de Gênero (INDG) que calcula e compara a desigualdade de gênero entre as unidades federativas brasileiras de forma análoga à qual o Global Gender Gap Index (GGI), elaborado pelo Fórum Econômico Mundial, calcula e compara a desigualdade de gênero entre países.

Há de ser considerado que índices de comparação internacional uniformizam características regionais e disparidades internas tendem a ser ignoradas. Logo, é importante mensurar a desigualdade de gênero em cada estado da federação, pois torna-se possível desagregar a realidade nacional, revelando a magnitude da desigualdade nas diferentes partes do território brasileiro. OÍndice Nacional de Desigualdade de Gênero (INDG)  é entãoestruturado de acordo com a Tabela I.

Após serem calculadas cada umadas razões, é calculada a média dos subíndices de cada dimensão. Posteriormente, é calculada a média das quatro dimensões e esta será igual a pontuação final do estado, que pode variar entre zero (máxima desigualdade) e 1(igualdade).

Verifica-se, assim, o quão desigual é a maneira como homens e mulheres usufruem do nível de desenvolvimento do seu estado e não o nível geral de desenvolvimento estadual. O INDG, assim como o GGI, é um índice de desigualdade, não de desenvolvimento.

Tabela I
Estrutura do Índice Nacional de Desigualdade de Gênero (INDG)

Na dimensão Participação Econômica e Oportunidades, Roraima obteve o melhor resultado (0,87), apresentando a maior pontuação quanto à  quantidade de homens e mulheres que ocupam altos cargos (0,96), pontuação igual a 1 para a quantidade de técnicos, além de uma das pontuações mais altaspara o salário médio estimado (0,98).

Já o pior resultado foi o de Santa Catarina (0,67), apresentando a pior razão para o subíndice de disparidade salarial na mesma posição (0,61). A proporcionalidade entre os salários pagos para homens e mulheres ocupando o mesmo cargo só foi igual a 1 para dirigentes e para técnicos no Mato Grosso.

Quanto à dimensão Educação, osubíndice de alfabetização e de matrícula líquida do ensino fundamental são muito próximos de 1 para todos os estados, enquanto a matrícula líquida do ensino médio mostra prevalência feminina em todos os estados 4.

Já a razão da matrícula bruta do ensino superior só é menor do que 1 no Rio Grande do Norte. Em todos os outros estados, a proporção entre mulheres e homens universitários é maior do que 1 e, em Alagoas e no Maranhão, o número de mulheres matriculadas é quase o dobro do de homens. Assim, todos os estados obtiveram pontuação igual a 1.

Em todos os subíndices da dimensão Poder Político, os homens são expressivamente mais numerosos que as mulheres. Em dezesseis estados e no Distrito Federal, apenas homens foram eleitos para o cargo de senador. Nos outros dez estados, há apenas uma senadora para cada dois senadores.

Em relação aos deputados federais, o Espírito Santo apresenta o melhor resultado com 4 deputadas para 6 deputados, enquanto no Mato Grosso do Sul e em Sergipe não há mulheres eleitas. Já o Amapá obteve o melhor resultado para deputados estaduais e, apesar de não haver estados com a pontuação igual a zero nesse subíndice, Minas Gerais e Goiás apresentam pontuação igual a 0,05.

No subíndice dos governadores, vinte estados obtiveram pontuação igual a zero, enquanto Rio Grande do Norte e Maranhão, onde Wilma Maria de Faria e Roseana Sarney cumpriram, respectivamente, dois mandatos, foram os estados com as maiores pontuações (0,666).

Também na pontuação final da dimensão política, Rio Grande do Norte e Maranhão apresentaram os melhores resultados (iguais a 0,4 e 0,31, respectivamente). Curiosamente, assim como na dimensão econômica, Paraná e Santa Catarina obtiveram as pontuações mais baixas.

O INDG objetiva replicar o GGI e por isso a mesma estrutura de dimensões e subíndices foi mantida. Contudo, no Brasil, não há indícios de que os pais façam seleção  de sexo dos bebês e nem de que as mulheres, em relação aos homens, sofram privações nutricionais ou de acesso ao sistema de saúde que possam reduzir sua expectativa de vida.

Dessa forma, os estados têm uma performance igualitária e uniforme  no subíndice de expectativa de vida e apresentam pontuações maiores do que 0,996 no subíndicede nascimentos (lembrando que nascem naturalmente mais meninos do que meninas, em uma proporção aproximada de 105 para 100).

Os resultados finais do INDG, apresentados em ordem decrescente na Tabela II, refletem que o GGI calculado para o Brasil não é homogêneo para todo o território nacional, havendo diferenças consideráveis quanto à desigualdade de gênero entre os estados brasileiros. O Rio Grande do Norte obteve a pontuação geral mais alta (0,78), 15% maior do que a de Santa Catarina, que obteve a pior pontuação (0,676).

Tabela II
Resultado final do Índice Nacional de Desigualdade de Gênero (INDG)

A região Norte obteve a maior pontuação média, igual a 0,739, apesar de a pontuação média do Nordeste ser muito próxima, igual a 0,732. Já a pontuação média da região Sudeste foi igual a 0,721. Centro-Oeste e Sul apresentaram média igual a 0,706 e 0,698, respectivamente.

Apesar dos resultados muito parecidos e próximos de 1 nas dimensões de Educação e de Saúde, em nenhum estado o INDG final foi igual ou superior a 0,8. As dimensões de Participação Econômica e de Poder Político representam no índice geral como as mulheres brasileiras, em maior ou menor intensidade dependendo do estado onde vivem, ainda não usufruem do espaço público da mesma forma que os homens, seja no mercado de trabalho ou no exercício do poder governamental.

Embora os estados do Norte e do Nordeste, em geral, tenham obtido melhores resultados no INDG do que os estados do Centro-Sul, não é possível uniformizar os desempenhos estaduais por região. Além disso,pode-se afirmar que a renda parece não determinar diretamente o quão desigual é a relação entre homens e mulheres, como representado pelo Gráfico I.

Gráfico I
Relação entre o Índice Nacional de Desigualdade de Gênero
e a Renda Familiar Per Capita Média em R$

É possível observar que as unidades federativas mais ricas, como o Distrito Federal, São Paulo, Paraná e Santa Catarina, estão na metade inferior da distribuição, ao passo que os melhores resultados do INDG foram encontrados em estados relativamente pobres, como Rio Grande do Norte, Roraima, Maranhão e Amapá.

Por fim, deve-se ressaltar que a desigualdade de gênero é  uma estrutura fundamental da organização social, que é elaborada individual e coletivamente de forma constante, sendo impossível abarcar toda sua complexidade. Ainda assim, apesar das limitações dos indicadores quantitativos, é essencial reconhecer sua importância para dar visibilidade a fenômenos multidimensionais de forma simplificada.

Para ler mais sobre o tema:

CARDOSO, L. 2012. A Mensuração da Desigualdade de Gênero: Um Índice para os Estados Brasileiros. In: XIX Prêmio Corecon-DF de Economia. Brasília: Teixeira Gráfica e Editora, p. 225-285.ISSN 2179-4979

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[1] Matrícula líquida é definida pela UNESCO como a porcentagem de indivíduos de determinada faixa etária que estão efetivamente matriculados na série devida.

[2] Matrícula bruta é definida pela UNESCO como o número total de indivíduos matriculados em determinado nível educacional independentemente de sua idade.

[3] Caso a proporção seja maior do que 1, como acontece na dimensão de Educação, considera-se a pontuação máxima igual a 1.

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Como anda a desigualdade de gênero no Brasil? https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=846&utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=como-anda-a-desigualdade-de-genero-no-brasil https://www.brasil-economia-governo.com.br/?p=846#comments Mon, 14 Nov 2011 04:01:57 +0000 http://www.brasil-economia-governo.org.br/?p=846 Desde 2006, o Fórum Econômico Mundial divulga anualmente o Global Gender Gap Index (GGI), que quantifica a magnitude da desigualdade de gênero em mais de 100 países. Em 1º de novembro, foi publicado o GGI de 2011, que classificou o Brasil como 82º dentre 135 países no ranking.

Apesar de índices internacionais tenderem a formas quantitativas de mensuração, o GGI é inovador por combinar dados quantitativos aos qualitativos, estes obtidos pela Executive Opinion Survey do Fórum Econômico Mundial. Além disso, o GGI é o mais robusto dos indicadores de desigualdade de gênero, medindo as disparidades entre homens e mulheres em quatro dimensões, no total de 14 subíndices, de acordo com a tabela I a seguir.

Após serem calculadas as razões, ocorre a normalização dos subíndices por meio da equalização de seus desvios padrões. Os subíndices são então somados, gerando um número para cada dimensão. Posteriormente, é calculada a média das quatro dimensões e esta será igual à pontuação final do país, que pode variar entre 1(igualdade) e 0 (máxima desigualdade).

Em 2006, foram analisados 20 países a menos do que em 2011, e o Brasil, com uma pontuação igual a 0,6543, foi classificado como o 67º país dentre os 115 mensurados. Caso o número de países se mantivesse o mesmo em 2011, a pontuação brasileira, igual a 0,6679, classificaria o País na 76ª posição. Outrossim, nos dois períodos, o Brasil ficou abaixo do índice médio dos 115 países, igual a 0,6617 em 2006 e 0,6824 em 2011.

De 2006 a 2011, o crescimento médio dos índices foi de 4,03%, enquanto o Brasil apresentou uma pequena melhora de 2,1%. É um avanço realmente modesto quando comparado ao Lesotho e a Nicarágua, que aumentaram seus índices em 12,6% e 10,3% respectivamente. Mas é um progresso na busca da igualdade de gênero que não deixa de ser positivo, ao contrário de El Salvador, por exemplo, que viu seu índice diminuir em 3,9%.

O avanço concentrou-se no índice de participação econômica e oportunidades. Mas, apesar da maior inserção da mão de obra feminina no mercado de trabalho em comparação aos anos anteriores, a participação das mulheres ainda é aproximadamente 25% menor em relação à dos homens e a remuneração de homens e mulheres continua consideravelmente desigual.

O subíndice de igualdade salarial classifica o Brasil no último decil do ranking como o 124º país. Já o subíndice de profissionais técnicos, que mensura a mão de obra qualificada, surpreendentemente apresenta razão maior do que 1, o que significa maior quantidade de profissionais femininos do que masculinos, mesmo que, no geral, a taxa de desemprego de mulheres adultas seja 11%  e a dos homens adultos, 5%. No total, considerando a média dos subíndices, o desempenho brasileiro na dimensão econômica obteve a pontuação 0,6490, ocupando a 68ª posição.

Entretanto, é necessário ressaltar que o GGI não quantifica o trabalho informal e/ou doméstico, o que denota falta de representatividade do índice para países que, como o Brasil, tem parte expressiva de sua renda vinculada à economia informal. Infelizmente, nenhum outro índice em voga preenche essa lacuna. O índice de desenvolvimento humano (IDH) elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) não desagrega seus subíndices por sexo.  O Gender-Related Development Index (GDI) também criado pelo PNUD é considerado indicador de desenvolvimento e não de desigualdade, por não ter razões entre mulheres e homens como sua base de cálculo. O Social Institutions and Gender Index (SIGI) da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD) aborda o aspecto institucional da desigualdade de gênero e o Gender Equity Index (GEI) da organização Social Watch estuda o poder político, a educação e a participação econômica, mas não analisa a esfera da saúde, como faz o Global Gender Gap Index.

A dimensão concernente à saúde é a de melhor performance nacional no GGI, repetindo o que já havia sido observado em 2010, pois o Brasil obteve novamente a pontuação máxima, garantindo a 1ª posição junto a mais 37 países. Mas, isso não significa que o sistema de saúde brasileiro tenha qualidade satisfatória – o GGI não é um índice de desenvolvimento, mas de desigualdade de gênero. Logo, a pontuação representa apenas que há condições de igualdade entre homens e mulheres nessa esfera.

Também a educação brasileira é bem avaliada quanto à igualdade de gênero, mantendo-se a pontuação de 2010, igual à 0,990, sendo classificado como o 66º país nesse índice. A taxa de alfabetização é a mesma para homens e mulheres, havendo uma pequena prevalência masculina no ensino fundamental. Contudo, no ensino médio e no superior, as mulheres são mais numerosas do que os homens.

A dimensão política é a de pior desempenho do Brasil nos seis anos analisados, sendo classificado em 2011 como o 114º, com uma pontuação igual a 0,053, atrás de países como Chade, Mali e Azerbaijão. Esse cenário, contudo, apresenta-se melhor do que o do ano anterior, quando o índice político brasileiro obteve pontuação igual a 0,049. Vale ressaltar que o poder político tende a ser a dimensão mais desigual em todos os países analisados, mas a representatividade das brasileiras na política é ínfima e realmente alarmante, apesar da eleição da presidente Dilma Rousseff e das tentativas de se implementar uma política eleitoral efetiva de cotas para mulheres desde 1995.

As regras sobre a participação política feminina estabelecem apenas uma reserva partidária de vagas que, muitas vezes, acabam por não ser preenchidas, devido a uma gama de fatores culturais, sociais, econômicos, psicológicos e institucionais. E mesmo que as vagas sejam preenchidas, isso não significa necessariamente que haverá um maior número de mulheres eleitas.

Vários países latino americanos foram classificados de forma significativamente superior ao Brasil no quesito político. A Argentina, por exemplo, possui a 20ª colocação nesse índice, próxima do Chile na 22ª. Também no ranking geral, ambos estão melhor que o Brasil – o Chile está na 46ª posição e a Argentina na 28ª, a melhor classificação da América do Sul, enquanto na região, o Brasil é o último colocado, devido principalmente ao seu péssimo desempenho na política, atrás de vizinhos como Paraguai, Bolívia e Peru.

O desafio brasileiro, portanto, consiste em estender os bons resultados da educação para a economia e para a política. A qualificação profissional feminina deve servir de base para maior participação das mulheres no mercado de trabalho formal e para remuneração salarial igualitária, além de uma representação política, no mínimo, mais expressiva.

As mensurações fornecem subsídio para mover o debate analítico sobre a igualdade de gênero de uma postura passional para um posicionamento concreto baseado em argumentos objetivos, pois o que é medido e documentado é mais facilmente combatido. Assim, dar visibilidade ao posicionamento desigual de homens e mulheres na sociedade é fundamental para desconstruir o caráter estrutural da desigualdade de gênero, um dos mais persistentes eixos de desigualdade.

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Para ler mais sobre o tema:

http://reports.weforum.org/global-gender-gap-2011/

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